Povo Arara da TI Cachoeira Seca luta por retirada de não indígenas do seu território e por fim de conflitos com os colonos

UF: PA

Município Atingido: Placas (PA)

Outros Municípios: Altamira (PA), Rurópolis (PA), Uruará (PA)

População: Povos indígenas

Atividades Geradoras do Conflito: Atuação de entidades governamentais, Barragens e hidrelétricas, Hidrovias, rodovias, ferrovias, complexos/terminais portuários e aeroportos, Madeireiras, Políticas públicas e legislação ambiental

Impactos Socioambientais: Alteração no ciclo reprodutivo da fauna, Alteração no regime tradicional de uso e ocupação do território, Desmatamento e/ou queimada, Falta / irregularidade na demarcação de território tradicional, Invasão / dano a área protegida ou unidade de conservação

Danos à Saúde: Piora na qualidade de vida, Violência – ameaça, Violência – assassinato, Violência – coação física

Síntese

O povo Arara da TI Cachoeira Seca possui uma trajetória histórica caracterizada pela fuga e pelo isolamento durante um longo período, devido às pressões das frentes de colonização e aos projetos de desenvolvimento em seu território, em especial a rodovia BR-230, conhecida como Transamazônica. Por esse motivo, a aproximação da Fundação Nacional do Índio (Funai) [a partir de 2023 denominada Fundação Nacional dos Povos Indígenas, mantendo a sigla] com essa etnia pode ser considerada recente, datando de 1987. Os Arara utilizam seu território principalmente para a coleta de castanhas, babaçu, caça e outros insumos essenciais para sua subsistência. A TI também conta com a presença do povo Xipaya em três aldeias (Kujubim, Cupi e Yarumê), mas estes ainda seguem em busca de reconhecimento pelo órgão indigenista federal.

De acordo com trabalhos como o de Kerlley dos Santos (2017), do Centro de Trabalho Indigenista (CTI), Instituto Socioambiental (ISA), dentre outros, desde a construção da rodovia Transamazônica, o território desse povo tem sido alvo de ataques de madeireiros, grileiros e outros invasores. Além disso, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) regularizou, por volta de 1970, o assentamento da Cooperativa Tritícola Serrana Ltda (Cotrijuí), que incentivou a ocupação de não indígenas no território, os quais se instalaram na região em busca de melhores condições de vida. A Funai já havia iniciado o processo administrativo para demarcação da TI Cachoeira Seca em 1970, localizada ao norte da região conhecida como Terra do Meio, entre os municípios de Placas, Uruará e Altamira, no Pará.

Enquanto a TI Cachoeira Seca não era demarcada, a invasão ao território dos Arara aumentava cada vez mais. Por isso, nos últimos anos, a TI esteve sempre entre as terras indígenas mais desmatadas do Brasil, frequentemente assumindo a primeira posição, de acordo com o monitoramento realizado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). A exploração de madeira, além de promover a degradação ambiental, impede que os Arara percorram seu território para exercer suas atividades tradicionais.

Além dos conflitos com grileiros, madeireiros, fazendeiros e colonos, os Arara também foram impactados pela construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. A TI foi homologada pela Presidência da República durante a gestão de Dilma Rousseff, em 2016, como uma condicionante de Belo Monte. Entretanto, os conflitos se intensificaram após a demarcação.

A luta do povo Arara atualmente é para que o governo federal promova a retirada dos não indígenas do seu território, combata as consequências da liberação do garimpo, especialmente a partir de 2019, para que o Ibama intensifique a fiscalização das terras, a apreensão das madeiras retiradas ilegalmente e a destruição das máquinas usadas na atividade. O povo também sofreu a perda de uma de suas lideranças, Tymbektodem Arara, conhecido como Tymbek, encontrado morto no rio Iriri em outubro de 2023.

 

Contexto Ampliado

A bacia do rio Xingu possui uma área de 51 milhões de hectares administrada por mais de 30 municípios dos estados do Mato Grosso e Pará. Além disso, a região abriga os maiores corredores de áreas protegidas do mundo, que se estendem por 28 milhões de hectares. No total, são 20 Terras Indígenas (TIs) e 10 Unidades de Conservação (UCs). O corredor do Xingu possui uma enorme diversidade de animais, plantas e processos ecológicos. O território é ocupado por centenas de famílias ribeirinhas e 26 povos indígenas, e inclui uma região denominada Terra do Meio, de acordo com o Instituto Socioambiental (ISA).

Bacia do Rio Xingu. Fonte: Wikipédia

A Terra do Meio, segundo o ISA (2015), representa 30% do corredor do Xingu. Até o século XVIII, esse local era utilizado tanto para circulação quanto para ocupação de diversos povos indígenas, como os Arara, Juruna, Kayapó, Araweté, Asurini, Xipaya, Kuruaya e Parakanã. Após esse período, é possível encontrar relatos de ocupações não indígenas na localidade, como as missões religiosas e expedições para a coleta de especiarias , pau-cravo e cacau.

A partir do século XVIII, a população não indígena passou a povoar a região, atraída pela borracha. Com a queda da exploração dos seringais, as famílias que ali se estabeleceram conquistaram uma maior autonomia para diversificar suas atividades, surgindo então o modo de vida dos autodenominados “beiradeiros”, também conhecidos como ribeirinhos. Ainda de acordo com o ISA, o povo Arara, também residente da Terra do Meio, é formado por subgrupos que viviam entre os rios Tapajós e Xingu. Da família linguística Karib, do subgrupo Arara com os Ikpeng (população 459), vivem no Parque Indígena do Xingu (PIX) e possuem duas línguas extintas: apiacá do Tocantins e yaruma.

Esses subgrupos eram ligados através de redes de caça e festas na época de seca. Provavelmente originários das áreas do rio Xingu, os Arara mudaram-se para o norte da bacia em meados do século XIX, quando os Kayapó foram expulsos do vale do rio Araguaia pelas frentes de colonização e migraram para o médio Xingu. Acossados entre os Kayapó e os brancos, os Arara seguiram para a região da Volta Grande do rio Xingu, concentrando-se na margem esquerda entre a foz do afluente Iriri e Altamira, ocupando a região divisora de águas entre o Xingu e o Tapajós.

Segundo a pesquisadora Kerlley Diane Silva dos Santos (2017), o contato dos Arara com a sociedade brasileira teve seu primeiro registro em 1850, com os beiradeiros que residiam entre os rios Xingu e Iriri. Os relatos diziam que era uma relação pacífica sem conflitos ou ataques. Tanto que, em 1861, um grupo Arara permaneceu dez dias entre os seringueiros abaixo da Cachoeira Grande do Iriri.

Entretanto, entre os anos de 1889 e 1894 os Arara começaram a ser perseguidos por um grupo de seringueiros na região entre o Xingu e o Iriri. Segundo o ISA, a partir desse período muitos subgrupos de Arara foram forçados a novas migrações devido ao ataque de outros grupos indígenas, como Kayapó e Juruna, e às perseguições de seringueiros, caçadores e colonos.

A pesquisadora Kerlley Santos afirma em seus estudos que o início das obras da rodovia Transamazônica, no final da década de 1960, configurou-se como o período de intensificação dos conflitos no território tradicionalmente ocupado pelos Arara.

Os incentivos do Estado brasileiro para a colonização da Amazônia impulsionaram o deslocamento de inúmeras famílias em busca de novas oportunidades de trabalho e de moradia. Em geral, de origem camponesa e alijadas de terras ou recursos básicos para subsistência, destacam-se, entre elas, os migrantes do Nordeste, cujas famílias passaram a se instalar nas terras tradicionais do povo Arara. Com a colonização da região, iniciou-se um processo de perseguição aos povos indígenas, inclusive pela Funai, que, diferente da sua atual política de respeito ao isolamento voluntário, buscou ativamente fazer contato com os Arara. Por esse motivo, os indígenas criaram uma forte resistência aos invasores das suas terras tradicionais, tratando-os como inimigos.

Nesse período, os ataques dos Arara foram manchetes dos jornais, pois as respostas violentas às pressões socioambientais, demográficas e territoriais que sofriam espalharam o terror entre os colonos da região de Altamira. Ainda de acordo com a pesquisadora Kerlley Santos (2017), inspirada nas ideias do antropólogo Márnio Teixeira-Pinto, o processo de “pacificação” dos Arara (um eufemismo usado na época para descrever as perseguições, expropriações territoriais, confinamento e até massacres sofridos pelos povos indígenas no Brasil) era um processo considerado estratégico pelo Estado brasileiro devido ao projeto de intensificação da colonização da região amazônica. Entretanto, os índios resistiram arduamente a todas as tentativas de “contato” da Funai.

De 1970 até 1975 foram organizadas mais de oito frentes de “contato” com o povo Arara, que resistiu, de acordo com o autor Rubens Valente (2017), pois não desejava o contato após sofrer diversas violências ao longo dos anos, como inclusive a separação da etnia pela rodovia Transamazônica (BR-230).

Segundo a pesquisadora Kerlley Santos (2017), o subgrupo Arara da Cachoeira Seca estava afastado dos demais devido à desestruturação de seu antigo território pela construção da rodovia, que o cortou ao meio. Esse subgrupo, ao tentar se reaproximar dos demais, foi afastado por barreiras formadas pela ocupação não indígena que os impedia de encontrar os outros subgrupos. A partir desse contexto, começou um processo de fuga e resistência. A partir de 1976, os Arara passaram a reagir de forma mais violenta às tentativas de incursões dos pesquisadores da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM). Naquele ano, eles faziam pesquisas na região de Altamira em uma picada aberta na direção do rio Iriri, no Km 100 da Transamazônica, mas ignoraram os sinais que os indígenas deixaram no caminho, como restos de animais. Assim, os Arara reagiram para impedir a entrada dos pesquisadores no território, chegando inclusive a decapitá-los.

Além da divisão do território do povo Arara, a construção da Transamazônica trouxe uma nova forma de ocupação colonial em Cachoeira Seca, propiciando a exploração madeireira e a pecuária na região hoje pertencente aos municípios de Altamira, Placas, Rurópolis e Uruará. Segundo Rafael Nakamura, para o Boletim Povos Isolados da Amazônia (2018), os moradores não indígenas eram cooptados por grileiros para registro de sua posse em cartórios da região para que, em seguida, se fizesse a extração da madeira de forma legalizada. Segundo o jornalista Rubens Valente (2017), além da construção da rodovia, em meados da década de 1970, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), após a concessão do Estado brasileiro, iniciou um processo de assentamento por meio de um contrato assinado com a Cooperativa Tritícola Serrana Ltda (Cotrijuí), em 1977, no qual ela deveria assentar famílias de colonos em até cinco anos em uma área de 396 mil hectares próxima à Transamazônica. A Cotrijuí anunciou que transferiu cerca de duas mil famílias para o local. De acordo com reportagem do portal Ambiente Brasil em 07 de abril de 2007, o Incra afirmou não ter conhecimento da existência do povo na localidade.

Somente em 02 de fevereiro de 1981 a Funai conseguiu, enfim, estabelecer contato com os Arara; entretanto, o contato foi realizado com um subgrupo situado ao sul da Transamazônica e outro ao norte da rodovia, que são atualmente residentes da TI Arara. De acordo com a pesquisadora Kerlley Santos (2017), foi nesse período que a Madeireira Madernach Indústria, Comércio e Exportação de Madeira – mais conhecida pela sua razão social, Madeireira Bannach Ltda – iniciou a construção da Transiriri, estrada vicinal da BR-230 com destino à Vila Maribel, na margem esquerda do rio Iriri, rodovia essa que atravessa o território da TI Cachoeira Seca e possui mais de 200 km de extensão, de acordo com dados da Associação Kowit (Associação Arara).

