CE – Povo indígena Anacé, pescadores, agricultores e outras comunidades tradicionais lutam e resistem contra impactos negativos do Complexo Industrial e Portuário do Pecém – CIPP

UF: CE

Município Atingido: São Gonçalo do Amarante (CE)

Outros Municípios: Caucaia (CE)

População: Agricultores familiares, Pescadores artesanais, Povos indígenas

Atividades Geradoras do Conflito: Atuação de entidades governamentais, Especulação imobiliária, Hidrovias, rodovias, ferrovias, complexos/terminais portuários e aeroportos, Indústria química e petroquímica, Mineração, garimpo e siderurgia, Políticas públicas e legislação ambiental, Termoelétricas

Impactos Socioambientais: Alteração no ciclo reprodutivo da fauna, Alteração no regime tradicional de uso e ocupação do território, Assoreamento de recurso hídrico, Contaminação ou intoxicação por substâncias nocivas, Desmatamento e/ou queimada, Falta / irregularidade na autorização ou licenciamento ambiental, Falta / irregularidade na demarcação de território tradicional, Falta de saneamento básico, Poluição atmosférica, Poluição de recurso hídrico, Poluição do solo, Poluição sonora

Danos à Saúde: Acidentes, Doenças não transmissíveis ou crônicas, Insegurança alimentar, Piora na qualidade de vida, Suicídio, Violência – ameaça

Síntese

Este caso envolve a luta do povo Anacé, que vive em territórios tradicionais nos municípios de São Gonçalo do Amarante e Caucaia, na região litorânea do Ceará. Desde os anos 1990, os Anacé sofrem os impactos negativos do Complexo Industrial e Portuário do Pecém – CIPP e, mais recentemente, com os projetos de retirada das águas dos lagos e dunas da região para as atividades do CIPP.

Remoções forçadas e estratégias violentas de silenciamento das reivindicações da população indígena, de agricultores familiares e pescadores artesanais são parte de um cenário que envolve os interesses financeiros do Estado do Ceará, em suas diversas gestões nos últimos anos, mas também de bancos e empresas nacionais e internacionais que atuam no CIPP.

O conflito envolvendo a opção por uma matriz energética altamente poluente e danosa, com base no carvão mineral, ainda que localizado no Estado do Ceará, envolve outros países, como a Colômbia, maior exportador de carvão mineral para o CIPP.

A partir de 2010, soma-se às violações provocadas pelo CIPP a questão da apropriação das águas de rios e afluentes dos territórios tradicionalmente ocupados e em Área de Preservação Ambiental – APA Lagamar do Cauípe que, sob o discurso de escassez, o Estado pretende explorar. As 27 comunidades da região do Lagamar do Cauípe estão envolvidas e lutando em defesa de uma das principais fontes de alimentos e da vida, mas também ressaltando o aspecto sagrado e ancestral que representa o Lagamar, área que será mais afetada com a retirada das águas.

Apesar dos estudos realizados por parte da Fundação Nacional do Índio – Funai, o povo Anacé permanece sem o reconhecimento da população indígena por parte do Estado brasileiro, e seu território permanece vulnerabilizado pelos interesses públicos e privados. O cenário político do Brasil tem demonstrado que, apesar de todos os esforços das instâncias públicas defensoras do povo Anacé e de outras populações atingidas (como o Ministério Público Federal – MPF), há risco de colapso dos ecossistemas dependentes dos mananciais hídricos, de superexploração do lençol freático e de salinização do aquífero, além de poluição do ar.

O povo Anacé, pescadores, agricultores e moradores das comunidades diretamente afetadas vêm ao longo dos últimos anos realizando ações de resistência. Duas delas culminaram em acampamentos liderados, principalmente, por mulheres.

É uma agenda que tem contado com apoio de diversas organizações da sociedade civil local e nacional, como o Conselho Indigenista Missionário –Cimi, o GT Racismo Ambiental da Rede Brasileira de Justiça Ambiental – RBJA, o Comitê Territorial de Matões e o Escritório de Direitos Humanos e Assessoria Jurídica Popular Frei Tito de Alencar – EFTA.

O Núcleo Trabalho, Meio Ambiente e Saúde da Universidade Federal do Ceará – Tramas e a Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz Ceará também têm contribuído com as lutas do povo Anacé e das populações atingidas pelas atividades do CIPP.

Contexto Ampliado

“Naquela região nós erámos apenas agricultores, pescadores. Nós vivíamos da colheita da palha da carnaúba. Da folha da carnaúba os próprios Anacé faziam artesanato e ainda fazem até hoje. Além de tudo isso, da agricultura, eram plantadas bastante coisa. Também tínhamos a pesca e a gente vivia da casa de farinha, algumas inclusive estão sendo reabertas, lá no Matões tem uma. Quando a gente recebeu as primeiras notícias do CIPP, a gente viu que aquilo ali iria mudar. As pessoas tinham ideia de que aquilo ali se tornaria a coisa melhor do mundo. Colocaram para as pessoas, principalmente para os jovens, que eles teriam emprego, que eles iriam ter toda felicidade. E não é o que aconteceu e não é o que acontece até hoje”.  Paulo França Anacé (entrevista gentilmente cedida durante a realização da Oficina da Universidade Popular dos Movimentos Sociais – UPMS das Águas realizada no Ceará de 29 de novembro a 2 de dezembro de 2018).

