MG – Trabalhadores rurais Sem Terra do Acampamento Nova Vida, da Fazenda Córrego Fundo-Gravatá, em Novo Cruzeiro, lutam contra reintegração de posse
UF: MG
Município Atingido: Novo Cruzeiro (MG)
Outros Municípios: Novo Cruzeiro (MG)
População: Trabalhadores rurais sem terra
Atividades Geradoras do Conflito: Atuação de entidades governamentais, Madeireiras, Mineração, garimpo e siderurgia, Monoculturas, Pecuária, Perímetros irrigados
Impactos Socioambientais: Alteração no regime tradicional de uso e ocupação do território, Desmatamento e/ou queimada
Danos à Saúde: Insegurança alimentar, Piora na qualidade de vida, Violência – ameaça
Síntese
O Acampamento Nova Vida, formado em abril de 2001 e que, em 2015, completou 14 anos de existência, localiza-se no município de Novo Cruzeiro, pertencente a Mesorregião do Jequitinhonha e Microrregião de Araçuaí, no estado de Minas Gerais. Trata-se de um acampamento altamente produtivo, organizado pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) na cidade. O acampamento foi estruturado na Fazenda Córrego Fundo-Gravatá, pertencente ao fazendeiro Olinto Alves (já falecido), improdutiva e deixada para seus herdeiros, como seu filho Erpino Alves Faria.
Novo Cruzeiro pode ser considerado como município berço do MST em Minas Gerais. De acordo com o Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (CEDEFES), o município tem um histórico de acampamentos dos sem-terra e conta com o primeiro assentamento de Minas, o Assentamento Aruega. Além disso, outros dois acampamentos já foram formados na cidade (Sapezinho e Dom Enzo), mas as famílias já sofreram despejo.
O Acampamento Nova Vida é altamente produtivo, sendo responsável pelo abastecimento da cidade de Novo Cruzeiro e de outros municípios da região. São 373 hectares de terra que hoje abrigam 32 famílias remanescentes. No acampamento se produz milho e feijão em larga escala, além de mandioca, abóbora, hortaliças e outras culturas variadas e orgânicas; o acampamento também conta com a atividade apicultora, que rende cerca de 70 quilos de mel silvestre a cada retirada.
Diante da relevância do acampamento para o município, a Prefeitura Municipal de Novo Cruzeiro decretou, em 2014, que se trata de uma área de utilidade social destinada à conformação de uma colônia agrícola, e se dispôs a pagar uma parte do dinheiro da desapropriação de parte da área (27 hectares). Apesar disso, a Fazenda Córrego Fundo-Gravatá vem sendo alvo de uma tentativa de desmobilização a partir de uma ação de reintegração de posse por parte dos proprietários ajuizada na 3ª Vara Agrária de Minas Gerais. Acredita-se que há uma forte articulação política que visa transformar a área da fazenda em plantação de eucalipto. Mas as famílias acampadas não aceitam o despejo e muitos dizem que só sairão de lá num caixão.
Contexto Ampliado
O Acampamento Nova Vida, que em abril de 2015 completou 14 anos de existência, está localizado no município de Novo Cruzeiro, pertencente a Mesorregião do Jequitinhonha e Microrregião de Araçuaí, no estado de Minas Gerais. Trata-se de um acampamento altamente produtivo, organizado pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) na cidade. O acampamento foi estruturado na improdutiva Fazenda Córrego Fundo-Gravatá, pertencente ao falecido fazendeiro Olinto Alves e seus herdeiros, como seu filho Erpino Alves Faria. Segundo o blog Combate Racismo Ambiental (2012), o MST luta em Minas Gerais há quase 30 anos, organizado em sete grandes regiões: Triângulo, Sul, Leste, Norte, Zona da Mata, Metropolitana e Vale do Jequitinhonha. Em 2012, havia conquistado 42 assentamentos e tinha, na época, 39 acampamentos em 39 latifúndios que não cumpriam sua função social. Entre assentadas e acampadas, cerca de 7 mil famílias Sem Terra integravam o MST no estado no ano de 2012.
