Municípios de Mogi Guaçu, Paranapanema, Ribeirão Preto e Rio das Pedras concentram casos de trabalho escravo, especialmente sobre fiscalização e resgate nos canaviais e na citricultura

UF: SP

Município Atingido: Rio das Pedras (SP)

Outros Municípios: Andradina (SP), Araçatuba (SP), Araraquara (SP), Barra Bonita (SP), Botucatu (SP), Capivari (SP), Dois Córregos (SP), Elias Fausto (SP), Franca; Guariba (SP), Iacanga (SP), Ibaté (SP), Igarapava (SP), Ipaussu (SP), Ituverava (SP), Jaú (SP), Jeriquara(SP), Lucianópolis (SP), Mirandópolis (SP), Morro Agudo (SP), Patrocino Paulista (SP), Penápolis (SP), Piracicaba (SP), Pirangi (SP), Rafard (SP), Reginópolis (SP), Ribeirão Preto (SP), Rio das Pedras (SP), São Joaquim da Barra (SP), São José dos Campos (SP), São Manoel (SP), Taubaté (SP), Valparaíso (SP)

População: Agricultores familiares, Migrantes, Trabalhadores em atividades insalubres, Trabalhadores rurais assalariados, Trabalhadores rurais sem terra

Atividades Geradoras do Conflito: Agroindústria, Atuação de entidades governamentais, Monoculturas

Impactos Socioambientais: Alteração no ciclo reprodutivo da fauna, Contaminação ou intoxicação por substâncias nocivas, Desmatamento e/ou queimada, Falta de saneamento básico, Incêndios e/ou queimadas, Mudanças climáticas, Precarização/riscos no ambiente de trabalho

Danos à Saúde: Acidentes, Contaminação por agrotóxico, Doenças não transmissíveis ou crônicas, Falta de atendimento médico, Insegurança alimentar, Piora na qualidade de vida, Violência – ameaça, Violência – assassinato, Violência – coação física, Violência – lesão corporal

Síntese

De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o artigo 149 do Código Penal prevê os elementos que caracterizam a redução de um ser humano à condição análoga à de escravo: “a submissão a trabalhos forçados ou a jornadas exaustivas, a sujeição a condições degradantes de trabalho e a restrição de locomoção do trabalhador”.

Já o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) interpreta a legislação brasileira sobre o conceito de trabalho escravo contemporâneo da seguinte maneira:

“[N]os tempos atuais, sua configuração vai muito além da privação de liberdade, ocorrendo nas mais amplas situações de ofensa à dignidade do ser humano, como em hipóteses de submissão a condições degradantes de trabalho, jornadas exaustivas ou forçadas por dívidas impostas aos trabalhadores”.

Desde a década de 1940, o Código Penal Brasileiro prevê a punição a esse crime. A essas formas dá-se o nome de trabalho escravo contemporâneo, escravidão contemporânea, e condições análogas às de escravo.

Para combater essa situação, por meio da portaria nº 550 editada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) em 14 de junho de 1985, foi criado o Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM) para agir diretamente nos casos de prática de trabalho escravo diante das denúncias provindas de vários pontos do território nacional.

De acordo com o Panorama Geográfico Geral da Erradicação do Trabalho Escavo e do Tráfico de Pessoas, entre 1993 e 2023 foram encontrados 63.516 trabalhadores em condições análogas à de escravo, com 61.035 resgates no mesmo período. Foram, em média, 2.104,7 trabalhadores resgatados por ano.

O resgate tem por finalidade fazer cessar a violação de direitos humanos desses trabalhadores, reparar os danos causados no âmbito da relação de trabalho e promover o devido encaminhamento das vítimas para serem acolhidas pela assistência social, como explica Raimundo Melo para o Consultor Jurídico.

Além da fiscalização visando ao resgate de trabalhadores escravizados, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) procura dialogar com entidades de trabalhadores e de empregadores, associações empresariais e representantes de setores produtivos, com o objetivo de firmar protocolos para a adoção de boas práticas trabalhistas e assegurar condições de trabalho decentes.

De acordo com o Observatório da Erradicação do Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas, mantido pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) e pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), no município de São Paulo, em 2023, 8,7% da taxa de resgatados eram de não migrantes, 4% eram trabalhadores provenientes da migração intraestadual, e 16%, da migração interestadual.

No Brasil, 28 janeiro é considerado o Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, data em que ocorreu a chamada “Chacina de Unaí”, exposta neste Mapa de Conflitos. O caso do qual tratamos se concentra nos municípios de Mogi Guaçu (SP), Paranapanema (SP), Ribeirão Preto (SP) e Rio das Pedras (SP), especialmente sobre fiscalização e resgate nos canaviais e na citricultura.

Em 2023, de acordo com o Educa BR, o Brasil detinha 50% da produção mundial de suco de laranja. Três grandes produtores (Citrosuco, Cutrale e LDC) foram responsáveis por 48% da produção brasileira, sendo as principais empresas acusadas por graves violações trabalhistas.

Segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) sistematizados pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), 178 trabalhadores foram resgatados de condições análogas à escravidão no setor da laranja desde 1995. Esses trabalhadores, na maioria das vezes, são contratados apenas por temporada e necessitam de grande força física, já que carregam nas costas, durante muitas horas, sacos com dezenas de quilos da fruta.

Além disso, em 2019, de acordo com dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), os trabalhadores enfrentavam condições climáticas extremas e riscos à saúde associados ao uso de agrotóxicos, pois a laranja foi um dos alimentos com mais agrotóxicos proibidos ou acima do limite permitido, como divulgado pelo programa “Escravo, nem pensar!”, do Repórter Brasil.

Em São Paulo, conforme informes do MTE sistematizados pelo portal Repórter Brasil com apoio da CPT em “Escravo, nem pensar!”, os dados até 2024 indicam que a incidência de trabalho escravo nesse estado ocupava a nona posição referente à quantidade de trabalhadores submetidos a esse crime entre os anos de 1995 e 2023, com 2.615 trabalhadores escravizados em 189 casos.

Foi constatado que esse tipo de exploração está presente em atividades urbanas e rurais. Nas cidades, o problema é verificado sobretudo na região metropolitana da capital, na construção civil (670 escravizados, ou 26% do total no estado) e na confecção têxtil (615, ou 24%). Já no meio rural há preponderância de registros em lavouras no interior paulista, como cana-de-açúcar (342, ou 13%), além de café, laranja e outras culturas. Em relação às lavouras, os trabalhadores são migrantes internos, a maioria proveniente do Maranhão.

Os dados das ações de combate ao trabalho análogo ao de escravo no Brasil estão disponíveis no Observatório da Erradicação do Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas. Há também informações no Painel de Informações e Estatísticas da Inspeção do Trabalho no Brasil.

 

Contexto Ampliado

O artigo 149 do Código Penal brasileiro estabelece como crime de condição análoga à de escravo: “quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto”. O mesmo artigo prescreve como pena para tal crime “reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência”.

Também incorre em crime quem:

“I – cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho; II – mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho”.

O § 2o do mesmo artigo considera agravantes do crime se for cometido: “I – contra criança ou adolescente; II – por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem”.

