RJ – Moradores da Vila União de Curicica lutam contra remoções e por indenizações justas
UF: RJ
Município Atingido: Rio de Janeiro (RJ)
Outros Municípios: Rio de Janeiro (RJ)
População: Comunidades urbanas, Moradores em periferias, ocupações e favelas
Atividades Geradoras do Conflito: Especulação imobiliária, Hidrovias, rodovias, ferrovias, complexos/terminais portuários e aeroportos, Indústria do turismo, Mega-eventos, Políticas públicas e legislação ambiental
Impactos Socioambientais: Alteração no regime tradicional de uso e ocupação do território, Desmatamento e/ou queimada, Favelização
Danos à Saúde: Piora na qualidade de vida, Violência – coação física, Violência psicológica
Síntese
A Vila União de Curicica, fundada em 1986 e atualmente com cerca de três mil moradores, está situada no bairro Curicica, na zona oeste do Rio de Janeiro e é uma das comunidades que está sendo impactada pelas obras da Transolímpica – uma via expressa do sistema Bus Rapid Transit (BRT) de 26 km de extensão que ligará Recreio dos Bandeirantes a Deodoro e compõe o projeto da Cidade Olímpica.
Este fato se complexifica considerando que até recentemente a comunidade estava no mapa de urbanização da prefeitura e receberia obras do “Morar Carioca”, programa de urbanização de favelas atualmente realizado pela prefeitura, mas que foi suspenso pois o interesse do poder público agora é remover a comunidade e sua população.
A Prefeitura afirmava que os removidos, aproximadamente 876 famílias, seriam reassentados em um projeto habitacional de Minha Casa Minha Vida, na Colônia Juliano Moreira, próximo a Curicica. Contudo, parte da população que seria removida afirma que os apartamentos, além de muito pequenos, não contemplam os comerciantes, motivo pelo qual se negam a sair de Vila União. Dessa forma, o projeto da Prefeitura considera apenas a questão habitacional, ignorando a economia existente na comunidade.
Além disso, em novembro de 2014, a Prefeitura afirmou que algumas das famílias que estavam sendo removidas do bairro sequer outra moradia iriam receber. Apenas R$ 400 de aluguel social durante quatro meses, visto que os mesmos não tinham os documentos necessários para acessar o programa do governo federal de habitação popular.
Além das remoções de populações de diferentes bairros, a Transolímpica será construída em uma área de Mata Atlântica. A construção da avenida derrubará aproximadamente 200 mil m² de vegetação na zona oeste, uma área equivalente a 24 campos de futebol.
Embora alguns moradores da Vila União de Curicica já tenham sido removidos, a população que permanece afirma não aceitar as condições impostas pela administração pública municipal, as quais consideram absurdas, e continua lutando por seu prosseguimento na área ou, pelo menos, por indenizações justas por suas casas.
Contexto Ampliado
A cidade do Rio de Janeiro está sendo palco de diversos projetos estruturais promovidos pelos diversos níveis da administração pública com o objetivo de prepará-la para sediar os Jogos Olímpicos de 2016. As obras incluem a construção de instalações esportivas e obras de infraestrutura no campo da mobilidade urbana, tais como: modernização e expansão do metrô, construção de corredores de ônibus, reformas no Aeroporto Internacional Tom Jobim e diferentes obras viárias de acesso à área urbana.
De acordo com as análises publicadas no Dossiê do Comitê Popular da Copa e das Olimpíadas do Rio de Janeiro (maio de 2013), os impactos dessas intervenções urbanas são, entre outras coisas, a exclusão social, com destaque para as remoções. Esses projetos têm provocado transformações profundas na dinâmica da cidade; de um lado, é possível perceber novos processos de elitização e mercantilização da cidade, e de outro, novos padrões de relação entre o Estado e os agentes econômicos e sociais, marcados pela negação das esferas públicas democráticas de tomada de decisões e por intervenções autoritárias, na perspectiva daquilo que tem sido chamado de cidade de exceção, de acordo com o Dossiê (2013, p. 08).