A fala de Paulo França, uma das lideranças do Povo Anacé, coloca uma problemática que vem se arrastando ao longo dos últimos anos na região que envolve os municípios de São Gonçalo do Amarante e Caucaia desde a implementação do Complexo Industrial e Portuário de Pecém – CIPP, inicialmente proposto sob o argumento de suprimento da demanda emergencial de energia elétrica no País. Antes de entrarmos no contexto do conflito que se dá desde os anos 1990 e afeta não só o Povo Indígena Anacé, mas também agricultores familiares e pescadores artesanais, se faz necessário revisitar o Relatório Provincial de 1863.

O Relatório afirmava que estavam extintas as populações indígenas e o, à época, presidente da província, José Bento da Cunha Júnior, foi bastante enfático, conforme trecho do Relatório transcrito a seguir:

“Já não existem aqui índios aldeados ou bravios. Das antigas tribos (sic) de Tabajaras, Cariris e Potiguaris, que habitavam a província, uma parte foi destruída, outra emigrou e o resto constituiu os aldeamentos da Serra da Ibiapaba, que os Jesuítas no princípio do século passado formaram em Villa Viçosa, S. Pedro de Ibiapina, e S. Benedicto com os índios chamados Camussis, Anacaz, Ararius e Acaracú, todos da grande família Tabajara. Com a extinção dos Jesuítas, que os governavam theocraticamente, decahiram esses aldeamentos, e já em 1818 informava um ouvidor ao governador Sampaio que os índios iam-se extinguindo na Ibiapaba, onde tinham aqueles religiosos um celebre hospício no lugar denominado Villa Viçosa, que com os outros acima indicados abrangem a comarca deste nome. E nelles que ainda hoje se encontram maior número de descendentes das antigas raças; mas andam-se hoje misturados na massa geral da população.” (Relatório Provincial apud Antunes, 2012: 12).

O Relatório não é apenas um dado histórico, mas um índice do ocultamento forçado que se materializou entre diversas populações indígenas no Ceará e outras partes do Nordeste, sendo fato inconteste a ausência de políticas que dessem conta das especificidades dos povos indígenas da região durante boa parte dos séculos XIX e XX. Em 2012, a Assembleia Legislativa do Estado do Ceará – Alece, através do pedido da Deputada Estadual Raquel Marques, do Partido dos Trabalhadores – PT, realizou audiência pública de reparação tendo como objeto o Relatório Provincial.

Apesar da forte presença de povos indígenas na Audiência; de no ano de 2010 mais de 9 mil pessoas se autodeclararem indígena na Região Metropolitana de Fortaleza; e de 90% do municípios cearenses possuírem nomes de origem indígena (Antunes, 2012), o imaginário sobre a ausência de indígenas, de acordo com relatos, segue forte e coloca obstáculos materiais, políticos e simbólicos à luta indígena local. Um exemplo emblemático são as constantes tentativas de epistemicídio, ou seja, o apagamento das formas de existências, conhecimentos e vida dos povos indígenas e originários, em seu extremo, a negação radical do status de humanidade dessas populações e povos (SANTOS e MENESES, 2009).

O contexto colonial, em sua expressiva violência material e simbólica, fez com que diversos povos indígenas da região, diante dos sucessivos massacres e extermínio, fossem forçados a ocultar suas cosmologias para continuar vivendo. As formas de cultos ao sagrado, as línguas e as concepções de mundo foram negadas em nome de um projeto colonial que não favorecia a co-presença; a partir da visão colonizadora, era preciso exterminar o Outro – o indígena e as populações escravizadas, ou dominá-los, transformá-los por completo (sobre a violência colonial de povos indígenas da região Nordeste, sugerimos a leitura do texto: Morte e vida do Nordeste indígena: a emergência étnica como fenômeno histórico regional, de José Maurício Andion Arruti, 1995, aqui).

É importante destacar que, muito embora o processo tenha sido demasiadamente violento e desumanizante, os povos originários e as populações escravizadas resistiram, principalmente a partir do século XX. No caso dos Anacé, as gerações presentes foram alimentadas pela oralidade de seus ancestrais e a agenda de reafirmação do seu povo diante dos conflitos atuais se tornou necessária por representar uma reparação há muito esperada.