Dados da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa, 2022) informam que o Brasil é o maior produtor de açúcar e álcool do mundo, com 713,2 milhões de toneladas produzidas em 2023. Respondendo por cerca de 42% da produção global da commodity, o Brasil exporta para diversos países, especialmente árabes. Porém, um relatório produzido pelo Departamento Econômico da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo (Faesp), com dados da Conab, indicou uma produção de 685,9 milhões de toneladas de cana-de-açúcar na safra 2024/25, volume 3,8% menor do que a safra anterior.

Segundo o banco de dados da Nova Cana (2024), existem no Brasil 434 usinas de produção e processamento de cana-de-açúcar, das quais 172 (ou cerca de 40%) no estado de São Paulo.

De acordo com o Nova Cana (224), baseando-se em dados do Painel de Informações e Estatísticas da Inspeção do Trabalho no Brasil (Painel SIT), o índice do trabalho análogo ao escravo no setor canavieiro, em 2023 ficou em 258, com 28,7% abaixo das 362 pessoas resgatadas em 2022; porém, superior aos 142 casos de 2021.

O auditor fiscal do trabalho André Esposito Roston relatou algumas características da agressão sofrida pelos trabalhadores no setor canavieiro, caracterizado por jornadas exaustivas, como: “a ameaça de sanção física ou psicológica; trabalho forçado; trabalho extenuante que acarrete violação de direitos relacionados à segurança, saúde, descanso e convívio familiar e social.”

Trabalhadores em condições análogas à escravidão nos canaviais brasileiros e formalização após a ação penal. Fonte: Radar SIT. Elaborados pela Nova Cana (2024).

Também há evidências de exploração de trabalhadores rurais na citricultura. O Ministério Público do Trabalho (MPT) afirmou que o trabalho escravo nesse agronegócio é um problema crescente no estado. Em 2007, dos 18,6 milhões de toneladas produzidas no Brasil, 14,9 milhões foram em propriedades paulistas. Em 2009, ainda não havia números oficiais, mas o MPT informou que o estado de São Paulo respondia por 80% da produção de laranja no país.

“O trabalho escravo nas plantações de laranja sempre foi um problema no Estado. É uma preocupação constante nas nossas fiscalizações”, afirmou o coordenador nacional de erradicação do trabalho escravo do MPT, Sebastião Vieira Caixeta. A Associação Brasileira dos Citricultores (Associtrus) estimava, em 2009, que 50 mil pessoas trabalhavam na colheita de laranja em São Paulo.

De acordo com a Série Histórica da atividade na citricultura de São Paulo desenvolvido pelo Observatório de Erradicação do Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas, 91 trabalhadores foram encontrados em condição análoga à de escravo entre 2008 a 2023.

Série Histórica dos Trabalhadores resgatados na citricultura em São Paulo. Fonte: Observatório da Erradicação do Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas, 2024

Uma parte dos trabalhadores rurais migrantes, entretanto, vive em condições de trabalho exploratórias e não tem seus direitos trabalhistas reconhecidos. O número de trabalhadores imigrantes resgatados da escravidão contemporânea dobrou no Brasil, segundo dados do Painel SIT, repassados pela Agência Brasil (2022). Em 2021, a Divisão para Erradicação do Trabalho Escravo registrou 74 resgates. Em 2022, foram 148 casos.

O coordenador-geral de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Análogo ao de Escravizado e Tráfico de Pessoas do MTE, André Roston, afirmou que o tema está relacionado com a efetividade global da atividade do Sistema Federal de Inspeção do Trabalho: o combate ao trabalho escravo no país:

“Avaliamos que as principais demandas apresentadas pela Inspeção do Trabalho foram satisfeitas, garantindo a não discriminação do trabalhador por sua origem e colocando em primeiro plano a garantia dos direitos humanos e trabalhistas”, ressaltou.

Muitos pesquisadores como Livia Miraglia, Julianna Hernandez; Rayhanna Oliveira (2019) et al. denominam as atividades ali realizadas como “trabalho escravo contemporâneo”.

No entanto, as autoras procuraram demonstrar que, pelo menos no âmbito dos Tribunais Regionais Federais (TRFs), são muito presentes concepções históricas simplificadoras sobre a escravidão no Brasil, focando as decisões judiciais principalmente no critério de restrição da liberdade. Segundo elas, “essas concepções históricas acabam esvaziando os demais elementos constitutivos do tipo do artigo 149 do CP, a saber, a jornada exaustiva e, muito especialmente, as condições degradantes de trabalho”.

O dia a dia nos canaviais mostra, entretanto, que o atual regime de trabalho dos trabalhadores rurais se assemelha com a escravidão do século XIX. De acordo com o Portal da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ, 2008), baseando-se no histórico das diligências realizadas pelo grupo de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), embora as empresas assinem a carteira de trabalho, é comum não recolherem o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Os exames admissionais nem sempre são realizados de forma adequada, e as condições em que o trabalho é efetuado são consideradas “péssimas” pelos fiscais do trabalho.

Em 28 de junho de 1995 foi criado o Grupo Executivo de Repressão ao Trabalho Forçado (Gertraf) por representantes de cinco ministérios: Agricultura, Indústria e Comércio, Justiça, Meio Ambiente e Trabalho e a Equipe Móvel de Fiscalização – ligada à Secretaria de Fiscalização do Trabalho (Sefit), hoje à Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT). De acordo com análise da Comissão Pastoral da Terra (CPT), um dispositivo desse tipo era assumido pelo Fórum Nacional Permanente Contra a Violência no Campo, conforme alertado na época pela CPT, tendo em vista a ineficiência quase total da fiscalização até então praticada.

Afirma a CPT: “Ao criar a Equipe Móvel, o governo reconhecia a necessidade imprescindível de se combater o trabalho escravo tendo uma estratégia repressiva totalmente isenta às pressões das oligarquias locais”.

A respeito da criação desse grupo, a Comissão Pastoral da Terra (2000) analisava que uma ação eficiente contra o trabalho análogo ao de escravo exige minimamente “uma fiscalização extremamente ágil e absolutamente independente; uma efetiva punição dos culpados; uma abrangente política de prevenção e dissuasão”.

Trabalhadores rurais que chegam em São Paulo para trabalhar nos canaviais geralmente são recrutados em zonas muitos pobres, no Nordeste e Norte do Brasil, pelos chamados “gatos”, como analisa Nataly Pinheiro (2013) sobre aqueles que trabalham para os proprietários rurais e que atraem os trabalhadores rurais com ofertas enganosas.

Por virem de regiões pobres, os trabalhadores enxergam nos canaviais de São Paulo a oportunidade de melhorarem de vida. Segundo Antônio Almeida, pesquisador da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) para o Olhar Virtual (2009), portal da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), esses trabalhadores são, em geral, homens entre 18 e 20 anos e analfabetos funcionais, contando com três a sete anos de escolaridade.

“Os trabalhadores dormem em alojamentos miseráveis, com colchões amontoados, ventilação insuficiente, poucos banheiros para muita gente, ratos e baratas. Outra situação de vulnerabilidade dos trabalhadores rurais é a falta de proteção. Os equipamentos de proteção não dispõem de boa qualidade e sua reposição é demorada. As luvas e os sapatos são de tamanho único e, por isso, nem sempre se ajustam às mãos e aos pés dos trabalhadores. Os óculos de proteção ficam embaçados por conta da fuligem da cana, o que leva, frequentemente, os trabalhadores rurais a abandoná-los no decorrer do expediente. As empresas são obrigadas a fornecer equipamentos de segurança sem custo para o trabalhador”.

Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT, 2009), a principal forma utilizada no Brasil para submeter os trabalhadores a formas de trabalho forçado é a intimidação por dívidas. Em geral, o trabalhador recebe por produção, ou seja, seus salários variam de acordo com a quantidade de cana cortada. Não raro, trabalham até mesmo em seus horários de pausa; para economizar tempo, almoçam sob o sol, aspirando o pó da cana.

Nos canaviais, são forçados a cortar de 10 a 15 toneladas de cana por dia. Caso não cumpram a meta, podem ser demitidos no segundo mês de trabalho. Os trabalhadores rurais, além de violentados, também morrem em decorrência das condições de trabalho. De abril de 2004 a julho de 2008, 21 trabalhadores morreram por exaustão nos canaviais de São Paulo.

Conforme indicado pelo Anuário Estatístico de Acidentes do Trabalho (Ministério da Economia, 2022), os parâmetros nacionais de incidência de acidentes de trabalho a cada grupo de mil trabalhadores variou de 16,93 em 2012 a 10,82 em 2020.

Comparando esses dados gerais com dados da Relação Anual de Informações Sociais, (Rais) e Smartlab (2022), a incidência de acidentes de trabalho nas atividades manuais da produção de cana-de-açúcar brasileira era superior aos registros nacionais até 2015. A partir desses dados, José Rodolfo Tenório Lima e Cassiano Ricardo Rumin (2024) analisam que a incidência de acidentes no trabalho manual vai sendo reduzida ao longo dos anos, chegando a 12,03 em 2020, valor um pouco superior à incidência nacional, porém bem inferior à encontrada no início do período analisado, conforme tabela demonstrativa a seguir:

“Força de trabalho, acidentes e taxa de incidência do setor sucroalcooleiro, área agrícola do setor e atividades manuais e mecanizadas da área agrícola no período de 2012 a 2020”. Fonte: José Rodolfo Tenório Lima; Cassiano Ricardo Rumin (2024).

Podem ser destacados, nesse período de recorte, os anos de 2012 e 2013, em que as taxas de incidência de acidentes do trabalho manual são, respectivamente; 23,49 e 20,54 a cada grupo de cem mil trabalhadores; valores bem superiores ao parâmetro nacional. Contudo, a incidência de acidentes no trabalho manual vai sendo reduzida ao longo dos anos, chegando a 12,03 em 2020, valor um pouco superior à incidência nacional, porém bem inferior à encontrada no início do período analisado.

 

Parâmetros de Incidência de acidentes de Trabalho.
Ano Nacional Setor Sucroalcooleiro
2012 16,93 23,49
2013 16,75 20,54
2014 16,25 18,41
2015 14,41 16,61
2016 14,26 14,61
2017 13,38 13,62
2018 13,97 13,54
2019 13,72 12,68
2020 10,82 12,03

 

No entanto, no ano 2000, a CPT publicou sobre a precarização e o esvaziamento da fiscalização realizada pela Equipe Móvel do MTE, cuja eficiência foi colocada em xeque pela impunidade das infrações e dos crimes encontrados:

“A reincidência sistemática das práticas culposas em muitas fazendas aponta para o fracasso do sistema repressivo, além da pouca vontade de resolver a questão. (…) O valor das multas aplicadas, quando pago, continua insignificante, considerando-se o poder econômico dos latifúndios envolvidos. E continua mais lucrativo prosseguir com a prática do trabalho escravo, pagando de vez em quando (se pagar…) as multas de praxe”.

A CPT afirma ainda que a desapropriação das terras das fazendas autuadas por trabalho escravo também tem se revelado ineficiente, pois, ao indenizar os então proprietários, o Estado estaria, na crítica da Comissão, “premiando o dono do imóvel”. A indenização paga pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) compensava amplamente a perda da terra.

Em 2003 passa a existir, por meio do MTE, o “Cadastro de Empregadores que Tenham Submetido Trabalhadores à Condição Análoga à Escravidão”, popularmente conhecido como “Lista Suja”. Ela foi revogada pela Portaria Interministerial MTE/SEDH nº 02, de 12 de maio de 2011, sendo que esta sofreu revogação pela Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH n° 4, de 11 de maio de 2016.

De acordo com Renata Zulma (2016) para a Imprensa Oficial, dentre as novidades que a Portaria n. 4/2016 traz está a possibilidade da União, com participação da AGU, firmar Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) ou acordo judicial com o empregador que estiver sujeito a integrar a lista suja do trabalho escravo. O Ministério Público do Trabalho (MPT), por sua vez, será cientificado do pedido do empregador para que acompanhe as tratativas e participe facultativamente dos ajustes.

Ainda em 2003, de acordo com o “Atlas do Trabalho Escravo no Brasil” (2007), o aparato legal brasileiro, com base no qual os vários acordos de parcerias foram realizados e as penas legais foram definidas, sofreu modificações. A Lei n° 10 803, de 11 de dezembro de 2003, alterou o artigo 149 do Decreto-lei n° 2848 de 07 de dezembro de 1940, trazendo inovações em relação à tipificação até então vigente, como a ampliação da definição e hipóteses em que se configura o trabalho escravo, o aumento da pena prevista e o agravamento da pena por trabalho infantil ou racismo.

Em abril de 2007, a Cosan, um grupo de usinas do Brasil que concentra uma das maiores produções de açúcar e álcool do mundo, assinou um Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (TAC) com o MPT para garantia da regularização das relações trabalhistas e do meio ambiente de trabalho na produção de cana-de-açúcar.

De acordo com o Repórter Brasil, o TAC foi firmado na Procuradoria Regional do Trabalho da 15ª Região na presença dos Procuradores Mário Antonio Gomes, Cássio Calvilani Dalla-Déa (Ofício de Araraquara) e José Fernando Ruiz Maturana (Ofício de Bauru), e previa a redução gradativa da terceirização do corte de cana e o respeito às normas de saúde e segurança no trabalho em todas as unidades do grupo; na época, 17 usinas.

Em caso de irregularidades na condição de alojamento dos empregados das prestadoras, a Cosan interviria imediatamente para adequação das condições previstas na Norma Regulamentadora 31 (NR 31, que regula o trabalho rural) ou a adoção de solução para atendimento à legislação laboral e à dignidade dos trabalhadores, no prazo máximo de 48 horas.

As usinas envolvidas no TAC foram: Costa Pinto (Piracicaba); Santa Helena (Rio das Pedras); São Francisco (Elias Fausto); Rafard (Rafard); Diamante (Jaú); Serra (Ibaté); Junqueira (Igarapava); Filial Mundial (Mirandópolis); Bom Retiro (Capivari); Barra (Barra Bonita); Bonfim (Guariba); Tamoio (Araraquara); Dois Córregos (Dois Córregos); Ipaussu (Ipaussu); Univalem (Valparaíso); Gasa (Andradina); e Destivale (Araçatuba).