O Nova Vida é um acampamento altamente produtivo, sendo responsável pelo abastecimento da cidade de Novo Cruzeiro e de outros municípios da região. São 373 hectares de terra que hoje abrigam 32 famílias remanescentes. No acampamento se produz milho e feijão em larga escala, além de mandioca, abóbora, hortaliças e outras culturas variadas e orgânicas; o acampamento também conta com atividade apicultora, que rende cerca de 70 quilos de mel silvestre a cada retirada. Segundo aponta o site do Instituto Humanitas Unisinos (2015), com muito esforço e trabalho das famílias, a área foi, ao longo dos anos, estruturada, através, por exemplo, da construção de estradas de acesso; de mata-burros para possibilitar a transposição de córregos e rios; de casas; áreas de lazer, como campo de futebol; centro de reuniões, onde ocorrem decisões coletivas; rádio comunitária; da elaboração de um plano de conservação para a Mata Atlântica nos topos de chapadas e a 60 metros das margens do Rio Gravatá; do estabelecimento de áreas de cultivo próximas às residências, complementando as lavouras principais.
Diante da relevância do acampamento para o município de Novo Cruzeiro, o site do MST (2015) aponta que a Prefeitura Municipal decretou (em 2014) que se trata de uma área de utilidade social destinada à conformação de uma colônia agrícola e se dispôs a pagar uma parte do dinheiro da desapropriação de parte dela. Apesar disso, a Fazenda Córrego Fundo-Gravatá vem sendo alvo de uma tentativa de desmobilização a partir de uma ação de reintegração de posse por parte dos proprietários, que, através do processo 1.0024.02.819019-7/001, tramita na 3ª Vara Agrária de Minas Gerais. Acredita-se que há uma forte articulação política que visa transformar a área da fazenda em plantação de eucalipto. Mas as famílias acampadas não aceitam o despejo e muitos dizem que só sairão de lá num caixão.
De acordo com a Nota de repúdio à ordem de reintegração de posse contra o Acampamento Nova Vida, escrita pelo professor doutor da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e do Instituto Brasileiro de Estudos Contemporâneos (IBEC), Rogério Fernandes Macedo, no Portal da Unisinos (2015), se ocorrer o despejo, as consequências e os impactos serão notáveis:
1) a conversão das 32 famílias produtivas (aproximadamente 107 pessoas ao total) em sem tetos, desprovidos de renda, desabrigados;
2) a destruição da vida de aproximadamente 30 crianças e jovens;
3) a possibilidade real de derramamento de sangue, em face da atuação da polícia no cumprimento da ordem de reintegração de posse e da resistência dos trabalhadores, que criaram vínculos fortíssimos ao longo desses 13 anos;
4) a transformação da cidade de Novo Cruzeiro em palco de um conflito social, que pode atingir proporções inéditas;
5) a destruição da lavoura, tão produtiva, que ampliará a crise alimentar que se abate sobre o Vale do Jequitinhonha há séculos;
6) a degradação dos recursos naturais notadamente florestais e hídricos tão bem preservados e geridos pelos trabalhadores rurais.
Conforme apontam Fávero e Monteiro (2014), o Vale do Jequitinhonha (Mesorregião do Jequitinhonha) está localizado na porção nordeste do estado de Minas Gerais e conta com 51 municípios e uma população de 720.356 pessoas (IBGE, 2010). A região apresenta diversidade social, cultural, econômica e ambiental, tendo como variedades de paisagens os Campos Rupestres, Cerrados, Caatinga e Mata Atlântica. Mais de 50% da população do Vale habita ou realiza atividades no meio rural. Por este fator, há uma rica diversidade étnica, cultural e de organização social camponesa, visto que no vale figuram povos indígenas, quilombolas, comunidades agroextrativistas, comunidades tradicionais camponesas, ribeirinhos e outras, que vivem em interação com os biomas.
