MG – Moradores lutam por obras de saneamento e pela revitalização da lagoa de Ibirité
UF: MG
Município Atingido: Ibirité (MG)
Outros Municípios: Ibirité (MG)
População: Moradores de aterros e/ou terrenos contaminados, Operários
Impactos Socioambientais: Alteração no ciclo reprodutivo da fauna, Assoreamento de recurso hídrico, Poluição atmosférica, Poluição de recurso hídrico, Poluição do solo
Danos à Saúde: Doenças não transmissíveis ou crônicas, Piora na qualidade de vida
Síntese
O Município de Ibirité localiza-se na Zona Metalúrgica de Minas Gerais, fazendo parte da Região Metropolitana de Belo Horizonte. Limita-se com os municípios de Belo Horizonte, Contagem, Betim, Sarzedo e Brumadinho. Sua área é de 73, 83 km² e possui uma população estimada em 157.000 pessoas (IBGE, 2009).
A economia de Ibirité se baseia no setor de serviços (69, 84%), seguido pelo setor secundário (29, 32%) e com um pouco significativo remanescente agropecuário (0, 84%). Assim, segundo dados da prefeitura local, pelo menos 98% de sua população reside em áreas urbanizadas.
A rápida urbanização a partir da década de 1970, a proximidade com empreendimentos industriais localizados ao longo da bacia do rio Paraopeba e outras bacias hidrográficas da região metropolitana, e a falta de planejamento urbano e saneamento ambiental levaram a uma situação de degradação ambiental no município.
A partir de 2002, constatou-se que a Lagoa de Ibirité – ou Lagoa da Petrobras, como é conhecida localmente -, outrora ponto turístico e opção recreativa dos ibiterenenses, representava risco à saúde da população local devido à proliferação de algas cianofíceas em suas águas e a presença de biotoxinas por elas produzidas. Hoje, os frequentadores do local sofrem o risco de contrair xistose (esquistossomose) e doenças hepáticas ao manter contato com suas águas.
A Refinaria Gabriel Passos (REGAP) da Petrobras, com sede em Betim, é uma das principais poluidoras, já que seus efluentes líquidos são despejados diretamente no corpo d’água (que, na realidade, tem origem em um represamento realizado para suprir as necessidades hídricas da própria refinaria). Por esse motivo, a Petrobras tem financiado as obras de construção de uma estação de tratamento de águas fluviais no entorno da lagoa. Entretanto, divergências entre a empresa e a prefeitura local tem impedido que o equipamento entre em funcionamento, já que a administração municipal alega ter sido enganada pela empresa por ocasião da construção da ETAF, e não possuir recursos para custear sua operação.
Enquanto isto não é resolvido, os moradores do entorno da lagoa estão sujeitos à doenças decorrentes de enchentes intensificadas por erros no projeto da ETAF e do contato compulsório com suas águas contaminadas nessas ocasiões – motivo pelo qual, em 2008, com o apoio do Consórcio Intermunicipal da Bacia Hidrográfica do Rio Paraopeba (Cibapar), fundaram o Grupo Natureza Viva a fim de garantir a realização de obras emergenciais para solucionar o problema e lutar pela revitalização da lagoa.
Contexto Ampliado
Até meados da década de 1970, Ibirité possuía uma economia basicamente agrícola. Entretanto, com a instalação da Refinaria Gabriel Passos (REGAP) no município vizinho de Betim, a consolidação de uma infraestrutura de transporte rodoviário e ferroviário e a crescente industrialização da Região Metropolitana de Belo Horizonte, onde está inserido, o município passou a oferecer uma ampla variedade de serviços, principalmente para atender a demanda de trabalhadores locais absorvidos como mão-de-obra nas indústrias da região. O setor industrial ibiritenense contribui com apenas cerca de 30% do PIB local.