A construção da rodovia foi autorizada pelo Incra em 1984, pois, de acordo com o discurso oficial da época, a construção da Transiriri iria contribuir para a integração do assentamento ao perímetro urbano de Vila Maribel. Entretanto, o objetivo principal da madeireira era facilitar o acesso às terras griladas por ela, localizadas na outra margem do rio.

A partir da construção da Transiriri, intensificou-se ainda mais o processo de ocupação na região, ou seja, a instalação de população migrante, incentivada pelos políticos locais, que aproveitavam os ramais (estradas rústicas) que a Madeireira Bannach utilizava para escoar mogno e abriam lotes no território do povo Arara. Após as ocupações das áreas, o Incra regularizava os lotes comprados pelas famílias. Por esse motivo, houve um grande fluxo migratório para a localidade, ocupando o local na esperança de que seus lotes fossem regularizados. Foi nesse período que a área na qual a TI seria demarcada foi alvo de grileiros e madeireiros, havendo uma multiplicação dos ramais madeireiros nos anos que se seguiram.

Enquanto esse processo de ocupação da região se intensificava, a Funai continuava com as tentativas de aproximação com o povo Arara da região da Cachoeira Seca. Ainda segundo a pesquisadora Kerlley Santos (2017), em 1985 ocorreram as primeiras tentativas do governo federal de demarcar o território que viria a ser a TI Cachoeira Seca, com a interdição de 1.060.400 hectares ao sul da Transamazônica, com objetivo de promover a atração dos Arara que ali perambulavam.

O primeiro contato ocorreu em janeiro de 1987, quando os indígenas coletaram presentes dos funcionários da Funai. O contato foi breve; entretanto, após quatro dias, os indígenas retornaram ao acampamento com presentes aos representantes da Fundação. Após esse período, não houve mais contatos. Em 02 de julho de 1987, houve seis contatos seguidos e, após dois meses, os contatos foram definitivos.

No dia 24 de maio de 1988, ainda segundo a pesquisadora Kerlley Santos (2017), a Funai expediu a Portaria nº 584 para a formação de um Grupo de Trabalho (GT) para identificar os limites da TI Cachoeira Seca, devido à intensa invasão dos grupos madeireiros na região. Entretanto, devido à falta de recursos, esse GT foi dissolvido.

Em notícia publicada no jornal O Liberal, em 03 de dezembro de 1988, o deputado Nicias Ribeiro (do Partido dos Trabalhadores – PT) denunciou a ação ilegal dos madeireiros na terra que se pretendia demarcar como território tradicional dos Arara. Segundo ele, os madeireiros estavam retirando madeira nobre do território indígena. O então superintendente regional da Funai, Salomão Santos, informou que a instituição já estava sabendo do ocorrido e estava organizando ações para frear a extração ilegal de madeira na TI.

De acordo com a pesquisadora Kerlley Santos (2017), após três meses da criação do primeiro GT, a Funai expediu a Portaria nº 1.528, no 21 de dezembro de 1988, para constituição de um novo grupo de trabalho; entretanto, o recurso somente foi disponibilizado em 1989. Wilma Marques Leitão, antropóloga da 4ª Superintendência Executiva Regional da Funai (4ª Suer), assumiu a coordenação do GT. Além dela, compunham a equipe o engenheiro agrônomo Antônio França Rebouças Júnior e o sertanista Afonso Alves da Cruz.

O GT realizou seus trabalhos entre 20 de maio e 6 de junho de 1989. A pesquisa foi dividida em duas etapas: contato com a comunidade e levantamento fundiário na margem esquerda do rio Iriri (limite sul da área), e viagem pela Transamazônica para levantamento fundiário no limite norte da área. Entretanto, a segunda etapa nunca ocorreu devido à falta de orçamento.

Ainda de acordo com a pesquisadora Kerlley Santos, em 30 de abril de 1990, a equipe apresentou um laudo antropológico incompleto, pois não havia o levantamento fundiário dos projetos de colonização do Incra ao longo da Transamazônica. Segundo ela, o laudo chama atenção pelo conteúdo deficitário admitido pelo estudo, já que os trabalhos de campo não tinham sido finalizados, e pela falta de participação do próprio grupo Arara da Cachoeira Seca. Essa situação ocorreu porque os funcionários da Funai não falavam a língua dos Arara e nenhum indígena adulto falava português.

Além disso, o processo de demarcação de terras indígenas da época, muito influenciado pela política indigenista da Ditadura Militar, ainda não previa a participação dos povos indígenas no processo. Esse direito só seria regulamentado pelo § 3º do decreto 22 de 04 de fevereiro de 1991, que dispõe sobre o processo administrativo de demarcação das terras indígenas e dá outras providências, assinado pelo então presidente Fernando Collor de Mello.

O laudo propôs uma delimitação de 686.501 hectares descontínua em relação à TI Arara, pois nos estudos da Wilma Leitão constava que os povos da TI Arara e do território Cachoeira Seca eram de etnias diferentes: havia os Arara e os “Imaramã”. Entretanto, mesmo com esse entendimento, a equipe técnica frisou no estudo a necessidade de interditar um corredor que conectava as duas TI.

No laudo antropológico também havia menções à atuação das madeireiras no território da Cachoeira Seca. No estudo, a Madeireira Bannach é apontada como principal responsável pela devastação da área. A antropóloga descreveu inclusive a estrutura da empresa, composta por serraria, posto de gasolina, pista de pouso e estradas vicinais para escoamento da madeira intensamente explorada na área, em especial, o mogno.

Em notícia publicada no jornal O Liberal, no dia 12 de março de 1991, o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou uma ação de reintegração de posse contra a Madeireira Bannach (Processo no 0000006-88.1991.4.01.3902, número antigo: 91.00.00456-1), apontando o empreendimento como ameaça ao território indígena. No dia 22 do mesmo mês, o juiz Daniel Paes Ribeiro, da Justiça Federal, deferiu liminar determinando a saída da madeireira do local e, em 2 de abril, emitiu um mandado de reintegração de posse em favor do órgão indigenista (segundo a Constituição de 1988, os povos indígenas são considerados apenas usufrutuários das terras indígenas, sendo a propriedade uma prerrogativa do Estado representado pela Secretaria de Patrimônio da União – SPU).

Entre os dias 14 e 19 de abril de 1991, dois oficiais de Justiça acompanhados da Polícia Federal (PF) e do então presidente da Funai, Carlos Amaury, deslocaram-se até a Madeireira Bannach para cumprir a ordem de reintegração de posse. Entretanto, segundo Carlos Amaury em entrevista para o jornal O Liberal em 28 de maio de 1991, a empresa não aceitou a reintegração e somente paralisou as atividades. Nessa mesma notícia, o presidente da Funai esclareceu ao jornal que o processo de reintegração de posse dizia respeito somente à empresa Bannach, e não aos colonos que ocupavam a área. Na versão do jornal, , os políticos da região de Altamira temiam que o processo de reintegração de posse gerasse novo conflito social.

A pesquisadora Kerlley Santos (2017) explica em seus estudos que a Madeireira Bannach utilizava a causa dos colonos como pretexto para manter-se na região. Segundo ela, as justificavas da empresa para permanecer no território eram os empregos gerados para os inúmeros colonos e a renda produzida por ela, da qual diversas famílias dependiam indiretamente. Com base nesse argumento, em maio de 1991, o juiz reconsiderou o caráter imediato da retirada da empresa do território.

Santos também afirma que, como a madeireira não tinha interesse em retirar-se do local, ela fomentava o conflito entre os colonos e indígenas. A pesquisadora explica que os funcionários da madeireira diziam aos colonos que o motivo da sua saída estava relacionado somente com os Arara. Ainda segundo Santos, a proposta da antropóloga Wilma Leitão em relação à área da TI Cachoeira Seca foi revista pela Comissão Especial de Análise (CEA) da Funai em duas sessões. A primeira, ocorrida em 5 de setembro de 1991, aprovou a redução da área da TI para 78.000 hectares.

Ainda segundo a pesquisadora, a empresa possuía tanta influência política na região que, em 25 de fevereiro de 1992, por meio da lei municipal nª 388, a Câmara dos Vereadores de Altamira elevou o parque de processamento da madeireira, instalado na margem esquerda do rio Iriri e dentro da TI Cachoeira Seca, à categoria de vila do município, criando o Distrito Porto Bannach. A Funai denunciou a criação da lei municipal. Entretanto, ela não foi revogada.

A segunda reunião realizada pela CEA sobre o laudo antropológico de Wilma Leitão ocorreu em 24 de abril de 1992, na qual a comissão decidiu reduzir o limite norte e aumentar a área ao leste do perímetro indicado pelo estudo, conectando as duas TI (Arara e Cachoeira Seca). A justificativa utilizada pela CEA foi a tentativa de evitar conflitos entre os colonos e reaproximar os dois subgrupos, já que naquele período as tensões entre colonos e indígenas estavam elevadas. O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) denunciou em 22 de janeiro de 1993 a atuação das madeireiras no território Arara, principalmente da Madeireira Bannach, que retirava mogno da região de forma irregular, fomentando o conflito.

Após as modificações realizadas pela CEA, o então ministro da Justiça Mauricio Corrêa declarou, por meio da Portaria n° 26/1993, a TI Cachoeira Seca. Essa portaria foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) em 22 de janeiro de 1993 com 760.000 hectares conectados à TI Arara, com aproximadamente 570 quilômetros de área. O ministro também determinou que a Funai iniciasse a demarcação administrativa da reserva proibindo o ingresso, trânsito e permanência de pessoas desconhecidas na TI.

No entanto, o traçado da terra indígena não agradou às empresas e incomodou alguns órgãos municipais locais. Segundo notícia publicada no Jornal do Brasil em 28 de janeiro de 1993, os prefeitos de Altamira, Rurópolis e Uruará alertaram o ministro Mauricio Corrêa da possibilidade de conflito armado entre colonos e indígenas. O prefeito de Altamira Mauricio Bastazini  (Partido dos Trabalhadores- PT) revelou que existiam mais de duas mil famílias na área regularizada pelo Incra. Na mesma notícia, a Funai informou que estava disposta a negociar com o Incra o destino desses colonos para encontrarem as melhores soluções possíveis.

Outras entidades que se pronunciaram foram do município de Uruará. A Prefeitura Municipal, a Câmara de Vereadores, a Associação dos Produtores de Cacau e Pimenta do Reino, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais e o Sindicato Rural encaminharam um documento para o Ministério da Justiça (MJ) e o Exército alegando que a terra indígena causaria inúmeros problemas sociais ao município, principalmente, relacionados aos colonos que residiam na área.

No entanto, segundo a pesquisadora Kerlley Santos (2017), o interesse desses grupos era manter a continuidade das atividades de empresas madeireiras na região, como a da Madeireira Bannach. Os grupos que fizeram o documento para o Ministério da Justiça e para o Exército entraram com mandados de segurança contra o processo administrativo de reconhecimento da TI. Além disso, a prefeitura de Uruará enviou representação ao procurador geral da República, Aristides Junqueira Alvarenga, por meio do procedimento administrativo no 08100.000342/93-31, questionando as delimitações da TI determinadas pela Funai.

De acordo com notícia do Correio Brasiliense publicada em 09 de fevereiro de 1993, após dois encontros com os prefeitos de Altamira, Medicilândia, Rurópolis e Uruará, o ministro Mauricio Corrêa determinou que a Funai revisasse os limites da área da TI Cachoeira Seca. O motivo da revisão era excluir as áreas dos colonos que possuíam suas terras regularizadas pelo Incra. Segundo o ministro, a revisão era para evitar conflitos entre indígenas e colonos e para que a União não tivesse problemas com processos de indenizações no futuro, desconsiderando, assim, tanto a análise técnica do GT quanto a legislação indigenista vigente, especialmente a Constituição Federal de 1988 e o decreto 22/1991.