Além das mudanças legislativas, a continuidade do quadro de sobre-exploração de trabalhadores brasileiros pelo agronegócio no estado de São Paulo provocou, em 2008 e ao longo dos anos, fortes protestos por parte de movimentos sociais. No dia 30 de abril de 2008, por exemplo, um grupo de integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) bloqueou o acesso de caminhões à Usina Santa Helena, do grupo Cosan, no município de Rio das Pedras, a 160 quilômetros da cidade de São Paulo.

Estudantes de agronomia da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz/USP, do campus de Piracicaba, e representantes de algumas categorias trabalhistas, como metalúrgicos e químicos, participaram da manifestação, que contou com aproximadamente 300 pessoas. Eles protestaram para informar ao público a existência de trabalho escravo nos canaviais mantidos pela usina, contra a qual existiam, na época, mais de 100 denúncias de infrações diversas da legislação do trabalho. Os manifestantes solicitaram que as áreas com irregularidades fossem destinadas à reforma agrária.

O grupo, entretanto, foi pouco afetado pelo protesto, e continuou crescendo economicamente a despeito das acusações trabalhistas que pesavam contra ele. Atualmente, de acordo com o Infomoney (2024), o grupo Cosan continua a atuar nos setores de agronegócio, distribuição de combustíveis e de gás natural, de lubrificantes e logística, com empresas como Raízen, Comgas, Moove e Rumo e marcas como a Shell.

Com origem no setor sucroenergético, ao longo de sua trajetória, iniciada em 1936, a companhia diversificou seu portfólio de negócios, tornando-se um dos maiores fabricantes de etanol e o maior exportador de cana-de-açúcar do mundo. Também é a maior operadora de ferrovia da América Latina, e mantém a liderança na distribuição de gás natural e de combustíveis e lubrificantes no Brasil.

Em 2008, a Anistia Internacional (AI) divulgou em Londres um relatório apontando dados sobre as condições de trabalho e disputas de terras em áreas rurais no Brasil, destacando problemas nas áreas de plantação de cana-de-açúcar destinadas à produção de etanol, bem como as ações governamentais realizadas. As denúncias sobre as péssimas condições de trabalho no setor canavieiro geraram forte repercussão entre os especialistas da área, que reconheceram que a fiscalização desse problema estava “muito abaixo das necessidades”.

Na região de Ribeirão Preto, por exemplo, havia dois procuradores estaduais para acompanhar 39 usinas. Esse relatório informou que, até março de 2008, 288 pessoas, submetidas a trabalhos forçados em seis plantações paulistas de cana-de-açúcar, foram resgatadas. A ação de combate foi feita por procuradores da Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho do estado de São Paulo (Sert/SP).

Como informado pelo portal Olhar Virtual (2008), o pesquisador Francisco José Alves, professor da Universidade Federal de São Carlos (UFScar), explicou à época que houve uma intensificação do trabalho nos canaviais. Na década de 1980, cada trabalhador costumava produzir, diariamente, cinco toneladas de cana cortada. Em 20 anos, esse número quase triplicou, sem que houvesse qualquer modificação substancial nas tecnologias de corte de cana.

Para o pesquisador, esse processo só seria interrompido pela total mecanização da extração de cana. Em contrapartida, haveria desemprego em massa no setor. Se em 2008 o trabalho nas lavouras canavieiras fosse completamente mecanizado, cerca de 180 mil trabalhadores, provenientes apenas do estado de São Paulo, ficariam desempregados.

Em 2008, conforme noticiado pelo jornal Extra, as irregularidades nas plantações de laranja foram o foco principal da Delegacia Regional do Trabalho de São Paulo (DRT-SP). Em reunião com as quatro principais empresas do ramo no estado (Cutrale, Coimbra Frutesp, Citrosuco e Citrovita), a DRT-SP fez um balanço das irregularidades constatadas ao longo de 2007 e avisou que cobraria responsabilidade também das grandes indústrias e não apenas dos produtores.

Segundo a DRT-SP, foram realizadas 221 diligências em laranjais onde trabalhavam 37.561 pessoas em 2007. As irregularidades mais comuns foram ausência de registro em carteira de trabalho, péssimas condições laborais, irregularidades no transporte e descumprimento da normativa 31 expedida pelo MTE, que regula o trabalho rural.

A então chefe da DRT-SP, Lucíola Rodrigues Jaime, afirmou na época: “Enquanto estávamos com as atenções voltadas para os trabalhadores da cana-de-açúcar, cresceu o número de denúncias no setor citricultor, a despeito das parcerias do segmento com instituições de certificação social.”

Em uma ação realizada em um laranjal da região de Mogi Guaçu, na região de Campinas, entre os dias 19 e 23 de dezembro de 2007, a DRT-SP encontrou crianças de 12 anos trabalhando na colheita da fruta.

Em junho de 2009, reportagem do jornal O Estado de São Paulo divulgou notícia intitulada “escravidão migrou dos canaviais para os pomares”, na qual informava que, naquele ano, São Paulo respondia por 80% da produção de laranja no Brasil, e que, de acordo com o coordenador nacional de erradicação do trabalho escravo do MPT, Sebastião Vieira Caixeta, “o trabalho escravo nas plantações de laranja sempre foi um problema no Estado. É uma preocupação constante nas nossas fiscalizações”.

A Associação Brasileira dos Citricultores (Associtrus) estimou que, na época, havia 50 mil pessoas trabalhando na colheita de laranja no estado de São Paulo.

De acordo com reportagem de Daniela Penha para o Repórter Brasil (2018), em 2013, fiscalização do MPT constatou que 26 empregados da empresa Citrosuco Agroindústria S.A. sofriam restrições à liberdade de ir e vir e estavam sujeitos a condições degradantes de trabalho e moradia em dois laranjais da empresa, localizados nos municípios de Botucatu (Fazenda Água Sumida) e São Manoel (Fazenda Graminha), interior de São Paulo. Foram lavrados 25 autos de infração contra a empresa.

A Citrosuco foi multada pelo MTE e ainda poderia responder a processos judiciais, além de sofrer outras sanções administrativas, como a entrada na “lista suja” do trabalho escravo ou a perda dos direitos econômicos.

De acordo com Penha:

“A fiscalização constatou que os 26 resgatados, migrantes nordestinos, sofriam restrições à liberdade de ir e vir e estavam sujeitos a condições degradantes de trabalho e moradia. Os trabalhadores relataram, na época, que chegaram a São Paulo com a promessa de que teriam bons salários e alojamentos, porém contraíram dívidas e viviam sem qualquer estrutura. Em nota enviada à Repórter Brasil, a empresa afirma que ‘é indevida a inclusão de seu nome no Cadastro de Empregadores do Ministério do Trabalho’ e que ‘já apresentou recurso e buscará nova decisão judicial para que seu nome seja devidamente retirado de tal lista’.”

O procurador do trabalho Fernando Maturana (então vinculado à Procuradoria do Trabalho do Município de Bauru), que acompanhou a ação em 2013, ressaltou na época que a prática do trabalho análogo ao de escravo foi constatada pelos relatos dos trabalhadores e pela situação degradante encontrada no local: “A fiscalização constatou a infração. O fato de a empresa ter se adequado dali para frente não anula o que foi constatado”.