Rápida urbanização e crescimento demográfico, falta de planejamento urbano e de obras de saneamento, além de ausência de educação ambiental ou normas de fiscalização no lançamento de efluentes industriais nas bacias da região – cuja industrialização foi marcada por um processo inconsequente de desenvolvimento a qualquer custo, característico da política econômica do período pós-64 – foram fatores preponderantes para o atual estado de degradação ambiental verificado nos corpos d?água do município.
Criada em 1968, como parte do projeto de instalação da Refinaria Gabriel Passos (REGAP) da Petrobras, a Lagoa de Ibirité é característica desse processo. Originalmente parte da bacia Ribeirão Sarzedo, localizada na bacia do rio Paraopeba (um dos principais afluentes do rio São Francisco), a Lagoa de Ibirité foi criada a partir do represamento de parte do curso deste ribeirão, e passou a constituir uma das principais fontes de água para a refinaria.
A REGAP possui capacidade para refinar até 150 barris de petróleo por dia, os quais geram subprodutos como gasolina, óleo diesel, querosene de aviação, GLP, aguarrás, asfaltos, coque e enxofre. Instalada em 1962, iniciou suas operações seis anos depois, e sofreria ampliações em 1982 e 1994. Durante mais de 30 anos, a REGAP despejou efluentes líquidos na lagoa, através do córrego Pintado, sem maiores preocupações ambientais; essa posição começou a mudar na última década, quando o aumento da preocupação com a qualidade ambiental por parte da população em geral, e a evolução da legislação ambiental brasileira, levaram a empresa a instituir um programa de monitoramento da qualidade da água e estudar opções de reuso para suas águas industriais.
Entretanto, décadas de uso indiscriminado, a ocupação desordenada de seu entorno, a falta de obras de engenharia ambiental necessárias para conter seu assoreamento, e o lançamento de esgoto não tratado contribuíram para minar qualquer possibilidade de recuperação da lagoa em curto prazo.
Um estudo realizado por um grupo de consultoria liderado por Fernando Jardim, a serviço da Copasa (Companhia de Saneamento de Minas Gerais), identificou, através de bioensaios, que a lagoa conta com colônias de algas das espécies M. aeruginosa e M. flosaquae – produtoras de hepatotoxinas, que podem levar a sérias complicações no fígado humano. Por esse motivo, a empresa elevou o nível de alerta da lagoa para o nível 2, com a realização de monitoramento semanal e substituição do fornecimento de água potável para refinaria por água de poço (a água produzida pela ETA passou a ser utilizada somente para fins industriais).
Outro risco para a população é a contaminação pelo helminto Schistossoma mansoni – presente na lagoa, o qual pode causar a esquistossomose ou xistose -, cuja proliferação é favorecida pelo despejo de esgoto sem tratamento em corpos d?água, podendo causar náuseas, vômitos, coceiras, vermelhidão na pele, fraqueza, inchações no ventre, diarreia, prisão de ventre, perda de peso ou paralisia.
Segundo o deputado estadual Dinis Pinheiro, estudos da UFMG teriam verificado que a lagoa também estaria sendo poluída com nitrato, nitrito e materiais condutores que são subproduto do refino do petróleo. Constatação esta que até hoje não recebeu qualquer medida por parte dos órgãos estaduais de fiscalização ambiental, apesar de terem sido informados dos resultados da pesquisa.
Em 2002, a Petrobras, Prefeitura Municipal de Ibirité e Instituto Mineiro de Gestão das águas (Igam) chegaram a um entendimento sobre formas de melhorar a qualidade das águas da lagoa: a opção selecionada foi a construção de uma Estação de Tratamento de água Fluvial (ETAF). Pelo convênio firmado entre a empresa e o poder público, a Petrobras ficaria responsável pelo financiamento das obras – a custo de R$ 7 milhões -, o Igam escolheria a empresa responsável pelas obras, e a administração municipal arcaria com os custos de operação da estação (inicialmente, estimados em R$ 60 mil mensais).