A institucionalidade da cidade de exceção vivenciada, sobretudo, pela população pobre carioca é caracterizada pela imposição da norma a cada caso particular – a partir de decretos, medidas provisórias, leis votadas ao largo do ordenamento jurídico, diferentes portarias e resoluções -, longe da participação dos cidadãos. Institucionalidade essa que está violando abertamente os princípios da impessoalidade, universalidade e publicidade da lei e os atos da administração. Nessa perspectiva, as intervenções em curso envolvem diversos processos nos quais os interesses privados têm sido beneficiados por isenções e favores, feitos em detrimento do interesse público, legitimados em nome das parcerias público-privadas, ainda segundo o Dossiê (2013, p.08).
A Vila União, situada no bairro Curicica – próximo a Jacarepaguá, na zona oeste do Rio de Janeiro -, é uma das comunidades que está sendo impactada pelas obras preparatórias para as Olimpíadas de 2016. A mesma foi fundada em 1986, ou seja, tem praticamente 30 anos de existência e atualmente possui cerca de três mil moradores. A Vila União está atualmente ameaçada de remoção porque parte da Transolímpica irá ser construída no local onde atualmente está situada a comunidade.
A Transolímpica é um projeto de via expressa do sistema Bus Rapid Transit (BRT), de 26 km de extensão, que ligará Recreio dos Bandeirantes a Deodoro, na região oeste da cidade do Rio de Janeiro. Conforme é exposto no site Cidade Olímpica da Prefeitura do Rio de Janeiro, a via vai cortar vários bairros da região, sendo estes: Jacarepaguá, Curicica, Taquara, Boiúna, Sulacap, Magalhães Bastos e Vila Militar, significando um investimento total de R$ 1,6 bilhão. É importante pontuar, entretanto, que, deste total, R$ 300 milhões serão gastos somente para desapropriação de imóveis que hoje encontram-se no trajeto da nova avenida.
A via expressa fará ligação com a Transcarioca, em Curicica, e com a Transoeste, no Recreio dos Bandeirantes, além de se interligar a outros modais como os trens da Supervia, no bairro de Deodoro. O projeto prevê a construção de 31 pontes, 25 viadutos, 17 estações, além de três terminais e de dois túneis, um deles atravessando o Maciço da Pedra Branca, e ainda a duplicação de vias, como a Avenida Salvador Allende e as estradas de Curicica e do Guerenguê, em Jacarepaguá.
O financiamento do corredor viário será feito com a iniciativa privada por meio do sistema de concessão. Em 19 de abril de 2012, foi anunciado que o consórcio formado por Invepar, Odebrecht e CCR, chamado Rio Olímpico, venceu o leilão do projeto da Transolímpica. O contrato tem duração de 35 anos. O grupo será responsável pela conservação, manutenção e operação do corredor viário. Ainda haverá um pedágio como existe na Linha Amarela, a extensão deste margeará a linha férrea na Vila Militar, seguindo em paralelo à Estrada São Pedro de Alcântara entretanto, este trecho seria licitado separadamente. O início das obras seria em junho de 2012.
Segundo reportagem publicada pelo Rio on Watch (29-08-2012), uma grande parte da Vila União de Curicica terá que desaparecer, visto que as estradas que fazem limite com a comunidade, sendo elas Estrada de Curicica e Estrada Calmete, no projeto da Transolímpica, serão alargadas três vezes mais a fim de acomodar seis pistas para o tráfego. Vânia de Jesus Julio Neri, presidente da Associação de Moradores da Vila União no período, afirmou em reportagem que a Prefeitura permanecia sem uma comunicação adequada com os moradores. Apesar da proximidade do início das obras, estes continuavam sem saber onde seriam reassentados ou se seriam adequadamente indenizados: tudo indica que eles virão e tirarão as pessoas da comunidade. Mas não sabemos para onde nós iremos. Não sabemos se será para a Estrada de Curicica, ou numa parte totalmente diferente do Rio. Nós não sabemos de nada.