Maturana também afirmou ao Repórter Brasil que a Citrosuco aderiu a um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) pelo qual ressarciu os trabalhadores, arcou com o pagamento de dano moral coletivo e se comprometeu a adequar a conduta no futuro, o que, na opinião dele, não extingue a responsabilização da mesma pela infração cometida: “Para fins de lista suja, a situação no momento da fiscalização materializa as condutas passíveis de responsabilização criminal, trabalhista e administrativa, cuja maior implicação é a inserção na lista suja”.

Em 2017, durante o governo interino de Michel Temer, do Movimento Democrático Brasileiro (MDB) [2016-2018], a regulamentação do cadastro de empresas foi alterada, e a divulgação das empresas na lista suja passou a depender de uma “determinação expressa do ministro do Trabalho”.

De acordo com a Conectas (2018), considerada uma política de Estado exemplar pela Organização das Nações Unidas (ONU) e pela OIT, a “lista suja” sofreu ataques de entidades representativas de setores como o agronegócio e a construção civil, que tentaram abolir o instrumento por via judicial. O governo federal, durante o mandato de Temer, tentou enfraquecer a “lista suja” com a edição da Portaria n° 1.129/2017, que impôs obstáculos à publicação do nome dos empregadores listados.

De acordo com dados obtidos pelo portal de notícias G1 por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI) e republicados pela Conectas, o ano de 2017 teve o menor número de operações da Equipe Móvel do MTE desde que foi instituída a “lista suja”, em 2004. Foram apenas 88 fiscalizações ao longo do ano.

A queda no número de fiscalizações em 2017 acarretou o menor número de trabalhadores resgatados de situação análoga à escravidão desde 1998. Na reportagem do Portal Geledés “Idas e vindas da lista suja do trabalho escravo no Brasil”, Caio Borges afirma: “Apenas 341 pessoas foram libertadas, o que representa uma diminuição de 61,5% em relação ao ano anterior, 2016. Para se ter uma ideia, em 2007, praticamente seis mil pessoas foram resgatadas, ou seja, em uma década, o número de pessoas resgatadas caiu 95%.”

No dia 23 de março de 2017, o MTE divulgou 85 nomes de empregadores na “lista suja” do trabalho escravo; entre eles, novamente, a Citrosuco. Após duas horas da publicação, porém, a empresa teve seu nome retirado do cadastro, junto a outros 16 nomes de pessoas físicas e jurídicas. O MTE alegou que a Citrosuco e os outros excluídos ainda não haviam esgotado os recursos a que tinham direito na esfera administrativa.

Na época, o Ministério Público do Trabalho (MPT) pediu formalmente explicações sobre a exclusão dos nomes ao MTE. O MTE republicou, então, alguns nomes em 25 de abril de 2017, quase um mês após a retirada dos demais. Mas, no dia anterior (24), a Citrosuco já havia conseguido liminar judicial, concedida pelo juiz do Trabalho Sandro Valério Bodo, de Botucatu, para que seu nome não fosse divulgado.

No dia da republicação da lista, a decisão judicial foi oficializada no Diário Oficial da União (DOU). No entanto, segundo reportagem de Daniela Penha para o Repórter Brasil (2018), na lista atualizada pelo MTE constou que a decisão administrativa de procedência ou irrecorribilidade, quando se esgotam as possibilidades de defesa da empresa em relação ao auto de infração lavrado na ação fiscal, foi proferida em 28 de julho de 2016, sete meses antes da publicação da lista em março de 2017.

“Entre as alegações da empresa, está a de que não poderia ser incluída na lista porque, no auto de infração emitido, a imposição da multa não havia ocorrido por condição análoga à de escravo. Além disso, destacou que o inquérito da Polícia Federal fora arquivado por determinação do Ministério Público Federal por ausência de provas para oferecimento de denúncia criminal.”

A reportagem acrescenta que, em 17 de dezembro de 2018, o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT 15-Campinas) derrubou liminar anterior e, com isso, a Citrosuco entrou no cadastro da lista suja de empresas do trabalho escravo. O juiz do Trabalho substituto Jeferson Peyerl rejeitou o argumento do MTE, que alegou que a Citrosuco – bem como as demais empresas e pessoas físicas excluídas do documento – ainda não havia esgotado os recursos a que tinha direito na esfera administrativa.

No entanto, o juiz afirmou que a aplicação de multa é da competência do juízo criminal, e que o auditor “constou de forma minuciosa” os fatos que “o levaram a crer que no local estava sendo praticado o trabalho análogo ao de escravo”. Ele considerou que o arquivamento do inquérito policial não tem “eficácia de coisa julgada” perante as outras esferas.

Peyerl julgou “improcedentes todos os pedidos da Autora [Citrosuco]”, conforme consta na decisão. O juiz entendeu que houve caracterização de trabalho análogo ao de escravo e, então, não havia justificativas para manter a Citrosuco fora da lista.

“Por fim, comungo no entendimento do MPT de que a publicação do referido Cadastro não condena ninguém; ao revés, simplesmente faz cumprir o princípio constitucional da publicidade do ato administrativo e da Transparência na Administração Pública”, discorreu o juiz.

Em fevereiro de 2020, Daniela Penha, para o portal Repórter Brasil, esteve na Fazenda São Bento, no município de Lucianópolis, e flagrou trabalhadores a serviço de Valmi Blanco Machado atuando sem registro e recebendo menos do que o salário-mínimo na colheita da laranja. A equipe da reportagem foi recebida por funcionários que, mesmo após a identificação dos jornalistas, acionaram a Polícia Militar do Estado de São Paulo (PMSP). Mais de seis viaturas estiveram na fazenda, o que, segundo a reportagem, configurou uma clara ação de intimidação.

Em 8 de dezembro de 2020, uma operação da Auditoria Fiscal do Trabalho na fazenda São Bento (fornecedora de laranjas para a Citrosuco) constatou que um grupo de 18 trabalhadores estava trabalhando havia oito dias sem registro ou remuneração, como já havia informado o Repórter Brasil no começo do mesmo ano. Segundo os colhedores, eles já haviam contraído dívidas, pois tinham de pagar pela comida.

“Havia uma completa negação da legislação trabalhista, por isso a caracterização da situação degradante. Desde o transporte, que estava irregular, às condições de trabalho”, ressalta o procurador Fernando Maturana.

Segundo o portal Repórter Brasil, a fazenda São Bento pertence a Valmi Blanco Machado, que atuava há décadas no setor e comercializava com grandes empresas agroindustriais, além de ser também produtor leiteiro. Ele foi autuado por manter trabalhadores em situação análoga à de escravo e por outras irregularidades trabalhistas, num total de 30 autuações.

Na fazenda, os auditores fiscais do trabalho – acompanhados pela Polícia Federal (PF) e pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) – encontraram três situações distintas, segundo a reportagem: “migrantes nordestinos atuando com registro, prestadores de serviços de um consórcio trabalhando de maneira irregular e o grupo resgatado como trabalho escravo. Mesmo entre os trabalhadores registrados, porém, havia irregularidades”.

“Alojados na fazenda, os trabalhadores tinham de pagar pela comida e pelo cozinheiro; ‘Se a lei não tivesse chegado, a gente tava devendo. Não ia ter lucro nenhum’, contou um deles” (Fonte: Grupo Móvel/Auditoria Fiscal do Trabalho, 2020).