Todavia, a estação de tratamento jamais entrou em operação. Concluída a obra em 2004, ficou constatado que os custos de operação seriam maiores do que os estimados inicialmente, subindo para mais de R$ 300 mil reais mensais. Alegando não possuir recursos financeiros para operar a ETAF – dado o baixo orçamento do município -, e acusando a Petrobras de ter subestimado os custos, a prefeitura local abandonou o equipamento no ano seguinte, o qual permanece inoperante até hoje.
Posteriormente, a Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) se tornaria a responsável pela gestão dos serviços de água e esgoto do município, mas esta se recusou a assumir a ETAF sob a alegação de que o projeto havia sido mal formulado: ela teria sido construída a montante do lago, numa várzea de dispersão das cheias, e não resolveria os problemas que se propunha solucionar (combater a poluição da lagoa).
O Ministério Público chegou a abrir inquérito civil para apurar o caso, mas até hoje nada foi feito de fato.
Enquanto o impasse permanece, os moradores do entorno, especialmente os residentes nos bairros Jardim das Oliveiras e Jardim das Rosas, sofrem com as consequências desta obra mal planejada, já que ela estaria represando as águas da chuva e fazendo com que elas refluam sobre as casas dos moradores, expondo-os a riscos à saúde desnecessários. Estas denúncias ocorreram em 2008, durante audiência pública realizada pela Comissão de Assuntos Municipais e Regionalização da Assembléia Legislativa de Minas Gerais para discutir o assunto. Os moradores também denunciaram que o refluxo também ocorre através do sistema de esgotos da Copasa, o qual acaba levando os problemas para dentro das casas (mesmo aquelas cujo interior não foi atingido pelas enchentes).
Cansados de esperar uma solução para a mútua troca de acusações entre a administração municipal e a Petrobras, os moradores do município aproveitaram a realização do VI Seminário Participativo de Gestão das águas da Lagoa de Ibirité e se articularam para criar o Grupo Natureza Viva. Com o apoio do Consórcio Intermunicipal da Bacia Hidrográfica do Rio Paraopeba (Cibapar) e do Comitê de Bacia Hidrográfica do mesmo rio, cerca de 50 pessoas de diversos bairros da cidade têm lutado para garantir a realização das obras de saneamento que a cidade necessita e a revitalização da lagoa de Ibirité.
Entre as ações do grupo está o apoio ao Projeto Lagoa da Gente, criado pelo Cibapar para incentivar o uso sustentável da lagoa e como iniciativa de educação ambiental da população local. Além disso, o grupo participa de reuniões e seminários para a criação de projetos ambientais, oficinas de produtos reciclados, de geração de renda e de peças teatrais, além de outras atividades voltadas para a melhoria das condições da Lagoa.
Em 13 de julho de 2009, membros do projeto Lagoa da Gente, e do grupo Natureza Viva, estiveram na Prefeitura de Ibirité e no Igam levando um relatório com os problemas emergenciais discutidos em reunião realizada, dias antes, na Associação Comunitária do Lago Azul. Entre as prioridades definidas pelo grupo na reunião, estão ações para garantir que as obras de construção da Estação de Tratamento de Esgoto da cidade, que a Copasa antecipou de 2015 para 2011, sejam implementadas dentro do prazo estabelecido. Essa obra tem sido considerada essencial para diminuir a carga de poluentes e esgotos residenciais despejados in natura todos os dias na lagoa. Outra prioridade é a luta por saneamento básico nos bairros.
Cronologia
2002: Prefeitura Municipal de Ibirité, Petrobras e Instituto Mineiro de Gestão das águas (Igam) firmam acordo para construção de Estação de Tratamento de água Fluvial (ETAF) no entorno da Lagoa de Ibirité.
2004: Término da construção da ETAF.
2005: Estação de Tratamento de água Fluvial instalada no entorno da Lagoa de Ibirité é abandonada. Prefeitura Municipal de Ibirité e Petrobras acusam-se mutuamente a respeito da responsabilidade pela paralisação da obra. Petrobras afirma ter custeado as obras, devendo a prefeitura realizar sua operação. Administração municipal afirma não possuir recursos para arcar com o custo mensal de operação, em torno de R$ 300 mil.