De acordo com a mesma notícia, Vânia Neri contou que, desde o ano anterior, 2011, a Associação vinha tentando diálogo com a Prefeitura para saber detalhes concretos sobre os impactos da Transolímpica na Vila União, mas nenhuma resposta foi dada pela mesma. O que queremos é que a prefeitura venha, sente e converse conosco sobre o que deve acontecer com a nossa comunidade. Só queremos saber. Mas isso ainda não aconteceu.
Em 24 de outubro de 2012, houve uma audiência pública organizada pelo Instituto Estadual do Ambiente (INEA) no âmbito do licenciamento ambiental do corredor viário, a Transolímpica. Segundo a publicação no website de Eliomar Coelho Vereador do Rio (24-10-2012), a audiência foi marcada por contradições e exposições vazias. Logo no início, o representante do INEA anunciou que a plateia, composta pelos moradores dos bairros atingidos e os militantes do Coletivo Resistência Popular Zona Oeste II não poderiam fazer uso da palavra e os questionamentos deveriam ser encaminhados por escrito.
O representante da prefeitura do Rio de Janeiro iniciou as falas, limitando-se a fazer propaganda do BRT, ao invés, por exemplo, de explicar o licenciamento da obra viária ou os objetivos da audiência pública. Na sequência, falou o representante da empresa responsável pelos Estudos e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) da obra, a MRS Ambiental. Este usou todo seu tempo para expor dados quantitativos e conceitos vagos para legitimar qualquer tipo de impacto ambiental da construção.
Eliomar, vereador do município, primeiramente criticou o encaminhamento inicial do INEA e solicitou que as falas fossem abertas para a população presente o que não foi atendido pelo Instituto. No segundo momento, o vereador denunciou que a prefeitura, no memorial descritivo da obra, apresentou ao INEA apenas parte do projeto a ser licenciado; na ocasião, faltava traçar um trecho de quase 10 km de via no memorial. Além disso, afirmou que todos os viadutos de acesso à parte do corredor viário sendo licenciado tampouco estavam presentes no escopo do licenciamento ambiental, o que impedia uma análise integrada do empreendimento, ainda segundo reportagem do website Eliomar Coelho Vereador do Rio (24-10-2012)
O que torna o caso da Vila União de Curicica ainda mais contraditório é que, em 2011, foi anunciado pela Prefeitura do Rio de Janeiro que a comunidade havia sido contemplada pelo programa Morar Carioca (ver no site a listagem de comunidades que o programa pretende atender, http://goo.gl/EvGuao), o que havia trazido esperanças de melhorias e de regularização das habitações existentes no bairro.
O Morar Carioca foi criado em 2010 pelo poder municipal, segundo informação publicada no site da Prefeitura do Rio de Janeiro (11-01-2011). O programa tem como objetivo o de promover a inclusão social, através da integração urbana e social completa e definitiva de todas as favelasdo Rio até 2020. Coordenado pela Secretaria Municipal de Habitação e considerado o maior programa de urbanização de favelas do país, a iniciativa faz parte do legado da Prefeitura para realização das Olimpíadas. O programa tem como meta investir R$ 8,5 bilhões até 2020, sendo R$ 2,1 bilhões até 2013 e 70 mil famílias beneficiadas, R$ 2,65 bilhões de 2014 até 2016 alcançando 86 mil famílias no ciclo dois, e R$ 3,75 bilhões de 2017 a 2020, abrangendo 109 mil domicílios no ciclo três.
Nesse sentido, de acordo com notícia do Rio on Watch (29-08-2012), no contexto do ano de 2012 existia para a população da Vila União de Curicica uma situação de ambiguidade, visto que não havia um pronunciamento oficial da Prefeitura sobre a remoção da população da Vila por conta da construção da Transolímpica, ao mesmo tempo em que o projeto Morar Carioca indicava que iria contemplar a comunidade. Algumas pessoas dizem que nós temos que sair, e outros dizem que o projeto Morar Carioca virá e beneficiará a Vila União. Então, eu não consigo entender nada, afirmou Vânia Néri na época. A reportagem apontou ainda que essa situação confusa provocada pelo poder público municipal demonstrava ser uma estratégia para paralisar a comunidade; ou seja, sem informações oficiais, a população ficou à espera e inicialmente não se mobilizou.