Em pronunciamento, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) informaram ao jornal A Crítica, em 14 de fevereiro de 1993, que a solicitação do Ministro da Justiça não agradou às comunidades indígenas. De acordo com as entidades, elas estavam organizando documentos para denunciar o fato ao então presidente Itamar Franco (Partido da Reconstrução Nacional -PRN), pois trava-se de decisão inconstitucional.

Em 31 de março de 1993, o procurador da República e coordenador de Defesa de Direitos e Interesses Indígenas do MPF, Wagner Gonçalves, visitou o território Cachoeira Seca devido a representação contra a declaração da TI pelos prefeitos de Altamira, Medicilândia, Rurópolis e Uruará ao procurador geral da República, Aristides Junqueira Alvarenga. Segundo Santos, nesse período, o antropólogo assessor do MPF, Germano Crisóstomo Frazão, produziu um parecer sobre a portaria nº 26, de 22 de abril de 1993, alegando que o estudo da Funai não continha justificativas para ampliar a área da TI Cachoeira Seca e nem para preservar o corredor entre as duas TIs.

Segundo Germano, esse motivo era inexistente pelo fato de os dois grupos indígenas não serem reconhecidos pelo Estado como da mesma etnia. O parecer de Germano C. Frazão embasou a atuação do procurador Wagner Gonçalves, que concluiu em 10 de julho pela ilegalidade da portaria nº 26 da Funai de 1993.

Em 19 de julho de 1993, Guilherme Henrique Magaldi Netto, consultor jurídico do Ministério da Justiça, solicitou que a Funai se manifestasse de forma conclusiva diante dos questionamentos do procurador federal.

Ainda de acordo com Kerlley Santos, diante de tais questionamentos, em 22 de abril de 1994, o então chefe da Coordenação de Antropologia da Funai, Alceu Cotia Mariz, apresentou parecer alegando que a instituição não tinha dúvidas quanto à importância da conexão das duas TIs e da área demarcada. Segundo Mariz, os estudos da região já haviam provado a necessidade dessas duas medidas. Entretanto, o antropólogo sugeriu a produção de um novo laudo, caso fosse necessário.

O antropólogo indicado para elaborar o novo laudo sobre os Arara foi Márnio Teixeira-Pinto, por meio da Portaria no 428/PRES, de 27 de abril de 1994. O laudo antropológico do pesquisador foi apresentado no dia 23 de dezembro do mesmo ano.

O estudo de Teixeira-Pinto, de acordo com Santos, desmistificou o entendimento de que os Arara da TI Arara e da TI Cachoeira Seca seriam de grupos étnicos diferentes. Segundo Teixeira-Pinto, esse entendimento equivocado ocorreu porque Wilma Leitão compreendeu a palavra “imaramã” como um etnônimo, por meio do qual os indígenas da Cachoeira Seca se diferenciariam daqueles da TI Arara. Entretanto, Teixeira-Pinto descobriu que a palavra imaramã não existia no vocabulário dos Arara. Existe, entretanto, o imarãmãɳ, que significa família ou grupo familiar.

Outro equívoco do primeiro laudo antropológico que gerou questionamentos do procurador da República e do antropólogo assessor do MPF foi a separação e o isolamento do grupo Arara. Teixeira-Pinto, em seu estudo, também esclareceu esse ponto. Ele explicou que a separação dos grupos ocorreu não devido a um isolamento voluntário, mas devido à tentativa de contato dos colonos e dos projetos desenvolvimentistas da região, que forçaram o grupo a um deslocamento.

Teixeira-Pinto concluiu em seu parecer que não havia dúvidas quanto ao território do grupo Arara na Cachoeira Seca, e que os indígenas desse grupo são de fato um subgrupo do povo Arara. Além disso, a área demarcada pela Portaria Declaratória nº 26/1993 correspondia a algumas das áreas tradicionais do grupo em questão.

Segundo Santos, os grupos que estavam insatisfeitos com o processo de demarcação entraram com cinco mandados de segurança em 1996. Entretanto, somente duas ações obtiveram sucesso no Superior Tribunal de Justiça (STJ), alegando uma suposta incoerência na demarcação da terra indígena, principalmente na alteração dos limites.

Os juízes do STJ concederam, em 10 de dezembro de 1997, o mandado de segurança e anularam a portaria n° 26/1993. A concessão baseou-se na fragilidade dos estudos que subsidiaram o aumento da área de 686.501 hectares para os 760.000 hectares, e para garantir a participação dos grupos envolvidos no processo de demarcação.

Enquanto o processo de demarcação da TI Cachoeira Seca não era concluído, as invasões por grileiros e madeireiros continuavam, e os conflitos entre os indígenas, colonos e madeiros também se acirravam. No dia 19 de maio de 1999, os Arara da TI detiveram oito homens em seu território. Segundo notícia publicada no jornal O Liberal em 21 de maio de 1999, esses homens estavam fazendo uma picada na mata para abertura de uma estrada dentro da região da Cachoeira Seca para escoamento de madeira ilegal.

Outro episódio de conflito envolvendo o povo Arara ocorreu em 24 de maio de 2000. Na época, o Cimi denunciou o assassinato de um Arara na região de Altamira. Segundo notícia do jornal O Liberal, integrantes do Cimi e indígenas Arara foram atacados com armas de fogo por pescadores e madeireiros quando chegavam de barco em uma região denominada Dois Irmãos. Além desse ataque, o Cimi informou que o corpo do indígena Karaya foi encontrado na mata após alguns dias desaparecido, sendo um pescador o principal suspeito. A pesquisadora Kerlley Santos (2017) aponta que, a partir de 2001, acelerou-se o processo de invasão no interior do território da TI. Nesse período, surgiram as grandes fazendas mediante a concentração de lotes e a grilagem, com assédio aos pequenos posseiros.

No dia 16 de junho de 2004, uma delegação do povo Arara foi a Brasília entregar ao assessor do ministro da Justiça, Cláudio Luiz Beirão, um abaixo-assinado com 23 mil assinaturas coletadas durante campanha pela demarcação realizada em dezembro de 2003. Ainda segundo notícia publicada pelo Cimi no dia 17 de junho de 2004, a delegação também se reuniu com Artur Mendes, do Departamento de Assuntos Fundiários da Funai; Rolf Hackbart, então presidente do Incra; e parlamentares e procuradores da 6ª Câmara de Conciliação e Revisão (6ªCCR) do Ministério Público Federal (MPF), expondo preocupação com a demora da demarcação e com o aumento do número de invasores.

A notícia também informou que os indígenas estavam se sentindo ameaçados e perseguidos pelos invasores em seu próprio território. Após o assassinato de Karaya, eles não mais saíam sozinhos para caçar ou pescar: “Todo mundo sai junto porque a gente tem medo de andar só. Se a gente encontrar o branco no mato e ele matar um, cadê o outro para salvar?”, indagou Laut Arara.

Como a Funai não havia recebido a notificação do STJ para o cancelamento da Portaria Declaratória n° 26/1993, o processo de demarcação continuou em andamento. Em 22 de junho de 2004, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) e a Câmara Municipal de Uruará encaminharam ofício à Fundação informando a decisão do STJ.

O clima de tensão na região da TI Cachoeira Seca em junho de 2004 continuava, tanto que, em notícia divulgada pelo Cimi no dia 01 de julho de 2004, o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais e candidato a prefeito em Uruará, Paulo Medeiros (Partido dos Trabalhadores – PT), disse que os colonos e empresários estavam se organizando: “Vamos barrar. Nós não vamos aceitar a demarcação”. O sindicalista ainda disse que o objetivo era fechar a Transamazônica e informou: “Estamos tomando providências, também vamos entrar com uma ação na Justiça Federal pedindo a suspensão da demarcação”.

Segundo o ISA, no dia 20 de julho de 2004, a demarcação da TI Cachoeira Seca foi paralisada pela Funai devido à decisão tomada pelo procurador geral Luiz Soares de Lima, da procuradoria especializada da Funai, com base em decisão do STJ tomada em 1997. Após a decisão do procurador, o bispo de Altamira, dom Erwin, manifestou preocupação pelo andamento da demarcação da referida área ao ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos, que não se pronunciou naquele momento.

De acordo com notícia publicada pelo jornal O Estado de São Paulo em 22 de julho de 2004, cerca de 300 agricultores e pequenos proprietários interditaram uma ponte da rodovia Transamazônica na altura do município de Placas/PA, em protesto contra a demarcação da TI. Além disso, os manifestantes reivindicavam a regularização das famílias que residiam na área da Cachoeira Seca. Os manifestantes alegavam que iriam incendiar a ponte caso suas demandas não fossem atendidas.

Nesse mesmo dia, a Funai enviou um fax para os líderes da manifestação informando que a demarcação da reserva estava suspensa, decisão que foi comemorada pelos manifestantes. Segundo Agnaldo Dantas, vice-prefeito de Uruará, em notícia publicada no dia 22 de julho de 2004 pelo O Estado de São Paulo, os próprios Arara não reconheciam o local demarcado pela Funai como deles: “Eles não querem aquela terra”.

Entretanto, a missionária Petronila Almeida, do Cimi, apresentou o contraditório na notícia, afirmando que os Arara reconheciam aquelas terras como parte de seu território tradicional e que lutavam para que seu território fosse demarcado: “A luta desse povo não é recente, vem desde [19]93 quando saiu a portaria demarcatória da área. Depois de 11 anos, nenhuma providência foi tomada pelos órgãos competentes.”

Segundo a pesquisadora Kerlley Santos (2017), em 29 de outubro de 2004 a Funai expediu a Portaria nº 1.357/2004 assegurando ao povo Arara o direito de acesso ao território, proibindo o estabelecimento ou ingresso de novos ocupantes no local e a restrição de direito de acesso, ingresso ou locomoção de pessoas estranhas aos quadros da Funai. Em 18 de novembro de 2004, o órgão expediu outra Portaria, nº 1.442, na qual foi constituído um novo grupo de trabalho para realizar estudos complementares para a delimitação da Terra Indígena com objetivo de sanar possíveis questionamentos contrários à demarcação e atualizar informações sobre o território dos Arara.

No dia 11 de maio de 2006, 30 pessoas de quatro povos indígenas se reuniram em Altamira/PA para um encontro de povos e entidades da região. De acordo com notícia publicada pelo Cimi, no mesmo dia do encontro os Arara demonstraram preocupação com suas gerações futuras devido às invasões no seu território, e alertaram que estavam dispostos a defender suas terras. Benigno Marques, administrador executivo da Funai em Altamira, informou que o relatório antropológico fora realizado dentro do prazo em 2005, e que estava sendo analisado pela Fundação.

Representantes do Cimi denunciaram durante o encontro a atuação do governo federal. Segundo a instituição, a demarcação foi tratada com lentidão e os funcionários da Funai teriam atuado de forma a convencer os indígenas a aceitarem a redução do seu território sob o argumento de urgência para demarcação da TI.

No encontro também houve falas das lideranças indígenas que compareceram ao evento. Os Parakanã da terra Apyterewá, por exemplo, alertaram que os acordos para redução das terras não garantem rapidez no processo de demarcação. Disseram também que tiveram seu território reduzido no ato de publicação da portaria declaratória e que, até aquele momento, não havia conclusão da demarcação de suas terras.

Segundo notícia publicada no Diário do Pará no dia 13 de agosto de 2006, o MPF ajuizara uma ação civil pública (ACP) dois dias antes exigindo que a Funai apresentasse de forma definitiva o relatório de demarcação da terra indígena. Na ação, pedia-se que a Justiça Federal desse prazo de 30 dias para apresentação do relatório. Além disso, o procurador da República em Altamira, Marco Antônio de Almeida, solicitou que o órgão pagasse uma multa de 10 mil reais por dia em caso de descumprimento.

Segundo a mesma notícia, o procurador afirmou na ocasião que o prazo estabelecido pela Fundação para apresentação do novo relatório era junho de 2005; entretanto, o estudo ainda não tinha sido apresentado até aquele momento. Almeida indagou: “Como prevenir contra as invasões de terras, a prática diária de crimes ambientais e a permanente ameaça de extinção da etnia Arara com a patente omissão governamental?”

