PA – Projeto de mineração Volta Grande-Belo Sun ameaça modos de vida e sobrevivência de povos indígenas, ribeirinhos e outras comunidades tradicionais
UF: PA
Município Atingido: Senador José Porfírio (PA)
Outros Municípios: Altamira (PA), Vitória do Xingu (PA)
População: Agricultores familiares, Extrativistas, Pescadores artesanais, Povos indígenas, Ribeirinhos
Atividades Geradoras do Conflito: Atuação de entidades governamentais, Mineração, garimpo e siderurgia
Impactos Socioambientais: Alteração no ciclo reprodutivo da fauna, Alteração no regime tradicional de uso e ocupação do território, Contaminação ou intoxicação por substâncias nocivas, Desmatamento e/ou queimada, Falta / irregularidade na autorização ou licenciamento ambiental, Falta / irregularidade na demarcação de território tradicional, Poluição de recurso hídrico, Poluição do solo
Danos à Saúde: Desnutrição, Insegurança alimentar, Piora na qualidade de vida, Violência – ameaça
Síntese
O Projeto Volta Grande – Belo Sun é o maior projeto de mineração de ouro a céu aberto do país e foi proposto pela empresa canadense Belo Sun Mining Corporation, que faz parte do grupo Forbes & Manhattan Inc. Mesmo com a saída de uma das principais acionistas do empreendimento – a empresa canadense Agnico Eagle Mines -, a mineradora Belo Sun tem outras cinco acionistas, mas sua composição passa por uma restruturação.
O empreendimento está localizado na região denominada Volta Grande do Xingu, no Estado do Pará, município Senador José Porfírio. Nessa área está situada a usina de Belo Monte, a maior hidrelétrica do país, com previsão de produzir 233 mil MW de energia quando estiver em pleno funcionamento. Esta área é composta por um trecho de aproximadamente 100 km do Rio Xingu, reconhecido por sua sociobiodiversidade, com presença de povos indígenas e comunidades ribeirinhas que vivem da pesca, da caça, do extrativismo e da agricultura familiar, atividades vinculadas aos ciclos sazonais de cheias e secas que acontecem na região.
As identidades predominantes nas comunidades que podem ser afetadas pelo projeto de mineração da empresa Belo Sun são tão amplas e complexas quanto a diversidade de populações que habitam a Volta Grande do rio Xingu: indígenas aldeados em suas terras, indígenas citadinos, indígenas em isolamento voluntário, agricultores, garimpeiros, ribeirinhos, assentados, pescadores e trabalhadores em geral.
Os passos iniciais para a extração de ouro começaram com a Licença Prévia (LP) emitida em 2014 pela Secretaria do Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (SEMAS), após a aprovação do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) pelo Conselho Estadual de Meio Ambiente do Pará (Coema). No dia 02 de fevereiro de 2017, foi emitida a Licença de Instalação (LI). Após uma série de ações civis públicas e cautelares ajuizadas pelo Ministério Público Federal (MPF) e pela Defensoria Pública do Estado do Pará (DPE/PA), apontando irregularidades na execução da obra, a licença foi suspensa. Essas irregularidades estão relacionadas à compra ilegal de terra dentro do assentamento PA Ressaca e ao despejo forçado de seus moradores, além da falta de consulta prévia, livre e informada aos povos indígenas da região e da ausência de um estudo de impacto ambiental nas terras indígenas Paquiçamba (povo Juruna) e Arara da Volta Grande (povo Arara), fora outras ilegalidades no processo de licenciamento ambiental.
A região já vem sendo altamente impactada pela construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, e movimentos sociais – como o Movimento Xingu Vivo para Sempre e a Cooperativa Mista dos Garimpeiros da Ressaca, Itatá, Galo, Ouro Verde e Ilha da Fazenda (Coomgrif) – e organizações da sociedade civil – como o Instituto Socioambiental (ISA) – se mobilizam para impedir o andamento da obra.
Além do MPF, da DPE/PA e dos movimentos sociais, a obra vem sendo questionada pelo Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI), pela Defensoria Pública da União (DPU), e por acadêmicos e pesquisadores da Universidade Federal do Pará (UFPA), além de mais de 800 mil signatários de todo mundo, que subscreveram uma petição compartilhada através da plataforma Avaaz contra a mineradora e seus investidores.
Contexto Ampliado
“O rio é a nossa mãe e pai. Nós sobrevivemos dele, o rio pra nós é tudo, é a nossa vida. Como diz a história, o rio é nosso, é dos Juruna. Antes dos brancos chegarem, nós sempre fomos um povo canoeiro, sempre sobrevivemos do rio. Por que nós chamamos Yudja? Os donos do rio. Nós somos os donos do rio. O rio pra nós é tudo. Enquanto existir o Xingu, nós estamos lutando. Vamos até o fim. Quando ele morrer, nós morre[remos] junto.” – Gilliarde Juruna, em entrevista na matéria “A Volta Grande do Xingu: curva do rio que banha duas terras indígenas”, publicada no site da Associação Yudja Miratu da Volta Grande do Xingu.
O Projeto Volta Grande – Belo Sun é uma proposta da empresa canadense Belo Sun Mining Corporation, pertencente ao grupo Forbes & Manhattan Inc., um banco mercantil de capital privado que desenvolve projetos internacionais de mineração, e que já investiu mais de R$ 4 bilhões na obra. Em seu próprio site, a empresa qualifica o empreendimento como o “maior projeto de ouro em desenvolvimento no Brasil”. Está situado no município Senador José Porfírio, divisa com o município de Altamira, no Pará, na região denominada Volta Grande do Xingu, onde está localizada a usina de Belo Monte, a maior hidrelétrica do país. Segundo o jornal O Valor, em matéria publicada no dia 21 de julho de 2017, quando estiver completamente concluída, a Usina de Belo Monte terá capacidade de 11,233 mil MW, dos quais 11 mil MW serão provenientes da casa de força principal e 233,1 MW da casa de força complementar.
Esta área corresponde a um trecho de aproximadamente 100 km do Rio Xingu, conhecido por sua rica sociobiodiversidade, habitada por povos indígenas e comunidades ribeirinhas que vivem da pesca, da caça, do extrativismo e da agricultura familiar, atividades relacionadas aos ciclos sazonais de cheias e secas que acontecem na região.
Segundo estudo produzido pelo Instituto Socioambiental, a instalação da hidrelétrica de Belo Monte causou uma série de impactos à Volta Grande do Xingu, provocando o desvio de grande parte do fluxo d’água do Rio, diminuindo a vazão no denominado Trecho de Vazão Reduzida (TVR). Essa redução no volume de água vem gerando impactos inéditos e diretos sobre a qualidade da água, a flora e fauna, a pesca e sobre importantes elementos socioculturais dos povos que lá vivem.
O projeto minerário da Belo Sun pretende se instalar exatamente nessa área, denominada Área Diretamente Afetada (ADA) da Usina Hidrelétrica Belo Monte, na região do Trecho de Vazão Reduzida (TVR), de acordo com o próprio licenciamento ambiental da mineradora. A mina, segundo o projeto, estaria a aproximadamente 10 quilômetros da barragem de Belo Monte, a nove quilômetros da Terra Indígena Paquiçamba, habitada pelo povo indígena Juruna, e a 13 quilômetros da Terra Indígena Arara da Volta Grande, habitada pelo povo indígena Arara, na área diretamente impactada pela usina.
O município de Senador José Porfírio, onde se prevê a instalação do empreendimento, tem um grande território, o único descontínuo do Estado, com aproximadamente 14 mil km², e uma população de aproximadamente 13 mil pessoas, segundo os dados do IBGE. As terras indígenas correspondem a 70% do território. Ainda de acordo com o IBGE, o município tem o menor IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) da região e também lidera o ranking de mortalidade infantil do Estado, com mais de 44 mil casos somente no ano de 2014. O saneamento básico do município atinge apenas 6,5% da população.