Um dos trabalhadores, identificado como João [nome alterado para proteger sua identidade], contou ao Repórter Brasil que, no começo do mês de dezembro, o grupo deixou Pontalinda, cidade onde viviam, no interior de São Paulo, a 300 quilômetros de Lucianópolis, após serem arregimentados por um “gato”: “A gente tava trabalhando no escuro, sem saber o que ia ganhar. Não tinha registro, nem hora de almoço. E nem banheiro… tinha que usar o mato mesmo.”

Segundo o auto de infração, obtido pelo Repórter Brasil, os trabalhadores foram expostos a trabalho degradante e “a condições que claramente atentavam contra os seus direitos humanos e à sua dignidade”. Foram registradas irregularidades como “arregimentação por meio de fraude, engano, coação”; “induzimento do trabalhador a assinar documentos em branco, com informações inverídicas ou a respeito das quais o trabalhador não tenha o entendimento devido” e “exploração da situação de vulnerabilidade de trabalhador para inserir condições abusivas”.

Valmi Machado foi notificado a pagar R$ 72 mil de verbas rescisórias, incluindo indenização por dano moral no valor de R$ 2 mil para cada vítima. Ele firmou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o MPT se responsabilizando a resolver as demais irregularidades encontradas em relação aos outros trabalhadores.

Em 2021, foi realizada a primeira edição da Operação Resgate, com 128 fiscalizações distribuídas em 22 estados brasileiros e no Distrito Federal. Na ocasião, foram resgatados de condições análogas às de escravo 136 trabalhadores, sendo cinco imigrantes e oito crianças e adolescentes.

De acordo com análise de Maurício Krepsky Fagundes e Rafael Lopes de Castro (2021), na medida em que replicou a boa-prática do Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM) do então MTE (o GEFM foi incorporado pelo antigo Ministério da Economia – ME em 2019 e reincorporado ao MTE em 2023), em proporções até àquela época inéditas, a Operação Resgate possibilitou uma nova percepção do fenômeno das formas modernas de escravidão em pleno período da pandemia de covid-19 no Brasil.

A atuação revelou, segundo Fagundes e Castro (2021), “a diversidade de trabalhadores vítimas da escravidão contemporânea, embora sob um mesmo prisma de vulnerabilidade social, e a similaridade das situações encontradas, sobretudo pelas condições degradantes de trabalho a que estavam submetidos os trabalhadores e trabalhadoras resgatadas”.

Em 2022, reportagem de Leonardo Sakamoto para o portal Universo Online (UOL) atualizou informações sobre pessoas encontradas em situação análoga à de escravo naquele ano, sendo 2.575, segundo informações do então Ministério do Trabalho e Previdência (MTP). Com isso, o país atingiu 60.251 trabalhadores resgatados desde a criação dos GEFMs em 1995.

Os 2.575 resgatados receberam R$ 8,19 milhões em salários e verbas rescisórias. Mais de R$ 2,8 milhões foram recuperados para o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

As operações foram coordenadas pela Inspeção do Trabalho em parceria com o MPT, a PF, a Polícia Rodoviária Federal (PRF), o Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU), entre outras instituições; ou por equipes ligadas às Superintendências Regionais do Trabalho e Emprego (SRTEs) nos estados, que também contam com o apoio das polícias Civil, Militar e Ambiental.

De acordo com o auditor fiscal do trabalho Maurício Krepsky, chefe da Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo (Detrae) do MPT: “O resgate tem por finalidade fazer cessar a violação de direitos, reparar os danos causados no âmbito da relação de trabalho e promover o devido encaminhamento das vítimas para serem acolhidas pela assistência social”.

Em termos de balanço relativo ao ano de 2022, a Operação Resgate II resultou na libertação de 337 trabalhadores de condições análogas à escravidão, sendo cinco crianças e adolescentes e quatro migrantes de nacionalidade paraguaia e venezuelana. Pelo menos 149 dos resgatados foram também vítimas de tráfico de pessoas.

Ao todo, foram 462 operações no país, e Minas Gerais foi o estado com mais operações de combate ao trabalho escravo, com 117 empregadores fiscalizados e o maior número de resgatados: 1.070. Desde 2013, o estado lidera em número de flagrados em situação de escravidão contemporânea. Os estados de Goiás (49) e Bahia (32) vêm logo atrás na quantidade de fiscalizações, mas Goiás ficou em segundo lugar (271) em número de vítimas, seguido por Piauí (180), Rio Grande do Sul (156) e São Paulo (146).

O cultivo da cana-de-açúcar foi a atividade com maior número de resgatados em 2022, conforme o então Ministério do Trabalho e Previdência, com 362 vítimas. Na sequência, aparecem atividades de apoio à agricultura (273), produção de carvão vegetal (212), cultivo de alho (171), de café (168), de maçã (126), a extração e britamento de pedras (115), criação de bovinos (110), cultivo de soja (108), extração de madeira (102) e construção civil (68). Do total de resgatados, 87% estavam em atividades rurais.

Em 26 de janeiro de 2023, auditores fiscais do trabalho encontraram 32 trabalhadores em alojamentos insalubres e sem condições de habitabilidade em um canavial da zona rural de Pirangi (SP). Trabalhavam para a Colombo Agroindústria, que produz o açúcar refinado Caravelas, como divulgado em reportagem de Pedro Stropasolas para o Brasil de Fato.

Segundo inspeções realizadas pelo GEFM, da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), os trabalhadores foram aliciados no estado de Minas Gerais, na região do Triângulo Mineiro, por representantes de uma empresa que presta serviço de capina e replante de mudas para uma fazenda fornecedora da gigante do ramo açucareiro.

A produtora do Caravelas, contratante da empresa terceirizada, estava em negociação para assinar um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) com o MPT e a DPU. A terceirizada, por sua vez, já havia assinado o TAC, comprometendo-se a sanar as irregularidades trabalhistas encontradas nos locais fiscalizados e garantir o retorno dos trabalhadores aos seus locais de origem.

Os trabalhadores foram encontrados em situação de servidão por dívida e em condições degradantes de trabalho e de moradia, dois dos elementos que tipificam a escravidão contemporânea, com base no artigo 149 do Código Penal. Segundo os auditores fiscais do trabalho do Grupo Especial de Fiscalização Móvel, da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT)), as vítimas arcaram com as passagens e todos os custos da viagem de Minas Gerais até Pirangi (SP), que foi feita em duas vans superlotadas. Os trabalhadores também pagaram adiantado o aluguel das casas precárias onde ficaram alojados.

Em Pirangi, os trabalhadores foram informados de que iriam receber por diárias, e não por produção no canavial. Em virtude das chuvas na região, eles ainda permaneceram dez dias sem receber e realizar qualquer atividade, contraindo dívidas em um mercado na cidade. “Nós fizemos um cálculo muito rápido e percebemos que, da forma como eles estavam endividados, muito provavelmente não conseguiriam pagar as dívidas ainda que ao final do período do contrato”, completa.

De acordo com os auditores fiscais do trabalho, após a operação, as verbas rescisórias foram pagas aos trabalhadores resgatados, que também receberiam três parcelas de um salário mínimo cada. Todos os gastos que as vítimas tiveram também seriam ressarcidos pela terceirizada contratada pela Colombo Agroindústria.