O Povo Anacé inicia seu processo de organização pela demarcação de seu território, junto à Fundação Nacional do Índio – Funai e a Procuradoria da República – PR/MPF no Ceará, no ano de 2003, depois de uma sequência de ameaças e expropriações provocadas pela chegada do CIPP. Em 1995 foram iniciados os levantamentos de verificação da viabilidade do Complexo Portuário e em março de 1996 o Governo do Estado do Ceará, através do Decreto nº 24.032/96, declarou como de utilidade pública as terras localizadas nos municípios de Caucaia e São Gonçalo do Amarante para fins de desapropriação, atendendo aos interesses dos empreendedores do CIPP, que teve suas obras iniciadas ainda no mês de maio do mesmo ano. Ao todo foi desapropriada uma área total de mais de 330km².

As obras do CIPP foram finalizadas em 2001 e sua inauguração oficial se deu em março de 2002. De acordo com informações encontradas no site oficial, o Complexo portuário é composto por diversas instalações, dentre as quais, de órgãos federais: Ministério da Fazenda, Ministério da Agricultura, Ministério da Justiça, Ministério da Saúde e Ministério de Meio Ambiente, através do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – Ibama.

Também há instalações de órgãos estaduais: Secretaria da Fazenda e Secretaria da Agricultura. Os empreendimentos e companhias industriais que compõem o CIPP são: Terminal Portuário do Pecém, Zona de Processamento de Exportação do Ceará, Companhia Siderúrgica do Pecém, Refinaria Premium II, Termelétricas Pecém I e Pecém II (site oficial do CIPP).

No período de implementação do CIPP o discurso recorrente era o de que haveria mais emprego para a população local e muitos trabalhadores que viviam da agricultura e da pesca artesanal foram trabalhar na construção civil e, com as obras finalizadas, passaram a fazer parte das estatísticas de desemprego, como ressalta Paulo França Anacé:

“A maioria das pessoas dali não trabalham e não vivem do CIPP. O que aconteceu é que aquelas pessoas que eram agricultoras, pescadoras e até mesmo tendo construído suas próprias casas, acabaram tendo que partir para construir grandes obras, no caso a siderúrgica, a termoelétrica, e sobreviveram como se tivessem ganhado milhões. Aquela ilusão do dinheiro fez com que bastante pessoas acreditassem que aquele sonho estava chegando. […] A ilusão foi colocada de que o futuro seria o CIPP. Então, perdemos um pouco da nossa identificação, perdemos um pouco da nossa cultura, os Anacés foram colocados de lado” (Oficina UPMS das Águas Ceará, nov/dez. 2018).

Em 2006, o Povo Anacé passa a integrar o movimento indígena no Ceará durante a realização da Assembleia dos Povos Indígenas no Ceará realizada na aldeia Nazário, do povo Tabajara, no município de Crateús, marcando assim o início de uma longa jornada de mobilizações, sendo o ano de 2007 emblemático nesse sentido. A primeira mobilização aconteceu no mês de maio quando, juntamente com outras etnias do Ceará, o povo Anacé ocupa a sede da Funai em Fortaleza a fim de exigir a demarcação dos territórios tradicionais e reafirmar a importância da Funai nesse processo.

Em setembro acontece a 2ª Assembleia do Povo Anacé, que em sua pauta reforça a necessidade da reestruturação da Funai no Ceará, além da formação de grupos de trabalho para identificar, demarcar e homologar os territórios das comunidades indígenas, pedindo a anulação da venda de terras e a proibição de projetos imobiliários nas áreas indígenas no Estado. De acordo com depoimento de Junior Anacé, durante os preparativos para a 2ª Assembleia do Povo Anacé, nos primeiros sete anos após serem arrancados de seu território, 32 idosos da etnia morreram, concorrendo para essa mortalidade a tristeza e o desgosto com a violência de sua expulsão do território que sempre habitaram.

Em dezembro de 2007 aconteceu o 2º Encontro dos Povos Indígenas do Ceará, que debateu as desapropriações, expulsões e as limitações estruturais de órgãos como a Funai (e também a Funasa), no que tange à educação, saúde, água e saneamento, tanto para os Anacés quanto para as demais populações indígenas e tradicionais.

O ano de 2008 é marcado pelo início dos processos jurídicos. No mês de abril a Defensoria Pública da Comarca de São Gonçalo do Amarante move Ação Civil Pública – ACP contra impactos negativos da instalação de usinas termoelétricas no CIPP e em agosto o Ministério Público Federal – MPF encaminhou recomendação à Funai a fim de dar continuidade ao processo de demarcação da TI Anacé, o que aconteceu apenas em agosto de 2009, quando a Funai constituiu o Grupo de Trabalho para realizar estudos de identificação da terra indígena.