Os técnicos do escritório de arquitetura Corcovado empresa que assinou contrato com a Secretaria Municipal de Habitação (SMH) em maio de 2012 para desenvolver o programa Morar Carioca em algumas comunidades da zona oeste – informaram que o trabalho em Vila União se iniciou em setembro de 2012, mas executaram apenas a fase de diagnóstico, pois a mesma logo foi excluída do programa pela Prefeitura sem nenhuma justificativa, de acordo com as informações expostas no Dossiê do Comitê Popular da Copa e das Olimpíadas do Rio de Janeiro (2014).
Em novembro de 2012 a presidente da Associação de Moradores da Vila União, segundo informações publicadas no Dossiê (2013), recebeu informação de que a comunidade inteira seria afetada pela construção da Transolímpica, o que explicava a paralisação das atividades do programa Morar Carioca. A Vila teria que ser realocada, seja pela construção do corredor expresso, seja por estar parcialmente localizada em faixa marginal de proteção.
Em maio de 2013 foi lançado o segundo Dossiê do Comitê Popular da Copa e das Olimpíadas do Rio de Janeiro, produzido principalmente por pesquisadores do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IPPUR/UFRJ). No mesmo é exposto que cerca de 8.350 famílias do município estavam ameaçadas ou já haviam sido removidas de suas casas por conta de obras destinadas a recepção de ambos os eventos esportivos internacionais. Sobre a Vila União de Curicica, visto que foi a primeira vez que a comunidade foi incorporada no Dossiê do Município, apresentou que naquele momento aproximadamente três mil famílias estavam ameaçadas de serem removidas. Essa informação dá a magnitude do impacto da obra sobre a comunidade, já que, caso os planos da Prefeitura se concretizem, pelo menos 1/3 das famílias removidas no município neste período terão saído de lá.
O documento também chama atenção para o fato do Ministério Público Estadual (MPE) ter questionado o processo de licenciamento ambiental da Transolímpica, sobretudo devido ao fracionamento do projeto e à insuficiência de informações sobre os impactos sociais decorrentes das obras, ressaltando a falta de debate público e de informações sobre os atingidos, como o número total de famílias em risco de remoção.
Em 15 de maio de 2013, foi publicada no site do Centro de Estudos em Sustentabilidade da Escola de Administração de Empresas de São Paulo (EAESP) uma resposta da prefeitura do Rio de Janeiro às denúncias de crimes sociais provocados pelas obras preparatórias para os eventos esportivos. Entre outras coisas, a mesma afirmou que as obras têm o objetivo de beneficiar a população e os jogos Olímpicos têm possibilitado essas construções:
A Prefeitura do Rio tem realizado obras estruturantes em toda a cidade com o objetivo de proporcionar mobilidade urbana com conforto e segurança para os cariocas. É neste contexto que se enquadram os projetos das novas alternativas viárias em andamento. Transcarioca, Transoeste, Transolímpica e Transbrasil são projetos fundamentais para atender às necessidades de mobilidade da cidade e foram alavancados pelos Jogos Olímpicos de 2016.
Além das casas e comércios, a previsão é a remoção de estruturas públicas importantes da Vila União, como a Escola Silveira Sampaio, uma das poucas que oferecem atividades esportivas e culturais para a comunidade, como futebol de salão, tênis de mesa, ginástica, atletismo e levantamento de peso. Conforme publicado pelo site Comitê Popular da Copa e Olimpíadas Rio (07-03-2013), a população já se manifestou também contra a remoção da mesma, visto que para conquistar o Núcleo de Arte Silveira Sampaio foi necessária muita luta da comunidade, mas nenhuma resposta sobre a demanda foi apresentada pelo poder público até o momento.