A produção camponesa do Vale do Jequitinhonha é a principal responsável pela dinamização econômica da maioria dos municípios da região, sendo as feiras livres a sua maior expressão. As famílias produzem alimentos para consumo, venda, trocas cerimoniais e comunitárias. Porém, é uma região que apresenta baixos indicadores sociais. A riqueza de recursos naturais (pedras preciosas e rochas raras, biodiversidade, recursos hídricos) fez com que, desde a colonização, a região se conformasse como polo de extração e de espoliação, o que resultou no estigma de Vale da Miséria.
Zalgelmi (2007) aponta que, no final do século XVIII, ocorreu uma diminuição drástica da produção de ouro e diamantes no estado de Minas, propiciando uma série de movimentos migratórios. No início do século XIX, por esta razão, os processos de deslocamentos populacionais foram acentuados para o nordeste do estado. No Vale do Araçuaí, a população se deslocou em direção à mata inexplorada, que consistia em terras fartas, férteis e sem dono. Assim, muitos moradores do Alto Jequitinhonha passaram a explorar as matas do Baixo Jequitinhonha e do Vale do Mucuri, favorecendo um movimento migratório e povoador que durou mais de um século; na medida em que as terras iam se desgastando, abriam-se novas frentes de expansão em busca de terras novas. Porém, no final do século XIX, as constantes migrações aumentaram a população e diminuíram a quantidade de terras sem dono.
A região do Baixo Jequitinhonha e do Vale do Mucuri foram mantidas até o século XIX, segundo estratégia da Coroa Portuguesa, como áreas proibidas de realização de extração e contrabando de riquezas minerais, em especial o ouro e diamante. Mas, a partir do século XX, Fávero e Monteiro (2014) indicam que ocorreu uma forma intensa de extração de madeira para comercialização, seguida da implantação de pastagens em grandes extensões de terra. Tal processo de ocupação resultou em alta concentração fundiária, o que fez com que alguns municípios passassem a não ter mais a presença de comunidades camponesas.
Na época, Zangelmi (2007) aponta que a documentação legal das terras não tinha importância. A avaliação da terra não era por dinheiro, os negócios eram feitos com base em trocas por mantimentos ou outras porções de terras, por exemplo. A terra era garantia de fartura, poder, prestígio e apropriação do serviço alheio, mas não de dinheiro. As fazendas eram policultoras e de subsistência, pois produziam e extraíam quase tudo que consumiam, e os fazendeiros eram vistos como heróis protetores. No entanto, as relações não eram pacíficas, pois muitas vezes o fazendeiro impunha aos seus agregados normas à força, o que gerava tensões e até mesmo novas migrações.
Outro fator para o movimento migratório foi a crescente insuficiência de terras para trabalhadores rurais, o que esgotava o solo e exigia dos trabalhadores mais assiduidade no trabalho. Assim, a partir de 1960 e 1970, ocorreu um refluxo migratório no nordeste de Minas, e as pessoas buscaram outros meios de vida em cidades como São Paulo, ou terras em outras regiões com mata ainda pouco explorada, como no Norte do país.
Zangelmi (2007) coloca que, neste período, o modlo de agregação dos fazendeiros e da terra sem valor monetário começa a se perder nos Vales do Mucuri e no Baixo Jequitinhonha. A violência se propaga por uma série de razões, dentre elas, a entrada de madeireiros, grileiros e aventureiros na região, o que aumentou as tensões. Além disso, o Estado e a inciativa privada passam a implantar grandes projetos agropecuários nos vales do Mucuri, Jequitinhonha e Doce, o que resultou na ampliação da concentração fundiária e da violência; a expulsão e a morte de trabalhadores rurais e posseiros tornou-se frequente. Criou-se, a partir daí, um mercado de terras que modificou a estrutura fundiária e de poder na região, integrando a propriedade rural ao mercado, que passou a especializar a sua produção e a empregar poucos trabalhadores.