Na ACP movida em 2008 pelo defensor público Thiago Tozzi, da Comarca de São Gonçalo do Amarante, registrou-se uma série de impactos nocivos à saúde que o carvão mineral e sua cadeia de carbono poderia provocar. Esses impactos foram apresentados no Dossiê do I Encontro Internacional dos Atingidos pela Vale, realizado em abril de 2010. De acordo com sistematização da ação feita no Dossiê, o defensor trouxe como principais impactos:

  • Elevado potencial de toxicidade, podendo mudar a composição da vegetação e penetrar na cadeia alimentar;
  • Degradação do solo e da água diante da drenagem ácida;
  • Partículas suspensas agravam o quadro de complicações respiratórias, a exemplo da asma, e altera negativamente a qualidade do ar.
  • Aumento do aquecimento global provocado pelo CO2.

Ainda de acordo com o Relatório do Encontro Internacional de Atingidos pela Vale S/A:

“Essa somatória inflacionará e deteriorará a partir da redução e estandardização de oportunidade o lazer dos brasileiros e de populações regionais. Abordará, ainda, as comunidades nativas como subsidiárias das novas cancuns nacionais, em total desrespeito com a diversidade cultural que marca a nação, com as culturas locais, o sentido de pertencimento, identidade, autoafirmação de comunidade, que passam à condição de tutelados pelas assertivas público-privadas, nacionais-internacionais e dirigidas pelos poderes financeiros e mercadológicos ditados por agentes impalpáveis. Um processo de colonização singular e opressivo impõe-se, mais complexo, em detrimento da soberania dos povos Anacé, pequeno retrato de uma comunidade nacional mais ampla, tratada como espectadora da expectação do seu próprio futuro e presente” (2010, p. 88).

Outro dado importante destacado no Dossiê do Encontro Internacional dos Atingidos pela Vale S/A diz respeito à chuva ácida. De acordo com a professora Raquel Rigotto, do Núcleo Trabalho, Meio Ambiente e Saúde da Universidade Federal do Ceará – Tramas/UFC, além da possibilidade de chuva ácida, em virtude da alta emissão de dióxido de enxofre, o alcance desta emissão, dependendo das condições do microclima, poderia atingir um raio que variava de 80 a 300 quilômetros. O Ceará tem pouco mais de 500 quilômetros de litoral e o complexo Pecém está a 60km da capital Fortaleza (Dossiê dos Impactos e Violações da Vale no Mundo, abril de 2010).

É importante destacar que, para além dos impactos já sentidos pelas populações do entorno com a poluição do ar e os desterros forçados, o CIPP está localizado em uma planície litorânea com um largo cordão de dunas fixas e móveis. Nesse sentido, olhar para os impactos de forma fragmentada, esquecendo da complexidade do todo, pode gerar consequências ainda mais graves a longo prazo.

Em recomendação feita no mês de novembro de 2008 – nº 59/08, o MPF solicita ao Governo do Estado do Ceará a suspenção da desapropriação dos terrenos onde vivia o povo Anacé até a conclusão dos estudos de identificação e delimitação da TI. Os procuradores da República Francisco de Araújo Macêdo Filho, Alessander Sales e Márcio Andrade Torres assinaram a recomendação após conhecerem os estudos iniciais realizados por antropólogo do MPF, com dados que estimavam a extensão de aproximadamente 11,6 mil hectares da área indígena, com cerca de 800 famílias Anacé (reportagem do Ministério Público Federal, em 06 fev. 2009)

No artigo intitulado “O recurso ao Ministério Público Federal como estratégia indígena para a gestão de seu território: os casos Tapeba e Anacé no Ceará”, Sérgio Góes Telles Brissac observa que o Governo do Estado do Ceará se manifestou contrário à recomendação do MPF afirmando:

“Não há tradicionalidade, não há valores culturais, religiosos, étnicos do povo que se autodenomina Anacé, muito menos notícia de reinvindicação de posse, ocupação ou permanência na área descrita no aludido parecer”.

Assim, não acatou a recomendação do MPF (BRISSAC, 2009, p. 10).

Em fevereiro de 2009, os Anacé protestaram contra as desapropriações e chamaram atenção para a acelerada deterioração das estruturas da antiga Igreja de São Roque, em São Gonçalo do Amarante que, mesmo em condições precárias, seria um patrimônio histórico relevante para a memória das respectivas comunidades locais. Além de serem considerados obstáculos ao desenvolvimento por agentes públicos e privados, os Anacé morriam por atropelamentos, suicídios e eram assassinados por ações do narcotráfico, que chegou à localidade junto com o porto do Pecém (Cimi, 2009).

Reunida no Ceará em março de 2009, a Rede Brasileira de Justiça Ambiental – RBJA, articulada à Assembleia dos Povos Credores do Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID, por ocasião da comemoração dos 50 anos do banco, em Medellín, aprovou carta em repúdio ao financiamento das termelétricas Pecém I e Porto de Itaqui, pelo BID. A RBJA questionou o financiamento de cerca de 200 milhões de dólares pouco após o anúncio do BID, em 2007, de promover iniciativas no sentido da construção de uma política de combate às mudanças climáticas (matéria disponível no Ecodebate, em 28 mar. 2009).