Em 03 de setembro de 2013, o blog Combate Racismo Ambiental publicou uma reportagem sobre os moradores do bairro Magalhães Bastos, que também estavam correndo o risco de remoção devido à construção da Transolímpica. Segundo a reportagem, aproximadamente 80 famílias do bairro não seriam mais removidas porque os moradores conseguiram se organizar e negociar com o Exército Brasileiro para que este cedesse um terreno nas proximidades da Avenida Brasil para a construção da via expressa, poupando terrenos do bairro Magalhães Bastos. Rogério Bastos, um dos moradores que participou da negociação, afirmou: Entramos com ações na Secretaria do Patrimônio da União para regularizar os terrenos do Exército, procuramos o Ministério da Justiça, a Procuradoria-Geral da República, tudo para tentar evitar as desapropriações. Agora, estamos aliviados. Magalhães Bastos será o único lugar 100% sem desapropriação. Esse fato contribuiu para a mobilização das demais comunidades afetadas com a construção da Transolímpica.
Em 24 de fevereiro de 2014, foi publicada uma reportagem no site Viomundo afirmando que quase todas as casas da Vila União de Curicica tinham a indesejada marca SMH, identificando as moradias a serem demolidas pela Secretaria Municipal de Habitação para dar lugar a Transolímpica. Segundo o portal, na grande maioria dos casos a Secretaria não dialogou com as famílias, apenas informou/marcou a notificação de despejo.
Messes depois, em 16 de agosto, foi divulgada pelo jornal O Globo a confirmação de que aproximadamente 876 famílias da Vila União de Curicica seriam despejadas e, destas, 337 famílias teriam que deixar suas casas até setembro. A reportagem chamou a atenção para o fato de que, caso esse despejo fosse efetivado, seria a maior remoção desde 2009, superando as ocorridas para implantar os BRTs Transcarioca (150 famílias removidas) e Transoeste (644 famílias removidas). A notícia ainda expunha que ainda não existia negociações com os moradores de Vila União, mas segundo a Prefeitura a maioria das famílias seriam reassentadas num condomínio do programa Minha Casa Minha Vida próximo dali, num terreno da antiga Colônia Juliano Moreira (hoje Instituto Municipal de Assistência à Saúde Juliano Moreira), um antigo manicômio, hoje municipalizado e em processo de desinstitucionalização após o estabelecimento de políticas antimanicomiais derivadas do movimento pela reforma psiquiátrica.
A promessa do poder público é que este reassentamento estaria na fase final de construção e teria 1400 apartamentos entretanto, com apenas 37,7 metros quadrados cada, incluindo, neste espaço exíguo, dois quartos, sala e cozinha. Os apartamentos seriam destinados aos moradores de Vila União e de outras áreas também afetadas pelas obras olímpicas próximas à Jacarepaguá, ainda segundo o Globo (16-08-2014). Nesse sentido, chamamos atenção para o fato de queo projeto do reassentamento é insuficiente para todas as famílias a serem removidas de Vila União para a construção da via expressa, e que em nenhum momento foi assinalado pela prefeitura um destino para as outras famílias despejadas (no mínimo, mais 1600 famílias).
Além das remoções de populações de diferentes bairros, a Transolímpica irá ser construída em uma área de Mata Atlântica. A construção da avenida derrubará 200 mil m² de vegetação, uma área equivalente a 24 campos de futebol. Segundo a Secretaria Municipal de Obras, a supressão da vegetação será compensada pelo plantio de 400 mil m² de espécies de plantas do mesmo bioma justamente no Parque Estadual da Pedra Branca, conforme informações expostas no site Notícias Bol (28-09-2014).
Mas a Prefeitura, ao contrário do que havia sido noticiado anteriormente, não esperou o mês de setembro para iniciar as remoções, visto que, segundo notícia da Rio on Watch (10-09-2014), no final de agosto aproximadamente 900 famílias começaram a se mudar para abrir espaço para as obras da BRT Transolímpica. Na mesma reportagem, foram publicados alguns depoimentos dos moradores:
José Paulo, de 70 anos, afirmou: Se você colocar uma cama dupla nos novos apartamentos, não tem espaço para o armário. Não tem lugar para lavar as roupas do mesmo jeito que tínhamos. Por que nós, que temos uma casa melhor, iríamos querer nos mudar daqui? Já que eu não posso ficar, eu quero ser indenizado com um preço justo.