Na porção do baixo curso do Jequitinhonha, cujas cidades de referência são Almenara e Jequitinhonha, o histórico é de dominação política de fazendeiros. Isto fez com que, a partir de 1980, a luta pela terra se intensificasse na região, encampada pelo Movimento Sindical e pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), com a criação de dezenas de acampamentos e assentamentos de trabalhadores rurais. Muitas das lutas do Baixo e também do Médio Jequitinhonha foram impulsionadas pela presença das Dioceses Católicas de Almenara e Araçuaí, que permitiram que, entre 1970 e 1980, entrassem na região as pastorais sociais, que seguindo a Teologia da Libertação auxiliaram na formação política e propiciaram o surgimento das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), contribuindo na luta pela terra a partir da organização de sindicatos, associações e diversos movimentos sociais (FÁVERO e MONTEIRO, 2014). Porém, destaca-se que as lutas pela terra têm sido conflituosas e sangrentas. Um dos casos mais emblemáticos foi o episódio do Massacre de Felisburgo, ocorrido no município de mesmo nome, no Acampamento Terra Prometida, em que cinco trabalhadores rurais foram assassinados em 20 de novembro de 1994.
Assim, no Baixo e no Médio Jequitinhonha, os camponeses que ainda não conquistaram a terra criam meios para fazê-lo. Muitos têm buscado formas de produzir alimentos para o seu sustento ou para obtenção de renda via comercialização em feiras livres. Alguns aproveitam as margens do Rio Jequitinhonha para realizar cultivos durante o período de estiagem (vazante) do rio, mas são tensionados pela presença de perímetros irrigados voltados à fruticultura de grande escala na região. Tanto seu histórico de ocupação quanto o desenvolvimento de uma agricultura modernizada têm caracterizado a região do Vale do Jequitinhonha como lócus de frequentes processos de expropriação territorial de comunidades camponesas, ao mesmo tempo em que as comunidades têm demonstrado sua capacidade de resistência.
É o caso do município de Novo Cruzeiro, na porção média do Jequitinhonha, berço do MST em Minas Gerais. De acordo com o Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (CEDEFES), o município tem um histórico de acampamentos dos sem-terra e conta com o primeiro assentamento de Minas, o Assentamento Aruega; também teve outros dois acampamentos cujas famílias já foram despejadas: Sapezinho e Dom Enzo. Neste município que, em abril de 2001, foi formado o Acampamento Nova Vida.
Segundo registros do Centro de Documentação Dom Tomás Balduíno (CPDOC), da Comissão Pastoral da Terra (CPT), 150 famílias ligadas ao MST, em 17 de abril de 2001, fizeram duas ações como parte das manifestações em todo o país para marcar os seis anos do massacre de Eldorado dos Carajás, no Pará: a ocupação da Fazenda Experimental Carmo da Mata, que pertencia à Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig); e a instalação de um acampamento provisório na BR-116, no município de Frei Inocêncio. Na sequência, no dia 22 de abril de 2001, 120 famílias ocuparam a Fazenda Gravatá, em Novo Cruzeiro, Vale do Mucuri. No mesmo dia, outras 150 famílias ocuparam a Fazenda Santa Fé, em Uberlândia, todas fazendas particulares. O CPDOC coloca que, apesar da presença policial, não houve conflitos. Na época eram mais de 1,2 mil famílias acampadas esperando por desapropriações do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), fora o noroeste do estado, pertencente à superintendência do Distrito Federal.
Em 09 de março de 2006, a CPT registrou que um integrante da direção estadual do MST em Minas Gerais, Paulo Sérgio Barbosa de Oliveira, sofreu um atentado em Novo Cruzeiro. Quando retornava de moto ao Acampamento Nova Vida, dois homens dispararam dez tiros contra ele, sendo que dois acertaram o capacete e um acertou o retrovisor da moto. Paulo escapou do atentado sem ferimentos e foi feito um registro na Delegacia de Polícia de Novo Cruzeiro. Na época, a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais e o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) foram informados do incidente, bem como foi reivindicada a presença de representantes destas entidades no local do atentado. Registrou-se que na região outras lideranças do MST já tinham sofrido ameaças e que não era a primeira vez que Paulo Sérgio era vítima de uma tentativa de assassinato.