De acordo com Kerlley Santos (2017), os estudos complementares somente foram apresentados pela antropóloga Maria Helena Amorim Pinheiro, coordenadora do GT, em 3 de novembro de 2006. No estudo, a área de delimitação apresentada foi uma extensão de 734.027 ha, com um perímetro de 450 km, preservando a conectividade entre as duas TIs.

Em 27 de fevereiro de 2007, o então presidente da Funai, Mércio Pereira Gomes, aprovou os estudos complementares do GT e determinou a publicação da decisão no Diário Oficial (DOU). As cópias foram enviadas para as prefeituras municipais de Altamira, Placas, Rurópolis e Uruará, bem como para as unidades do Incra em Altamira, Rurópolis e Santarém.

Ainda de acordo com Santos (2017), após as disputas judiciais entre a Funai e o Município de Uruará, o processo foi encaminhado para o Ministério da Justiça e analisado pelo então advogado da União, Fernando de Carvalho Amorim, junto com a Coordenação de Estudos e Pareceres do MJ. Em 2 de maio de 2008, Fernando Carvalho divulgou parecer em que concluía que o processo de demarcação da TI Cachoeira Seca cumprira a legislação vigente. Assim, no dia 30 de junho de 2008, foi expedida a Portaria n° 1.235/2008, do Ministério da Justiça, declarando como posse permanente dos Arara a TI Cachoeira Seca, e ligando-a à TI Arara, com uma superfície de 734.027 hectares.

Os Arara, além de terem que lutar pela demarcação do seu território e lidar com os conflitos envolvendo os madeireiros, grileiros e colonos, também tiveram que lidar com a implantação de grandes empreendimentos desenvolvimentistas na região, como a Hidrelétrica de Belo Monte (para mais informações sobre os impactos dessa usina nos diversos povos e comunidades da Volta Grande do Xingu, consulte a ficha “PA – Complexo hidrelétrico de Belo Monte ameaça povos indígenas, ribeirinhos e parte da população de Altamira”).

A empresa Norte Energia entregou o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatório de Impacto Ambiental (Rima) ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) em março de 2009. Entretanto, as terras indígenas que seriam afetadas pelo empreendimento não foram mencionadas pelo empreendedor: Paquiçamba (dos povos Juruna/Yudjá) Cachoeira Seca (Arara), Kararao (Mebêngôkre Kayapó e Mebêgôkre Kararaô), Uruaya (Xipaya), Bau (Mebêngôkre Kayapó e Mebêngôkre Kayapó Mekrãgnoti), Menkragnoti (Mengra Mrari e Mebêngôkre Kayapó Mekrãgnoti), Paraná do Arauato (Mura) Trincheira Bacajá (Mebêngôkre Kayapó, Mebêngôkre Kayapó Kararaô e Xikrin), Arara (Arara), Arawete Igarape Ipixuna (Araweté) e Koatinemo (Asurini do Xingu). Essas TIs foram mencionadas pela Funai após análise do EIA/Rima.

Segundo Kerlley Santos, após a publicação da Portaria n° 1.235/2008 do Ministério da Justiça, no dia 05 de maio de 2009, a Funai publicou uma licitação para a contratação de uma empresa para realizar a demarcação física dos limites da TI Cachoeira Seca. A empresa que venceu a licitação foi a Seta Serviços Técnicos e Agrimensura Ltda. Os trabalhos começaram em 20 de agosto, mas foram paralisados em menos de um mês devido ao impedimento por colonos e fazendeiros.

Como consequência, no dia 18 de setembro de 2009, o procurador federal Marco Antônio Delfino de Almeida solicitou, por meio do ofício no 1.109 PGF/AGU/09, o apoio da Polícia Federal (PF) para acompanhar o processo de demarcação física da TI. De acordo com Santos, a resistência dos colonos foi apoiada pelo Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (STTR) de Uruará. O sindicato, que sempre se opôs à demarcação, enviou o Ofício STTR Circular no 006/2009 no qual a entidade afirmava que iriam unir-se com os colonos e não iriam deixar que a TI fosse demarcada. A ação foi eficiente num primeiro momento, pois paralisou o processo naquele período.

No dia 1º de dezembro de 2009, lideranças de diversos povos indígenas do Brasil, inclusive do povo Arara da Cachoeira Seca, se reuniram para escrever um comunicado ao então presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a representantes de diversas instituições do país na época, como: Deborah Macedo Duprat (Vice-Procuradora-Geral da República), Edson Lobão (Ministro de Minas e Energia), Carlos Minc (Ministro do Meio Ambiente), Mércio Meira (Presidente da Funai), Roberto Messias Franco (Presidente do Ibama), Tarso Genro (Ministro da Justiça) e Gilmar Mendes (Presidente do Supremo Tribunal Federal).

Na carta, as lideranças denunciavam as condições desfavoráveis em que os povos indígenas do Brasil se encontravam, e que há mais de 20 anos seus direitos estavam sendo negados. Além disso, denunciavam que os povos não foram consultados quanto à construção de Belo Monte e que não lhes foram apresentadas medidas que propiciassem alternativas aos impactos sobre suas condições de vida e sobrevivência. Na carta, as lideranças também solicitaram que o empreendimento não fosse instalado, alertando que, caso o processo de licenciamento continuasse, os povos não iriam compactuar com a construção da hidrelétrica.

Segundo o ISA, no dia 1º fevereiro de 2010, a Licença Prévia (LP) de Belo Monte foi concedida pelo Ibama. Junto com a concessão da licença, o órgão apresentou 19 condicionantes relativas a populações indígenas, dentre elas, a demarcação física, a homologação e a completa desintrusão da TI Cachoeira Seca.

Em maio de 2010, o MPF solicitou novamente informações à Funai sobre a continuidade do processo da demarcação física da TI. A pesquisadora Kerlley Santos (2019) apresenta em suas pesquisas que, em junho daquele ano, a Fundação informou que a demarcação ainda não havia sido concluída, pois o território não estava seguro para a empresa Seta continuar os trabalhos devido à posição hostil dos colonos.

No dia 1º de junho de 2011, a Usina Hidrelétrica de Belo Monte recebeu a Licença de Instalação (LI), mesmo sem ter cumprido as condicionantes referentes ao componente indígena da LP, inclusive a condicionante referente à TI da Cachoeira Seca. Em notícia de O Globo de 06 de junho de 2011, o MPF manifestou-se afirmando que o Ibama fora irresponsável, já que as condições para implantação das obras não foram efetivadas pelo Consórcio Norte Energia.

Segundo Kerlley Santos (2017), em 14 de junho de 2011, a empresa Seta retomou os trabalhos de demarcação com o apoio da Polícia Federal (PF). Entretanto, ocorreu uma nova manifestação dos colonos e ribeirinhos apoiados por grileiros e madeireiros. Ainda de acordo com a pesquisadora, a manifestação durou uma semana e contou com mais de três mil pessoas.

Com o intuito de negociar uma solução, a secretária nacional de Segurança Pública em Altamira, Regina Miki, e o então comandante da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP), Alexandre Aragon, se deslocaram até o local para contribuírem com o andamento da demarcação de forma pacífica. Após inúmeros processos de negociação, em agosto de 2011 a demarcação física da TI Cachoeira Seca foi concluída.

O próximo passo para a homologação da TI Cachoeira Seca seria executar o plano de regularização fundiária. Por esse motivo, em 20 de setembro de 2011 foi expedida a Portaria da Funai nº 07/DPDS. A referida portaria constituiu um GT com objetivo de atualizar o levantamento e a avaliação de benfeitorias das ocupações dos não indígenas localizadas na TI. O grupo foi constituído por funcionários da Funai e do Incra. Foi estabelecido um prazo de 60 dias para a equipe levantar as benfeitorias e mais 15 dias para elaboração do relatório.

De acordo com Kerlley Santos (2017), a criação do GT foi alvo de questionamentos quando, em outubro de 2011, a Prefeitura Municipal de Uruará contestou a composição da equipe do GT. Segundo o documento do executivo municipal, o grupo deveria incluir pelo menos um representante do município de Uruará, um representante da Câmara Municipal e um representante do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (STTR). Além disso, a prefeitura solicitou a criação de uma comissão para o acompanhamento das atividades. Entretanto, os trabalhos do GT não avançaram.

Por meio da portaria no Funai 1.044/PRES/2012, de 24 de agosto de 2012, foi criado um novo GT para dar continuidade à atualização do levantamento e à avaliação das benfeitorias dos ocupantes não indígenas, estabelecendo prazo de 30 dias para a realização do trabalho. No entanto, cerca de um mês depois, a referida portaria foi revogada, sem a realização dos trabalhos de campo. De acordo com a justificativa da Funai apresentada por Kerlley Santos (2017), “devido à complexidade do suporte logístico que não pode ser atendido pela Coordenação Regional Centro Leste do Pará em Altamira”.

Segundo notícia do ISA, a TI Cachoeira Seca foi a segunda terra indígena mais desmatada do país em 2011. De acordo com o Instituto, esse dado apontava para a urgência de se avançar com o processo da regularização fundiária. O ISA divulgou, no dia 13 de fevereiro de 2014, a nota técnica “Estado de Cumprimento das Condicionantes referentes à proteção das terras indígenas impactadas pela Usina Belo Monte”. No documento foi exposto que, das 19 condicionantes aplicadas pela Funai, somente três foram cumpridas e uma estava em andamento. Além disso, o documento concluiu que o processo de implantação do empreendimento agravara as condições de risco de algumas TIs, como no caso da TI Cachoeira Seca. De acordo com a nota, o desmatamento nessa TI aumentou consideravelmente entre 2012 e 2013.

Devido ao acúmulo dos efeitos da instalação de Belo Monte nas terras indígenas e o incumprimento das condicionantes, no dia 22 de maio de 2014 mais de 320 indígenas e ribeirinhos ocuparam as principais vias de acesso aos canteiros de obras da usina. Dentre as pautas principais estava o reassentamento dos não indígenas e a retirada dos madeireiros da TI Cachoeira Seca.

No dia 23, um ônibus do Consórcio Construtor de Belo Monte (CCBM) foi queimado e, no dia 26, três indígenas foram feridos em confronto com a Força Nacional de Segurança Pública (FNSP). Somente no dia 27 de maio de 2014 os manifestantes desocuparam o local. A decisão foi tomada após 12 horas de negociação entre os representantes do governo federal e as lideranças indígenas. No acordo firmado, decidiu-se por agendar uma reunião para o dia 04 de junho em Brasília, na qual estariam presentes representantes da concessionária Norte Energia, da Casa Civil, do Ministério da Justiça e da Funai.

Em notícia publicada pelo ISA em 11 de maio de 2015, o Instituto concluiu que a área explorada ilegalmente pelos madeireiros na TI Cachoeira Seca havia mais do que duplicado em 2014, passando de 4.700 hectares em 2013 para 13.390 hectares em 2014, equivalendo a mais de 1.080 estádios do Maracanã, no Rio de Janeiro. Ainda segundo a notícia, o MPF e as organizações governamentais denunciaram que o aumento de extração de madeira ilegal estaria relacionado às obras de Belo Monte. Juan Doblas, analista de geoprocessamento do ISA, apontou: “Atualmente, a situação está descontrolada. Já estou na região há cinco anos. Antigamente, os caminhões de madeira só andavam à noite. Agora é dia e noite”. Em operação realizada entre os dias 13 e 21 de agosto, os agentes do Ibama multaram o CCBM em 250 mil reais por extração ilegal de madeira.

No dia 22 de setembro de 2015, a diretoria do Ibama negou a concessão da Licença de Operação (LO) de Belo Monte enquanto dez das pendências socioambientais da obra não fossem cumpridas. Entretanto, as condicionantes sobre as questões indígenas não foram analisadas pelo órgão, pois a diretoria atribuiu essa responsabilidade à Funai.