A pressão não foi suficiente e, no dia 30 de outubro de 2009, o Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID liberou US$260 milhões do financiamento de longo prazo da UTE Porto do Pecém I (disponível em: EDP Energias do Brasil, São Paulo, 03 nov. 2009).

Ainda em março de 2009, o GT Racismo Ambiental da RBJA, ao final do II Seminário Brasileiro contra o Racismo Ambiental, se posicionou a favor da luta do Povo Anacé na Carta de Fortaleza, assinada por 50 organizações sociais brasileiras presentes no Seminário (disponível no portal Combate Racismo Ambiental, 25 mar. 2009).

Luta dos Anacé contra o CIPP em 2009. Protesto na Terra Anacé. Foto: Tania Pacheco.

Em abril de 2009, os Anacé denunciaram que funcionários do Instituto de Desenvolvimento Agrário do Ceará – Idace estariam cadastrando os indígenas sem explicar os motivos. Tais procedimentos se relacionariam ao processo de desapropriação promovido pelo governo do Ceará em benefício das construções do CIPP, segundo informações do Cimi.

O ano de 2009 ficou marcado por duas grandes conquistas do Povo Anacé: a primeira foi a constituição do GT da Funai responsável pelo levantamento e delimitação do território Anacé, e a segunda conquista veio com a ACP movida pelo MPF em favor dos Anacé, no mês de dezembro.

A ACP exigia que o governo estadual: a) suspendesse as desapropriações realizadas no mês de fevereiro; b) obrigava o Estado a não executar quaisquer obras e a suspender todas as licenças já expedidas pela Superintendência Estadual do Meio Ambiente – Semace que tivessem por objeto empreendimentos no território; c) assegurava a continuidade dos trabalhos de demarcação da TI Anacé.

Entretanto, se os Anacé conquistaram importante apoio do MPF para defesa da integridade de seu território e para avanço de suas demandas junto à Funai, por outro lado, os grandes grupos econômicos interessados em sua expulsão, e em fazer avançar o licenciamento e a instalação dos projetos incluídos no CIPP, encontraram nos grandes conglomerados da mídia corporativa um aliado importante na disputa territorial.

Em maio de 2010, os repórteres Leonardo Coutinho, Igor Paulin e Júlia de Medeiros assinaram matéria publicada na revista semanal Veja sob o título: “A farra da antropologia oportunista”, que visava, sob o pretexto de tratar-se de uma reportagem investigativa, apresentar supostas fraudes relativas à execução da política nacional de reconhecimento territorial de povos indígenas e quilombolas. Segundo a matéria, diversas comunidades estariam reivindicando ilegitimamente uma ancestralidade indígena ou quilombola a que não teriam direito apenas com o objetivo de obterem terras, muitas vezes motivadas pela suposta influência e interesses de ONGs e de setores da Igreja Católica. Na ótica da publicação, essas “fraudes antropológicas” impediriam o desenvolvimento nacional e a implantação de projetos produtivos em diversas regiões do País.

Entre as comunidades arroladas como exemplos dessa fraude estavam os Anacé, descritos pela revista pejorativamente como:

“Macumbeiros de cocar que se diziam índios. Um padre […] convenceu seus fiéis de que esses investimentos os expulsarão do local. Sua única saída para ficar lá seria declararem-se indígenas”.

O sincretismo religioso dos povos indígenas nordestinos é usado pela revista como índice dessa suposta fraude antropológica. Os repórteres afirmam que o fato dos Anacé frequentarem terreiros de candomblé – e de realizar a dança de São Gonçalo, padroeiro do município onde vivem -, indicaria não serem eles verdadeiros índios, pois a origem da chamada “macumba”, nome popular que inclui tanto o Candomblé quanto a Umbanda, seria africana e, a da dança, portuguesa.

Essa análise rasa e descontextualizada apresentada pela revista não condiz com boa parte da literatura antropológica brasileira a respeito do processo histórico que levou à “caboclização” dos índios nordestinos – e sua posterior reermegência enquanto grupos possuidores de identidade própria e distinta da nacional -, um processo permeado por relações de poder e opressão por parte do Estado e grupos sociais majoritários, conforme explicita José Maurício Arruti em trabalho publicado na revista Estudos Históricos em 1995.