No dia 28 de maio de 2009, houve o julgamento da Apelação Cível nº 1.0024.02.819019-7/001, que trata do pedido de reintegração de posse da Fazenda Córrego Fundo-Gravatá, pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJ-MG), cujo relator foi o Desembargador Maurílio Gabriel. O processo foi ajuizado pelo fazendeiro Erpino Alves Faria, filho de Olinto Alves, e outros, contra Paulo Sérgio Barbosa de Oliveira, como representante do MST na ocupação da fazenda. O desembargador expediu a reintegração da posse do imóvel rural e fixou uma multa de R$ 100 mil para os apelados em caso de novo esbulho (entrada na propriedade). Além disso, condenou os réus ao pagamento das custas processuais, inclusive as recursais, e dos honorários advocatícios, arbitrados em R$ 3 mil. Porém, como os réus estavam amparados pelo benefício da assistência judiciária, esta exigência ficou suspensa. A decisão do desembargador foi acompanhada pelos outros desembargadores, Tibúrcio Marques e Tiago Pinto.
No dia 08 de janeiro de 2012, conforme divulgado no blog Combate Racismo Ambiental, no Acampamento Novo Cruzeiro, em Jequitiaí, norte de Minas, aconteceu uma celebração das várias conquistas do MST no estado no ano de 2011: a alfabetização da 1ª turma do projeto MOVA-Brasil no Acampamento Novo Paraíso; a consolidação e desenvolvimento do Assentamento 1º do Sul, no sul de Minas; a realização de 11 ocupações em fazendas improdutivas; de várias manifestações; a realização do IV Encontro Mineiro dos Sem-Terrinha; além de outras realizações.
Uma destas conquistas foi o estabelecimento de um convênio no valor de R$ 40 milhões entre o Governo Federal (90% dos fundos) e o Governo Estadual (10%) para viabilizar a desapropriação e o pagamento da compra de quatro fazendas emblemáticas, palco de conflitos agrários: as Fazendas Correntes (em Jequitaí), Ariadnópolis (em Campo do Meio), Eldorado (no município de Frei Inocêncio) e a Fazenda Gravatá, em Novo Cruzeiro.
No dia 24 de setembro de 2013, autoridades civis e militares se reuniram na Câmara Municipal de Novo Cruzeiro para dar continuidade ao processo de reintegração de posse da Fazenda Gravatá, segundo o site da Polícia Militar (PM) de Minas Gerais. De acordo com o Coronel Pinheiro, comandante da 15ª Região da Polícia Militar (RPM), a proposta era esgotar as possibilidades da reintegração sem uso da força policial. Participaram do encontro o Comandante da Décima Quinta Região de Polícia Militar, Coronel Aroldo Pinheiro de Araújo; o Prefeito de Novo Cruzeiro, Sr. Gilson Ferreira da Costa; o Presidente da Câmara Municipal de Novo Cruzeiro, Sr. Arnaldo da Paixão Gomes; o Comandante do Décimo Nono Batalhão de Polícia Militar, Tenente Coronel Adirson Antônio Glório de Ramos; o Coordenador Regional da Defensoria Pública, Dr. Péricles Batista da Silva; o Defensor Público, Dr. Moacir Costa Rabelo; representante da Ouvidoria Agrria, Sr. Antônio Augusto Miranda de São José; o Líder do Movimento Sem Terra, Sr. Paulo Sérgio B. de Oliveira; a Presidenta do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Srª Maria Aparecida Fernandes Pereira; e várias outras autoridades ligadas diretamente ao litígio. Ao final, Paulo Sérgio convidou todos os presentes a conhecerem o Acampamento Nova Vida.
