MT – Povo Xavante enfrenta grileiros e oportunistas, que se valem de violência, do lobby político e das fragilidades e ineficiência dos poderes Judiciário e Executivo para a protelação e usurpação dos seus direitos territoriais

UF: MT

Município Atingido: São Félix do Araguaia (MT)

Outros Municípios: Água Boa (MT), Alto Boa Vista (MT), Barra do Garças (MT), Bom Jesus do Araguaia (MT), Cuiabá (MT)

População: Povos indígenas

Atividades Geradoras do Conflito: Atuação de entidades governamentais, Atuação do Judiciário e/ou do Ministério Público, Monoculturas

Impactos Socioambientais: Alteração no regime tradicional de uso e ocupação do território, Desmatamento e/ou queimada, Falta / irregularidade na demarcação de território tradicional

Danos à Saúde: Falta de atendimento médico, Insegurança alimentar, Piora na qualidade de vida, Violência – ameaça

Síntese

Os Xavante – autodenominados A’uwe (“gente”) – formam com os Xerente, do Estado do Tocantins, um conjunto etnolinguístico conhecido na literatura antropológica como Acuen, pertencente à família linguística Jê, do tronco Macro-Jê. Os A’uwe contemporâneos incorporaram a designação “Xavante” e é por meio dela que se referem a si próprios ao lidar com os waradzu (“brancos”). Entre si, porém, os diversos subgrupos locais que compõem essa sociedade indígena se identificam como a’uwe ou a’uwe uptabi (“gente de verdade”).

Os Xavante somavam, em 2010, de acordo com os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quase 20.000 pessoas, uma das maiores populações indígenas do país. O povo está dividido em diversas Terras Indígenas no Estado do Mato Grosso, que constituem parte do seu antigo território de ocupação tradicional. Afora as Terras Indígenas Chão Preto e Ubawawe, contíguas à TI Parabubure, as demais terras Xavantes – Marechal Rondon, Marãiwatsédé, São Marcos, Pimentel Barbosa, Areões e Sangradouro/Volta Grande – são geograficamente descontínuas.

A marcha para o oeste brasileiro, iniciada nos primeiros anos do século passado, ainda não terminou no Mato Grosso. A região é marcada por uma história de expropriação territorial indígena visando a incorporação das terras à economia nacional através de monoculturas extensivas e pecuária, sendo, atualmente, considerado o Estado que mais exporta grãos, em especial a soja.

Os Xavante lutaram por mais de 20 anos pela demarcação e desintrusão da Terra Indígena Marãiwatsédé, em um território grilado, ocupado por grandes fazendas. Ao longo dos anos, os Xavante passaram por um processo de expropriação de seu território, o que resultou no título de terra indígena mais desmatada do Brasil. Atualmente, a TI está ocupada pelos Xavante, mas as ameaças ao seu território não cessaram.

Contexto Ampliado

Os Xavante – autodenominados A´uwe (“gente”) – formam com os Xerente (autodenominados Akwe), do Estado do Tocantins, um conjunto linguístico conhecido como Acuen, pertencente à família linguística Jê, do tronco Macro-Jê. No período colonial e imperial, grupos Acuen também foram identificados pelos etnômios “xacriabá” e “acroá”. Essas designações foram produzidas por não-indígenas visando identificar e distinguir os diversos subgrupos Acuen que controlavam um amplo território no Centro-Oeste brasileiro. Além disso, na literatura de viajantes, bandeirantes e missionários, os Acuen, como grupos do chamado Brasil Central, ficaram conhecidos como Tapuias, em oposição aos grupos do tronco Tupi, denominados Tamoios e localizados no litoral brasileiro, de acordo com a antropóloga Laura Graham. Segundo a versão mais aceita, o nome “Xavante” lhes foi atribuído por não-índios visando sua diferenciação dos demais Acuen, particularmente, em relação aos “xerente”, dos quais se separaram por volta de 1820 ainda na Província de Goiás. Entre si, entretanto, há diversos subgrupos locais que se identificam como a’uwe ou a’uwe uptabi (“gente de verdade”).

O cultivo agrícola, sobretudo de milho (o alimento de maior destaque em termos cerimoniais e sócio-cosmológicos Xavante), feijão e abóbora, desempenham um papel secundário na economia. A maior parte da subsistência dos Xavante vem da caça e da coleta de raízes silvestres, castanhas, frutos e outros vegetais, ainda segundo a antropóloga. Até o início da intensificação da colonização em 1960, os Xavante obtinham esses alimentos em excursões de caça e coleta: longas viagens, que duravam alguns meses cada uma, nas quais grupos de famílias extensas iam buscar recursos alimentares. Na estação seca, a fim de conduzir atividades cerimoniais, os grupos de viajantes se reuniam em grandes aldeias semipermanentes. Hoje, tal padrão tradicional de excursões praticamente desapareceu por conta da significativa redução das terras disponíveis ao aproveitamento Xavante e do reduzido estoque de caça ali existente. Ainda assim, viagens de caça ou pesca mais curtas, nas quais grupos se ausentam da aldeia por uma ou duas noites, são comuns.

A degradação ambiental, resultado da criação de gado e da monocultura no interior e no entorno das terras Xavantes, reduziu fortemente o estoque de caças. Além disso, como as atuais terras dos Xavante não representam mais do que pequenos fragmentos da extensão total de que eles antes dispunham para sua subsistência, encontrar caça suficiente para uma alimentação saudável leva alguns caçadores a adentrar em fazendas particulares com regularidade, intensificando os conflitos.

De acordo com a agência de notícias A Pública, os Xavante procuram manter o controle do território, cortado por duas estradas federais, no Vale do Araguaia. Uma das últimas fronteiras agrícolas do Mato Grosso, a área convive há décadas com o desmatamento ilegal, grilagem e venda irregular de lotes, crimes de pistolagem e seguidas violações aos direitos humanos.

Apesar disso, desde 1960, os Xavante estão em processo de recuperação demográfica, com elevadas taxas de natalidade e de crescimento populacional. A mortalidade infantil, no entanto, ainda é relativamente alta – significativamente superior à média brasileira. De acordo com o ISA, apenas 86% das crianças sobrevivem até os dez anos de idade. Em muitos casos, as causas de morte resultam de doenças associadas às precárias condições sanitárias ou da contaminação da água. Doenças gastrointestinais (gastroenterites) e infecções respiratórias respondem por uma significativa proporção de mortes de crianças.

O sedentarismo, a carência de caça e de outras fontes de proteína, assim como os planos desenvolvimentistas que a Fundação Nacional do Índio – Funai implementou na década de 1970 e 1980, resultaram em dramáticas mudanças na dieta Xavante, que levaram à desnutrição e outros problemas de saúde a ela relacionados, como a anemia e, contraditoriamente, a obesidade. As mudanças na dieta, em especial o incentivo ao uso de açúcar e farinha de trigo refinada, também se expressam em novos casos de diabetes.

Os Xavante somavam, em 2010, de acordo com os dados de IBGE, quase 20.000 pessoas, uma das maiores populações indígenas do País, abrigadas em diversas Terras Indígenas que constituem parte do seu antigo território de ocupação tradicional, na região compreendida pela Serra do Roncador e pelos vales dos rios das Mortes, Kuluene, Couto de Magalhães, Batovi e Garças, no Leste Matogrossense. Afora as Terras Indígenas Chão Preto e Ubawawe, contíguas à TI Parabubure, as demais terras Xavante – Marechal Rondon, Marãiwatséde, São Marcos, Pimentel Barbosa, Areões e Sangradouro/Volta Grande – são geograficamente descontínuas. Localizadas em meio a um conjunto de bacias hidrográficas responsáveis pela biodiversidade regional e, portanto, base do modo de vida tradicional indígena, essa região vem sofrendo impactos ambientais desde a década de 1960 devido à sua incorporação pela agropecuária extensiva, processo intensificado a partir da década de 1980 pela crescente implementação da produção de grãos para exportação, em especial, a soja.