De acordo com a pesquisadora Kerlley Santos, devido ao posicionamento do Ibama, o MPF em Altamira fez duas recomendações à Funai; uma, específica sobre a proteção do território dos Arara da Cachoeira Seca, expedida no dia 23 de setembro. A recomendação (Ofício n° 3931201 5IPRM/ATMlGABI) advertia o órgão em relação à necessidade de cobrar do governo federal a garantia do cumprimento das condicionantes referentes ao uso exclusivo dos Arara sobre seu território.

Entre essas condicionantes estavam: a regularização fundiária da TI, a presença efetiva do Estado no local (por meio do funcionamento imediato das Bases de Proteção Territorial situadas no interior da Terra Indígena e no rio Iriri), estabelecimento de um cronograma formal de retirada dos ocupantes não indígenas de forma progressiva e desativação da Transiriri, garantindo os direitos fundamentais dos ocupantes não indígenas de boa-fé. Para o MPF, a homologação da TI Cachoeira Seca era etapa indispensável para ser cumprida antes da concessão da LO de Belo Monte.

No dia 02 de outubro de 2015, notícia publicada no site do Greenpeace informava que nove pessoas haviam sido presas em flagrante pelo Ibama quando derrubavam árvores na TI Cachoeira Seca. Segundo os fiscais, elas faziam parte de um esquema que extraía madeiras ilegalmente para exportá-las. Durante a operação, os fiscais percorreram mais de 100 quilômetros da estrada aberta pelos madeireiros na terra indígena; no percurso foram encontradas dezenas de toras de madeiras nobre, como ipê, maçaranduba e angelim, prontas para serem transportadas. Também foram flagrados caminhões entrando e saindo da floresta.

Em 12 de novembro de 2015, a Funai entregou ao Ibama o ofício nº 587 2015/PRES/FUNAI/MJ no qual solicitava sanções à empresa Norte Energia pelas falhas de execução do componente indígena, cobrando a reelaboração integral da matriz de impactos da obra e das correspondentes medidas de mitigação para os povos afetados. Entretanto, no mesmo documento, o órgão afirmava que as ações relacionadas ao componente indígena, necessárias, precedentes e preparatórias para o enchimento do reservatório e para implementação da vazão reduzida, haviam sido integralmente cumpridas.

O ISA apontou a contradição do posicionamento da Funai, pois, ao mesmo tempo em que certificou falhas do não cumprimento das condicionantes, não se posicionou contrariamente à concessão da LO. Assim, o Ibama concedeu a LO no dia 24 do mesmo mês, sem que a TI Cachoeira Seca fosse homologada e sob protesto de grupos indígenas e entidades civis.

Entre os dias 7 e 17 de março de 2016, a relatora especial das Nações Unidas sobre os direitos dos povos indígenas, Victoria Tauli-Corpuz, esteve no Brasil visitando algumas TIs, onde conversou com lideranças indígenas, organizações da sociedade civil e de direitos humanos, representantes dos três poderes do Estado brasileiro, MPF, Funai e alguns governantes estaduais. A TI Cachoeira Seca foi uma das TIs visitadas por ela.

Em seu pronunciamento no dia 17 de março, a relatora fez algumas observações e recomendações ao Estado brasileiro, antecipando algumas questões que escreveria posteriormente em seu relatório. Dentre as questões abordadas em seu pronunciamento estava sua preocupação com a morosidade da homologação da TI Cachoeira Seca e da retirada dos moradores não indígenas. Ela expôs a necessidade urgente de uma solução dessa questão. Assim, no dia 05 de abril de 2016, o governo federal publicou no DOU o decreto que homologava a demarcação administrativa da Terra Indígena Cachoeira Seca com 733.688 hectares como de posse permanente e de usufruto exclusivo do povo Arara. Esse ato constituiu o cumprimento de uma das principais condicionantes do componente indígena proposto pela Funai em 2009 para a concessão da LP de Belo Monte.

Após a homologação, segundo notícia publicada no site da Funai no mesmo dia, os próximos passos seriam realizar o levantamento fundiário para identificar as ocupações de boa-fé que seriam passiveis de indenização e o cadastramento dos ocupantes não indígenas com perfil para reforma agrária que deveriam ser prioritariamente reassentados pelo Incra.

De acordo com a procuradora da República Thais Santi em entrevista para o portal G1 no dia 05 de abril:

“O ato de homologação desse território, além de dívida histórica do Estado brasileiro para com os indígenas Arara, representa o único caminho para a sobrevivência desse grupo face às transformações brutais que Belo Monte acarretou. Sem a homologação e desintrusão da Terra Indígena Cachoeira Seca, a inviabilidade da hidrelétrica forçosamente teria de ser reconhecida”.

Ela afirmou na ocasião que a referida TI permanecia como a mais invadida e com maior índice de desmatamento do país.

Mesmo com a morosidade da homologação, o povo Arara considerou o ato uma vitória: “A nossa luta pela demarcação da nossa terra não é de hoje. A gente brigou, lutou por tudo isso. É bom ver a nossa vitória”, comemorou o cacique Mobu Odo, também em entrevista para o G1.

Em 17 de maio de 2016, um mês após a homologação da área, os Arara fizeram uma carta endereçada aos diversos órgãos federais exigindo uma solução ágil para a proteção do território:

“Após a homologação, ao invés de nos sentirmos mais seguros, temos percebido uma grande reação dos grupos que têm interesse em nosso território, que começaram a nos ameaçar diretamente. Se a desintrusão e/ou ações de controle não ocorrem em um prazo curto, existe alto risco de intensificação do número de invasões, da extração ilegal de madeira e do desmatamento dentro de nossa área, junto com a piora na nossa segurança”.

Além disso, apontaram que os conflitos estavam cada vez mais acirrados.

Notícia publicada no site do ISA em 31 de agosto de 2018 informou que os Arara se deslocaram, no dia 29 de agosto, até a cidade de Altamira para uma reunião com o MPF a fim de exigirem apoio do órgão na retirada dos não indígenas de suas terras, além de denunciarem o aumento do desmatamento. “Estamos cansados, mas não vamos parar de lutar pelo nosso território”, informou o cacique Mobu Odo.

Durante a reunião, a procuradora do MPF Thais Santi se comprometeu a propor uma ação judicial sobre o caso dos Arara e acompanhá-los em uma audiência na Justiça Federal para que denunciassem, mais uma vez, a situação de vulnerabilidade em que se encontravam.

O ISA divulgou no dia 27 de novembro de 2018 dados sobre o aumento considerável do desmatamento da TI Cachoeira Seca. Segundo estudos realizados pelo Instituto, apenas no mês de outubro foi desmatado o equivalente a 1.800 campos de futebol, o que correspondia a todo o desmatamento ocorrido em 2017.

Ainda de acordo com o ISA, de janeiro a outubro haviam sido desmatados 2.900 hectares de floresta. Apenas em 2016, considerado o pico de desmatamento, foram extraídos mais de 1,2 mil caminhões de madeira ilegal, segundo o Sistema de Indicação por Radar de Desmatamento (Sirad X), sistema de monitoramento de desmatamento desenvolvido pelo ISA.

De acordo com dados do Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD) divulgados em janeiro de 2019 por meio do Boletim do Desmatamento, produzidos pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), o desmatamento na Amazônia subiu 34% em dezembro de 2018 em comparação com o mesmo período do ano de 2017, passando de 184 quilômetros quadrados perdidos para 246 km². O estado do Pará destacou-se entre os que mais haviam desmatado, contribuindo com 48% da perda de floresta registrada no período. A TI Cachoeira Seca perdeu 8 quilômetros quadrados e ocupou a 1ª posição do ranking, seguida da TI Ituna/Itatá, localizada no município de Senador José Porfírio, também no Pará.

Estudo do ISA e da Rede Xingu, publicado em julho de 2020, além de confirmar uma tendência de crescimento do desmatamento da Amazônia, alertou que três terras indígenas haviam sofrido de forma mais alarmante com a invasão do garimpo entre 2018 e 2019. O estudo destacou que, no interior das TIs Baú, Apyterewa e Cachoeira Seca, áreas de garimpo foram abertas ou reativadas, especialmente entre 2018 e 2019, ainda no governo interino de Michel Temer (Movimento Democrático Brasileiro- MBD).

Depois do Pará, Mato Grosso foi o segundo estado com maior participação na área desmatada (35%), seguido por Rondônia (7%), Amazonas (5%), Roraima (3%), Acre e Amapá (1%). No acumulado do período, que soma todos os alertas de desmatamento detectados entre agosto de 2018 até dezembro, foram identificados 1.706 quilômetros de cobertura florestal convertida em área desmatada, o que representa um aumento de 79% em relação ao mesmo período do ano anterior (agosto de 2017 a dezembro de 2017). Isso significa que a tendência de aumento de desmatamento na Amazônia continuava ascendente, de acordo com o estudo.

No dia 02 de janeiro de 2019, após reforma administrativa realizada pelo presidente Jair Bolsonaro retirar da Funai a responsabilidade de demarcar terras indígenas, transferindo essa atribuição para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), um grupo de madeireiros avançou sobre a TI Arara. De acordo com notícia publicada no jornal O Estado de São Paulo no mesmo dia da invasão, a situação no local era tensa e havia riscos de invasores e indígenas entrarem em conflito. A invasão foi confirmada pela diretora de proteção territorial da Fundação Nacional do Índio (Funai), Azelene Inácio: “Estamos acompanhando a situação. Uma equipe de servidores locais da Funai já foi deslocada para a área”.

Ainda sobre a invasão na TI, em reportagem publicada no jornal Folha de São Paulo no dia 04 de janeiro, de acordo com o cacique da TI Arara Leo Xipaia, os madeireiros estavam derrubando castanheiras, ipês, jatobás e abrindo uma clareira para divisão de lotes: “Passamos lá rápido, tinha trator, máquina e caminhão. Eles estão limpando a área. Ficamos proibidos de ir lá, para não ter um conflito maior”. Na ocasião, o cacique cobrou uma ação rápida da Funai, da Polícia Federal e do Ibama.

O cacique também informou que tanto os indígenas que moram na TI Arara quanto os residentes na TI Cachoeira Seca estavam se organizando para fazer protestos nas estradas caso não houvesse nenhuma ação do governo federal para a retirada dos invasores. Ainda segundo reportagem da Folha, uma fonte não identificada informou que os invasores estavam utilizando cinco caminhões, dois tratores, uma pá-carregadeira e um trator de esteira.

Em fevereiro de 2020, o governo Jair Bolsonaro apresentou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei (PL) 191/2020, que autorizava a mineração e a construção de hidrelétricas em TIs, inclusive nas que protegem povos indígenas de recente contato ou em isolamento voluntário, legalizando o garimpo nessas áreas. Essa medida representou um estímulo maior para a invasão em terras indígenas por garimpeiros e provocou grandes retrocessos nas políticas de proteção aos Arara em Cachoeira Seca. Importa mencionar que tal PL fez parte de um conjunto de iniciativas do governo Bolsonaro que desregulavam ou desmantelavam importantes políticas públicas indigenistas, gerando grande mobilização da sociedade civil e entidades indígenas por permitir a exploração minerária, autorizando a instalação de lavras de petróleo e gás, além da geração de energia elétrica em terras indígenas, como publicado por diversos veículos, muitos ligados a ONGs e movimentos sociais, como  Cimi, O Eco, Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), ISA e outros.

No dia 30 de abril de 2020, a juíza da Comarca de Uruará, Caroline Silva, proibiu a realização de uma manifestação, prevista para esse mesmo dia, contra a continuidade da ação de fiscalização promovida pelo Ibama na TI Cachoeira Seca. A decisão tomou como válida manifestação para outra data futura, dentro do âmbito do município de Uruará, enquanto perdurasse a situação de pandemia de covid-19, doença causada pelo vírus Sars-CoV-2 e reconhecida como uma Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (Espin) pelo Ministério da Saúde em 03 de março de 2020.