O Brasil de Fato teve acesso ao TAC enviado à Colombo Agroindústria e informou que o MPT pediu, entre outros termos: “a capacitação das empresas prestadoras de serviço contratadas pela empresa; que a Colombo se comprometa com medidas de fiscalização a suas prestadoras de serviço, seja em relação ao alojamento, aos veículos de transporte e à oferta de água potável.”

Entre 06 e 10 de março de 2023, o MTE realizou uma ação em municípios da região de Franca e Ribeirão Preto em que flagrou mais de 200 trabalhadores em precariedade nas propriedades em Ituverava, Jeriquara, Morro Agudo e São Joaquim da Barra, em atividades relacionadas ao plantio de cana-de-açúcar, que fornecem parte da demanda das usinas sucroenergéticas da região, segundo reportagem de Pedro Lacerda para a Agência Brasil.

Segundo o então coordenador de fiscalização do trabalho rural do MTE, Fernando da Silva, todos os 200 trabalhadores estavam atuando sem registro formal de emprego, além de diversas outras irregularidades: “Em algumas frentes de trabalho, não havia nem um único trabalhador registrado, uma situação de completa informalidade”.

Os trabalhadores não dispunham de equipamentos de proteção individual ou ferramentas, trabalhavam sem qualquer instalação sanitária, abrigo ou local para refeição, além de enfrentarem problemas no fornecimento de água potável e fresca. A inspeção interditou várias frentes por risco de acidentes graves, como caminhões se deslocando pela área de plantio enquanto levavam trabalhadores em pé sobre a carga de cana-de-açúcar.

Em abril de 2023, outra ação do MTE resgatou 85 trabalhadores submetidos a condições análogas à escravidão durante operação de fiscalização da atividade de plantio de cana nos municípios de Iacanga, Morro Agudo e Reginópolis. O grupo laborava de domingo a domingo, oito ou nove horas por dia, com intervalo para o almoço inferior a 15 minutos.

Os trabalhadores, oriundos dos municípios de Oeiras no Piauí e Pindaí na Bahia, foram aliciados pelos chamados “gatos”, que os ofertou aos empregadores das propriedades em São Paulo. Chegaram à localidade em ônibus em péssimas condições de conservação e segurança, já tendo que pagar entre R$ 400,00 e R$ 500,00 pelas passagens de ida.

“Segundo relato dos auditores responsáveis pela fiscalização, os alojamentos destinados ao grupo de trabalhadores estavam em condições precárias de higiene e conservação. Não lhes eram fornecidos papel higiênico, roupa de cama ou colchões, tendo de arcar com as despesas de gás e de aluguel. Faziam suas refeições sentados no chão ou sobre camas, tendo de adquirir, além dos colchões para dormir, panelas para o preparo de alimentos, acarretando mais despesas”.

As áreas de plantio da cana pertenciam a dois plantadores, sendo um deles pessoa jurídica, e outro, pessoa física [não identificados], cuja propriedade era objeto de arrendamento. Os empregadores não forneciam almoço, refeitórios ou banheiros, obrigando os trabalhadores a satisfazerem suas necessidades no mato e a se alimentarem com o que levavam junto aos pés da cana.

Em agosto de 2023, o Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP), o MTE, o MPF, a DPU, a PF e a PRF realizaram a Operação Resgate III. No total, segundo o G1, em todo o país foram resgatados 532 trabalhadores em condições análogas à escravidão, em 222 inspeções realizadas por mais de 70 equipes de fiscalização. No município de Patrocínio Paulista (SP), 17 colhedores de laranja foram resgatados de uma fazenda não identificada na reportagem. Auditores fiscais do MPT que estiveram no local constataram que eles eram alojados de forma degradante.

Eles eram do município de Jales (SP), e foram levados para Patrocínio Paulista por um turmeiro – pessoa que atua no meio rural – para trabalhar na citricultura. Eles não tinham registro em carteira de trabalho e ganhavam por produtividade. Na colheita, os trabalhadores não tinham equipamentos de proteção individual e não havia sanitários ou locais para refeição.

Os 17 trabalhadores receberam verbas salariais, rescisórias e indenizações por dano moral individual e retornaram à Jales. O MPT revelou que o empregador assumiu os custos com transporte e alimentação para a viagem de volta. Um inquérito também foi instaurado para investigar a empresa tomadora dos serviços de colheita.

De acordo com informação publicada pela Federação dos Empregados Rurais Assalariados do Estado de São Paulo (Feraesp), além de Patrocínio Paulista, as forças tarefa de fiscalização também atuaram em Penápolis, São José dos Campos e Taubaté. Além desses, outros municípios receberam ações fiscais, em um total de oito termos de ajuste de conduta (TACs) celebrados com os contratantes.

O MPT e a DPU celebraram Termo de Ajuste de Conduta (TAC) com os empregadores, contemplando o registro retroativo do trabalhador e o pagamento de todas as verbas salariais e rescisórias devidas. O acordo previa ainda cláusulas com obrigações de manter a regularidade trabalhista, sob pena de multa. Os fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego garantiram a emissão da guia de seguro-desemprego dos trabalhadores resgatados, e eles foram removidos para um abrigo municipal pela Secretaria de Assistência Social do Município de Taubaté.

Em 17 de abril de 2024, entrou em vigor a Portaria Interministerial nº 46, que trata do aperfeiçoamento da proteção de migrantes em situação de vulnerabilidade, assinada pelos ministérios da Justiça e Segurança Pública (MJSP) e do Trabalho e Emprego (MTE). O instrumento normativo tratou da autorização de residência para vítimas de tráfico de pessoas, de trabalho escravo ou de violação de direito agravada por sua condição migratória, como divulgou a página Agência Gov (2024).

A coordenadora-geral de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e Contrabando de Migrantes da Secretaria Nacional de Justiça (Senajus), Marina Bernardes, ressaltou para o Agência Gov que a reformulação foi proposta com o objetivo de fortalecer a proteção de migrantes vítimas dessas graves violações:

“O trabalho de reformulação foi uma construção coletiva e envolveu as instituições que podem requerer a autorização de residência, com a anuência do imigrante. O objetivo foi agregar ao texto os melhores padrões de proteção e a expertise de cada uma dessas instituições no tratamento dos casos”.

O novo instrumento normativo substituiu a Portaria nº 87, de 23 de março de 2020, produzindo as seguintes mudanças:

Mudanças e permanências no novo instrumento normativo que substituiu a Portaria nº 87, de 23 de março de 2020. Fonte: Agência Gov (2024).

Durante julho e agosto de 2024 ocorreu a Operação Resgate IV em 15 estados e no DF, que retirou 593 trabalhadores de condições de trabalho escravo contemporâneo. Esse número é 11,65% maior do que o de resgatados na operação realizada em 2023 (532). Ao todo, mais de 23 equipes de fiscalização participaram de 130 inspeções.

A ação ocorreu por meio de instituições como: Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério Público Federal (MPF), Defensoria Pública da União (DPU), Polícia Federal (PF) e Polícia Rodoviária Federal (PRF).

Em 2024, houve resgates em 10 estados. Aqueles com mais pessoas resgatadas foram Minas Gerais (291), São Paulo (83), Distrito Federal (23) e Mato Grosso do Sul (13). Quase 72% do total trabalhavam na agropecuária, outros 17% na indústria, e cerca de 11% no comércio e serviços.