O Estado do Pará foi campeão de desmatamento nos últimos anos. De agosto de 2010 a janeiro de 2017, o desmatamento atingiu cerca de 390 km². De acordo com Daniel Bragança, em matéria publicada no site O Eco, Altamira e Senador José Porfírio são o segundo e o terceiro municípios, respectivamente, com o maior índice de desmatamento do Estado. Em cinco anos, de 2013 a 2017, o desmatamento no município de Senador José Porfírio aumentou mais de 500%. Entre os anos de 2009 a 2011, o desmatamento atingiu cerca de 15% da área do município (por volta de 2000 km²). Em apenas seis meses, entre agosto de 2017 a janeiro de 2018, foram desmatados 330 km²
Os investimentos anunciados para o empreendimento são de mais de um bilhão de reais e a previsão é de que a exploração aconteça por 12 anos. Os números referentes à quantidade de ouro extraída nesse período, entretanto, variam. Segundo a Agência Pública e outros veículos, serão extraídas cerca de 60 toneladas em 12 anos. A própria empresa tem dados controversos relacionados à quantidade de ouro a ser extraída: no processo de licenciamento, a previsão é de que se retire 45 toneladas em 12 anos. No entanto, no site da empresa, a informação é que serão extraídas aproximadamente 160 toneladas de ouro.
Segundo estudo publicado pela Fundação Rosa Luxemburgo, denominado “Veias abertas da Volta Grande do Xingu”, ao longo desse período está previsto que a empresa pague por volta de R$ 60 milhões em royalties de mineração para o Estado, o que equivale aproximadamente a R$ 5 milhões por ano. Desse total, 65% serão destinados a Senador José Porfírio, município do empreendimento. Em impostos, Belo Sun deve gerar aproximadamente R$ 130 milhões, nos níveis federal, estadual e municipal, durante o período de instalação. Na sua operação, serão R$ 55 milhões ao ano, também para impostos nas três esferas.
Segundo a Agência Pública, a atividade minerária não é novidade na região. Em entrevista concedida à Agência, Gilberto Amaral, da cooperativa Mista dos Garimpeiros da Ressaca, Itatá, Galo, Ouro Verde e Ilha da Fazenda (Coomgrif), afirmou que os pioneiros do garimpo artesanal chegaram àquelas terras por volta de 1930 e 1940, quando muitas pessoas migraram para a região, principalmente, oriundas do garimpo de Serra Pelada (PA). Em 1970, a primeira grande empresa mineradora, denominada Orca Mineração, se instalou no local. A partir de então, os povos indígenas, garimpeiros artesanais, ribeirinhos, camponeses e pescadores passaram a ser alvo de tentativas de expropriação territorial e conflitos violentos. Em meados dos anos de 1980, a exploração mineral da Volta Grande passou a ser realizada por outra empresa, denominada Verena Minerals Corporation. Entretanto, até o início da década de 1990, o nome da Orca Mineração ainda estava relacionado à tentativa de expulsão de pequenos garimpeiros e processos envolvendo pistolagem.
No dia 30 de junho de 2010, em Toronto, Canadá, se reuniram em assembleia os acionistas da Verena Minerals Corporation, aprovando alterações na composição da administração da empresa e a adoção de um novo nome: Belo Sun Mining Corporation. Nesse mesmo ano, outro evento marcou o início de transformações para a região da Volta Grande: o leilão para a obra da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, vencido pela Norte Energia, consórcio composto por Centrais Elétricas Brasileiras S.A (Eletrobras), Vale S.A, Companhia Energética de Minas Gerais S.A (Cemig), Light S.A., entre outras empresas. As obras tiveram início em agosto de 2011, causando profundos impactos na região (ver neste Mapa informações específicas sobre a construção da hidrelétrica de Belo Monte).
De acordo com a Agência Pública, a Belo Sun está envolvida em 42 processos minerários no Pará, especificamente nos municípios de Altamira, Anapu, Pacajá, Senador José Porfírio, Vitória do Xingu e Itaituba. Nos municípios situados na região da Volta Grande do Rio Xingu, os requerimentos da empresa são de autorização de pesquisa e de disponibilidade para pesquisa de ouro, minério de ouro e tantalita. Desses, 18 já estão com autorização de pesquisa junto ao Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). O atual projeto de Belo Sun prevê duas cavas, denominadas Ouro Verde e Grota Seca, as duas com, aproximadamente, 220 metros de profundidade. Os nomes fazem referência a duas antigas minas de ouro existentes na área e exploradas por garimpeiros locais.
A primeira audiência pública sobre as minas da Belo Sun aconteceu no dia 13 de setembro de 2012, no município de Senador José Porfírio (PA), e foi coordenada pelo titular da Sema na época, José Alberto da Silva Colares. Também estiveram presentes a Procuradoria Geral do Estado (PGE), o Ministério Público Federal (MPF), a Defensoria Pública do Estado (DPE/PA) e a Prefeitura de Senador José Porfírio. Nessa época, a expectativa de implantação das obras era o ano de 2013, sendo a operação prevista para começar em 2015, acompanhando o cronograma da hidrelétrica de Belo Monte. Segundo a Agência Pública, o projeto previa a extração de aproximadamente 60 toneladas de ouro durante 12 anos, e a produção de milhares de toneladas de rejeitos tóxicos que deveriam ser armazenados em barragens localizadas à beira do rio Xingu.
Essa barragem de rejeitos teria uma capacidade de 35,43 milhões de metros cúbicos ao final da operação. A barragem do Fundão, em Mariana, que rompeu em novembro de 2015, gerando o maior desastre ambiental já registrado no país, comportava oficialmente 2,65 milhões de metros cúbicos de areia, lama e detritos de minério, mas vazaram do reservatório 55 milhões de metros cúbicos de rejeitos, segundo a Fundação Estadual do Meio Ambiente de Minas Gerais (FEAM).
Apesar de qualificar como alto o risco de ruptura da represa, a mineradora não informa quais seriam as consequências de um possível desastre aos indígenas e ribeirinhos que vivem na região. Ao final da exploração, a iniciativa prevê deixar duas pilhas gigantes de material tóxico, que somadas terão área de 346 hectares, com altura média de 205 metros e 504 milhões de toneladas de rochas. Segundo o professor Friedhelm Korte, da Universidade Técnica de Weihenstephan, na Alemanha, a extração do ouro produz toneladas de lama em parte contaminada com metais pesados, como chumbo, cádmio, cobre, mercúrio e arsênio. “O processo de lavagem resulta em centenas de outras substâncias, cujas reações entre si não foram pesquisadas”, alertou o especialista, em matéria publicada pela DW Brasil.
A VOGBR Recursos Hídricos e Geotecnia LTDA – mesma empresa que planejoua barragem do Fundão, que se rompeu em Mariana/MG -, também está envolvida no projeto minerário de Belo Sun; e Samuel Paes Loures, o engenheiro civil que assinou o laudo de segurança da barragem do Fundão, é o mesmo engenheiro que assinou o laudo de segurança de Belo Sun. Eles foram denunciados pelo MPF e pela Polícia Civil de Minas Gerais – juntamente com a Samarco Mineração S.A, Vale e a multinacional anglo-australiana BHP Billiton – pelo desastre em Mariana (MG) que matou 19 pessoas e contaminou 650 km ao longo da bacia do rio Doce.