De acordo com o TJ/PA, a Ação Civil Pública (ACP) com pedido liminar de tutela de urgência foi proposta pelo Ministério Público do Pará (MPPA) em face de Osinete Alves, Gean Soares, Valdivino Antônio, Patrícia Cardoso, Wanderson Almeida, Wagner Saraiva e outros. Na petição inicial, o MPPA alegou que, conforme notícias veiculadas nas mídias sociais e informações recebidas pelas Promotorias Agrária de Altamira e Uruará, os requeridos pretendiam promover manifestação no município.

Ciente de que a aglomeração de pessoas próximas a uma terra indígena em um momento de pandemia seria perigosa, argumentava:

Essa movimentação de pessoas do interior da terra indígena para participarem da manifestação traz riscos tanto às famílias indígenas quanto às não indígenas. Destaco que os povos indígenas, em razão da necessidade de políticas públicas específicas, tornam-se mais vulneráveis nesse cenário. Além da possibilidade de transmissão da doença caso haja contato com alguém infectado (manifestante ou não), tem-se visto que o aumento dos casos de COVID-19 tem acarretado significativo aumento dos atendimentos no sistema de saúde”.

Em 06 de maio de 2020, a Associação dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente e do Plano Especial de Cargos do MMA e do Ibama no Pará (Asibama/PA) publicou nota à imprensa afirmando que, no dia anterior, em operação de combate a ilícitos ambientais no entorno da TI Cachoeira Seca, a equipe de servidores do Ibama em sobrevoo surpreendeu um acampamento de extração ilegal de madeira abandonado por madeireiros durante a abordagem. Utilizando os instrumentos do Decreto 6.514/08, a equipe, devido à impossibilidade de remoção de todas as máquinas, realizou a destruição dos bens, conduzindo então o caminhão que pôde ser retirado para Uruará. Próximo à cidade, foram emboscados por manifestantes, que, como visto, impediam o trabalho de fiscalização, voltado para a proteção da TI Cachoeira Seca. Na negociação, o coordenador da equipe foi atingido por uma garrafa atirada por um dos manifestantes, sendo ferido e conduzido para o hospital, onde foi atendido e medicado.

“A Asibama/PA, conhecedora dos riscos inerentes à atividade de fiscalização e do valor da missão de proteger o meio ambiente, sempre apoiará os servidores que abraçam o serviço institucional da proteção do patrimônio de todos os brasileiros, e cujo uso irrestrito e sem cuidado algum, em troca de lucros imediatos, causam prejuízos para toda a sociedade. O Ibama, seu presidente, a Diretoria de Proteção Ambiental, e também o MMA, diretamente ligados à fiscalização ambiental federal, têm o dever de manifestação e apoio ao servidor atingido, às equipes ainda em campo e, principalmente, de garantir a segurança de todos os servidores ligados à fiscalização, controle, e gestão do meio ambiente, no âmbito de suas instituições, para que tais casos, graves, não tornem a se repetir.”

Em 29 de junho de 2020, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), representada por 12 advogados indígenas, os partidos políticos Partido Socialismo e Liberdade (Psol), Partido Socialista Brasileiro (PSB), Rede Sustentabilidade (Rede), Partido dos Trabalhadores (PT), Partido Democrático Trabalhista (PDT) e Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e a Clínica de Direitos Fundamentais da Faculdade de Direitos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) ingressaram com uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), pedindo que o tribunal determinasse medidas urgentes, por meio de liminar, para garantir a vida dos indígenas devido à pandemia de covid-19, levando em conta, especialmente,  a proximidade do recesso judiciário. Como destacam:

“Os danos e riscos para os povos indígenas são ainda maiores do que para o restante da população. Existe a possibilidade real de extermínio de etnias inteiras, sobretudo de grupos isolados ou de recente contato. Outros povos indígenas estão sendo também afetados de modo desproporcional. A irresponsabilidade sanitária do governo federal – que, mesmo depois de 55 mil mortos no país, continua tratando o coronavírus como ‘gripezinha’, com indiferença e negacionismo científico – se aliou ao aberto racismo institucional contra os povos indígenas, para gerar uma verdadeira tragédia civilizacional. Está em curso um genocídio! E vidas indígenas importam!”

Dentre as principais exigências, destaca-se que a

“União Federal tomasse imediatamente todas as medidas necessárias para instalação e manutenção de barreiras sanitárias para proteção das terras indígenas onde localizavam-se povos em condição de isolamento e de recente contato, como os Arara da TI Cachoeira Seca, conforme cita a petição, dentre outras TIs”.

Segundo dados do ISA e da Rede Xingu+, publicados em julho de 2020, entre abril e maio de 2020 foram desmatados 562 hectares associados à exploração garimpeira, comprometendo a qualidade das águas em 20 sub-bacias do rio Xingu. Ao todo haviam sido desmatados aproximadamente 22 mil hectares de floresta por conta dessa atividade. Além das TIs, o estudo também mostrou que quatro unidades de conservação (UCs) – Reserva Extrativista (Resex) Riozinho do Aufrísio, Parque Nacional (Parna) Serra do Pardo, Floresta Nacional (Flona) de Altamira e na Resex do Rio Iriri – foram afetadas.

De acordo com o ISA, baseando-se em dados do 22º boletim Sirad X, em apenas quatro meses, entre setembro e dezembro de 2020, mais de 1,7 mil hectares foram desmatados na TI Cachoeira Seca, a terceira mais desmatada na bacia do Xingu em 2020. Essa taxa, quase quatro vezes maior do que o total desmatado nos oito primeiros meses do ano, coincidiu com a retirada de uma base de fiscalização do Ibama na região. Como afirma o cacique Mobu Odo Arara, da Terra Indígena Cachoeira Seca: “A nossa área virou um balcão de negócios. Todo mundo vive da nossa área, do roubo de madeira, da venda de terra, e da pesquisa de ouro”.

Com o avanço de novas frentes, o desmatamento na TI Cachoeira Seca, que antes se concentrava na divisa norte e na região leste, em 2020 encontrava-se distribuído em quase todo o território indígena. Em síntese, desde 2009, segundo o sistema do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes), mantido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), mais de 324 km² de floresta foram derrubados na TI, área maior do que o município de Cuiabá, capital mato-grossense.

No dia 10 de maio de 2021, ao completar uma década do início da obra de Belo Monte, e após cinco anos do início das operações da UHE, o Cimi divulgou um encontro entre caciques e lideranças de 12 terras indígenas (TIs) da região do médio Xingu, em Brasília, cujo objetivo era cobrar o cumprimento de condicionantes impostas para a construção da usina. Além de lideranças dos Arara da TI Cachoeira Seca, reuniram-se os Assurini, Araweté, Parakanã, Xipaya, Kuruaya, Arara, Arara da Volta Grande, Juruna, Kayapó e Xikrin.

A comitiva de lideranças foi recebida pelo então secretário da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), coronel do Exército Robson Santos da Silva. Representantes do Consórcio Norte Energia também participaram da reunião, à distância, mas não se comprometeram com a proposta dos indígenas de assinar um termo de compromisso para o cumprimento das ações de saúde previstas no Componente Indígena do Plano Básico Ambiental (PBA-CI) da usina.

A Sesai se comprometeu a produzir, junto com as lideranças e o Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) de Altamira,, que atende às comunidades da região, um documento sistematizando prioridades e prazos para o cumprimento das condicionantes relativas à saúde indígena, bem como buscar um acordo com a concessionária para garantir a participação e o acompanhamento efetivos dos indígenas e do próprio Dsei na execução das atividades previstas.

“De acordo com o Ministério da Saúde, no Brasil, existem 34 Dseis divididos estrategicamente por critérios territoriais, tendo como base a ocupação geográfica das comunidades indígenas, de forma que não correspondem aos limites dos estados. Sua estrutura de atendimento conta com unidades básicas de saúde indígenas, polos base e as Casas de Saúde Indígena (Casai).”

Em 14 de maio de 2021, ainda no contexto dessa reunião, as reivindicações da comitiva foram voltadas especialmente à Sesai, à Funai e ao Consórcio Norte Energia. De acordo com Leo Xipaya, presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena (Condisi) de Altamira e cacique da aldeia Cujubin, na TI Cachoeira Seca:“Está sendo complicado mantermos nossos povos em isolamento na pandemia, uma vez que a assistência não chega e as condicionantes não estão sendo cumpridas, nem por parte da Norte Energia, nem por parte da Funai, que é um órgão que está deixando de dar assistência às comunidades indígenas. Estamos em busca de melhorias para os povos do médio Xingu. Queremos ser ouvidos.”

Até aquele momento, de acordo com o Cimi, a UHE Belo Monte fora alvo de mais de 20 ações civis públicas do MPF devido ao desrespeito do direito de consentimento livre, prévio e informado das populações tradicionais afetadas pela obra. Em um dos processos, o órgão afirmou que a construção da hidrelétrica resultou numa ação etnocida contra os povos indígenas da região.

Ainda em relação à saúde indígena, os participantes cobraram a efetivação, por parte da Sesai e da Norte Energia, das condicionantes ligadas à reestruturação do atendimento à saúde indígena pelo Dsei de Altamira. Eles denunciaram também a falta de profissionais, de infraestrutura adequada, de meios para o transporte de pacientes e até a falta de água potável nas aldeias da região.

Outro problema foi a falta de combustível para os motores que operam os poços artesianos nas aldeias do médio Xingu. José Cleanton Ribeiro, da coordenação do Conselho Indigenista Missionário – Cimi Regional Norte 2, equipe de Altamira, critica: “Nenhuma das 48 condicionantes específicas para a saúde indígena foi entregue em sua íntegra. Algumas estão pela metade, outras estão estacionadas, e agora se usa a pandemia como desculpa para que não sejam feitas”.

As condições fundamentais da saúde indígena, como a integridade do território, foram fragilizadas de tal forma que, segundo o monitoramento do Prodes, o aumento no desmatamento em terras indígenas foi de 138% na comparação entre a média dos três anos do governo Jair Bolsonaro (2019 a 2021) com os três anos anteriores (2016 a 2018).

De acordo com o ISA, em 2021, houve uma redução de desmatamento de 18,6% em comparação com 2020. No entanto, conforme argumenta o documento do ISA, o nível de invasões e ilegalidade no interior das TIs ainda era muito elevado, e representava naquele momento mais de 18 milhões de árvores derrubadas, sendo 2,5% do desmatamento total na Amazônia Legal.

Antonio Oviedo, coordenador do Programa de Áreas Protegidas do ISA explica: “O Prodes registra apenas o desmatamento de corte raso, ou seja, a supressão total da vegetação nativa. Entretanto, as TIs sofrem intensos processos de invasão e degradação florestal, provenientes do roubo de madeira, garimpos ilegais e incêndios criminosos”.

A campeã de destruição naquele levantamento foi a TI Apyterewa (PA), com mais de 6,7 mil hectares desmatados, 7% a mais do que em 2020. Em seguida, a TI Trincheira-Bacajá (PA) teve um aumento de 51% em comparação com 2020. Na sequência, a TI Kayapó (PA) teve 2,5 mil hectares desmatados em 2021, um acréscimo de 56% em relação ao ano de 2020. A TI Cachoeira Seca ficou em quarto lugar no ranking de 2021, com 23,4 km² de desmatamento. Naquele ano houve uma queda na taxa de destruição da floresta em 67,7%, pois foram 72,5 km² entre 2019 e 2020.

A reportagem relembrou que, além da falta de regulamentação fundiária nas áreas protegidas do entorno, a grilagem de terras e o roubo de madeira contribuem para o alto patamar de destruição.