Entre as atividades econômicas com maior número de vítimas na área rural estão o cultivo da cebola (141), da horticultura (82), de café (76), de alho (59), e de batata e cebola (84). Na época, devido ao fato de algumas equipes estarem em campo, os dados totais não foram consolidados em relação às ações fiscais.

Gustavo Ferroni, coordenador de Justiça Rural da Oxfam Brasil, afirmou que o trabalho no campo é “herdeiro direto” da lógica de servidão que caracteriza a escravidão, e constitui uma “máquina de alimentar desigualdades”. Ele lembra que a mão de obra rural do país só entrou no escopo das leis trabalhistas a partir de 1988, com a promulgação da Constituição.

O combate ao trabalho análogo à escravidão conta com a possibilidade de denúncias feitas de forma remota e sigilosa no Sistema Ipê, mantido pelo MTE, e os dados oficiais das ações de combate ao trabalho análogo à escravidão no Brasil podem ser acessados no Radar da Inspeção do Trabalho, Radar SIT.

 

Atualizado em Setembro de 2024.

Cronologia

Década de 1940: O Artigo 149 do Decreto Lei nº 2.848 de 07 de dezembro de 1940, do Código Penal Brasileiro, prevê punição para quem reduzir alguém à condição análoga à de escravo: reclusão, de 2 a oito anos.

28 de junho de 1995: Criado o Grupo Executivo de Repressão ao Trabalho Forçado (Gertraf) por representantes de cinco ministérios: Agricultura, Indústria e Comércio, Justiça, Meio Ambiente e Trabalho, incluindo a Equipe Móvel de Fiscalização.

2003: O Ministério do Trabalho e Emprego cria o Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores à condição análoga à escravidão, popularmente conhecido como “Lista Suja”.

11 de dezembro de 2003: A Lei n° 10 803 altera o artigo 149 do Decreto-lei n° 2848 de 07 de dezembro de 1940, e reconceitua o trabalho escravo.

30 de abril de 2008: Um grupo de integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) bloqueia durante horas o acesso de caminhões à Usina Santa Helena, do grupo Cosan, no município de Rio das Pedras, a 160 quilômetros da cidade de São Paulo.

2008: Anistia Internacional (AI) divulga em Londres um relatório apontando que, até março de 2008, houve o resgate de 288 pessoas submetidas a trabalhos forçados em seis plantações paulistas de cana-de-açúcar. A ação de combate é de autoria de procuradores da Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho do estado de São Paulo (Sert/SP).

19 e 23 de dezembro de 2017: Em uma ação realizada em um laranjal em Mogi Guaçu, na região de Campinas, a Delegacia Regional do Trabalho em São Paulo (DRT-SP) encontra crianças de 12 anos na colheita de laranjas.

Junho de 2009: Reportagem d’O Estado de São Paulo divulga que São Paulo responde por 80% da produção de laranja no Brasil.

2013: Fiscalização do Ministério Público do Trabalho (MPT) constata que 26 empregados da empresa Citrosuco Agroindústria S.A sofrem restrições à liberdade de ir e vir e estão sujeitos a condições degradantes de trabalho e moradia.

11 de maio de 2016: Portaria Interministerial do Ministro de Estado do Trabalho e Previdência Social (MTPS) e do Ministério das Mulheres, Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos (MMIRDH) nº 4 disciplina a chamada “lista suja” do trabalho escravo.

2017: Governo interino de Michel Temer altera regulamentação do cadastro de empresas. Sua divulgação na lista suja do trabalho escravo passa a depender de uma “determinação expressa do ministro do Trabalho”.

23 de março de 2017: O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) divulga 85 nomes de empregadores na “lista suja” do trabalho escravo, entre eles a Citrosuco. Após duas horas da publicação, porém, a empresa tem seu nome retirado do cadastro pelo MTE, junto a outros 16 nomes de pessoas físicas e jurídicas.

24 de abril de 2017: A Citrosuco consegue liminar concedida pelo juiz do Trabalho Sandro Valério Bodo, de Botucatu, para que seu nome não seja divulgado na “lista suja” do trabalho escravo pelo MTE.

17 de dezembro de 2018: O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT 15- Campinas) derruba liminar anterior e a Citrosuco entra novamente no cadastro, pelo MTE, da “lista suja” do trabalho escravo.

Fevereiro de 2020: Repórter Brasil flagra, na Fazenda São Bento, no município de Lucianópolis, trabalhadores do empregador Valmi Blanco Machado atuando sem registro e recebendo menos do que o salário-mínimo na colheita da laranja.

08 de dezembro de 2020: Operação da Auditoria Fiscal do Trabalho na fazenda São Bento constata 18 trabalhadores trabalhando sem registro e sem remuneração na fazenda, fornecedora de laranjas para a Citrosuco.

2021: Realizada a primeira edição da Operação Resgate, com 128 fiscalizações distribuídas em 22 estados brasileiros e no Distrito Federal.

26 de janeiro de 2023: Auditores fiscais do trabalho encontram 32 trabalhadores em alojamentos insalubres e sem condições de habitabilidade em um canavial da zona rural de Pirangi (SP), a serviço da Colombo Agroindústria, que produz o açúcar refinado Caravelas.

06 a 10 de março de 2023: O MTE realiza ação em municípios da região de Franca e Ribeirão Preto, flagrando mais de 200 trabalhadores em precariedade nas propriedades em Ituverava, Jeriquara, Morro Agudo e São Joaquim da Barra em atividades relacionadas ao plantio de cana-de-açúcar, que fornecem parte da demanda das usinas sucroenergéticas da região.

Abril de 2023: Outra ação do MTE resgata 85 trabalhadores submetidos a condições análogas à escravidão durante operação fiscal ocorrida na atividade de plantio de cana nos municípios de Iacanga, Morro Agudo e Reginópolis.

Agosto de 2023: O Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP), junto com o MTE, o Ministério Público Federal (MPF), a Defensoria Pública da União (DPU), da Polícia Federal (PF) e da Polícia Rodoviária Federal (PRF) realiza Operação Resgate III. São resgatados 532 trabalhadores em condições análogas à escravidão em 222 inspeções realizadas por mais de 70 equipes de fiscalização.

17 de abril de 2024: Entra em vigor a Portaria Interministerial n 46, que trata do aperfeiçoamento da proteção de migrantes em situação de vulnerabilidade, e é assinada pelos ministérios da Justiça e Segurança Pública (MJSP) e do Trabalho e Emprego (MTE).

15 de julho de 2024: Relatório da Oxfan Brasil evidencia que mulheres e pessoas negras são as maiores vítimas das consequências da precarização no trabalho rural no Brasil.

Julho e agosto de 2024: Operação Resgate IV em 15 estados e no DF retira 593 trabalhadores de condições de trabalho escravo contemporâneo. A ação ocorre por meio de instituições como: Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério Público Federal (MPF), Defensoria Pública da União (DPU), Polícia Federal (PF) e Polícia Rodoviária Federal (PRF).

 

 

Fontes

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EM agosto, força-tarefa resgata 593 pessoas em condições análogas à escravidão. Agência Gov, 28 set. 2024. Disponível em: https://bit.ly/3Y0SMjm. Acesso em: 26 set. 2024.

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