Outro risco de contaminação pode acontecer pelo uso do cianeto, utilizado no processo de beneficiamento do ouro, método mais comum empregado pelas indústrias de mineração no mundo. O cianeto gera subprodutos de alta toxicidade para humanos, fauna, flora e águas, o que exige um minucioso controle e monitoramento, inclusive quando a operação da mina for encerrada. De acordo com o estudo realizado pela Fundação Rosa Luxemburgo, se a mineração operar por 12 anos, como previsto, estima-se que 10.500 toneladas de cianeto terão sido utilizadas na retirada do ouro. Os estudos da Belo Sun apontam que já há arsênio, antimônio, chumbo, cobre e enxofre nos materiais analisados na região. Além do potencial de contaminação dos ecossistemas, a presença desses elementos poderia ampliar a necessidade do uso de cianeto no processamento do ouro.
De acordo com a Ficha de informações de segurança de produtos químicos (FISPQ), o cianeto é uma substância tóxica para o organismo humano. Geralmente é utilizado na separação do ouro na forma de sais de sódio (cianeto de sódio), e a exposição a pequenas quantidades do produto já é suficiente para náusea, vômito, dor abdominal, palpitações, alteração respiratória, confusão, ansiedade e vertigem. Pode levar à morte se ingerida uma dose maior do que 180 mg. Ao ser inalado, pode causar irritação da garganta e dificuldade respiratória, também havendo o risco de morte. Ao entrar em contato com a pele pode causar coceira, irritação e queimaduras. Por fim, em contato com os olhos pode causar irritação e queimaduras, com desconforto, lacrimejamento e visão borrada.
A exposição crônica ao cianeto de sódio, quando em doses não-fatais, pode desencadear alterações auditivas, perda do apetite, dor de cabeça, fraqueza, náusea, tontura, irritação do trato respiratório, dermatoses, danos ao sistema nervoso e alterações no hemograma (células sanguíneas).
Outros riscos relacionados à saúde são ressaltados pelo Parecer Técnico do COEMA sobre o empreendimento, publicado em novembro de 2013. A demanda por serviços de saúde será potencializada pela intensificação da migração para a região. O documento aponta que os indicadores socioeconômicos descritos no EIA-RIMA do empreendimento revelam uma exposição da população a diversos tipos de doença, atrelada a falta de abastecimento de água, saneamento básico e coleta seletiva do lixo. Esse quadro será agravado pelos riscos de contaminação do solo, ar, água e geração de ruídos que Belo Sun poderá causar. Por fim, há uma preocupação com o aumento de doenças transmissíveis por vetores como a malária, leishmaniose e dengue.
Outra polêmica do projeto é o uso de água nas diversas etapas de extração de ouro. Inicialmente, a empresa pretendia captar água do próprio rio Xingu, mas a proposta foi vetada pelo Governo do Estado do Pará. Segundo matéria publicada no jornal o Estado de São Paulo, o Secretário do Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará, Luiz Fernandes Rocha, afirmou que os técnicos da Sema já impuseram adaptações ao projeto relacionadas à utilização das águas, vetando o uso do rio Xingu. Segundo o Secretário, “a empresa só poderá utilizar águas submersas ou água da chuva”. Além disso, por ser um rio federal (o rio Xingu atravessa dois estados brasileiros, Pará e Mato Grosso), seria necessária uma licença da Agência Nacional das Águas (ANA), acompanhada pelo IBAMA, para utilização de suas águas.
Sem a opção de utilizar as águas do rio Xingu, Belo Sun previu a construção de dois poços tubulares para garantir o abastecimento na fase de implantação da mina. A água potável seria utilizada para consumo dos trabalhadores. Haveria, ainda, a demanda de água para serviço e uso geral, que deveria ser captada superficialmente do rio Itatá, do igarapé Ressacão e de um igarapé próximo à área da Grota Seca. Até julho de 2017, a Semas não havia concedido nenhuma dessas licenças para o uso da água. Para atender à demanda, além de manter um dos poços em funcionamento, seriam construídos dois lagos de contenção, abastecidos com água da chuva.
De acordo com matéria da agência Eco, redigida por Carlos Gabaglia Penna, a mineração consome volumes exorbitantes de água em várias etapas: na pesquisa mineral, na lavra, no beneficiamento, no transporte por minerodutos e na infraestrutura. Frente a tudo isso, uma série de impactos pode acontecer, como o aumento da turbidez e a consequente variação na qualidade da água e na penetração da luz solar nos rios; alteração do pH da água, tornando-a geralmente mais ácida; derrame de óleos, graxas e metais pesados; redução do oxigênio dissolvido dos ecossistemas aquáticos; assoreamento de rios; poluição do ar, principalmente por material particulado; e perdas de grandes áreas de ecossistemas.
A demanda dessa quantidade de água para a mineração – aproximadamente seis milhões de litros de água por dia – seria suficiente para abastecer uma cidade de 45 mil habitantes, segundo o estudo elaborado pela Fundação Rosa Luxemburgo. Na tentativa de diminuir as críticas da população, a SEMAS estabeleceu, como uma das condicionantes à licença de instalação, que a empresa realizasse, mensalmente, o monitoramento hidrológico no trecho do Xingu onde se encontra a mina. Contudo, a atuação do órgão estadual tem sido insuficiente para reduzir os receios que um desastre possa acontecer. Representantes do Movimento Xingu Vivo para Sempre, do Instituto Socioambiental e autoridades públicas do MPF e DPE/PA alertam para os riscos de contaminação, rompimento da barragem de rejeitos e até a possibilidade de as explosões da mina afetarem a estrutura da UHE Belo Monte.
As populações
Segundo o Instituto Socioambiental, o mapa identitário das comunidades a serem afetadas pelo projeto de mineração da empresa Belo Sun é tão amplo e complexo quanto a diversidade de populações de Volta Grande do rio Xingu: indígenas que vivem em terras indígenas, indígenas citadinos, indígenas em isolamento voluntário, agricultores, garimpeiros, ribeirinhos, assentados, pescadores e trabalhadores em geral.
De acordo com matéria da Agência Pública, o centro desse projeto é uma área de assentamento da reforma agrária sob responsabilidade do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). Esse assentamento está localizado na Gleba Ituna, onde há cinco projetos de reforma agrária instalados. O empreendimento ocuparia, inicialmente, um trecho de cerca de 1.400 hectares do chamado PA Ressaca, criado em 1982 numa área total de 30.265 hectares. Essa área destinada para o assentamento era, anteriormente, habitada por povos indígenas.
Ainda segundo a Agência Pública, parte dos moradores decidiu se fixar em vilas próximas ao rio Xingu, entre as quais pode-se destacar a vila Ressaca, Galo, Ilha da Fazenda, Grota Seca e Ouro Verde. Antes da consolidação do assentamento, a ocupação dessas áreas se intensificou nas décadas de 1930 e 1940, quando começaram a se desenvolver pequenos comércios, escolas e alguns serviços públicos, e a vila da Ressaca acabou se consolidando como um centro econômico de Volta Grande. O dinheiro que circulava vinha, principalmente, da venda do ouro, de produtos agrícolas, de aves e peixes.
A atividade garimpeira dessa região é diferente das outras áreas da Amazônia por ser associativa e em menor escala, gerando menos impactos socioambientais. Criada em 2006, na vila da Ressaca, a Cooperativa Mista dos Garimpeiros da Ressaca, Galo, Ouro Verde e Ilha da Fazenda (COOMGRIF) conseguiu regularizar, apenas parcialmente, a atividade perante os órgãos oficiais, como o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). Segundo o vice-presidente da COOMGRIF, José Pereira Cunha, que chegou à região no começo dos anos 1980, apesar das tentativas de legalizar a atividade garimpeira na região, o DNPM sempre priorizou a mineração industrial.