O atual conflito entre os Xavante e posseiros no interior da terra Marãiwatsédé é fruto de fatores políticos e sociais decorrentes do modo como se deu a colonização no País, e de uma política de assimilação e expropriação territorial. Expatriados de seus territórios tradicionais e reassentados em comunidades criadas artificialmente, e que muitas vezes incluíam indígenas de diferentes etnias provenientes de diversos territórios, os Xavante foram submetidos a confinamentos territoriais.

Os primeiros relatos sobre os Xavante são de 1852, quando o Frei Rafael de Taggia assinala que residiram no aldeamento de Teresa Cristina, hoje município de Tocantinia (TO), à beira do Rio Tocantins, cerca de 4.000 índios “Xavante” e “Xerente”. Dificilmente essas estimativas podem ser incorporadas fielmente, pois a sobreposição identitária e, portanto, territorial, entre os subgrupos considerados Acuen impede que se tenha de fato um número populacional preciso sobre cada um deles. Isso somente se daria a partir do (re)contato dos grupos locais Xavante na década de 1940 e 1950, então já no Leste Matogrossense, com agentes tais como as missões católicas salesianas, o Serviço de Proteção aos Índios, de acordo com o verbete do Instituto Socioambiental.

No início do século XVIII, durante a expansão para o Oeste patrocinada por garimpeiros, bandeirantes, missionários e colonizadores atraídos pelo ouro descoberto em Goiás, começaram as primeiras frentes de contato com os Xavante.

Na segunda metade do mesmo século, vários grupos, incluindo alguns identificados como “Xavante”, estiveram assentados em aldeamentos patrocinados pelo governo, onde sofreram os efeitos devastadores de doenças epidêmicas. Depois, em algum momento do final do século XVIII ou do início do XIX, os antepassados dos Xavante cruzaram o rio Araguaia. Esse deslocamento rumo a oeste separou definitivamente os Xavante dos Xerente, que permaneceram na margem leste do rio. Uma vez cruzado o Araguaia, os Xavante se estabeleceram na região da Serra do Roncador, agora Estado do Mato Grosso. Seu povoado original, uma comunidade conhecida como Tsõrepre, passou por várias cisões ao longo do tempo. Durante o século XIX e a primeira metade do XX, distintos grupos migraram mais para oeste, fosse margeando o Rio das Mortes, fosse em direção às áreas do rio Suiá-Missu e das cabeceiras do Rio Kuluene, como relata a antropóloga Laura Graham.

Neste período, os Xavante permaneceram distantes das frentes de colonização, permanecendo alheios aos movimentos da sociedade brasileira até meados da década de 1930, quando novas frentes de colonização, patrocinadas pelo Estado Novo, avançaram sobre o Mato Grosso a fim de levar os benefícios do “progresso” e do “desenvolvimento” ao interior do País. Sendo identificados com o meio ambiente agreste e o hostil do cerrado, a “pacificação” dos Xavante, um eufemismo para a política de extermínio e expropriação territorial vigente no período, se tornou desafio a ser transposto rumo à “integração nacional”. À frente desse processo estariam equipes do então Serviço de Proteção aos Índios (SPI) e missionários religiosos salesianos.

No início da “Marcha para o Oeste”, as pressões externas voltaram a agravar as condições de vida dos Xavante. Associada à campanha estatal em prol da abertura do interior do País ao processo de colonização, uma série de propagandas em revistas e jornais de circulação nacional retratou os Xavante como símbolo do “bom selvagem” brasileiro. Dois padres católicos salesianos empenhados em fazer contato com os Xavante (1932) e uma ‘equipe de pacificação’ do SPI chefiada por Pimentel Barbosa (1941) foram mortos por grupos locais Xavante descontentes com invasão de seu território. Apoiando-se nesses fatos, a mídia destacava a imponente bravura dos Xavante e sua feroz resistência a forasteiros.

Contudo, somente em meados da década de 1960 ocorreria a “pacificação” dos Xavante. Segundo a antropóloga Laura Graham, “à medida que os grupos Xavante cediam às pressões da expansão nacional, os territórios que lhes haviam por mais de 100 anos garantido a reprodução de seu modo de vida tradicional, tornavam-se acessíveis à colonização e, especialmente, à produção capitalista”.

Isso significou antes de tudo a perda desses territórios tradicionais e sua remoção para postos do SPI em áreas mais distantes. Segundo a política indigenista da época, os índios deveriam ser “pacificados”, treinados, aculturados e reintegrados à sociedade nacional como trabalhadores produtivos do campo. Essa política, ao mesmo tempo em que buscava a sedentarização de grupos indígenas, visava a liberação de terras para grandes grupos agropecuários e empreendimentos capitalistas baseados na monocultura, pecuária extensiva e no latifúndio. Entre as décadas de 1960 e 1970, por incentivos fiscais do governo destinados a fomentar a colonização e o desenvolvimento econômico em larga escala da região, colonos e fazendeiros chegaram por lá. Imensas extensões de monocultura – de início, sobretudo arroz; mais recentemente, soja – foram implementadas pelos fazendeiros, que também desmataram vastas áreas de cerrado com vistas à criação de gado.

A partir de meados dos anos 1970, muitas das famílias que haviam deixado as terras habitadas no período anterior ao contato para buscar refúgio em missões ou postos do SPI começaram a retornar para seus territórios de origem. Ao fazê-lo, encontraram as áreas ocupadas por colonos ou por fazendeiros dedicados ao agronegócio de larga escala. Em alguns lugares, os colonizadores haviam estabelecido cidades inteiras. Quando líderes Xavante se puseram a reivindicar direitos sobre suas terras, a violência, concreta ou como ameaça, irrompeu em muitas localidades.

Foi através dessa política de desenvolvimento do interior, de colonização do Centro-Oeste e de integração do índio à sociedade nacional que as comunidades Xavante que viviam na região onde hoje se localizam os municípios de São Félix do Araguaia, Alto Boa Vista e Bom Jesus do Araguaia foram transferidas à força, por volta de 1966, e reassentadas em comunidades ao sul do Estado, na Missão Salesiana de São Marcos. As terras arrecadadas no processo foram então transferidas para a empresa Liquifarm Agropecuária Suiá-Missú, a fim de que fossem instalados diversos projetos agrícolas na área, que passou a ser conhecida como Fazenda Suiá-Missú. Nos anos 1970, a corporação detinha mais de 1,5 milhão de hectares, extensão que lhe distinguia como um dos maiores latifúndios do Brasil. Essa operação é emblemática do processo de colonização que se caracterizou pela violência, pela apropriação privada da terra e a desorganização social a que estiveram submetidos os Xavante.

A readaptação indígena à nova realidade foi marcada por sofrimento, dor e mortes. Dos cerca de 300 Xavante transferidos pela Força Aérea Brasileira (FAB) na ocasião, pelo menos 86 teriam morrido de sarampo logo depois. Expropriados de seu território tradicional e forçados a viverem de outras formas, sob a tutela de uma missão religiosa, os Xavante se encontraram na condição simultânea de desterrados e violentados por uma política indigenista etnocêntrica que não respeitava suas crenças, saberes, tradições ou especificidades étnicas.

Por volta de 1979, a Liquifarm Agropecuária Suiá-Missú e todo seu patrimônio passaram para o controle da multinacional italiana Holding Ente Nazionale Idrocarburi/Agip Petroli (ENI). Desde então, os Xavante iniciaram ações para pressionar a empresa a devolver seu território tradicional.