A reportagem mereceu não apenas o repúdio de representantes de movimentos sociais, ONGs e entidades que apoiam as lutas dos povos indígenas por seus territórios e contra o racismo a que estão submetidos, como também da própria Associação Brasileira de Antropologia – ABA (ver nota completa aqui) e da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC (ver nota completa aqui)

O antropólogo Eduardo Viveiros de Castro – citado na reportagem como fonte de muitas das opiniões apresentadas pela revista como contrárias à política nacional de demarcação de terras indígenas e titulação de comunidades quilombolas – desmentiu as declarações atribuídas a ele e enfatizou:

“Gostaria de saber quando e a quem eu disse isso, uma vez que (1) nunca tive qualquer espécie de contato com os responsáveis pela matéria; (2) não pronunciei em qualquer ocasião, ou publiquei em qualquer veículo, reflexão tão grotesca, no conteúdo como na forma. Na verdade, a frase a mim mentirosamente atribuída contradiz o espírito de todas as declarações que já tive ocasião de fazer sobre o tema. Assim sendo, cabe perguntar o que mais existiria de `montado´ ou de simplesmente inventado na matéria. A qual, se me permitem a opinião, achei repugnante” (disponível na matéria “Como demonizar populações vulneráveis”, publicada pelo jornalista Washington Araújo em 18 maio 2010, no Observatório da Imprensa).

Tania Pacheco, jornalista, historiadora e membro do Grupo de Trabalho Racismo Ambiental da Rede Brasileira de Justiça Ambiental, publicou nota em seu blog – Combate Racismo Ambiental – em que classificava o conteúdo da matéria como:

“Absurdo, racista, preconceituoso e, além de tudo, mentiroso – como inteiramente a serviço do capital ao qual pertencem e do qual são veículos subservientes”.

João Pacheco de Oliveira, antropólogo que coordenava a Comissão de Assuntos Indígenas da Associação Brasileira de Antropologia – CAI/ABA, publicou nota em que questionava a validade dos dados e estimativas apresentados pela revista, além de contestar afirmações realizadas pela mesma em relação à forma como os antropólogos contratados pela Funai para realização dos estudos eram remunerados.

Em junho de 2010, segundo reportagem de André Jonathas para o jornal O Povo, o Governo do Estado do Ceará negociava, com o povo Anacé, a assinatura de um acordo relativo à troca de um trecho de 1.000ha, dentro da área pleiteada pelos Anacé (prevista para receber parte da Refinaria Premium II, da Petrobras), por uma área de igual tamanho entre a Zona de Processamento de Exportação – ZPE e a Companhia Siderúrgica do Pecém – CSP.

Entrevistada por Teresa Fernandes para o mesmo jornal, Andréa Coelho, do povo Anacé, afirmou que a proposta do Governo do Estado do Ceará não atendia aos interesses da etnia, pois ilharia a comunidade dentro de uma área cercada por empreendimentos potencialmente poluentes: “Não tem como viver assim. Nós queremos a terra, mas também queremos viver com dignidade, com qualidade de vida”. A qualidade de vida de comunidade já era, naquela ocasião, afetada pelo CIPP. Segundo Andréa, que é Agente Comunitária de Saúde – ACS, o aumento da poeira derivada do intenso tráfego de carros e caminhões para o Complexo estaria intensificando a incidência de problemas respiratórios entre adultos e crianças.

Além dos Anacé, o MPF se manifestou contra a negociação proposta pelo Governo do Estado do Ceará. Um parecer da 6ª Câmara de Conciliação e Revisão – Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais (6ªCCR/MPF), em Brasília, assinado pelo analista pericial Marcos Paulo Fróes Schettino, advertia que o acordo poderia motivar uma série de problemas no futuro. Schettino dizia ainda que os acordos se demonstraram insustentáveis e as terras voltaram a ser reivindicadas pelos indígenas, tornando-se fonte de conflitos e problemas socioambientais. Um dos problemas relacionados ao acordo seria o fato de a Constituição Federal considerar as terras indígenas como bens da União sob usufruto dos povos que nelas habitam, e declará-las indisponíveis e inalienáveis, tornando qualquer título ou acordo firmado tendo-as como objetos juridicamente nulos e, portanto, sem efeitos.

Ainda no ano de 2010 foi criado o Comitê Territorial de Matões, grupo formado por moradores interessados em discutir o acesso e escassez de água nas 27 comunidades no entorno do Lagamar do Cauípe. Nesse período já existiam alguns diálogos entre o Governo do Estado e as comunidades do entorno do Lagamar, todavia, as duas perspectivas sobre o uso da água eram distintas e contraditórias entre si. De acordo com Paulo França, uma das lideranças do povo Anacé, a reivindicação era pela instalação de 27 poços que garantissem o abastecimento das comunidades, e a intenção do Governo do Estado era garantir água para as atividades de siderurgia e processamento de minério do CIPP.

Apesar de todo o debate em torno da demarcação do território Anacé, a Petrobras entregou, em janeiro de 2011, o relatório e o estudo de impacto ambiental da Refinaria Premium II solicitando a concessão de licença prévia do empreendimento. A empresa trabalhava com a previsão de que a refinaria fosse operar em 2017, com o refino de 300 barris de petróleo por dia, voltados para o mercado interno.