Na década de 1990, a situação começou a se transformar, principalmente, por conta da escassez de ouro mais superficial, o que promoveu disputas territoriais entre os garimpeiros artesanais e a empresa minerária Verena Minerals Corporation. Os conflitos se intensificaram com a chegada, em 2010, da empresa canadense Belo Sun. De acordo com o estudo da Fundação Rosa Luxemburgo, desde que adquiriu a mineradora Verena, além do direito de explorar lotes dos “donos dos garimpos”, a Belo Sun tem comprado ilegalmente o direito de posse de assentados na área do PA Ressaca com intenção de conseguir a instalação de sua estrutura para exploração. O relatório financeiro da Belo Sun Mining revela que foram gastos R$ 4,5 milhões na compra de direitos de posse de terra no Brasil.
Segundo esse mesmo estudo da Fundação Rosa Luxemburgo, as insatisfações com o projeto minerário apresentadas pela grande maioria dos garimpeiros da região são compartilhadas também pelos assentados do PA Ressaca. Nos últimos anos, técnicos da empresa fizeram o cadastramento das famílias, lotes e atividades econômicas daqueles que seriam afetados pelo empreendimento. Alguns venderam suas terras, outros estão ainda aguardando as ofertas da empresa. Segundo o jornalista Marcel Gomes, que elaborou o estudo, a avaliação geral é de que a empresa causa insegurança aos moradores com o objetivo de comprar os lotes com o menor preço possível. Os moradores das vilas da Ressaca, Galo e Ouro Verde relatam pressões e ameaças de despejo por parte da empresa. As vilas são compostas por três comunidades, em um total de 977 habitantes, que vivem da roça, pesca e do garimpo artesanal. O maior número está concentrado na Vila da Ressaca, com 453 pessoas, e todas elas deverão ser realocadas caso o empreendimento seja construído.
Não há informações precisas sobre indenizações a esses moradores. O lider comunitário Francisco Pereira dos Santos, entrevistado por Marcel Gomes, afirmou que o valor está estimado entre R$ 10.000 a R$ 20.000 por família. Alguns afirmam que não pretendem sair da região, já que tiram sua subsistência das roças e dos pescados. Juliana Magalhães, gerente de Desenvolvimento Social de Belo Sun, segundo o mesmo documento, afirma que essas negociações serão feitas somente após o restabelecimento da licença, atualmente suspensa.
Esse processo de vulnerabilização das comunidades locais face as irregularidades na compra de terrenos chamou a atenção da Defensoria Pública do Estado do Pará (DPE/PA), que entrou com uma Ação Civil Pública (ACP) na Vara Agrária de Altamira, vinculada ao Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJ-PA), no dia 15 de julho de 2013. A intenção era suspender o processo de licenciamento até que as questões relativas às famílias assentadas tivessem sido resolvidas, e que o direito à terra e ao trabalho fosse garantido. Além disso, a ACP também ordenou a retirada de placas em alguns lugares do PA da Ressaca que demarcavam propriedade privada da empresa, proibindo atividades de pesca, caça, garimpagem, e impediam a livre circulação das pessoas e o acesso às áreas de extrativismo.
Como a área prevista para a construção do empreendimento é um assentamento, necessariamente, o licenciamento ambiental deveria ser acompanhado pelo órgão responsável, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). O projeto prevê a remoção de pessoas que atualmente moram nessa parte do território, propondo, além da indenização às famílias, uma nova área a ser adquirida pela empresa para o novo assentamento.
Entretanto, os próprios técnicos do INCRA apontam problemas. Em um ofício datado de 16 de dezembro de 2016, o órgão revela a ausência de documentos por parte do empreendedor, cuja falta impede uma análise mais aprofundada do processo. Além disso, também aponta uma série de questões não esclarecidas de risco à saúde e à segurança das famílias localizadas nas áreas de influência do projeto. Pode-se destacar os seguintes pontos: ausência de um mapa descritivo e memorial da área de abrangência do projeto; ausência de uma relação com os nomes das pessoas e um mapa descritivo dos ocupantes de imóveis rurais a serem atingidos pelo projeto de mineração, remanejados e/ou indenizados; ausência de um levantamento detalhado das estradas existentes no interior do Projeto Volta Grande a serem interrompidas e/ou bloqueadas por ocasião da instalação do mesmo, assim como proposta de novo acesso.
De acordo com a Comissão Nacional de Direitos Humanos (CNDH), antes mesmo de Belo Sun ter a licença de instalação, a empresa já vinha atuando na área de forma irregular, comprando lotes, fazendas e garimpos nas proximidades de onde pretende instalar a mineração. As denúncias foram recolhidas em audiências públicas organizadas pela SEMAS, no âmbito do licenciamento ambiental, com os moradores da Vila Ressaca e Ilha da Fazenda.
Essa insegurança na regularização territorial também se reflete na soberania alimentar, já que algumas famílias deixaram de fazer suas roças a partir de 2016, diante da perspectiva de abandonar a área. As delimitações que a empresa colocou nos lotes que adquiriu dos assentados de maneira irregular proíbem a livre circulação dos moradores por áreas antes utilizadas para atividades extrativistas. Além disso, muitas famílias não querem sair do assentamento mas não sabem quais impactos a atividade minerária causaria nas águas, em suas plantações e na fauna e flora da região.
Segundo matéria publicada no Jornal Brasil de Fato, houve compra ilegal de terras de agricultores assentados pela reforma agrária, provocando desemprego e êxodo rural. Aproximadamente, 800 pessoas já deixaram as comunidades da Vila da Ressaca, Ilha da Fazenda e Vila do Galo, segundo o cálculo dos próprios atingidos. O direito à informação também está sendo violado. A maior parte dos estudos realizados pela empresa está em inglês, impedindo as pessoas de acessarem informações sobre o empreendimento. O acesso aos dados relacionados ao processo de licenciamento ambiental também não está publicizado.
Mesmo que essas questões sejam resolvidas, outros problemas fundiários que envolvem a Gleba Ituna, onde estão localizados o PA Ressaca e o Projeto Volta Grande, podem gerar mais controvérsias. A Gleba Ituna foi matriculada em nome da União em 1982, sobreposta a dois projetos de assentamento – um sob responsabilidade do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e outro do Instituto de Terras do Pará (Iterpa). A Ação Civil Pública que a Defensoria ajuizou contra a Belo Sun em 2013 interroga a compra dos terrenos para futura exploração. Por um lado, a Defensoria afirma que esses títulos não são válidos, enquanto a mineradora alega sua legitimidade. Além disso, a Defensoria afirma que no interior dessa gleba ainda existem áreas não discriminadas pelos órgãos fundiários responsáveis, o que poderia favorecer “práticas de grilagem e apropriações ilícitas de terra pública”. Já em 2015, a Secretaria de Patrimônio da União (SPU) declarou que as vilas da Ressaca e do Galo deveriam ser destinadas à regularização fundiária pelo Incra.
Além dessa Ação Civil Pública, foi também ajuizada uma ação cautelar, em 2013, pela Defensoria Pública do Estado do Pará (DPE/PA) contra a empresa Belo Sun. O intuito era evitar a remoção forçada dos moradores da Vila Ressaca, Galo e Ouro Verde após a compra irregular do direito de posse por parte da empresa. A chegada de Belo Sun agravou os conflitos fundiários em uma região que já sofria com a ausência de regularização fundiária e a extração ilegal de madeira, segundo afirmou Andreia Barreto, defensora pública. Contrariando essa ação, a Semas concedeu a licença prévia, em 2014, prevendo 37 condicionantes a serem executadas em 1.095 dias.