Ao final de 1981, seis terras Xavante haviam sido demarcadas: Areões, Pimentel Barbosa, São Marcos, Sangradouro, Marechal Rondon e Parabubure. Apesar dessas conquistas, os conflitos persistiram e, em algumas áreas, continuam ainda hoje. Nos anos 1990, os Xavante tiveram êxito em pleitos por ampliação de várias áreas, e após longa batalha conseguiram a demarcação e a homologação da terra Marawãitsédé, na região do rio Suiá-Missu. Apesar do reconhecimento oficial da Funai ter acontecido em 19 de janeiro de 1992, grande parte dessa terra indígena ficou por mais de 20 anos ocupada por centenas de não-índios. Um longo processo de luta para recuperação do seu território tradicional foi necessário, como veremos a seguir.

Em 1992, durante a realização da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (ECO-92), no Rio de Janeiro, lideranças Xavante conseguiram dos executivos da empresa italiana Agip a promessa de restituição do antigo território.

O tão desejado “retorno ao lar” dos Xavante foi, entretanto, sustado por um processo de ocupação da área identificada como seu território tradicional. Há informações de que políticos e grandes fazendeiros locais teriam organizado todo o processo de ocupação e distribuição das áreas da TI. Em junho de 1992, mais de 2 mil não-indígenas ocupavam a área. Apoiados por associações civis e pelo Ministério Público Federal (MPF), os Xavante lutaram pela regularização fundiária de suas terras e pela desocupação das mesmas, para que pudessem voltar a ocupar e explorar o território de seus antepassados. Desde 1998, cerca de 165 mil hectares foram homologados pela Funai como território Xavante.

Fazendeiros e posseiros residiram por mais de 20 anos no interior da TI Marãiwatsédé, através de medidas de ordem legal ou política, como ações judiciais, pressão política, audiências públicas ou projetos de decretos-legislativos que visavam cancelar a homologação, ou por meios violentos, como atentados contra membros da etnia.

As grandes áreas do Planalto Central brasileiro foram distribuídas entre grandes proprietários rurais e empresas agropecuárias, enquanto aos nativos locais restaram terras ou reservas indígenas exíguas, restritas e, em sua maioria, pouco adequadas aos modos de vida desses povos. A reprodução física e cultural dos povos indígenas estão garantidas na Constituição Federal de 1988.

No dia 16 de novembro de 1992, apesar da promessa de devolução ocorrida na Eco 92, a Agip leiloou parte da TI Marãiwatsédé. No mesmo mês, a Funai enviou ao MPF relatório indicando que 180 mil hectares da Fazenda Suiá-Missú que iriam a leilão pertenciam à TI Marãiwatsédé. No dia 30 de dezembro de 1992, o Governo italiano, então sob direção de Giuliano Amato, do Partido Socialista Italiano, pressiona a Agip para devolução das terras aos Xavante.

Na mesma década, os fazendeiros líderes do processo de ocupação, como Sebastião Prado, Renato Teodoro e Gilberto Luiz de Resende, o Gilbertão, criaram a Associação dos Produtores Rurais da Suiá-Missú (Aprosum), entidade que representou por décadas os moradores e produtores da região, de acordo com a agência A Pública.

No dia 22 de fevereiro de 1995, o então Ministro da Justiça, Nelson Jobim, susta o pedido de demarcação de Marãiwatsédé, atendendo aos pedidos dos senadores Júlio Campos, Carlos Bizerra e Jonar Pinheiro. No dia 30 de março de 1995, posseiros fecham a rodovia BR-158 e ameaçam funcionários da empresa contratada pela Funai para medição da área da TI. No dia seguinte, os funcionários deixaram a região após intimidação dos posseiros. No mês seguinte, no dia 25 de abril de 1995, o MPF determina que a Polícia Federal dê apoio aos trabalhos de demarcação da TI. Alguns dias depois, em 27 de abril de 1995, a Funai e a Polícia Federal começam a demarcação da terra indígena pela terceira vez.

Entre o compromisso firmado na ECO-92 e a homologação das terras se passariam pelo menos seis anos permeados pela complexa negociação entre a diretoria local da empresa e a Funai para oficializar a devolução do território indígena. A homologação só viria a ocorrer em dezembro de 1998. Mesmo com a homologação os Xavante ficaram impedidos de voltar para seu território, que permaneceu ocupado por não-indígenas.

Durante este período, intensificou-se a ocupação da área por posseiros e a distribuição das terras em diferentes propriedades rurais. Tal situação levou o Ministério Público Federal (MPF) a ajuizar em 1995 uma ação civil pública (ACP) que pedia à Justiça a retirada dos invasores. A batalha judicial iniciada nesta ocasião foi concluída apenas em 2013, quando a desintrusão terminou. Apesar disso, a ameaça de retorno dos posseiros e os conflitos de terra nunca cessaram.

No dia 21 de setembro de 1996, a Funai inicia cadastro dos posseiros para posterior reassentamento pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). No ano seguinte, em julho de 1997, a Funai ajuíza ação pela demarcação de Marãiwatsédé. Em setembro de 1996, posseiros interditaram novamente a BR-158 para impedir que a Funai e o Incra iniciassem o levantamento ocupacional e cadastral das famílias não-indígenas que viviam na Terra Indígena. Alguns dias depois, a BR-158 é desbloqueada e as equipes da Funai e do Incra voltam ao trabalho, com o apoio da Polícia Federal.

Em 1999, o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou o pedido de liminar referido no Mandado de Segurança nº 23.317, proposto naquela corte pelo Município de Alto da Boa Vista, contra a homologação da Terra Indígena Marãiwatsédé. O STF entendeu que o município não tinha legitimidade para ser impetrante no mandato em questão, pois não é e nunca foi proprietário da área que fora reconhecida como território tradicional indígena.

O advogado Luiz Francisco Caetano Lima, representante de aproximadamente 700 famílias de posseiros presentes na TI, obteve, em dezembro de 2000, liminar suspendendo o retorno dos Xavante, baseada na alegação de que nova perícia antropológica seria necessária para confirmar a procedência da homologação da Terra Indígena. A liminar, concedida pelo juiz da 5ª Vara do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), obrigou a Funai a realizar novo levantamento antropológico, apesar de já tê-lo feito durante os estudos que subsidiaram a homologação das terras.

Enquanto as ações e apelações se sucediam nos tribunais, com sucessos temporários para ambos os lados, a tensa situação no local foi mantida. Índios e posseiros viviam período de incertezas e hostilidades mútuas.

No dia 19 de setembro de 2000, após 34 anos, os Xavante voltam a Marãiwatsédé. Esse regresso, entretanto, duraria apenas alguns meses. No dia 5 de dezembro do mesmo ano, o advogado dos posseiros conseguiu provimento a pedido de liminar suspendendo o retorno para a TI. Em novembro de 2003, uma força-tarefa do Gabinete de Gestão Integrada em Segurança Pública de Mato Grosso (GGI/MT) se reúne para avaliar a situação da TI Marãiwatsédé. Cansados de aguardar a Justiça, no dia 1 de agosto de 2004 os Xavante acampam às margens da BR-158 aguardando autorização para regressar ao seu território, de acordo com o Instituto Socioambiental (ISA).

Alguns dias depois, no dia 8 do mesmo mês, uma comitiva da Organização das Nações Unidas (ONU) visita a região para verificar denúncias de violação de direitos humanos. No mesmo dia, o MPF e Funai encaminham ofício à Justiça Federal solicitando permissão para os Xavante retornarem a sua área. No dia seguinte, o STF decide que os Xavante podem retornar às suas terras. Sendo assim, no dia 11, os Xavante iniciam a construção de uma aldeia provisória. No mesmo mês, a Funai apreendeu toras de madeira ilegal saindo da TI, e o Incra desapropriou terras no Estado do Mato Grosso para assentar os posseiros, segundo a mesma fonte.