Paralelamente, no ano de 2011 foram iniciados os estudos de avaliação do potencial hídrico e subterrâneo da região do Cauípe, realizados pela Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos – COGERH. No mesmo ano foi divulgada a Lei Estadual nº 14.920, que autorizava a COGERH a conceder às empresas Porto do Pecém Geração de Energia S/A e MPX Pecém II Geração de Energia S/A 50% de desconto sobre o valor da tarifa de água (Lei Estadual nº 14.920. Estado do Ceará).

Segundo artigo apresentado por Ana Tófoli, em setembro de 2011 – que tinha como base o relatório preliminar da coordenadora do GT instituído pela Funai para realização dos estudos de identificação das terras indígenas Anacé, e antes mesmo da terceira ida a campo para estudo adicional pleiteado pelo GT -, a Presidência da Funai considerou que na área de Bolso, Chaves, Tapuio e demais localidades pertencentes ao município de São Gonçalo do Amarante e em Matões no município de Caucaia – área que corresponde à da refinaria – não havia elementos para serem consideradas terras tradicionalmente ocupadas por indígenas. Com base nessa conclusão preliminar de um estudo ainda em andamento, a Funai encaminhou ofício à Petrobras autorizando a construção da refinaria na área.

Apesar da liberação do terreno previsto para instalação da refinaria, a Funai continuou a realizar os estudos de identificação da TI Anacé e paralelamente iniciou negociações com o governo estadual para viabilizar o reassentamento de várias famílias Anacé localizadas no entorno do terreno. Isto incluía pelo menos 80 famílias da etnia e era considerado, pelo governo do Ceará e pela Petrobras, um impasse que estava atrasando as obras da Premium II.

Em setembro de 2012, o Governo estadual e a Petrobras apresentaram proposta de reassentamento das famílias Anacé em uma área de 725 hectares entre a rodovia CE-085 e uma praia no município de Caucaia. Uma equipe da Funai foi enviada para o local para vistoriar a área e levar a proposta aos Anacé. Sendo aceita, seria firmado um termo de compromisso entre as partes. A assinatura do acordo já havia sido negociada previamente com as famílias Anacé.

Em novembro de 2012, a Funai divulgou, após a assinatura do termo de compromisso, que estava elaborando um relatório circunstanciado de constituição da reserva, e que somente depois da conclusão desta etapa o reassentamento poderia ocorrer. O governador do estado, Cid Gomes, porém, tinha pressa neste processo, pois pretendia aproveitar a presença da presidenta Dilma Rousseff em Fortaleza para oficializar a entrega do terreno da refinaria à Petrobras (um compromisso político assumido por ambos durante a campanha eleitoral que elegeu a presidenta e reelegeu o governador).

Entretanto, a anuência da Funai ao acordo firmado com as famílias Anacé aconteceria somente em março de 2013, quando um ofício foi enviado pelo órgão indigenista à Semace aprovando os Estudos Complementares sobre o Componente Indígena Tapeba e Anacé do Plano Básico Ambiental (PBA), o que na prática permitia a concessão da Licença de Instalação – LI da Refinaria Premium II.

Em abril de 2013, o Governo do Estado do Ceará entregou formalmente uma área de 1930 hectares, que incluía parte do território tradicional dos Anacé, à Petrobras. A cessão da área estava prevista desde que foram estabelecidas as condições pelas quais a empresa instalaria os empreendimentos no Estado.

Em 14 de maio de 2013, foi realizada uma reunião na 6ª CCR do MPF com representantes da Funai, dos Anacé e dos empreendedores, na qual foi assinado oficialmente o acordo e a cessão do terreno ao Povo Anacé. A área inicialmente anunciada com 725 hectares foi reduzida para 543 hectares até a assinatura do acordo.

Em maio de 2013, a Secretaria da Infraestrutura do Estado do Ceará – Seinfra anunciou que estava preparando os projetos com vistas à realização das licitações para implantação da infraestrutura da área onde se instalaria a comunidade indígena. A proposta na ocasião era a construção de 163 casas distribuídas entre quatro aldeias, uma escola indígena, um posto de saúde, acesso viário, vias internas, sistemas de energia elétrica, de água e de esgoto, terraplenagem e drenagem. Segundo informações do Portal Pecém, o terreno adquirido custou R$ 15 milhões ao Governo Estadual e um valor igual seria pago pela Petrobras para construção da infraestrutura.

Apesar de o acordo ter sido oficialmente firmado em maio, e de a aquisição ter sido anunciada na mesma época, a lavratura do Termo de Compromisso entre Governo do Estado, Petrobras e a Funai foi sendo sucessivamente adiada ao longo dos meses seguintes a pedido do governo estadual. Estava inicialmente prevista para o dia 1º de julho, depois foi adiada para 17 de julho e, depois, para 03 de agosto.

Uma matéria do jornal Diário do Nordeste anunciou que a Procuradoria Geral do Estado do Ceará- PGE/CE havia adiado novamente a assinatura do termo para a segunda quinzena de setembro. Segundo o jornal, os sucessivos adiamentos estavam associados às dificuldades de negociação com os proprietários das áreas a serem desapropriadas para a formação da reserva. Por outro lado, a área cedida à Petrobras já estava consolidada e seu cercamento já estava ocorrendo.