Em 31 de janeiro de 2017, a DPE/PA entrou com uma nova ação cautelar contra a Belo Sun e o Estado do Pará, pedindo a suspensão do processo de licenciamento ambiental, baseada nos seguintes pontos: (i) o licenciamento inclui somente a Vila da Ressaca como diretamente afetada, excluindo outras comunidades, como Itatá e a Ilha da Fazenda. Essas comunidades também serão afetadas por aumento populacional, riscos de contaminação por cianeto, detonações da mina, e abertura e fechamento de estradas; (ii) não há estudos atualizados sobre as comunidades indígenas que serão indiretamente impactadas (Itatá/Ituna e Assurini) e também não há nenhuma menção aos agricultores que vivem no Projeto Estadual de Assentamento Agroextrativista (Peax) Napoleão Santos e na Gleba Estadual Bacajaí; (iii) a área que está sendo requerida para o projeto minerário não está regularizada em termos fundiários nem no Cadastro Ambiental Rural (CAR); (iv) a empresa não cumpriu a condicionante número 30 da Licença Prévia que exigia que o processo de remoção dos moradores do assentamento fosse feito junto ao INCRA.
No dia 21 de fevereiro de 2017, a DPE/PA entrou com uma nova Ação Civil Pública (ACP), dessa vez, contra o Estado do Pará e o Instituto de Terras do Pará (Iterpa), distribuída pela Vara Agrária de Altamira. A ação requeria urgência na regularização fundiária do Peax Napoleão Santos, onde residem 268 famílias extrativistas em uma área de 27.393 hectares. O Peax está localizado na Gleba Estadual Bacajaí, ao lado da Terra Indígena Arara da Volta Grande, no Município de Senador José Porfírio. A regularização foi solicitada em 2005, mas até agora, junho de 2018, não houve conclusão do processo. Segundo a Defensoria, Belo Sun já conseguiu licenças de pesquisa junto ao DNPM dentro dessa área extrativista, mas não consultou os moradores locais. Isso pode significar a abertura de novos projetos minerários no futuro, ou mesmo a expansão do Projeto Volta Grande.
A Defensoria afirma que a demora de mais de 11 anos para a regularização dessa área tem causado insegurança, facilitando os conflitos com outras pessoas interessadas em demarcar lotes e explorar madeira ilegalmente. Apesar do Iterpa ter realizado a identificação da área, desde 2010 o procedimento está parado na fase de demarcação.
É preciso ressaltar também que, segundo a Portaria Conjunta DNPM/Incra n° 01/2009, não é possível a realização de atividade minerária em três casos: (i) se o empreendimento afetar diretamente o desenvolvimento do projeto de assentamento; (ii) se for necessário realocar famílias; (iii) se causar impactos ambientais significativos. Dessa forma, o Projeto Volta Grande no Projeto de Assentamento Agroextrativista não é compatível com a garantia dos direitos territoriais das comunidades tradicionais extrativistas, já que afeta diretamente o desenvolvimento do assentamento, afirmam os defensores públicos Andreia Barreto, Ivo Câmara, Sérgio de Lima e Renan Rodrigues.
Ameaças
Enquanto o conflito se arrasta judicialmente, os moradores da Vila da Ressaca lutam para manter seus trabalhos e permanecer na sua terra. Segundo o vice-presidente da Coomgrif, José Pereira Cunha, em entrevista cedida à Fundação Rosa Luxemburgo: “Hoje a gente se sente ameaçado, está arriscado a tomar um tiro porque é a gente que está atrapalhando a empresa”.
As ameaças não atingem somente os garimpeiros artesanais. Diferentes lideranças dos movimentos sociais estão sob constante intimidação. Altamira, município vizinho a Senador José Porfírio, foi considerado, em 2017, pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), o município mais violento do país, tendo a maior taxa de homicídios e mortes violentas com causas indeterminadas. Segundo esse estudo, em 2000, o município de Altamira registrou 13 homicídios em todo o ano, uma média de 16,8 mortes por 100 mil habitantes. Em 2015, foram registradas 114 mortes, média de 105 por 100 mil habitantes. Ou seja, em 15 anos, a taxa de homicídios aumentou seis vezes. Ainda segundo o estudo, a forma desordenada e rápida com que a cidade cresceu após a chegada da Usina Belo Monte, associada à concentração de renda, tem sérias implicações sobre os altos índices de violência.
Entrevistada pela repórter Eliane Brum para o Jornal El País, a Secretária do Meio Ambiente de Senador José Porfírio também está ameaçada de morte. Zelma Campos foi Secretária do Meio Ambiente de Altamira por oito anos, e do município de Brasil Novo durante quatro, duas regiões conflituosas no Estado. Segundo Zelma, um dos seus antecessores teve um infarto na Secretaria e veio a falecer. Outro colega, Luiz Alberto Araújo, Secretário do Meio Ambiente de Altamira, foi executado com nove tiros na porta da sua casa em outubro de 2016, e até hoje o inquérito não foi concluído. Zelma afirma que, além da violência, o cargo também tem altos índices de rotatividade, já que nos últimos quatro anos de mandato, em uma região composta por 12 municípios, foram 35 secretários diferentes. Segundo ela, a pressão sofrida vem por todos os lados, em especial de grileiros e madeireiros.
A Defensoria Pública de Altamira, município com acesso mais fácil até a Vila da Ressaca, também recebeu denúncias de pessoas que vivem nas comunidades próximas à localidade onde poderão ser instaladas as minas da Belo Sun. Foram denunciadas agressões verbais, físicas e ameaças de morte a pessoas críticas à instalação do projeto minerário. Por conta disso, a própria defensora, Andreia Macedo Barreto, tem solicitado escolta policial quando vai trabalhar na região. Segundo ela, nessas situações de conflitos fundiários, muitas vítimas têm medo de sofrer as consequências e, por isso, não denunciam. Os casos registrados, portanto, são muito menores do que as ameaças que ocorrem na realidade.
Os debates acadêmicos também foram alvos de violência. No dia 29 de novembro de 2017, o prefeito de Senador José Porfírio, Dirceu Biancardi (PSDB), invadiu o auditório da Universidade Federal do Pará (UFPA), onde seria realizado o evento “Veias Abertas da Volta Grande do Xingu”. Além dele, dezenas de pessoas, muitas delas servidores públicos, intimidaram a professora Rosa Acevedo Marin e outros pesquisadores convidados, impedindo-os de realizar o debate acadêmico e transformando o espaço em palanque para defender o projeto Belo Sun. O episódio está sendo investigado pelo MPF.
Essas não foram as únicas ameaças advindas de servidores da Prefeitura de José Porfírio. No dia 24 de abril de 2018, a Conectas Direitos Humanos, a Asociación Interamericana para la Defensa del Ambiente (AIDA Américas), a Cooperativa Mista de Garimpeiros de Ressaca, Galo, Ouro Verde e Ilha da Fazenda, a Defensoria Pública do Estado do Pará, Justiça Global e o Movimento Xingu Vivo para Sempre assinaram uma carta enviada à Organização das Nações Unidas (ONU) relatando que cerca de 10 ativistas e defensores dos direitos humanos têm sofrido ameaças por se contraporem à instalação do Projeto Volta Grande da mineradora Belo Sun. Integrantes do Movimento Xingu Vivo para Sempre e da Cooperativa afirmaram sofrer intimidações e ameaças por parte dos servidores da Prefeitura de Senador José Porfírio e por pessoas ligadas ao empreendimento.
Povos Indígenas
Além dos garimpeiros locais e dos assentados, outra população que poderá ser atingida pelo empreendimento são os povos indígenas. Há comunidades de indígenas citadinos que moram nos municípios da região, duas terras indígenas – Terra Indígena Paquiçamba e Arara da Volta Grande do Xingu – localizadas nas proximidades do empreendimento, além da Terra Indígena Ituna/Itatá, onde vivem povos em isolamento voluntário.