No dia 3 de outubro de 2004, um atentado veio demonstrar que a ocorrência de uma tragédia era iminente. Dois jovens Xavante, de famílias que haviam iniciado a reocupação de pouco mais de 15 hectares na TI em 2000 – Felisberto, de 18 anos, e o adolescente G., de 16 anos –, foram surpreendidos por um grupo de motociclistas que surgiram da mata disparando vários tiros em sua direção. Dois tiros atingiram o adolescente G. no braço esquerdo e em uma costela. Outro resultou em fratura de uma perna de Felisberto. Os jovens receberam atendimento médico e sobreviveram. O caso foi denunciado na ocasião à Delegacia da Polícia Federal em Barra do Garças e ao MPF em Cuiabá.

Investigações da Polícia Civil deram conta de que o principal suspeito do atentado seria um posseiro cujo histórico de conflito com os índios era antigo. De acordo com o delegado Celso Renda Gomes, da Polícia Civil em Alto Boa Vista, somente esse posseiro teria registrado três ocorrências acusando os Xavante de ataques contra sua propriedade. A divulgação desta versão provocou forte indignação entre técnicos e diretores da Funai. O administrador executivo Edson Beiriz, da Regional da Funai, chegou a afirmar que não havia na Fundação nenhuma ocorrência de ataques de índios aos posseiros. Segundo ele, o que teria ocorrido seria uma tentativa dos posseiros de fabricar boletins a fim de tentar reverter a posse da TI.

Em fevereiro de 2007, uma reviravolta no campo jurídico trouxe nova esperança de resolução do conflito. No dia 05 daquele mês, o juiz federal José Pires da Cunha, de Cuiabá, concedeu liminar determinando a saída de invasores da TI Marãiwatsédé. Essa liminar era resultado da ACP proposta pelo MPF em 1995, tendo, portanto, levado 12 anos para ser julgada.

Entretanto, foram necessários apenas alguns meses para ser suspensa pelo desembargador federal Sebastião Fagundes de Deus. Em fevereiro de 2008, o procurador da República da 1ª Região, Odim Brandão Ferreira, entrou com recurso (agravo regimental) em favor dos índios. Este recurso seria analisado pelo mesmo desembargador federal.

Se, no campo jurídico, o conflito permanecia indefinido, no campo político os posseiros encontraram apoio no governo de Mato Grosso e no legislativo federal para sua permanência no local. Contrariando a legislação indigenista do Brasil, que afirma serem as terras indígenas um direito originário das comunidades que tradicionalmente as ocupam e que, portanto, são indisponíveis, inalienáveis e inegociáveis, autoridades do governo mato-grossense e do governo federal realizaram em Cuiabá uma audiência pública para discutir soluções a respeito do conflito da Gleba Suiá-Missú.

Segundo o informe do governo estadual, no local, existiria infraestrutura pública e particular com benfeitorias que tornariam a desintrusão inviável. Entretanto, após a homologação da TI Marãiwatsédé, qualquer instalação de infraestrutura no local seria feita com a ciência da conclusão do processo administrativo e à revelia da lei. A audiência buscava, portanto, uma solução conciliatória para agentes em situação sem a devida base legal. Qualquer solução que levasse à suspensão da homologação da terra indígena seria inconstitucional, na medida em que tais terras não eram passíveis de negociação. Mesmo que índios e posseiros chegassem a um acordo na audiência pública, nenhum documento poderia ser firmado sem a anulação do ato administrativo que havia criado a TI. Fica claro que o propósito conciliador da audiência tinha em vista efeitos muito mais políticos do que administrativos.

No mês seguinte, índios e posseiros iniciaram novos movimentos para tentar atingir seus objetivos. Enquanto os Xavante se reuniam com o MPF para discutir novas ações objetivando a desintrusão da TI, o deputado federal Homero Pereira (PR/MT) apresentou o Projeto de Decreto Legislativo 510/2008 pretendendo sustar os efeitos do decreto federal, de 11 de dezembro de 1998, que criou a TI Marãiwatsédé. Com o projeto, o deputado procurava se aproveitar da existência de mecanismos de controle mútuo entre os poderes da República para questionar o ato do Poder Executivo.

Cabe destacar como o conflito se desenrola em múltiplas dimensões e arenas simultaneamente. Encerrado na arena administrativa – já que o processo de demarcação e homologação fora concluído -, o conflito permanecia intenso nas arenas jurídica e política. Ao mesmo tempo em que se desenvolvem ações locais, o conflito envolvia também políticas federais, o que obrigava os atores envolvidos a transitarem pelos três poderes e nos três níveis federativos de governo. Além disso, é possível identificar uma disputa simbólica que permeia todas as ações dos atores sociais, na qual o que está em jogo é a legitimidade das reivindicações de cada um dos lados. É nessa dimensão que os efeitos das ações de cada grupo em disputa são explorados politicamente.

Num contexto em que a preocupação com a degradação ambiental crescia e se difundia, notícias como a da confirmação, em março de 2009, pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), de que a ocupação da TI Marãiwatsédé pelos posseiros estava aumentando o desmatamento da região corroboravam a tese de que a desintrusão da TI seria a solução ambientalmente mais responsável. Em junho de 2008, proprietário de uma fazenda na TI foi multado em mais de R$ 20 milhões pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) pelo desmatamento que promoveu na Terra Indígena Xavante.

O desmatamento é, contudo, apenas uma das facetas negativas do conflito. A atual situação fundiária dos Xavante também contribui para o aumento da mortalidade infantil entre as famílias presentes na TI. Em fevereiro de 2007, a Funai registrou que, no ano anterior, 17 crianças morreram de desnutrição na aldeia Alto Boa Vista – o índice de mortalidade infantil na área seria nove vezes superior à média nacional. O agravamento do conflito, decorrente da morosidade dos processos existentes, só tendia a piorar essa situação e trazer ainda mais danos a uma população tradicionalmente violentada e expropriada de seus direitos mais básicos.

O grau de violência e tensão intrínseca ao conflito foi substancialmente agravado em fevereiro de 2009, quando um atentado envolveu um veículo de transporte escolar das crianças e adolescentes Xavante. Em 09 de fevereiro, um ônibus que servia aos estudantes indígenas sofreu problemas mecânicos, sendo obrigado a ficar estacionado às margens da BR-158. Na madrugada daquele mesmo dia, o veículo foi incendiado, sendo completamente destruído. De acordo com reportagem de Caroline Rodrigues, em resposta, os índios bloquearam a referida rodovia no dia seguinte, realizando protestos e exigindo da Polícia Civil do Estado do Mato Grosso o início das investigações, a identificação dos responsáveis pelo atentado e o envio de agentes da Polícia Federal para o local. A Polícia Federal esteve em São Félix do Araguaia negociando a reabertura da estrada com os índios.

Em 07 de maio de 2009, as organizações indígenas presentes no VI Acampamento Terra Livre divulgaram documento reivindicando, entre outras demandas, a desintrusão da T.I. Marãiwatsédé.

Em março de 2010, Marly Picanço divulgou artigo denunciando o uso de posseiros e pequenos agricultores como massa de manobra por parte de grandes fazendeiros e políticos locais para legitimar socialmente sua pretensão de manutenção da posse ilegal sobre as terras Xavante.

Segundo Picanço, os grandes fazendeiros da região arrendariam a terra dos posseiros de Marãiwatsédé para usá-la como pastagem. Além disso, alguns fazendeiros estariam impedindo os posseiros de se cadastrarem junto ao Incra para conseguirem lotes em Assentamentos da Reforma Agrária existentes nas redondezas, como forma de mantê-los na condição de intrusos nas terras indígenas e legitimar um discurso que apresenta a manutenção dos não-índios na TI como forma de defesa dos interesses dos pequenos agricultores ali presentes.