Tetuliano Souza, de 62 anos, que possui um mercado de sucata fora de sua casa, disse: Só Jesus sabe o que eu vou fazer. Eu não quero uma outra casa. Eu prefiro dinheiro.
Cintia Neves, de 26 anos, tinha seis anos de idade quando seu pai comprou um terreno e construiu a casa de sua família em Vila União. Ela tem uma lanchonete e trabalha para a fornecedora de gás Copagaz, que fica próxima de onde ela mora com sua mãe e irmão. Eu estou preocupada, ela disse. Eu não sei o que eu vou fazer depois de sair daqui.
Júlio declarou: É triste. Essa é uma comunidade segura e que vive em paz. Nós não temos tráfico nem crime. Mas as obras têm que acontecer. A Transolímpica tem que passar por aqui.
Embora alguns moradores afirmarem preferir deixar suas casas para obterem um imóvel legalizado na antiga Colônia Juliano Moreira, a maioria dos habitantes de Vila União afirma não aceitar o despejo – além de perder suas moradias, os comerciantes também iriam ficar sem renda.
Nesse sentido, em 10 de setembro, aproximadamente 100 moradores se reuniram para discutir estratégias de permanência ou formas de alcançar indenizações justas. O encontro também contou com a presença de moradores de comunidades que vêm sendo ameaçadas ou que já vivenciaram remoções, e com a deputada estadual Janira Rocha, que ofereceu assessoria, segundo reportagem publicada pelo blog Combate Racismo Ambiental (18-09-2014).
A Deputada Janira entregou na reunião formulários para os moradores de Vila União demandarem investigações formais a respeito do que aconteceu com os fundos do Morar Carioca, que originalmente estavam destinados à comunidade, e se o que foi feito com eles era legal. Além disso, anunciou que foi enviada para o Ministério Público Federal (MPF), MPE e o Ministério das Cidades a notificação oficial requerendo informação a respeito do que foi feito com os recursos do Morar Carioca em 2011.
Em uma reportagem que trazia os problemas com o Programa Morar Carioca publicada pelo blog Combate Racismo Ambiental (26-09-2014) foi exposta uma fala de Antônio Augusto Veríssimo, ex-Coordenador de Planejamento e Projetos da SMH, que responsabiliza o Gabinete do Prefeito por paralisar as atividades do Programa em Vila União. Nós (SMH) não tomamos a decisão. Todas as ordens para suspender [os contratos] vieram de cima para baixo. Foi uma ordem direta do prefeito. Quando foi perguntado sobre as empresas de arquitetura restantes, acrescentou cuidadosamente: Nós não tivemos um sinal verde do prefeito para contratar o resto das equipes.
Na reunião realizada no dia 10 de setembro, os temas que nortearam a mesma foi a necessidade de mobilização, mas também a importância da boa relação entre aqueles ansiosos para sair e aqueles que desejam ficar, visto que os conflitos entre os membros da comunidade enfraquecem a luta, seja por indenizações justas, moradias dignas ou pela permanência no bairro, conforme publicado pelo blog Combate Racismo Ambiental (18-09-2014).
Nessa perspectiva, no dia 27 de setembro, parte dos moradores de Vila União organizou uma passeata evidenciando o desejo de permanecer no bairro. A ação foi iniciada na frente do Hospital Raphael de Paula Souza, na Estrada de Curicica, e terminou nas obras do futuro BRT.
Embora a situação da população de Vila União de Curicica parecesse que não poderia ficar mais difícil, em 07 de novembro de 2014 os moradores receberam a notícia de que os apartamentos na antiga Colônia Juliano Morais não estariam imediatamente disponíveis para todas as famílias que seriam removidas do bairro. Por conta disso, a prefeitura repassaria um aluguel social no valor de R$ 400,00 pagos até durante quatro meses (total de R$ 1.600,00). Ainda segundo a reportagem do jornal O Dia (14-11-2014), 177 famílias precisariam ir para o aluguel social nesta primeira fase para cumprir o cronograma das obras e que a justificativa externada por Alex Costa, subprefeito da Barra da Tijuca, seria que as pessoas que receberiam o aluguel social não possuíam documentação para ocupar um apartamento no programa Minha Casa Minha Vida.