A Terra Indígena Paquiçamba foi homologada, inicialmente, em 23 de setembro de 2013, com apenas quatro mil hectares. Sua ampliação para 16 mil ha foi declarada em 16 de junho de 2016 e ainda aguarda homologação. Essa ampliação era uma das condicionantes para a viabilidade da Usina de Belo Monte, apesar da redefinição territorial ter acontecido somente após a autorização do empreendimento na região. Desses hectares da área de ampliação, apenas 1.700 são de terra firme. Os outros são compostos por algumas pequenas ilhas e cursos d’água ao longo da Volta Grande do Xingu. Segundo dados da Funai de 2011, há 95 pessoas do povo Yudja (conhecidos também como Juruna) que habitam essa terra indígena, organizados em três aldeias: Paquiçamba, Muratu e Furo Seco.
A Terra Indígena Arara da Volta Grande do Xingu tem uma área de 26 mil ha e uma população de aproximadamente 143 pessoas, segundo recenseamento realizado pela Sesai em 2014. A terra indígena foi homologada em 20 de abril de 2015, sendo essa homologação uma das condicionantes da usina de Belo Monte, e está localizada a, aproximadamente, 13 quilômetros do empreendimento. Nas terras indígenas há requerimento de pesquisa mineral (ouro, estanho, cobre e cassiterita) e focos de desmatamento, que teve significativo aumento no ano de 2011, quando começou a construção da usina.
Além disso, o projeto minerário também está próximo da terra indígena Itaúna/Itata, habitada por povos em isolamento voluntário. Essa terra tem uma área de 142 mil ha e está situada nos municípios de Altamira e Senador José Porfírio. Atualmente, a Terra Indígena encontra-se “restrita para uso”, de acordo com a Portaria 50 do dia 22 de janeiro de 2016. Em 2017, houve um aumento considerável do desmatamento dentro da área.
Em relação aos indígenas citadinos, de acordo com o Projeto de Cadastro Socioeconômico dos Índios Moradores da cidade de Altamira e da Volta Grande do Xingu, especificamente no Trecho da Vazão Reduzida (TRV), realizado entre março de 2011 e março de 2012, são 550 famílias indígenas morando nessa região, em um total de 1.927 pessoas na área urbana. Essas famílias são de 22 etnias diferentes, sendo a maioria composta por Xipaya, Kuruaya e Juruna. Há algumas organizações atuando junto à população indígena que mora nas cidades, como a Associação dos Índios Moradores de Altamira (Aima) e a Associação Agrícola Representante do Índio Regional de Altamira Xipaia e Kuruaia (inicialmente, Akarira; atualmente, denominada Kirinapan).
Esses povos já vêm sofrendo com os impactos causados por Belo Monte, pois a barragem diminuiu a disponibilidade de água na Volta Grande. Os Yudja, que habitam a TI Paquiçamba e são conhecidos por serem grandes canoeiros, possuem como importante atividade econômica a criação de peixes ornamentais e a pesca. Também utilizam o rio para se deslocar, já que possuem uma rede ampla de parentesco em Altamira e nos outros municípios da Volta Grande. Além da dificuldade que os indígenas enfrentam em se adequar à nova dinâmica de cheia e vazante do rio, se preocupam com o potencial tóxico do cianeto, utilizado no processamento do ouro, e com os rejeitos alocados em duas pilhas de resíduos na margem do rio Xingu.
Em 2012, a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) emitiu um termo de referência que Belo Sun deveria realizar um estudo de impacto ambiental aos povos indígenas. Contudo, mesmo sem a conclusão desse estudo, a SEMAS não interrompeu o processo de licenciamento, se valendo de uma controversa Portaria Interministerial (419/2011) que prevê que os impactos dos empreendimentos de mineração devem ser considerados apenas se estiverem a, no máximo, 10 km de distância de uma terra indígena. Não há concordância quanto à distância da TI Paquiçamba até a mina de Belo Sun. Os indígenas e o Instituto Socioambiental (ISA) falam em 9,6 km, pois consideram a área ampliada, já declarada. O órgão licenciador aponta 10,7 km; Belo Sun registra 12 km.
A Semas insiste que os impactos estarão localizados apenas em um raio inferior a 10 km. Contudo, se houver uma tragédia como a de Mariana (de rompimento da barragem de rejeitos), não é possível prever até onde os impactos podem chegar. Independente dessa polêmica, o Ministério Público Federal (MPF) recomendou que a licença ao empreendimento não fosse concedida, uma vez que a terra indígena já está sendo afetada pelos impactos da hidrelétrica.
O governo do Pará, entretanto, não seguiu a recomendação e emitiu a licença prévia em 2013. Segundo o Secretário do Meio Ambiente do Pará da época, José Colares, não seria preciso fazer estudos de impactos ambientais nas terras indígenas antes de emitir a licença, pois o componente indígena poderia ser feito depois de comprovada a viabilidade do empreendimento. Ainda segundo ele, o empreendedor não poderia ser prejudicado.
A partir de então, foi ajuizada pelo Ministério Público Federal, no dia 11 de novembro de 2013, uma Ação Civil Pública (ACP) pedindo a suspensão do licenciamento até que se concluísse o componente indígena do estudo de impacto ambiental. Além disso, a ação também ressaltava a necessidade de consulta prévia, livre e informada, como prevê a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, ratificada pelo Brasil em 2003.
Segundo o Ministério Público Federal, a Semas está cometendo ilegalidades ao ignorar as recomendações e advertências em relação ao empreendimento, já que ainda não é possível dimensionar os impactos de Belo Monte, e, portanto, os impactos que Belo Sun traria à região. Além disso, não é possível que os estudos de impacto aos povos indígenas sejam feitos somente após a emissão da licença prévia.
No dia 23 de novembro do mesmo ano (2013), a Justiça Federal de Altamira (PA) condicionou o processo de licenciamento de Belo Sun à elaboração dos estudos de impacto aos povos indígenas. Segundo o juiz Sérgio Wolney de Oliveira Batista Guedes, a falta desse componente demonstra “graves violações à legislação ambiental e aos direitos indígenas”. O juiz também ressaltou os impactos acumulativos de Belo Monte e Belo Sun que poderiam causar impactos negativos e irreversíveis aos modos de vida desses povos.
Em junho de 2014, o juiz Claudio Henrique Fonseca de Pina, do Tribunal Regional Federal da Primeira Região (TRF1), confirmou a sentença, complementando que a Portaria Interministerial (419/2011) – que estabelece a distância entre o empreendimento e a terra indígena – não deveria ser usada nesse caso, dada a particularidade do empreendimento, localizado em uma área já impactada por outro empreendimento de grande porte e que já causou transformações profundas na região.
Diante disso, a empresa foi obrigada a elaborar o estudo do componente indígena. Esse estudo, entretanto, não foi aprovado pela FUNAI. Em outubro de 2016, a FUNAI encaminhou ofício a Semas comunicando que os estudos apresentados por Belo Sun foram considerados insuficientes. Um dos pontos destacados pela FUNAI foi a própria ausência do órgão na interlocução com os indígenas, além da falta de medidas mitigatórias aos efeitos da mineração, temendo que os impactos já trazidos por Belo Monte possam impedir uma vida com qualidade na região.
Tudo isso, porém, não impediu que a SEMAS emitisse a licença de instalação, no dia 2 de fevereiro de 2017. Segundo a empresa, as atividades estariam previstas para começar em setembro de 2017, e se daria continuidade às negociações com os moradores das áreas de influência. A expectativa da mineradora é que a instalação termine em dois anos. Na manhã do mesmo dia 2, o Ministério Público Federal enviou uma recomendação a Semas para que o então Secretário, Luiz Fernandes Rocha, não emitisse a licença de instalação até que fosse construído um Plano de Vida para os moradores da região, juntamente com uma avaliação dos efeitos acumulativos de Belo Monte, que deveria ser feita em parceria com o Ibama e a Norte Energia. A recomendação, entretanto, não foi acatada. Diante disso, o MPF convocou nova audiência pública, realizada no dia 21 de março de 2017, e iniciou mais dois processos judiciais contra a Belo Sun e a Semas por irregularidades no processo de licenciamento.