Em depoimento a Picanço, o cacique Xavante Damião afirma: “Os posseiros são peixinhos dos fazendeiros, dos prefeitos. Eu digo para eles: não escuta conversa de político. O fazendeiro vai te dar um pedaço da fazenda dele? Não vai. Quando sair a decisão que a terra é nossa, é o fazendeiro que vai para a estrada? Não. Eu digo: você tem que sair daqui e lutar pelos seus direitos. Eu estou aqui porque é nossa terra”.

Além das disputas fundiárias e episódios de violência, explicitava-se a grave situação de saúde daquela comunidade. O posto de saúde da aldeia contava então com apenas uma enfermeira e uma técnica em enfermagem, obrigando os índios a buscarem outras unidades de saúde quando precisavam de assistência médica.

Além disso, mais de 50% das crianças até cinco anos apresentavam algum problema nutricional. Nas outras terras do povo, esse índice permanece em torno de 18%, segundo as enfermeiras do posto da aldeia. A principal causa dessa situação é a falta de água na aldeia, o que obriga os indígenas a beberem água de um rio poluído por agrotóxicos que escoam das plantações vizinhas. A bomba de água construída pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa) não funciona adequadamente desde quando foi instalada. A redução da disponibilidade de alimentos, derivada do desmatamento, é uma das causas apontadas pela comunidade para o estado de insegurança alimentar e desnutrição infantil em que se encontrava.

De acordo com o cacique Damião: “Quando eu era pequeno e morava aqui, não era fácil para adoecer. Tinha fruta e caça, peixe, inhame, buruti, jatobá e mel. Era forte e sadio. Sem misturar açúcar na comida. Agora não tem nada disso, por isso, todo mundo [fica] doente”.

A denúncia de Damião a respeito da participação de políticos locais na manutenção de não-indígenas na TI foi confirmada pelo Ministério da Justiça (MJ) e a Funai quando da divulgação de uma lista de 68 propriedades rurais situadas dentre da terra indígena. Segundo reportagem de Liana Melo para o jornal O Globo, o prefeito do município, Filemon Gomes Costa Limoeiro, é “dono” de 250 hectares localizados na área em litígio, onde cria cerca de 400 cabeças de gado. Limoeiro afirmou à repórter ter movido ação na Justiça contestando a legitimidade da demarcação e pleiteando indenização sobre as propriedades rurais. Entre as propriedades arroladas pelo Governo Federal, apenas 11% possuíam cadastro junto à Receita Federal, sendo as demais consideradas irregulares. Grandes frigoríficos como o grupo JBS-Friboi estariam entre os compradores do gado abatido no local. Em novembro, nova decisão judicial considerou ilegais e de má-fé as propriedades existentes dentro das áreas homologadas como terras indígenas em São Félix do Araguaia.

Segundo nota da Funai para o TRF, não havia dúvida de que a comunidade Marãiwatsédé foi despojada da posse de suas terras na década de 1960, a partir do momento em que o Estado de Mato Grosso passou a emitir títulos de propriedade a não-indígenas, impulsionado pelo espírito expansionista de “colonização” daquela região brasileira. Os desembargadores concluíram que os posseiros não tinham nenhum direito às terras por se tratarem de invasores da área, inexistindo possibilidade de ajuizamento de ação indenizatória. As ações impetradas pelos ocupantes foram consideradas como de propósito meramente protelatório, atitude que deveria, segundo o TRF, ser combatida vigorosamente pelo juiz da causa, e que as provas apresentadas não eram válidas.

O julgamento que culminou com esta decisão teve início em 2009, quando o relator do caso, o desembargador Fagundes de Deus, apresentou voto favorável aos Xavante. Em janeiro de 2010, o desembargador João Batista também votou favoravelmente aos indígenas. Coube à procuradora Maria do Carmo Cardoso proferir o último voto, consolidando a unanimidade da decisão favorável aos Xavante, em agosto de 2010.

Os Xavante conseguiram nova conquista em 2011, quando a Funai anunciou a construção de 40 casas na Terra Indígena Marãiwatsédé. Segundo nota da fundação, as construções de alvenaria seguiam o conceito de casas ecológicas e tinham arquitetura diferenciada, preservando as formas tradicionais de habitação Xavante: redondas, com telhas vermelhas, como se fosse a palha de babaçu usada para construir no passado. A Funai informava ainda que cada casa teria 58m2, e abrigaria de 12 a 15 pessoas de uma mesma família. O valor total das construções era de aproximadamente R$ 1 milhão. Os recursos foram divididos entre a Funai (R$ 575,9 mil), a Cooperativa de Habitação Indígena da Região Sul – Coophirs (R$ 5,8 mil – contrapartida) e o Programa Nacional de Habitação Rural (PNHR) da Caixa Econômica Federal – CEF (R$ 480 mil).

Paralelamente ao processo de consolidação das aldeias já existentes, os Xavante intensificaram o processo de retomada das terras homologadas. Em maio de 2011, cerca de 200 índios ocuparam a área então conhecida como Fazenda Velho Oeste, localizada no município de Alto Boa Vista. Segundo o cacique Damião Paradzane, a iniciativa tinha como objetivo impedir que o então ocupante da área continuasse a dividi-la, arrendá-la ou vendê-la para terceiros, contrariamente à decisão judicial proferida em novembro do ano anterior – ou à decisão administrativa do Ministério da Justiça e da Funai em reconhecê-la como parte da TI. Os Xavante se propunham a permanecer na fazenda até conseguir uma reunião com o Incra para discutir o destino da área.

A desintrusão do restante da TI, ainda sob o poder de posseiros, tornou-se ainda mais distante em julho daquele ano, quando o Tribunal Regional Federal da 1º Região (TRF1), em Brasília, determinou a permanência das sete mil famílias de não-indígenas na TI. A determinação suspendia a decisão da Justiça Federal de Mato Grosso e condicionava a saída destes à apresentação de um plano de desintrusão, por parte do Ministério Público Federal (MPF) e da Funai, que oferecesse opções aos posseiros. O MPF anunciou na ocasião que o plano estaria pronto em até 30 dias.

Paralelamente a este processo, o Governo do Estado do Mato Grosso sancionou uma lei, votada na Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso (ALEMT), que permitia ao executivo estadual oferecer aos Xavante a opção de trocar as terras da TI por áreas situadas dentro do Parque Estadual do Araguaia. Esta proposta foi recusada pela etnia e considerada inconstitucional pela Funai, pois feria direitos assegurados ao povo indígena. Segundo o então coordenador da Funai em Ribeirão Cascalheira, Denivaldo Roberto da Rocha: “Não tem a menor possibilidade, nem a Funai e nem os índios estão levando em conta o que propõe esta lei”.

O então governador do Estado, Silval da Cunha Barbosa, afirmou em reportagem do Jornal Nacional não estar preocupado com os aspectos jurídicos da lei, considerando-a uma solução razoável para o que considerava um problema: “Nós oferecemos essa área e vamos ajudar a montar a estrutura, como dissemos. Agora, a forma legal, a Funai e o Ministério da Justiça que resolvam. Eles que criaram o problema na região”.

Ouvido por reportagem do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), o cacique Damião afirmou-se contrário à proposta de permuta: “A comunidade não quer ser retirada pela segunda vez da terra. Para nós, não interessa. Essa lei é contra os direitos que a Constituição dá para os índios. Estamos firmes e animados para a decisão final da Justiça”. Damião afirmou também estar pronto para resistir a qualquer proposta que significasse a retirada dos Xavante da área homologada: “Nunca Xavante chorou de medo, nunca fugiu de morrer. Xavante sempre enfrenta por seus direitos. Estou preparando muito bem essa guerra, está sendo pensado. É assim desde o século passado. Afirmamos e mantemos isso”.