Em 17 de janeiro de 2023 ocorreu uma operação federal de combate ao desmatamento na TI Cachoeira Seca, fechando duas serrarias clandestinas e aplicando mais de R$ 8 milhões em multas. A operação envolveu mais de 30 agentes do Ibama, Polícia Federal (PF), Polícia Rodoviária Federal (PRF) e Força Nacional de Segurança Pública (FNSP), que realizaram a primeira operação do ano na região, de acordo com o G1. Outras medidas importantes de reparação e mitigação dos danos causados pela invasão de atividades como o garimpo e as madeireiras foram oficializadas em 31 de março de 2023, quando o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, retirou o Projeto de Lei (PL) 191/2020 que tramitava na Câmara dos Deputados. De autoria do governo Bolsonaro, o PL pretendia regulamentar a mineração, a geração hidrelétrica, a exploração de petróleo e gás e a agricultura em larga escala nas terras indígenas.

Em maio de 2023, a Rede Xingu+ lançou o documento “Xingu sob Pressão”, denunciando o crescimento do desmatamento na região, entre os estados do Pará e do Mato Grosso. Das seis terras indígenas mais desmatadas na Amazônia Legal em 2022, cinco estão no Xingu: Apyterewa, Cachoeira Seca, Ituna Itatá, Trincheira-Bacajá e Kayapó. Juntas, elas alcançaram mais da metade (60%) do desmatamento de todas as terras indígenas da Amazônia Legal.

O mapa e o documento foram apresentados ao Ibama, ao Ministério do Meio Ambiente (MMA), à Funai e ao novo Ministério dos Povos Indígenas (MPI) por uma comitiva de lideranças de diferentes regiões do Pará e Mato Grosso, como Mydjere Mekrãgnotire, Ianukula Kaiabi, Doto Takak-Ire, Ewésh Yawalapiti Waurá e Giliarde Juruna.

De acordo com o Mídia Ninja, os membros da Rede Xingu+ obtiveram do presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, o compromisso com a manutenção da vida na Volta Grande do Xingu: “A garantia que eu posso dar é que com esse Hidrograma de Consenso esquece a licença. A prioridade nossa é a vida no Xingu”, afirmou.

Em 4 de setembro de 2023, indígenas do povo Xipaya foram recebidos pela presidenta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Joênia Wapichana, na sede do órgão, em Brasília. Pela Funai, participaram também a diretora de Proteção Territorial, Maria Janete de Carvalho, e o assessor da Presidência, Martinho de Andrade.

As lideranças, também membros da Associação Akanemã, instituição representativa dos povos Xipaya e Kuruaya, da Aldeia Kujubim, reivindicaram o reconhecimento étnico da presença dos povos na TI. A área possui três aldeias dos povos indígenas, com aproximadamente 87 pessoas. Na oportunidade, os indígenas também reivindicaram a proteção territorial da região, que sofre com ameaças constantes de madeireiros, e a elaboração de um plano de desintrusão. “Precisamos de segurança jurídica”, afirmou o cacique Léo Xipaya.

Segundo Maria Janete, o processo de desintrusão estava sendo objeto de diálogo junto ao Ministério Público da União (MPU), e deveria ser encaminhado após a realização de levantamentos fundiários para identificar as ocupações erigidas por ocupantes de boa-fé e que seriam indenizados, além do cadastramento dos ocupantes não indígenas com perfil para reforma agrária, representados pelo Incra.

Em 14 de outubro de 2023 foi encontrado morto no rio Iriri o líder indígena Tymbektodem Arara, na Terra Indígena Cachoeira Seca. Ele era conhecido como Tymbek, e foi encontrado 16 dias depois de ter ido ao Escritório das Nações Unidas (ONU) em Genebra, na Suíça, denunciar invasão de terras na TI Cachoeira Seca. Tymbek estava acompanhado de dois ribeirinhos locais em um barco no rio, de acordo com informações do G1.

Enquanto esteve em Genebra, na ONU, Tymbek recebeu áudios atribuídos a fazendeiros locais, segundo uma pessoa não identificada que o acompanhou: “Tanto ele quanto o cacique receberam áudios, nenhum dizendo ‘Vou te matar’, mas ‘Ah, você está aí? Que bom que está defendendo sua terra’. ‘Vocês não têm medo?’, ‘O que estão fazendo aí?’ E eles ficavam dando perdido, dizendo que era para apresentar a cultura Arara”, relatou ao G1.

Circularam duas versões para a morte: uma dizia que Tymbek estava em um barco e se jogou por conta própria no rio para nadar e não saiu mais da água, com os ribeirinhos tentando salvá-lo. Outra aponta que o indígena foi jogado do barco por eles e, por estar bêbado, não conseguiu nadar e se afogou. De acordo com o G1, até aquele momento as lideranças Arara estimavam que havia cerca de dois mil invasores na região.

Na visão dos Arara, a principal responsável por estes efeitos no território é a UHE Belo Monte. A construção da usina também é associada por eles a doenças crônicas devido à circulação de alimentos alheios à cultura e sustento desse povo, como os ultraprocessados. A partir do início das medidas compensatórias, os danos e seus impactos se intensificaram. Os Arara começaram a pedir equipamentos como bombas de água, voadeiras e geradores de energia elétrica, mas também receberam comida ultraprocessada diferente dos seus hábitos alimentares: biscoitos recheados, salsichas, refrigerantes, macarrão, arroz, sal e açúcar, segundo reportagem de Jullie Pereira para o Infoamazônia. As listas com os pedidos dos indígenas eram supervisionadas pela Funai.

De acordo com depoimento de Larissa Ferreira, nutricionista especializada em Saúde Pública e mestre em Biodiversidade e Conservação pela Universidade Federal do Pará (UFPA): “Na TI Cachoeira Seca, você chega numa aldeia e vê plástico para todo lado, então você já consegue ver ali o biotipo deles, o quão impactante é esse modo de alimentar que o branco influi ali nas questões de saúde. A gente vê indígenas diabéticos, hipertensos, com sobrepeso”.

A chegada da usina e o crescimento do garimpo provocaram alteração dos ciclos ecológicos nos territórios e desequilíbrio na produção e consumo de alimentos. O indigenista Leonardo Halszuk,que analisou e apoiou cadeias produtivas de povos indígenas do Médio Xingu, observou que os indígenas Arara mais jovens foram os mais interessados nos alimentos não tradicionais. “Os mais velhos não se interessam tanto por bolacha, pelos produtos industrializados”. Com essas mudanças graduais impactando diferentes gerações, os indígenas Arara começaram a pescar e fazer menos coleta de frutas, o que os levou a perder práticas alimentares e culturais importantes.

 

Atualizada em fevereiro 2024

Cronologia

Século XVIII: População não indígena passa a migrar para a região conhecida como Terra do Meio, atraída pela economia da borracha (seringa).

1850: Primeiros contatos entre os Arara e os beiradeiros que residem entre os rios Xingu e Iriri.

1861: Grupo do povo Arara permanece dez dias entre os seringueiros abaixo da Cachoeira Grande do Iriri.

1889: Grupo de seringueiros começa a perseguir os Arara na região entre os rios Xingu e Iriri.

1960: Início das obras da rodovia Transamazônica e de intensificação dos conflitos no território tradicional dos Arara.

1970: Início das frentes de atração da Fundação Nacional dos Índios (Funai) para contato com os Arara.

1970: Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) cede terras para a Cotrijuí promover processo de colonização no território do povo Arara.

1976: Os Arara passam a reagir de forma violenta às tentativas de contato da Funai.

02 de fevereiro 1981: Funai consegue estabelecer contato com os Arara da região da Volta Grande do Xingu.

1984: Incra autoriza construção da Transiriri pela Madeireira Bannach.

1985: Funai tenta demarcar território dos Arara do Sul.

Janeiro de 1987: Funai realiza primeiro contato com os Arara da Cachoeira Seca.

Setembro de 1987: Funai realiza primeiro contato permanente com os Arara da Cachoeira Seca.

24 de maio de 1988: Funai expede Portaria nº 584 para formação de Grupo de Trabalho (GT) para identificar os limites da TI Cachoeira Seca.

03 de dezembro de 1988: Deputado Nicias Ribeiro (PT/PA) denuncia ação ilegal dos madeireiros nas terras indígenas dos Arara.

21 de dezembro de 1988: Funai expede Portaria nº 1.528 para constituição de novo GT para demarcação da TI Cachoeira Seca.

20 de maio de 1989: Antropóloga Wilma Leitão e sua equipe técnica iniciam trabalhos necessários à elaboração do laudo antropológico para demarcação da TI Cachoeira Seca.

06 de junho de 1989: GT da Funai finaliza os trabalhos de campo.

30 de abril de 1990: GT apresenta laudo antropológico para Funai com proposta de delimitação de 686.501 hectares.

12 de março de 1991: Ministério Público Federal (MPF) ajuíza ação de reintegração de posse contra Madeireira Bannach.

22 de março de 1991: Juiz Daniel Paes Ribeiro, da Justiça Federal, defere pedido de liminar e determina saída da madeireira do local.

2 de abril de 1991: Juiz Daniel Paes Ribeiro emite mandado de reintegração de posse em favor dos Arara de Cachoeira Seca.

14 de abril de 1991: Dois oficiais de Justiça, acompanhados pela Polícia Federal (PF) e pelo presidente da Funai, vão até a Madeireira Bannach e cumprem ordem de reintegração de posse.

Maio de 1991: Juiz Daniel Paes Ribeiro reconsidera o caráter imediato da ordem de reintegração de posse contra Madeireira Bannach.

5 de setembro 1991: Comissão Especial de Análise (CEA) da Funai se reúne para analisar trabalho de Wilma Leitão. Nessa reunião, a Comissão altera limites de 686.501 hectares para 760.000 hectares, redesenhando o traçado da TI Cachoeira Seca.

25 de fevereiro de 1992: Prefeitura de Altamira eleva o parque de processamento da Madeireira Bannach, instalado na margem esquerda do rio Iriri e dentro da TI Cachoeira Seca, à categoria de vila.

24 de abril de 1992: CEA realiza segunda reunião sobre o laudo antropológico de Wilma Leitão. Na reunião, decide-se por reduzir o limite norte e aumentar a área ao leste, conectando a TI Arara à TI Cachoeira Seca.

22 de janeiro de 1993: Conselho Indigenista Missionário (Cimi) denuncia atuação das madeireiras no território dos Arara.

22 de janeiro de 1993: Ministro da Justiça, Mauricio Corrêa, assina Portaria n° 26/1993, que declara para efeito de demarcação a TI Cachoeira Seca com 760 mil hectares, e um perímetro aproximado de 570 quilômetros.

28 de janeiro de 1993: Prefeitos de Altamira, Rurópolis e Uruará alertam o ministro da Justiça Mauricio Corrêa da possibilidade de conflito armado entre colonos e índios.

09 de fevereiro de 1993: Ministro da Justiça Mauricio Corrêa determina que Funai revise os pontos limites da área da TI Cachoeira Seca.

14 de fevereiro de 1993: Cimi informa que os Arara não concordam com solicitação do ministro Mauricio Corrêa para que a Funai revise limites da TI.

31 de março de 1993: Procurador da República e coordenador de Defesa de Direitos e Interesses Indígenas do Ministério Público Federal (MPF), Wagner Gonçalves, visita a TI Cachoeira Seca.

22 de abril de 1993: Antropólogo e assessor do MPF, Germano Crisóstomo Frazão, produz parecer sobre a portaria nº 26/1993 alegando que a Funai não forneceu justificativas para ampliar a área da TI Cachoeira Seca e nem para preservação do corredor entre as duas TIs.

10 de julho de 1993: Procurador Wagner Gonçalves divulga parecer em que conclui pela ilegalidade da portaria nº 26/1993 da Funai e da continuidade entre as TIs Cachoeira Seca e Arara.