Por conta disso, em 11 de novembro a população de Vila União de Curicica se reuniu com o Vice-Presidente da Associação de Moradores da Vila União, Zezinho Orelha, e com Alex Costa. Enquanto muitos moradores acreditaram que Zezinho iria apoiar a Comunidade, ele reforçou o discurso de Costa dizendo à comunidade que eles viviam na área ilegalmente por 25 anos, e que, naquele momento, o governo precisava da terra para implantar um projeto que inclusive iria beneficiar toda a região oeste. A comunidade reagiu à fala de Zezinho e Costa com vaias. Aluguel Social não!, gritaram. Uma mãe com dois filhos nos braços, disse: A gente nunca teve que pagar aluguel na nossa própria casa, pra onde a gente vai tendo só R$ 400 por mês? Vamos ficar na rua!.
Em 04 de dezembro de 2014, na página do Facebook do Comitê Popular Rio Copa e Olimpíadas, foi divulgado que nove famílias de Curicica acordaram com polícia e os caminhões de mudança da prefeitura em sua porta. A nota pontuou que a Prefeitura e a polícia estavam agindo de forma violenta, antecipando as mudanças das famílias e intimidando as mesmas a saírem sem reclamar. Ademais, a demolição das casas das famílias que aceitaram sair já havia começado, deixando o bairro cheio de entulhos e com aspecto triste.
Episódios de remoções e realocações promovidas pela Prefeitura, como o caso da Vila União de Curicica, têm produzido conflitos socioambientais gravíssimos no Município. É preciso ser considerado que, quando uma parcela da comunidade é removida, além de impactos materiais e econômicos, quebram-se e deslocam-se as relações existentes com a população remanescente. Décadas de vivência, construção, e conhecimento do lugar e das pessoas são subitamente fragmentados, segundo exposto no Dossiê de 2014.
Embora alguns moradores da Vila União de Curicica já tenham sido removidos, a população que permanece afirma não aceitar as condições impostas pela administração pública municipal, as quais considera absurdas, e continua lutando por seu prosseguimento na área ou pelo menos por indenizações justas por suas casas.
Cronologia
1986 A Vila União é fundada no bairro Curicica – próximo a Jacarepaguá, na zona oeste do Rio de Janeiro.
2010 A Prefeitura do Rio de Janeiro cria o programa Morar Carioca.
2011 A Prefeitura do Rio de Janeiro anuncia que a Vila União de Curicica foi contemplada pelo pograma Morar Carioca.
19 de abril de 2012 A Prefeitura do Rio de Janeiro anuncia que o consórcio formado por Invepar, Odebrecht e CCR, chamado Rio Olímpico, venceu o leilão do projeto da Transolímpica.
29 de agosto de 2012 É publicada uma reportagem no Rio on Watch afirmando que uma grande parte da Vila União de Curicica terá que desaparecer por conta da construção da Transolímpica.
Setembro de 2012 Escritório de Arquitetura Corcovado executa a fase de diagnóstico do Morar Carioca em Vila União.
24 de outubro de 2012 INEA realiza audiência para licenciamento ambiental do corredor viário.
Novembro de 2012 – A presidente da Associação de Moradores da Vila União recebe informação de que a comunidade inteira seria afetada pela construção da Transolímpica.
Maio de 2013 É lançado o segundo Dossiê do Comitê Popular da Copa e das Olimpíadas do Rio de Janeiro, que fala de Vila União de Curicica.
03 de setembro de 2013 Após mobilização dos moradores do bairro e negociação com o Exército, o traçado da Transolímpica é alterado para não impactar a comunidade do bairro Magalhães Bastos.
Final de agosto de 2014 – Aproximadamente 900 famílias começam a se mudar para abrir espaço para as obras da BRT.
10 de setembro de 2014 – Aproximadamente 100 moradores se reúnem para discutir estratégias de permanência ou formas de alcançar indenizações justas.
27 de setembro de 2014 – Os moradores de Vila União organizam uma passeata evidenciando o desejo de permanecer no bairro.