No dia 23 de setembro de 2014, de acordo com o Diário de Teófilo Otoni, cerca de 150 pessoas do MST se reuniram na Câmara dos Vereadores para negociar a desocupação de terras. Uma liminar da Justiça, requisitada pelos donos da Fazenda Gravatá havia sido expedida e exigia a desocupação do terreno. A ordem para a reintegração veio do comando da PM em Belo Horizonte, através da 3ª Vara Agrícola. Assim, para negociar a possível saída, o MST se reuniu com os militares, bombeiros, Polícia Civil e a Secretaria Regional de Estado. Segundo a PM, os ocupantes deveriam desocupar a área em no máximo dez dias. Porém, além disso, na reunião foi definido que a Prefeitura de Novo Cruzeiro compraria, neste período de 10 dias, 27 hectares da fazenda, de forma a manter a produção agrícola na área. O valor da compra ultrapassava R$ 100 mil. De acordo com a polícia, caso a compra não ocorresse, a ordem de reintegração de posse seria cumprida.
Segundo noticiado no Diário de Teófilo Otoni, no dia 03 de outubro de 2014, o prédio da Prefeitura foi ocupado por integrantes do MST. Os moradores do acampamento Nova Vida fizeram uma manifestação com o intuito de pressionar a atual administração a assinar um decreto de desapropriação da Fazenda Córrego Fundo-Gravatá. Conforme foi negociado, a prefeitura tinha se comprometido a emitir um decreto determinando que a área de 27 hectares fosse declarada de interesse social, para assim, junto ao INCRA, conseguir a indenização dos proprietários e a demarcação das terras. A questão dependia apenas de alguns detalhes burocráticos, como documentos. Os manifestantes agendaram nova reunião com o prefeito para que o processo fosse agilizado. O presidente da Câmara de Vereadores do município também esteve presente no protesto e afirmou o compromisso da prefeitura e da Câmara pela aprovação do decreto.
No dia 28 de outubro de 2014, o Coronel Aroldo Pinheiro, da 15ª RPM, agendou na Câmara Municipal a sétima e última reunião para acertar a data de reintegração de posse da fazenda. A ação, com base na decisão do desembargador Maurílio Gabriel de junho de 2009, estava em vias de ser concluída. Segundo informação extraoficial noticiada no Diário de Teófilo Otoni, o valor a ser repassado pela Prefeitura aos herdeiros do falecido Olinto Alves, representado por Erpino Alves e irmãos, era muito alto, e a Câmara considerou inviável aprovar o projeto por se tratar de um gasto elevado, levando-se em conta que beneficiaria somente um pequeno grupo de famílias.
Conforme o site denominado Aconteceu no Vale, em 23 de janeiro de 2015, as famílias integrantes do Acampamento Nova Vida foram notificadas para que saíssem do acampamento. Dez membros da PM, juntamente com um oficial de justiça, estiveram no local alertando os moradores. Foi dado o prazo até o dia 26 de janeiro para que as famílias tirassem seus pertences do local. Porém, segundo a página do MST, no dia 26 de janeiro de 2015, policiais e helicópteros rondaram o local para fazer um mapeamento da área. No entanto, não houve conflito direto e o prazo de reintegração se estendeu até o dia 28 de janeiro.
No site do MST, em notícia do dia 26 de janeiro de 2015, o coordenador nacional do MST, Enio Bohnenberger, repudiou a ordem de reintegração emitida pelo comando da Polícia Militar de Belo Horizonte, por meio da 3ª Vara Agrícola, uma vez que área já era ocupada há anos e se transformou numa colônia agrícola. Os sem-terra, então, entraram com uma petição na Vara de Conflitos Agrários da Região para impedir a reintegração. Segundo o coordenador, a Prefeitura Municipal de Novo Cruzeiro apoia as famílias acampadas e, por esta razão, também entrou com uma segunda petição com o intuito de impedir a reintegração.
No dia 27 de janeiro de 2015, foi publicada no site do Instituto Unisinos uma nota de repúdio à ordem de reintegração de posse contra o Acampamento Nova Vida, escrita pelo professor Rogério Macedo, da UFVJM e do IBEC. Segundo o professor, contrário à ordem de despejo e à reintegração de posse, é digno de repúdio ignorar que a alta produtividade do Acampamento Nova Vida dá provas definitivas de que a miséria e a fome no Vale do Jequitinhonha e Mucuri são pré-requisitos da riqueza incalculável, acumulada pelos oligopólios dos ramos madeireiros, carvoeiros, químicos, da indústria papeleira, da construção civil, da siderurgia, da mineração, entre outros”. Ele aponta todo o esforço de trabalho e organização do acampamento ao longo dos anos de existência e assinala os impactos que viriam a ocorrer com esta ação, conforme já pontuado anteriormente neste relato.