19 de julho de 1993: Guilherme Henrique Magaldi Netto, consultor jurídico do Ministério da Justiça (MJ), solicita que Funai se manifeste de forma conclusiva diante dos questionamentos do procurador federal.

22 de abril de 1994: Alceu Cotia Mariz, chefe da Coordenação de Antropologia da Funai, apresenta ao MJ parecer alegando que a instituição não tem dúvidas quanto à importância da conexão das duas TIs e da área demarcada em questão.

27 de abril de 1994: Funai expede nova portaria nº 428/PRES para elaboração de novo laudo antropológico. Márnio Teixeira-Pinto é selecionado para a função.

23 de dezembro 1994: Márnio Teixeira-Pinto entrega relatório final do estudo.

1996: Grupos políticos insatisfeitos com o processo de demarcação da TI entram com cinco mandados de segurança no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para paralisar o processo. Somente dois mandados são acolhidos pelo Tribunal.

10 de dezembro de 1997: Ministros do STJ concedem provimento aos mandados de segurança e cancelam a portaria. A decisão baseia-se na fragilidade dos estudos que subsidiaram o aumento da área de 686.501 hectares para 760.000 hectares.

19 de maio de 1999: Povo Arara detém oito homens que abriam estrada dentro da área da TI.

24 de maio de 2000: Cimi denuncia assassinato do indígena Karaya e atentado sofrido por integrantes do Cimi e indígenas Arara quando chegavam à região denominada Dois Irmãos, atacados a tiros por pescadores e madeireiros.

2001: Pesquisadora Kerlley Santos aponta aumento dos processos de invasão no território dos Arara da Cachoeira Seca.

Dezembro de 2003: Arara fazem campanha para coletar assinaturas para abaixo-assinado em prol da demarcação da TI Cachoeira Seca.

16 de junho 2004: Delegação do povo Arara vai a Brasília e entrega ao ministro da Justiça, Cláudio Luiz Beirão, abaixo-assinado em prol da demarcação da sua terra. Reúnem-se com alguns representantes do governo federal.

22 de junho de 2004: Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (STTR) e Câmara Municipal de Uruará encaminham ofício à Funai cobrando cumprimento da decisão do STJ que havia cancelado a portaria n° 26/1993.

20 de julho de 2004: Funai paralisa processo de demarcação da TI Cachoeira Seca.

22 de julho de 2004: 300 agricultores interditam ponte da rodovia Transamazônica na altura do município de Placas/PA. No mesmo dia, Funai envia fax para líderes da manifestação informando que demarcação da reserva estava suspensa.

29 de outubro de 2004: Funai expede Portaria nº 1357/2004 assegurando ao povo Arara o direito de acesso ao território e proibindo o estabelecimento ou ingresso de novos ocupantes no local, bem como a restrição de direito de acesso, ingresso ou locomoção de pessoas estranhas aos quadros da Funai.

18 de novembro de 2004: Funai expede a Portaria nº 1442/2004 constituindo novo GT para realizar estudos complementares para delimitação da TI.

11 de maio de 2006: 30 representantes de quatro povos indígenas se reúnem em Altamira para discutir invasões no seu território.

11 de agosto de 2006: MPF exige que Funai apresente de forma definitiva relatório de demarcação da TI.

3 de novembro de 2006: Antropóloga Maria Helena Amorim Pinheiro, coordenadora do GT, entrega estudos complementares da demarcação.

27 de fevereiro de 2007: Presidente da Funai, Mércio Pereira Gomes, aprova estudos complementares do GT e determina publicação da decisão no Diário Oficial da União (DOU).

02 de maio de 2008: Advogado da União, Fernando Carvalho, apresenta parecer confirmando que o processo de demarcação da TI Cachoeira Seca cumpre legislação vigente.

30 de junho de 2008: MJ expede Portaria n° 1.235/2008 declarando a TI Cachoeira Seca como de posse permanente dos Arara.

Março de 2009: Empresa Norte Energia entrega Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório de Impacto Ambiental (Rima) da Usina Hidrelétrica (UHE) Belo Monte ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

05 de maio de 2009: Funai publica licitação para contratação de empresa para realizar demarcação física dos limites da Cachoeira Seca.

20 de agosto de 2009: Empresa Seta, que havia ganho a licitação para a regularização física da TI, inicia os trabalhos.

Setembro de 2009: Trabalhos da Seta são paralisados devido a impedimento dos colonos.

18 setembro de 2009: MPF solicita apoio da Polícia Federal (PF) às atividades de demarcação física da TI.

1º de dezembro 2009: Lideranças dos povos indígenas do Brasil, inclusive do povo Arara da Cachoeira Seca, se reúnem para escrever comunicado aos representantes do governo federal. Na carta, denunciam o descaso com os povos indígenas e solicitam suspensão do licenciamento da UHE Belo Monte.

1º de fevereiro de 2010: Ibama concede Licença Prévia (LP) à UHE Belo Monte, estabelecendo 19 condicionantes relativas a populações indígenas.

Maio de 2010: MPF solicita novamente informações para a Funai sobre continuidade do processo da demarcação física da TI.

Junho de 2010: Funai informa ao MPF que demarcação não foi concluída devido às ações hostis dos colonos.

1º de junho de 2011: Ibama concede Licença de Instalação (LI) da UHE Belo Monte ao Consórcio Norte Energia.

14 de junho de 2011: Empresa Seta retoma trabalhos de demarcação com apoio da PF. Entretanto, colonos fazem nova manifestação fechando rodovia Transamazônica por uma semana.

Agosto de 2011: Empresa Seta e Funai finalizam demarcação física da TI Cachoeira Seca.

20 de setembro de 2011: Funai expede Portaria nº 07/DPDS que constitui GT com objetivo de atualizar levantamento e avaliação de benfeitorias de não indígenas na TI para fins indenizatórios durante processo de desintrusão.

Outubro de 2011: Prefeitura Municipal de Uruará contesta composição da equipe do referido GT.

24 de agosto de 2012: Funai expede Portaria nº 1.044/PRES/2012 com objetivo de dar continuidade à atualização do levantamento e à avaliação das benfeitorias dos ocupantes não indígenas.

Setembro de 2012: Portaria nº 1.044/PRES/2012 é revogada por falta de estrutura da representação da Funai em Altamira para executá-la.

13 de fevereiro de 2014: Instituto Socioambiental (ISA) divulga nota técnica “Estado de Cumprimento das Condicionantes referentes à proteção das terras indígenas impactadas pela Usina Belo Monte”.

22 de maio de 2014: 320 indígenas e ribeirinhos ocupam principais vias de acesso aos canteiros de obras da UHE Belo Monte.

23 de maio de 2014: Um ônibus do Consórcio Construtor de Belo Monte (CCBM) é queimado.

26 de maio de 2014: Três indígenas são feridos em operação da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP).

27 de maio de 2014: Indígenas desocupam canteiros da UHE Belo Monte devido a um acordo firmado entre lideranças, representantes da Norte Energia, da Casa Civil, Ministério da Justiça e Funai.

11 de maio de 2015: ISA conclui em seus estudos que a área ilegalmente explorada pelos madeireiros na TI Cachoeira Seca mais do que duplicou em 2014.

13 de agosto de 2015: Ibama aplica multa de R$ 250 mil ao CCBM por compra de madeira ilegal.

22 de setembro de 2015: Diretoria do Ibama nega concessão da Licença de Operação (LO) de Belo Monte, condicionando-a ao cumprimento de dez pendências socioambientais da obra.

23 de setembro de 2015: MPF de Altamira expede duas recomendações a Funai. Uma delas é específica em relação à proteção do território dos indígenas Arara da Cachoeira Seca.

02 de outubro 2015: Ibama prende nove pessoas em flagrante por desmatamento na TI Cachoeira Seca.

12 de novembro de 2015: Funai envia ao Ibama ofício nº 587 2015/PRES/FUNAI/MJ no qual solicita sanções à empresa Norte Energia por falhas de execução do componente indígena.

24 de novembro de 2015: Ibama concede a LO de Belo Monte.

07 de março de 2016: Victoria Tauli-Corpuz, relatora especial das Nações Unidas sobre direitos dos povos indígenas, inicia visita ao Brasil.

17 de março de 2016: Victoria Tauli-Corpuz finaliza visita ao Brasil.

05 de abril de 2016: Presidência da República publica decreto de homologação da TI Cachoeira Seca no DOU, demarcando área com 733.688 hectares como de posse permanente e de usufruto exclusivo do povo Arara.

16 maio de 2016: Os Arara denunciam que conflitos em seu território aumentam após homologação das suas terras e exigem desintrusão e ações que controlem invasões dos madeireiros e grileiros.

29 de agosto de 2016: Povo Arara vai até a cidade de Altamira para reunião com MPF e exige apoio do órgão na retirada dos não indígenas de suas terras, além de denunciar aumento do desmatamento em seu território.

27 de novembro de 2018: ISA divulga dados sobre aumento considerável do desmatamento da TI Cachoeira Seca.

02 de janeiro de 2019: Grupo de madeireiros invade a TI Arara.

Janeiro de 2019: Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) publica dados do Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD), segundo o qual o desmatamento na Amazônia subiu 34% em dezembro de 2018, em comparação com o mesmo período do ano de 2017, passando de 184 quilômetros quadrados perdidos para 246 km².

Fevereiro de 2020 – O governo de Jair Bolsonaro apresenta o Projeto de Lei (PL) 191/2020 autorizando a mineração e a construção de hidrelétricas em TIs, inclusive nas que há indígenas isolados, legalizando o garimpo nessas áreas.

30 de abril de 2020 – A juíza da Comarca de Uruará, Caroline Silva, proíbe a realização de manifestação contra a continuidade da ação de fiscalização promovida pelo Ibama na TI Cachoeira Seca devido aos riscos proporcionados pela pandemia de covid-19.

05 de maio de 2020 – Operação de combate a ilícitos ambientais no entorno da TI Cachoeira Seca. Um servidor público que negociava com manifestantes contrários à manifestação é atingido com uma garrafada.

29 de junho de 2020 – A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), partidos políticos e outras entidades ingressam com uma Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) junto ao STF pedindo que o Supremo determine medidas urgentes, por meio de liminar, para garantir a vida dos indígenas devido à pandemia de covid-19, levando em conta, especialmente, a proximidade do recesso judiciário.

10 de maio de 2021Encontro reúne caciques e lideranças de 12 terras indígenas (TIs) da região do médio Xingu em Brasília para cobrar o cumprimento de condicionantes impostas para a construção da UHE Belo Monte.

14 de maio de 2021- Reunião da comitiva indígena com representantes da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), da Funai e do Consórcio Norte Energia.

17 de janeiro de 2023 – Operação federal de combate ao desmatamento na TI Cachoeira Seca do Ibama, Polícia Federal (PF), Polícia Rodoviária Federal (PRF) e Força Nacional de Segurança Pública (FNSP) fecha duas serrarias clandestinas e aplica mais de R$ 8 milhões em multas.

31 de março de 2023 – O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), oficializa o pedido de retirada de tramitação do PL 191/2020 na Câmara dos Deputados.

Maio de 2023: Rede Xingu+ lança o documento “Xingu sob Pressão” denunciando o crescimento do desmatamento entre os estados do Pará e do Mato Grosso.

04 de setembro de 2023 – Indígenas do povo Xipaya são recebidos pela presidenta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Joenia Wapichana, na sede do órgão, em Brasília.

14 de outubro de 2023 – Líder indígena Tymbektodem Arara, na Terra Indígena Cachoeira Seca, conhecido como Tymbek, é encontrado morto no rio Iriri.

 

Fontes

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Um comentário

  1. Só de uruara temos mas de 3 mil famílias na area demarcada pelo incra só queremos nossa area demarcada mesmo o certo é o incra vim com a funai e legalizar essa area tem muitas famílias que tem títulos definitivos dessas areas demarcada pelo incra.

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