De acordo com parecer jurídico elaborado pelos advogados Denise da Veiga Alves e Adelar Cupsinski, ambos assessores jurídicos do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), a Terra Indígena Marãiwatsédé é bem de uso especial da União para o fim específico de posse permanente e usufruto exclusivo de suas riquezas pelo povo Xavante. Portanto, a Lei nº 9.564 sancionada pelo governador de Mato Grosso, Silval Barbosa, seria inconstitucional.

Concomitantemente à discussão da constitucionalidade da lei estadual, a Funai ajuizou junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) a Suspensão de Segurança (SS) 4512 pedindo a suspensão da decisão do desembargador do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), que paralisou o processo de desintrusão de Marãiwatsédé.

A Funai alegou no pedido que a decisão proferida pelo desembargador do TRF-1 lesionava sobremaneira a ordem administrativa, com evidente prejuízo ao interesse público, ante a flagrante ilegitimidade e inconstitucionalidade da possibilidade de transação [da terra indígena] (contra texto expresso da Carta Magna), acirrando os ânimos na região, com possibilidade de conflitos entre os índios e os não-índios. Isto porque a decisão do TRF-1 teve como base a lei estadual aqui referida e sua proposta de permuta.

A Funai alegava que a lei mato-grossense continha duas inconstitucionalidades básicas: a primeira delas é que, de acordo com o artigo 20, inciso XI, da CF88, as terras indígenas brasileiras são de propriedade da União; a segunda é que o parágrafo 4º do artigo 231 da CF88 dispõe que as terras indígenas são inalienáveis e indisponíveis, sendo os direitos sobre elas imprescritíveis. Logo, não cabe ao Estado de Mato Grosso legislar sobre a matéria.

Segundo o ISA, no dia 31 de maio de 2011, o MPF se reuniu com a Funai, Incra, PF e CIMI para elaborar um plano de desintrusão para a TI Marãiwatsédé. Alguns meses depois, no dia 07 de novembro, a Funai ajuizou no STF um pedido para suspensão da decisão do TRF-1, que sustou o processo de regularização definitiva da TI Marãiwatsédé. Para a Funai, a decisão do TRF1, que teve como fundamento a suposta possibilidade de permuta da área em litígio por outra localizada no Parque Nacional do Araguaia, era inconstitucional, além da área proposta para permuta estar também ocupada por posseiros e fazendeiros.

Vinte anos depois da Eco-92, quando se prometeu aos Xavante o retorno para suas terras, o Cacique Damião Paridzané entregou para a presidente Dilma Rousseff, na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), uma carta exigindo a retirada dos invasores da TI Marãiwatsédé. Preocupados com a possibilidade de terem que sair da área, no dia 23 de junho de 2012 os posseiros bloquearam a rodovia BR-158.

No dia 3 de julho de 2012, a Funai reafirmou a legalidade da TI orientada por uma decisão do TRF1 que, em 2010, confirmou a decisão de primeiro grau reconhecendo a legitimidade do procedimento administrativo de demarcação da terra indígena. A posse de todos os ocupantes não-índios, sobre bem imóvel da União, foi considerada de má-fé. No dia seguinte, a Justiça obrigou a Funai a revelar qual seria o seu plano para a desintrusão da Terra Indígena, dando o prazo de 10 dias para tal e mais 30 dias para a retirada dos não-indígenas.

No dia 5 de dezembro de 2012, o MPF publicou relatório destacando que 1/3 da área dos Xavante estava ocupada por 22 grandes posseiros, entre eles, prefeitos e ex-prefeitos, vereadores, empresários e um desembargador, dificultando o conflituoso processo de desintrusão. No dia 10 de dezembro começou a ação de desintrusão. De acordo com a equipe responsável pela operação, não houve resistência na área rural, e a maioria dos locais já estaria desocupada. Em vários deles, os moradores desmontaram suas benfeitorias e removeram seus bens, deixando voluntariamente os imóveis. No total, desde o início da operação até o final do ano, foram vistoriadas 83 fazendas. Destas, 46 já estariam em posse da Funai.

Em uma ação estratégica, orquestrada pela Funai em parceria com a Polícia Federal, na madrugada do dia 30 de dezembro, quando o local estava esvaziado, o distrito de Posto da Mata, principal reduto de resistência não-indígena à desocupação da terra Xavante, foi ocupado. No dia 17 de janeiro, o Posto da Mata estava completamente desocupado. De acordo com a agência de notícias A Pública, a ação ocorreu num distrito de quase cinco mil habitantes que tinha casas, escola, igrejas, hotel, além de silo e posto de pesagem de grãos. No dia 28 de janeiro de 2013, mais de 20 anos após a promessa de demarcação da TI, finalmente a desintrusão foi considerada concluída. No dia 5 de abril, os Xavante fizeram uma festa para comemorar.

Menos de quatro meses depois, a terra indígena voltou a ser invadida. No dia 21 de abril, os posseiros montaram um acampamento no Posto da Mata. A pedido da representação do MPF no Mato Grosso, a Justiça Federal determinou que agentes da Polícia Federal, da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP) prestassem todo o apoio necessário para garantir que os antigos posseiros que se encontravam acampados no interior de Marãiwatsédé fossem retirados do local.

Em agosto de 2013, de acordo com o Ibama, 165 mil hectares, cerca de 20% da terra indígena, foram queimados de maneira criminosa. No dia 29 de janeiro de 2014, posseiros voltaram a ocupar a área do Posto da Mata, após saída da Polícia Federal. Na ação os posseiros expulsaram os servidores da Funai que estavam na região. Segundo o Ministério Público Federal, os incêndios criminosos provocados pelos ex-ocupantes da terra tinham o objetivo de descaracterizá-la. O órgão ajuizou ações penais contra 42 fazendeiros, cobrando uma reparação de pelo menos R$ 91,5 milhões pelo desmatamento da área.

Uma tese de doutorado defendida pela historiadora Maria do Socorro de Sousa Araújo na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) em 2013 mostra que 50 mil hectares no território estavam sendo financiados por uma empresa do grupo Safra, sendo parte de um financiamento mais amplo no Vale do Araguaia mato-grossense destinado a empresas que controlavam 2,17 milhões de hectares. Um terço desse total, 695 mil hectares (uma área maior que a Palestina), estava nas mãos dos invasores da Terra Indígena Marãiwatsédé.

Em maio de 2016, o Ministério Público Federal, durante a investigação dos crimes cometidos na terra indígena, pediu a prisão de dois dos líderes da frustrada reocupação: o vereador Osvaldo Levino, conhecido como Nivaldo do Posto da Mata, e Jovenil dos Santos, o Benil, marido da vice-prefeita de Alto Boa Vista, Irene Maria Rocha Santos. Ambos foram detidos pela segunda vez. Em 2014, eles já haviam sido presos após serem flagrados em interceptação telefônica tramando a invasão da terra. Num dos áudios obtidos pela Pública, um fazendeiro que tinha negócios no local comenta que “o Nilson Leitão [deputado federal] falou que é para o povo descer, e entrar para dentro da área mesmo. Que é para dar força. Para voltar com máquina, voltar com gado (…) e que ele [Nilson Leitão] pediu 30 escrituras para arrumar para ele”. No caso de Benil, o áudio revela uma conversa dele com posseiros da região: “Nós tá grilando umas terras aqui” (sic), disse, referindo-se à Marãiwatsédé.

Irene, de 50 anos e uma das ex-moradoras, conta que ela e o marido chegaram ao Posto da Mata em 1992, quando a área começava a ser avaliada pela Funai. “As prisões deixaram uma sequela muito grande. Perdemos tudo, terra, gado, o hotel e o restaurante que ficava no Posto da Mata”, afirmou. Ela defendia, na época da entrevista, que as prisões em maio foram injustas. “Os dois acabaram respondendo por algo que todo o povo passou”, disse à Agência Pública.