Em 28 de janeiro de 2015, o site do INCRA informou que um acordo extrajudicial foi firmado na Superintendência do INCRA Minas Gerais, em Belo Horizonte, suspendendo a reintegração de posse que estava em vias de se efetivar. A conciliação possibilitou que um conflito de maiores dimensões ocorresse no local, já que as famílias haviam afirmado que não deixariam o acampamento. A partir deste acordo ficou previsto que haveria uma avaliação conjunta entre o INCRA, o Governo do Estado e o proprietário do imóvel em até 90 dias.
Segundo o INCRA, se o valor da avaliação fosse aceito pelo fazendeiro, seriam adotadas medidas administrativas pelo estado e pelo próprio INCRA para pagar o valor estabelecido, por meio de compra e venda, conforme previsto no Decreto 433/92 (que dispõe sobre a aquisição de imóveis rurais, para fins de reforma agrária, por meio de compra e venda) ou no Programa Nacional de Crédito Fundiário (PNFC). Entretanto, se o valor acordado não atendesse ao pretendido pelo proprietário, a reintegração seria executada em cumprimento à sentença judicial da Vara de Conflitos Agrários da capital. O acordo seria protocolizado para homologação judicial. O proprietário da fazenda, lideranças do MST junto de seus advogados, o prefeito da cidade, um vereador e representantes da Secretaria de estado de Agricultura Pecuária e Abastecimento (Seapa) participaram da negociação, coordenada pelo superintendente do INCRA Danilo Prado.
Cronologia
Final do século XVIII – Ocorre uma diminuição drástica da produção de ouro e diamantes no estado de Minas, propiciando uma série de movimentos migratórios.
Início do século XIX – Por esta razão, os processos de deslocamentos populacionais são acentuados para o nordeste do estado.
Final do século XIX – As constantes migrações aumentam a população e diminuem a quantidade de terras sem dono no nordeste do estado.
– A região do Baixo Jequitinhonha e do Vale do Mucuri são mantidas como áreas proibidas de realização de extração e contrabando de riquezas minerais, em especial o ouro e diamante.
Século XX – Ocorre a acentuação da extração de madeira para comercialização, seguida da implantação de pastagens em grandes extensões de terra.
Entre 1960 e 1970 Acontece um refluxo migratório no nordeste de Minas, e as pessoas buscam outros meios de vida em cidades como São Paulo, ou terras em outras regiões com mata ainda pouco explorada, como no Norte do país.
Entre 1970 e 1980 – Pastorais sociais, seguidoras da Teologia da Libertação, auxiliam na formação política e propiciam o surgimento das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) no Baixo e Médio Jequitinhonha, contribuindo na luta pela terra a partir da organização de sindicatos, associações e diversos movimentos sociais.
20 de novembro de 1994 Acontece o Massacre de Felisburgo, em Felisburgo (MG), no Acampamento Terra Prometida, no qual cinco trabalhadores rurais são assassinados.
17 de abril de 2001- 150 famílias ligadas ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) faze duas ações: a ocupação da Fazenda Experimental Carmo da Mata, da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig); e a instalação de um acampamento provisório na BR-116, no município de Frei Inocêncio.
22 de abril de 2001 – 120 famílias ocupam a Fazenda Gravatá, em Novo Cruzeiro, Vale do Mucuri. No mesmo dia, outras 150 famílias ocupam a Fazenda Santa Fé, em Uberlândia, ambas fazendas particulares.
09 de março de 2006 – Um integrante da direção estadual do MST em Minas Gerais, Paulo Sérgio Barbosa de Oliveira, sofre um atentado em Novo Cruzeiro, quando retornava de moto ao Acampamento Nova Vida.