Novembro de 2008: Moradores do entorno da Lagoa de Ibirité criam o Grupo Natureza Viva, a fim de contribuir para as ações e discussões pelas melhorias ambientais no entorno da Lagoa de Ibirité.
03 de dezembro de 2008: A partir de requerimento do deputado estadual Dinis Pinheiro, a Comissão de Assuntos Municipais e Regionalização da Assembléia Legislativa de Minas Gerais realiza audiência pública para discutir impactos das obras da Estação de Tratamento de água Fluvial de Ibirité sobre os moradores dos bairros Jardim das Oliveiras e Jardim das Rosas, uma vez que o represamento das águas da chuva estaria provocando inundações nesses bairros.
08 de julho de 2009: Membros do Grupo Natureza Viva e representantes de moradores de vários bairros do município participam de reunião com representantes da Petrobras para discutir ações emergenciais para a revitalização da Lagoa de Ibirité. O Grupo ainda destacou o descaso com o saneamento básico em alguns bairros e a poluição da Lagoa.
13 de julho de 2009: Membros do projeto Lagoa da Gente, e do grupo Natureza Viva, vão à Prefeitura de Ibirité e ao Igam levando um relatório com os problemas emergenciais discutidos na reunião do dia 08/07.
Fontes
ASSEMBLéIA LEGISLATIVA DE MINAS GERAIS. Deputados querem resolver problema de inundações em Ibirité. Belo Horizonte, 02 dez. 2008. Disponível em: http://www.almg.gov.br/index.asp?grupo=comunicacao&diretorio=not&arquivo=Noticias_Pesquisa/. Acesso em: 28 jul. 2010.
COMITê DA BACIA HIDROGRáFICA DO RIO PARAOPEBAS. Grupo Natureza Viva: unidos pela Lagoa de Ibirité. Betim, 08 maio 2009. Disponível em: http://www.aguasdoparaopeba.org.br/conteudo.php?id=56. Acesso em: 28 jul. 2010.
_______. Grupo “Natureza Viva” define obras emergenciais em Ibirité. Betim, 14 jul. 2009. Disponível em: http://www.aguasdoparaopeba.org.br/conteudo.php?id=73/. Acesso em: 28 jul. 2010.
DIRETóRIO MUNICIPAL DO PARTIDOS DOS TRABALHADORES DE IBIRITé. Comunidade se mobiliza em defesa da Lagoa. Ibirité, 23 abr. 2009. Disponível em: http://www.uniblog.com.br/ptibirite/. Acesso em: 28 jul. 2010.
EVANS, Luciane. Lagoa de Ibirité sofre com sujeira e esgoto. O Estado de Minas, Belo Horizonte, 06 fev. 2009. Disponível em: http://wwo.uai.com.br/UAI/html/sessao_2/2009/02/06/em_noticia_interna, id_sessao=2&id_noticia=98170/em_noticia_interna.shtml. Acesso em: 28 jul. 2010.
JARDIM, F. A. et al. A experiência da Copasa no monitoramento, detecção e adoção de medidas mitigadoras para as cianobactérias tóxicas em estações de tratamento de água – Minas Gerais – Brasil. In: CONGRESSO INTERAMERICANO DE ENGENHARIA SANITáRIA E AMBIENTAL, 27, 03 a 08 dez, 2000, Porto Alegre. Trabalhos. Porto Algre: ABES, 2000. Disponível em: http://www.bvsde.paho.org/bvsaidis/tratagua/ii-034.pdf. Acesso em: 28 jul. 2010.
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_______. Aspectos Gerais. Disponível em: http://www.ibirite.mg.gov.br/index.php/prefeitura/historia/124-aspectos-gerais/. Acesso em: 28 jul. 2010.