O laticínio Piracanjuba, que também foi retirado do Posto da Mata, produzia uma média diária de 40 mil litros de leite. Antes de 2012, a prefeitura de Alto Boa Vista tinha em seus cadastros cerca de 200 mil cabeças de gado, 90% dentro da terra indígena. “Primeiro foi feita a retirada, para só depois promover o assentamento. Realmente o governo errou”, defendia Alexandre Croner de Abreu, da Funai, em entrevista para A Pública.

Segundo o Incra, 271 famílias foram cadastradas no órgão para serem reassentadas, mas, como não havia uma área definida entre 2012 e 2013, muitas se mudaram por conta própria para municípios e povoados da região, ou foram abrigadas em escolas de Alto Boa Vista. De acordo com a prefeitura local, o município passou a gastar mais com assistência social e atendimento psicológico.

É o caso do agricultor Jerônimo Lourenço da Silva, de 77 anos, que vive só na área de reassentamento desde que ela foi aberta, em 2014. “Fui tapeado por muito tempo. Os grandes produtores seguravam os pequenos para fazer a vontade deles”, lamenta o agricultor, que viveu por 12 anos na terra indígena. Vários posseiros disseram à Justiça que eram ameaçados pelos latifundiários caso eles quisessem sair das terras da Marãiwatsédé. Jerônimo conta ter chegado ao Posto da Mata em 2000, quando, afirma, adquiriu um pequeno pedaço de terra de 16 alqueires [cerca de 77 hectares] em troca de seis vacas prenhes. “Fizeram muitas travessias com a gente no Posto da Mata. Nossa ignorância era grande. Eu mesmo tive oportunidade de sair para outro assentamento, mas os produtores não deixavam ninguém sair de lá. Parecia uma escravidão”, declarou ao repórter Lucas Ferraz.

Em junho 2016, posseiros, produtores rurais e políticos retirados da região por forças federais se articularam pela terceira vez para reinvadir a terra de 165 mil hectares. O ressentimento com o governo de Dilma Rousseff fez com que Alto Boa Vista, município de 6 mil habitantes encravado no epicentro do conflito, se transformasse na cidade mais antipetista do País nas eleições de 2014, votando em peso no candidato derrotado do PSDB, Aécio Neves (ele recebeu 83% dos votos no primeiro turno), segundo matéria da A Pública.

Nova tentativa de reinvasão provocou a primeira crise do governo interino de Michel Temer, constantemente pressionado pelos deputados federais e senadores ligados ao agronegócio do Congresso Nacional, a chamada Bancada Ruralista, para promover mudanças nas regras de demarcação das terras indígenas. À época, o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, recebeu em seu gabinete em Brasília representantes dos Xavante, que pediam ajuda federal para assegurar a integridade de seu território tradicional.

Em resposta às tentativas de invasão, cerca de 130 Xavante acamparam por uma semana na encruzilhada, dentro da terra indígena, onde ficava o antigo Posto da Mata, que fora completamente destruído em uma nova desintrusão realizada em 2014. O cacique Damião Paridzané, líder político da etnia, avisou às autoridades em maio de 2016: “Xavante, quando perde a paciência, perde o juízo, vai entrar na cidade, vai acontecer sangramento, morte, ninguém sabe”, afirmou em entrevista para Lucas Ferraz da agência A Pública.

O Mato Grosso foi em 2016 o maior exportador de grãos do país — a soja é o principal produto da balança de exportação nacional, respondendo por mais de US$ 20 bilhões. A presença da soja, que começou a despontar no Vale do Araguaia no final dos anos 1970 mas que nunca superou a pecuária, cresceu consideravelmente nos últimos anos. “Essa região ainda tem um potencial muito grande. Se dobrarmos a área de cultivo, podemos chegar a 3 milhões de hectares de soja. O Mato Grosso produz atualmente 9 milhões”, conta Marcos da Rosa, presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho do Estado de Mato Grosso (Aprosoja/MT) e produtor gaúcho instalado na região desde a década de 1980, em entrevista à agência A Publica. O aumento das plantações de soja tem relação direta com as ocupações irregulares dentro da terra indígena.

No dia 16 de março de 2018, a Operação Amazônia Nativa (OPAN) denunciou a existência de aviões agrícolas pulverizando a terra indígena com agrotóxicos. Os Xavante reclamavam do cheiro insuportável do veneno, responsável por doenças respiratórias na população.

Entre agosto de 2017 e julho de 2018, o Mato Grosso continuou a liderar o ranking do desmatamento. Neste período, de acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), foram desmatados 7,9 km² no bioma do Cerrado, o maior índice dos últimos 10 anos. Apesar do aumento, as taxas de autos lavrados foi a menor em 2018, apenas 541. Em 2008, as taxas de ocorrências foram de 1.585. A terra indígena Marãiwatsédé foi alvo dos maiores índices desse desmatamento.

Parte integrante das atividades do “Abril Indígena” de 2018, o MPF lançou o documentário “Marãiwatsédé: o resgate da terra” (AQUI), que conta a saga de mais de 40 anos dos Xavante para o retorno ao seu território.

Em 2019, as ameaças continuaram. No mês de janeiro a 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal (6ªCCR/MPF), de Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais, publicou notícia informando que enviara ofício ao Ministério da Justiça (MJ) pedindo que fossem tomadas medidas urgentes de proteção a comunidades indígenas que se encontram sob graves ameaças, como é o caso da terra indígena Xavante de Marãiwatsédé. Segundo o relato, haveria intenções de novas invasões à TI.

 

Atualização: 26.06.2019

Cronologia

1852 – Primeiros relatos sobre os Xavante.

1941 – “Equipes de Pacificação” do SPI são mortas pelos Xavante.

31 de dezembro de 1965 – União transfere os Xavante de Marãiwatsédé para a Missão Salesiana de São Marcos.

1979 – Liquifarm Agropecuária Suiá-Missú passa para o controle da multinacional italiana Holding Ente Nazionale Idrocarburi/Agip Petroli (ENI).

19 de janeiro de 1992 – Marãiwatsédé é reconhecida como terra indígena pela Funai.

30 de maio de 1992 – Agip Petroli do Brasil promete devolver a área da fazenda Suiá-Missu aos Xavante durante a Eco-92.

24 de junho de 1992 – Mais de 2 mil posseiros ocupam parte da fazenda Suiá-Missu, então já reconhecida como TI Marãiwatsédé.

16 de novembro de 1992 – Apesar da promessa de devolução da área, Agip anuncia leilão de Marãiwatsédé.

30 de novembro de 1992 – Xavante tentam assistir ao leilão promovido pela ENI/Agip, mas são impedidos

– Funai envia ao MPF relatório indicando que 180 mil hectares da fazenda Suiá-Missu que iriam a leilão pertenciam à TI Marãiwatsédé.

18 de janeiro de 1995 – Funai seleciona empresa para realizar medições da Terra Indígena.

22 de fevereiro de 1995 – Ministro da Justiça, Nelson Jobim, susta o pedido de demarcação de Marãiwatsédé, atendendo aos pedidos dos senadores Júlio Campos, Carlos Bizerra e Jonar Pinheiro.

30 de março de 1995 – Posseiros fecham a BR-158 e ameaçam funcionários da empresa responsável pela medição da área da TI.

31 de março de 1995 – Funcionários da empresa deixam a região após serem ameaçados pelos             posseiros.

25 de abril de 1995 – MPF determina que a Polícia Federal dê cobertura aos trabalhos de demarcação da TI.

27 de abril de 1995 – Funai e Polícia Federal começam a demarcação física da terra indígena pela terceira vez.

22 de maio de 1995 – Justiça nega medida cautelar dos posseiros contra a demarcação.