Apenas seis dias após a emissão da Licença, no dia 8 de fevereiro, Belo Sun divulgou no próprio site um plano de pesquisa prevendo a expansão das atividades minerárias em 120 quilômetros ao longo do rio Xingu. Isso significaria o impacto direto a quatro terras indígenas: Terra Indígena Paquiçamba, Terra Indígena Arara da Volta Grande, Terra Indígena Ituna/Itata e Terra Indígena Trincheira do Bacajá. Entretanto, no mapa apresentado pela empresa, não há qualquer menção às terras indígenas.
De acordo com o Instituto Socioambiental, no dia 21 de fevereiro de 2017, foi suspensa a Licença de Instalação pela Vara Agrária e Juizado Especial Ambiental de Altamira, acatando Ação Civil Pública de 2013 da Defensoria Pública do Estado (DPE), que denunciava a compra ilegal de terras públicas pela empresa e a violação dos direitos humanos das populações ribeirinhas de Volta Grande, no Rio Xingu (PA).
Na decisão, o juiz Álvaro José da Silva Souza afirmou que a Belo Sun comprou terras públicas federais (Vila da Ressaca, Galo e Ouro Verde) e que iria encaminhar ao Ministério Público Federal (MPF) a decisão para que fosse feita uma investigação de grilagem de terra. Além disso, o juiz também afirmou que, no período de três anos entre a Licença Prévia e a Licença de Instalação, a empresa não tomou nenhuma atitude para realocar os assentados e ribeirinhos de forma digna. Nessa ocasião, a suspensão da Licença de Instalação foi determinada por um prazo de 180 dias até que a empresa regularizasse a situação. Pode-se dizer que foi uma vitória para os povos do Xingu, que vêm denunciando as violações aos direitos socioambientais desde que a empresa iniciou as pesquisas no território, em 2010.
Em abril do mesmo ano de 2017, o desembargador federal Jarair Meguerian confirmou que a empresa não cumpriu a ordem judicial de realização de estudo de impacto ambiental do componente indígena e manteve a suspensão da licença.
Enquanto não sai uma definição jurídica sobre o empreendimento, os Juruna lançaram, em agosto de 2017, o Protocolo de Consulta Juruna, baseado na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que prevê a realização de consulta livre, prévia e informada às populações indígenas afetadas por qualquer empreendimento. Como já informado nesse relato, o Brasil é signatário da convenção, que entrou em vigor no país em 2003. O Protocolo de Consulta é um conjunto de regras que descreve as formas que a própria etnia estabeleceu para regular como suas comunidades devem ser consultadas antes de qualquer decisão do governo – municipal, estadual ou federal – que possa afetar sua terra e seus direitos. Os Juruna afirmam em seu documento que não vão mais permitir que o governo desrespeite seus direitos e que não legitimarão consultas realizadas fora dos moldes estabelecidos pelo Protocolo.
Semas x Ibama
Outra polêmica do projeto diz respeito ao processo de licenciamento ambiental. Por que um empreendimento de grande porte, com alto risco socioambiental para a região, localizado a apenas 10 km da maior hidrelétrica do país, próximo a um rio federal e a duas terras indígenas, não teve seu processo de licenciamento sob responsabilidade do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (IBAMA), como prevê a legislação? O Ministério Público Federal e outras entidades da sociedade civil, como o Instituto Socioambiental, contestaram o licenciamento, que está sendo realizado pela Secretaria do Meio Ambiente do Estado do Pará, e lutam para que esse seja avaliado pelo IBAMA.
No dia 29 de agosto de 2014, o MPF ajuizou uma nova Ação Civil Pública, assinada pelos procuradores Thais Santi, Igor Resende, Ubiratan Cazzeta e Felício Pontes. A ação pedia a suspensão imediata do projeto Volta Grande e também afirmava que o órgão responsável pelo licenciamento ambiental deveria ser o Ibama, pedindo anulação de todo o processo realizado até aquele momento pelo Governo do Estado do Pará.
Como afirma o estudo elaborado pelo Instituto Socioambiental, outros dois pontos precisam ainda ser destacados em relação aos estudos de impacto ambiental de Belo Sun: os impactos de Belo Monte não foram levados em consideração e não há um diagnóstico dos impactos que Belo Sun pode trazer aos povos indígenas da região. Pode-se dizer que qualquer análise sobre a viabilidade de um empreendimento minerário deveria se basear em um diagnóstico que considere as transformações que já aconteceram na região em decorrência da construção da usina de Belo Monte. Entretanto, o estudo de impacto ambiental de Belo Sun foi elaborado a partir de uma base de dados de campo de 2011, antes da construção da usina, e de dados secundários antigos, que datam de 2006, que não levam em conta as alterações na vazão do rio Xingu com a hidrelétrica de Belo Monte.
Os próprios órgãos ambientais não sabem quais serão as condições socioambientais da região nos próximos anos, perante a brusca redução na vazão do Rio Xingu. No trecho de 100 km do rio Xingu, a previsão é de que 80% das águas sejam desviadas pelo movimento das turbinas. Exatamente por esse motivo, o IBAMA determinou que a Norte Energia monitore a região ao menos até 2025, quando a hidrelétrica deverá operar na sua máxima capacidade. Além da mudança na vazão, não é possível prever os efeitos gerados no ecossistema local, na quantidade e qualidade das espécies de peixes, como aponta o estudo “Atlas dos impactos da UHE Belo Monte sobre a pesca”, organizado por Ana De Francesco e Cristiane Carneiro, e publicado pelo Instituto Socioambiental (ISA).
A partir do relato de pescadores, indígenas e ribeirinhos, o estudo aponta que a luminosidade dos canteiros que funcionam durante 24 horas, a alteração na turbidez da água e as explosões de dinamite na obra de Belo Monte alteram consideravelmente a dinâmica da pesca. Ademais, para o abastecimento de areia para obra, foram drenadas e desmatadas uma série de ilhas, o que extinguiu centenas de pontos de pesca. Houve, portanto, redução da pesca, insegurança alimentar, extinção de espécies e escassez de água. O documento também aponta uma redução na produção pesqueira: entre janeiro de 2015 e janeiro de 2016, período em que foi feito o barramento no rio, essa produção caiu pela metade. Entre novembro de 2015 e julho de 2016, mais de 19 toneladas de peixes morreram, o dobro do que os Juruna pescaram durante três anos. A própria Norte Energia, consórcio responsável pelo empreendimento, reconhece uma alta mortandade de peixes.
Outro impacto significativo para os povos da região é a pressão nas proximidades ou dentro de suas terras. O Estudo de Impacto Ambiental relata que, no pico das obras do empreendimento, Belo Sun teria mais de 2.000 funcionários diretos e indiretos trabalhando na região. Segundo esse mesmo estudo elaborado pelo Instituto Socioambiental, essa situação aponta para um crescimento desordenado e uma urbanização repentina, assim como aconteceu em Altamira, que dobrou de tamanho em apenas três anos. Boa parte desses empregos são temporários. Além disso, muitas pessoas migram em busca de trabalho, acabando por buscar outras fontes de renda. Em um contexto de alto desmatamento, degradação florestal, invasão de terras indígenas e alto índice de violência no campo, seria preciso um cuidadoso diagnóstico dos impactos dessa pressão sobre os povos indígenas e as outras populações tradicionais da região. Essa análise, entretanto, precisaria ser feita de forma independente, e não atrelada aos impactos sobre a população urbana.