07 de novembro de 2014 – Os moradores recebem a notícia de que os apartamentos na antiga Colônia Juliano Morais não estariam imediatamente disponíveis para todas as famílias que seriam removidas do bairro. Por conta disso, a prefeitura repassaria paras as famílias um aluguel social no valor de R$ 400,00, pagos até durante quatro meses (total de R$ 1.600,00).
11 de novembro de 2014 – A população de Vila União de Curicica se reúne com o Vice-Presidente da Associação, Zezinho Orelha, e com Alex Costa, da subprefeitura de Barra da Tijuca.
04 de dezembro de 2014 – Nove famílias de Curicica são removidas pela Prefeitura antes do prazo estipulado.
Fontes
ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO RIO DE JANEIRO. Discurso da deputada Janira Rocha. Publicado (s/d). Disponível em: http://goo.gl/rWGdVM. Acesso em: 25 de novembro de 2014.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE IMPRENSA. Vila União de Curicica pede apoio à Comissão de Defesa dos Direitos Humanos da ABI. Publicado em 01 de dezembro de 2014. Disponível em: http://goo.gl/xJqlQr. Acesso em: 25 de novembro de 2014.
BLOG CONSCIÊNCIA. Remoções e demolições ameaçam e atacam comunidades pobres no Recife e no Rio de Janeiro. Publicado em 28 de setembro de 2014. Disponível em: http://goo.gl/yOg3Az. Acesso em: 25 de novembro de 2014.
CENTRO DE ESTUDOS EM SUSTENTABILIDADE DA EAESP. Famílias removidas ou ameaçadas por megaeventos no Rio ultrapassam 8.000. Publicado em 15 de maio de 2013. Disponível em: http://goo.gl/0GStBe. Acesso em: 25 de novembro de 2014.
CIDADE OLÍMPICA. BRT Transolímpica. Publicado em (s/d). Disponível em: http://goo.gl/TE0HIH. Acesso em: 25 de novembro de 2014.
COMBATE RACISMO AMBIENTAL. 100 Moradores se Reúnem para Resistir às Remoções na Vila União de Curicica. Publicado em 18 de setembro de 2014. Disponível em: http://goo.gl/syBCV1. Acesso em: 25 de novembro de 2014.
______. Ameaçados de remoção, moradores de Vila União de Curicica são informados que não há moradia para todos. Publicado em 18 de novembro. Disponível em: http://goo.gl/gZ3y8H. Acesso em: 25 de novembro de 2014.
______. Após mobilizações e protestos dos moradores, prefeitura do Rio muda traçado da Transolímpica. Publicado em 03 de setembro de 2013. Disponível em: http://goo.gl/CnnXvq. Acesso em: 25 de novembro de 2014.
______. Morar Carioca: O Desmantelamento do Sonhado Programa de Urbanização para as Favelas. Publicado em: 26 de setembro de 2014. Disponível em: http://goo.gl/S7ZPQq. Acesso em: 25 de novembro de 2014.
______. Vila União de Curicica Protesta Contra Remoções Para a Transolímpica. Publicado em: 15 de outubro de 2014. Disponível em: http://goo.gl/gZ3y8H. Acesso em: 25 de novembro de 2014.
COMITÊ POPULAR DA COPA E OLIMPÍADAS RIO. Mais uma escola na mira dos tratores da Prefeitura, agora no caminho da Transolímpica. Publicado em 07 de março de 2013. Disponível em: http://goo.gl/k427Ak. Acesso em: 25 de novembro de 2014.
DOSSIÊ DA ARTICULAÇÃO NACIONAL DOS COMITÊS POPULARES DA COPA E OLIMPÍADAS. Megaeventos e violações de direitos humanos no Brasil. Publicado em 2011. Disponível em: http://goo.gl/E0qbb1. Acesso em: 25 de novembro de 2014.
DOSSIÊ DO COMITÊ POPULAR DA COPA E DAS OLIMPÍADAS DO RIO DE JANEIRO. Megaeventos e violações de direitos humanos no Rio de Janeiro. Publicado em março de 2012. Disponível em: http://goo.gl/PGLQPV. Acesso em: 25 de novembro de 2014.
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