28 de maio de 2009 – Há o julgamento da Apelação Cível nº 1.0024.02.819019-7/001, que trata do pedido de reintegração de posse da Fazenda Córrego Fundo-Gravatá, pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJ-MG).
08 de janeiro de 2012 – Acontece, no Acampamento Novo Cruzeiro, em Jequitiaí, norte de Minas, uma celebração das várias conquistas do MST no estado no ano de 2011. Dentre as conquistas, estava o estabelecimento de um convênio no valor de 40 milhões de reais para desapropriar quatro fazendas; dentre elas, a Fazenda Gravatá.
24 de setembro de 2013 – Autoridades civis e militares se reúnem na Câmara Municipal de Novo Cruzeiro para dar continuidade ao processo de reintegração de posse da Fazenda Gravatá.
23 de setembro de 2014 Após expedição de uma liminar da Justiça, requisitada pelos donos da Fazenda Gravatá exigindo a desocupação do terreno, cerca de 150 pessoas do MST se reúnem na Câmara dos Vereadores para negociação. Decide-se que a área deveria ser ocupada em até dez dias e que, neste meio tempo, a Prefeitura de Novo Cruzeiro compraria 27 hectares da fazenda.
03 de outubro de 2014 – O prédio da Prefeitura é ocupado por integrantes do MST, com o intuito de pressionar a atual administração a assinar um decreto de desapropriação da Fazenda Córrego Fundo-Gravatá.
28 de outubro de 2014 – O Coronel Aroldo Pinheiro agenda, na Câmara Municipal, a sétima e última reunião para acertar a data de reintegração de posse da fazenda.
23 de janeiro de 2015 – As famílias integrantes do Acampamento Nova Vida são notificadas para que saiam do acampamento. É dado o prazo até o dia 26 de janeiro para que as famílias retirassem seus pertences do local.
26 de janeiro de 2015 – Policiais e helicópteros rondam o local para fazer um mapeamento da área. No entanto, não há conflito direto e o prazo de reintegração se estende até o dia 28 de janeiro.
26 de janeiro de 2015 – O coordenador nacional do MST, Enio Bohnenberger, repudia a ordem de reintegração emitida pelo comando da Polícia Militar de Belo Horizonte. Os sem-terra e a Prefeitura Municipal de Novo Cruzeiro entram com duas petições na Vara de Conflitos Agrários da Região para impedir a reintegração.
27 de janeiro de 2015 – É publicada, no site do Instituto Unisinos, uma nota de repúdio à ordem de reintegração de posse contra o Acampamento Nova Vida, escrita pelo professor doutor Rogério Fernandes Macedo.
28 de janeiro de 2015 O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) informa que é firmado um acordo extrajudicial suspendendo a reintegração de posse. Fica prevista uma avaliação conjunta entre o INCRA, o Governo do Estado e o proprietário do imóvel em até 90 dias.
Fontes
15ª RPM – Reintegração de posse em Novo Cruzeiro. Polícia Militar de Minas Gerais, 26 de setembro de 2013. Disponível em: https://goo.gl/O6zBsJ. Acesso em: 02 de julho de 2015.
ACORDO mediado pelo Incra impede reintegração de posse em Novo Cruzeiro (MG). Combate Racismo Ambiental, 29 de janeiro de 2015. Disponível em: http://goo.gl/SmKesQ. Acesso em: 02 de julho de 2015.
ALGUMAS conquistas do MST em Minas Gerais em 2011. Combate Racismo Ambiental, 10 de janeiro de 2012. Disponível em: http://goo.gl/tGdlYp. Acesso em: 02 de julho de 2015.
APÓS 13 anos, famílias correm risco de despejo do Acampamento Nova Vida, em MG. MST, 26 de janeiro de 2015. Disponível em: http://goo.gl/Uef45C. Acesso em: 02 de julho de 2015.
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CENTRO de Documentação Eloy Ferreira da Silva (CEDEFES). Disponível em: http://goo.gl/mt4BvT. Acesso em: 02 de julho de 2015.
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