Belo Monte + Belo Sun
Como já foi dito, embora não tenha sido considerada nos estudos de impacto ambiental, há profundas relações entre os impactos de Belo Monte e Belo Sun. De acordo com Antonia Mello, coordenadora do Movimento Xingu Vivo para Sempre, o projeto da barragem e Belo Sun caminham juntos. Além de Belo Sun, outras empresas, como a Vale, estão chegando na região. No próprio site da empresa, essa relação está colocada. O baixo custo da eletricidade fornecida por Belo Monte é uma das vantagens de se construir o empreendimento no local. Segundo a mineradora, “o estado do Pará é uma das regiões de menor custo do Brasil no que diz respeito à energia. Belo Sun está bem situada para desfrutar de energia de baixo custo”. De acordo com matéria do Brasil de Fato, no Brasil, empresas como Belo Sun pagam uma tarifa de energia até 10 vezes menor do que os consumidores residenciais. Além disso, o baixo nível de água do rio Xingu irá facilitar o acesso a Ouro Verde, uma das cavas previstas no projeto minerário.
A própria Norte Energia, consórcio construtor de Belo Monte, enviou à Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Estado do Pará (Semas) ofício que alerta sobre os riscos de Belo Sun, previsto para ser instalado na área de influência direta (AID) de Belo Monte. A empresa afirma que seria necessário fazer estudos sobre a qualidade da água do rio Xingu, além de avaliação dos abalos sísmicos causados pelas explosões da mina e do impacto no aumento dos fluxos de embarcações em Altamira e na Vila da Ressaca. Solicita, ainda, que o Ibama seja escutado e que os estudos a respeito dos impactos às comunidades indígenas sejam concluídos.
O estudo elaborado pelo Instituto Socioambiental destaca que, nesse contexto de profundas mudanças causadas pela construção da usina de Belo Monte, não é possível elaborar um estudo de impacto ambiental satisfatório, pois não há como prever os impactos socioambientais que irão acontecer na região. As transformações que estão acontecendo deverão levar ao menos 10 anos para que ocorra um reequilíbrio ambiental, e todo esse processo deverá ser devidamente monitorado e documentado pelo licenciamento ambiental de Belo Monte. Nesse panorama, é possível dizer que nenhum outro grande empreendimento deveria se instalar na região de Volta Grande antes de garantir a estabilidade do ecossistema.
No dia 20 abril de 2018, após uma campanha mobilizada pela Avaaz, que reuniu por volta de 800 mil assinaturas, uma das principais acionistas, a empresa canadense Agnico Eagle Mines, vendeu sua participação no empreendimento, que era de 19,14%. A empresa, que opera desde 1953, é considerada uma das empresas mais consistentes do setor de mineração de ouro no Canadá. Em 2016, investiu 15 milhões de dólares canadenses em Belo Sun. A mineradora Belo Sun ainda tem outras cinco acionistas, mas a composição passa por mudanças após a saída da Agnico.
Cronologia
1930 e 1940 – Chegada de garimpeiros artesanais na região de Volta Grande do Xingu.
1970 – Orca Mineradora, primeira empresa de mineração, se instala na região.
1982 – Gleba Ituna é matriculada como patrimônio da União.
1982 – Criação do Projeto de Assentamento (PA) Ressaca.
Década de 1980 – Verena Minerals, nova empresa de mineração, se instala.
2006 – Criação da Cooperativa Mista dos Garimpeiros da Ressaca, Galo, Ouro Verde e Ilha da Fazenda (COOMGRIF).
30 de junho de 2010 – Criação de Belo Sun Mining Corporation.
13 de setembro de 2012 – Primeira Audiência Pública sobre o Projeto Volta Grande é realizada no município de Senador José Porfírio.
Dezembro de 2012 – FUNAI emite um termo de referência do componente indígena do estudo de impacto ambiental do Projeto Volta Grande da Belo Sun.
10 de janeiro de 2013 – Audiência Pública é realizada na Vila da Ressaca.
22 de janeiro de 2013 – Documento emitido pelo Instituto Socioambiental (ISA) analisa o licenciamento ambiental do Projeto Volta Grande da Belo Sun Mineração.
15 de julho de 2013 – DPE/PA ajuíza uma ação civil pública e uma ação cautelar contra a mineradora Belo Sun.
23 de setembro de 2013 – Homologação da Terra Indígena Paquiçamba com 4 mil ha.
11 de novembro 2013 – MPF ajuíza ACP solicitando a suspensão do licenciamento até a finalização do estudo de componente indígena e de consultas aos povos indígenas.
16 de novembro de 2013 – Povo Juruna envia carta ao Governo do Estado do Pará exigindo a consulta livre, prévia e informada, como prevê a Convenção 169.
23 de novembro de 2013 – Justiça Federal em Altamira (PA) condiciona o licenciamento à conclusão do estudo de componente indígena.
2 de dezembro de 2013 – Governo do Estado do Pará concede a Licença Prévia ao empreendimento.
29 de agosto de 2014 – MPF ajuíza nova ACP exigindo a suspensão imediata do Projeto Volta Grande e substituição da Semas pelo Ibama como órgão licenciador.
20 de abril de 2015 – TI Arara da Volta Grande do Xingu é homologada.
2015 – SPU declara as vilas da Ressaca e do Galo como de interesse social para fins de regularização fundiária pelo INCRA.
11 de outubro de 2016 – Semas realiza audiência pública na Vila da Ressaca.
16 de junho de 2016 – MJ declara ampliação da TI em 16 mil ha.
Outubro de 2016 – FUNAI encaminha ofício a Semas reprovando os estudos do componente indígena apresentados pela Belo Sun.
Outubro de 2016 – CNDH recomenda paralisação das obras por aquisição irregular de terras públicas.
Outubro de 2016 – Luiz Alberto Araújo, Secretário do Meio Ambiente de Altamira, é executado na porta de casa.
16 de dezembro de 2016 – INCRA comunica Belo Sun que falta de documentos inviabiliza processo de realocação dos moradores do PA Ressaca.
31 de janeiro de 2017 – DPE/PA ajuíza nova ação cautelar requerendo a suspensão do processo de licenciamento ambiental da Belo Sun.
2 de fevereiro 2017 – SEMAS emite Licença de Instalação do empreendimento.
8 de fevereiro de 2017 – Belo Sun divulga plano de pesquisa que prevê a expansão das atividades minerárias em 120 quilômetros ao longo do rio Xingu.
21 de fevereiro de 2017 – DPE/PA ajuíza nova ACP contra o Estado do Pará e ITERPA.
21 de fevereiro de 2017 – Vara Agrária e Juizado Especial Ambiental de Altamira suspendem LI do empreendimento por compra ilegal de terras públicas e violação dos direitos humanos das populações ribeirinhas da Volta Grande.
21 de março de 2017 – Semas realiza nova audiência Pública na Vila da Ressaca.
Abril de 2017 – Desembargador federal Jirair Meguerian mantém suspensão da LI.
Agosto de 2017 – Povo Juruna lança Protocolo de Consulta.
29 de novembro de 2017 – Prefeito de Senador José Porfírio, Dirceu Biancardi (PSDB), e outros servidores ameaçam professores e convidados no Seminário “Veias Abertas da Volta Grande do Xingu”.
6 de dezembro de 2017 – TRF1 nega recurso apresentado por Belo Sun, mantém a suspensão da LI e determina realização de consulta prévia, livre e informada aos povos indígenas da região.
20 de abril de 2018 – Agnico Eagle Mines vende sua participação no empreendimento.
24 de abril de 2018 – Diversas organizações de direitos humanos e movimentos sociais enviam carta a ONU relatando ameaças contra ativistas e defensores dos direitos humanos.
Fontes
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Atualização : 26/06/2018 11:52:15