21 de setembro de 1996 – Funai inicia cadastro dos posseiros para posterior reassentamento pelo Incra.

27 de julho de 1997 – Funai ajuíza ação pela demarcação de Marãiwatsédé.

13 de setembro de 1998 – Posseiros interditam a BR-158 para impedir que a Funai e o Incra iniciem o levantamento ocupacional e cadastral das famílias não-indígenas que vivem na TI Marãiwatsédé.

26 de setembro de 1998 – BR-158 é desbloqueada e as equipes da Funai e do Incra voltam ao trabalho, com o apoio da Polícia Federal.

28 de março de 1999 – Procurador da Funai questiona os números de posseiros no interior da terra indígena.

19 de setembro de 2000 – Após 34 anos, os Xavante começam a voltar a Marãiwatsédé.

5 de dezembro de 2000 – Advogado dos posseiros consegue liminar suspendendo o retorno dos Xavante a Marãiwatsédé.

23 de outubro de 2003 – Os Xavante de Marãiwatsédé, que estão na aldeia Água Boa, localizada na Terra Indígena dos Areões, se organizam para regressar à terra indígena recém demarcada.

23 de novembro de 2003 – Força-tarefa do Gabinete de Gestão Integrada em Segurança Pública de Mato Grosso (GGI/MT) se reúne para avaliar os conflitos na TI Marãiwatsédé.

2 de dezembro de 2003 – Ministro da Justiça recebe presidente da Funai e comitiva Xavante.

28 de janeiro de 2004 – Audiência é realizada pela Justiça Federal para decidir sobre posse de Marãiwatsédé.

29 de janeiro de 2004 – Posseiros conseguem liminar impedindo o retorno dos Xavante

1 de agosto de 2004 – Xavante acampam nas margens da BR-158 aguardando autorização para regressar ao seu território.

8 de agosto de 2004 – Comitiva da ONU visita a região para verificar denúncias de violação de direitos humanos.

– MPF e Funai encaminham ofício à Justiça Federal solicitando permissão para os Xavante retornarem à sua área.

9 de agosto de 2004 – STF decide que os Xavante podem retornar para suas terras.

10 de agosto de 2004 – Funai apreende toras de madeira saindo da TI Marãiwatsédé.

11 de agosto de 2004 – Xavante constroem uma aldeia provisória.

19 de agosto de 2004 – Incra desapropria terras no MT para assentar os posseiros.

31 de março de 2005 – Incra inicia, novamente, o cadastro dos posseiros que ocupam Marãiwatsédé.

6 de fevereiro de 2007 – Juiz da 5ª Vara da Justiça Federal ordena a retirada dos posseiros da TI Marãiwatsédé.

12 de abril de 2007 – Asfaltamento da BR-158 ameaça os modos de vida dos Xavante.

13 de março de 2008 – Posseiros realizam audiência pública para negociar permanência em área da TI Marãiwatsédé.

30 de abril de 2008 – Grupo de 46 Xavante vai a Brasília buscar apoio para a desintrusão da TI.

17 de agosto de 2008 – Ibama, Funai e MPF realizam vistorias em 10 propriedades denunciadas por desmatamento na TI Marãiwatsédé.

3 de julho de 2009 – PF desmonta esquema de grilagem nas terras indígenas do MT e prende 13 pessoas.

29 de julho de 2009 – ICMBio identifica 6.000 hectares de produção ilegal de grãos na TI Marãiwatsédé.

8 de agosto de 2009 – TRF1 decide autorizar desintrusão da TI Marãiwatsédé.

30 de março de 2010 – Ibama apreende soja ilegal em fazenda dentro da TI Marãiwatsédé.

25 de julho de 2010 – TI Marãiwatsédé tem 45,5% da sua área desmatada, segundo o Inpe.

25 de novembro de 2010 – Justiça do Mato Grosso reconhece o direito dos Xavante à TI Marãiwatsédé.

12 de dezembro de 2010 – Damião Paradzane, liderança Xavante, recebe o Prêmio Estadual de Direitos Humanos.

12 de maio de 2011 – MPF entra com pedido de execução para que Justiça Federal determine prazo de 30 dias para desocupação da TI.

18 de maio de 2011 – Governo do MT propõe permuta entre terras da TI Marãiwatsédé e do Parque Estadual do Araguaia.

19 de maio de 2011 – Funai rechaça a proposta do governo do MT.

22 de maio de 2011 – Inpe divulga que maior foco de desmatamento na Amazônia Legal está dentro da TI Marãiwatsédé.

31 de maio de 2011 – MPF, Incra, Funai, Ibama, PF, Cimi e Câmara dos Deputados se reúnem para construir um plano de desintrusão da TI.

11 de março de 2012 – Xavante protocolam carta no MPF afirmando que não vão sair de seu território tradicional.

19 de março de 2012 – DNIT afirma que vai mudar traçado da BR-158 para não passar dentro da TI.

20 de março de 2012 – Área proposta por permuta pelo governo do Estado também está ocupada por fazendeiros e posseiros, segundo o ISA.

11 de abril de 2012 – TRF1 cassa laudo antropológico da perita que identificou a fazenda Suiá-Missu como pertencente aos Xavante.

12 de junho de 2012 – TRF1 revoga decisão que suspendia a desintrusão de Marãiwatsédé.

20 de junho de 2012 – Cacique Damião leva carta para a presidente Dilma Rousseff na Rio+20.

23 de junho de 2012 – Posseiros bloqueiam a BR-158 em protesto contra avanços no processo de desintrusão da TI.

3 de julho de 2012 – Funai reafirma legalidade no processo de regularização da TI Marãiwatsédé.

4 de julho de 2012 – Justiça do MT obriga Funai a revelar plano de desintrusão.

17 de julho de 2012 – Funai apresenta plano para a desintrusão.

13 de dezembro de 2012 – Equipe responsável pela desintrusão sofre ameaças.

15 de dezembro de 2012 – Posseiros queimam ponte na BR-158.

27 de dezembro de 2012 – Funai anuncia que, das 83 fazendas vistoriadas, 46 já estão em sua posse.

29 de dezembro de 2012 – Forças Federais ocupam distrito de Posto da Mata, principal reduto de resistência à demarcação da TI.

17 de janeiro de 2013 – Posto da Mata é totalmente desocupado.

28 de janeiro de 2013 – Desintrusão da TI Marãiwatsédé é considerada totalmente concluída pela Funai.

5 de abril de 2013 – Povo Xavante realiza ato em comemoração à recuperação da área.

21 de abril de 2013 – Posseiros do Posto da Mata voltam a ocupar a TI Marãiwatsédé.

26 de abril de 2013 – Justiça Federal determina retirada de posseiros da TI.

22 de agosto de 2014 – TI Marãiwatsédé sofre queimadas criminosas.

29 de janeiro de 2014 – Posseiros fecham rodovia e expulsam funcionários da Funai.

Maio de 2016 – MPF pede a prisão de dois dos líderes da frustrada reocupação: o vereador Osvaldo Levino, e o marido da vice-prefeita de Alto Boa Vista, Jovenil dos Santos.

Junho 2016 – Nova articulação de posseiros, produtores rurais e políticos para reocupar 165 mil hectares de terra.

– Cerca de 130 Xavante ocupam o Posto da Mata.

16 março de 2018 – OPAN denuncia que aviões agrícolas estão pulverizando a terra indígena com agrotóxicos.

2018 – Inpe anuncia que Mato Grosso lidera ranking do desmatamento.

19 de abril de 2018 – Lançamento do documentário “Marãiwatsédé: o resgate da terra”.

Janeiro de 2019 – 6ªCCR do MPF envia ao MJ ofício pedindo medidas urgentes de proteção à Terra indígena Xavante de Marãiwatsédé, que sofre novas ameaças de invasão.

 

Fontes

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