Em 14 de agosto, foi anunciado mais uma vez o adiamento da assinatura do termo de compromisso. Dessa vez, o Governo Estadual alegou que fazia isto a pedido da Funai, uma vez que o acordo envolvia também a delimitação de outra terra indígena situada dentro da área de influência do CIPP, a TI Tapeba. De acordo com o Diário do Nordeste, o governador Cid Gomes informou que aguardaria o fim das negociações entre os indígenas e a Funai, uma vez que os Tapeba ocupavam a sede da Coordenação Regional Nordeste II desde o dia anterior exigindo a publicação da Portaria de Delimitação da Terra Indígena Tapeba; diante do impasse, a Funai teria decidido conduzir ambos os processos paralelamente de forma a permitir a assinatura do termo de compromisso conjuntamente.

Em 22 de novembro de 2013, o termo de compromisso foi finalmente assinado e foi oficialmente anunciada a criação da Reserva Indígena Taba dos Anacés. O documento assinado confirmou que a Petrobras arcaria com o valor de R$ 15 milhões para pagar parte da compra do terreno, as indenizações e criação da infraestrutura (disponível no portal Petronotícias, em 22 nov. 2013).

Em janeiro de 2014, o Jornal dos Munícipios divulgou o anúncio da Seinfra de que o início das obras para construção da infraestrutura da reserva estava previsto para março daquele ano. Definiu-se que seriam implantados 17 lotes de 800 metros quadrados, divididos em módulos destinados às comunidades Baixa das Carnaúbas, Matões, Corrupião e Bolso. De acordo com o documento, cada unidade teria 80 metros quadrados, sendo composta por três quartos, banheiro, sala de estar, cozinha e área de serviço.

A Reserva Indígena Taba dos Anacés, muito embora tenha atendido parte da demanda do Povo Anacé, tornou-se também ponto de conflito, uma vez que, ainda na fase de construção do complexo habitacional, as expropriações de terras permaneceram, agora intensificadas pelo Plano de Segurança Hídrica da Região Metropolitana de Fortaleza, divulgado no ano de 2016.

A problemática em torno do “roubo da água”, assim tratado pelas populações locais e por parte do Povo Anacé, começou a ser anunciada ainda em 2010. Naquele momento o Governo do Estado entrou em negociação com as 27 comunidades a serem afetadas pelos dutos de transmissão que levariam água até o CIPP.

A ideia das comunidades era a de que, afetadas pela escassez de água diante da ausência de poços de uso coletivo, o Governo do Estado pudesse garantir a instalação dos 27 poços para o abastecimento das próprias comunidades. O Governo, por sua vez, apenas em 2016 respondeu dizendo que construiria somente 13 poços – a serem colocados nas comunidades que fossem sorteadas -, mas solicitava a aceitação de todas as comunidades para as obras que instalariam os dutos direcionados ao CIPP.

Inicia-se outro ciclo de conflitos envolvendo a luta pelos territórios tradicionalmente habitados contra as empresas que compõem o CIPP e o Governo do Estado do Ceará. Como ressalta Paulo França:

“O estado nos procura para dizer que nos dará os poços, mas desde que também seja permitido um projeto. Que é o projeto de retirada das águas do Cauípe junto com os postos que iriam até Paracuru. Nós fomos contra desde o início, o povo se virou contra o estado e a prefeitura e eles disseram que não. Teria que ser troca mesmo. Depois eles foram mudando o discurso porque viram que o povo foi se virando contra eles. Disseram que iriam fazer uma adutora mandando água para eles e para gente, só que a gente começou a ver que aquilo ali era uma mentira” (entrevista concedida no dia 02 de dezembro de 2018 no Ceará).

A primeira audiência pública sobre a retirada das águas do Lagamar do Cauípe aconteceu em fevereiro de 2017 na Assembleia Legislativa e foi promovida pelo deputado estadual Renato Roseno com a participação das diversas comunidades afetadas. Sem acordo estabelecido, a audiência pública teve um caráter informativo e logo depois as obras de colocação dos dutos foram iniciadas, contando com a anuência de alguns fazendeiros da região que colocaram suas terras à disposição para servir de armazém de estocagem dos materiais das obras. De acordo com a Lei que instituiu o Plano Nacional de Recursos Hídricos (Lei nº 9. 433 de 8 de janeiro de 1997), em situações de escassez, “o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a dessedentação de animais” (art. 1). Contudo, as populações atingidas afirmam que a postura do Governo do Estado do Ceará priorizava as grandes empresas.

Além de ser uma Área de Proteção Ambiental – APA, criada através do Decreto Estadual nº 24.957 de 05 de junho de 1998, o Lagamar do Cauípe é um lugar considerado místico e de grande valor ancestral. Mesmo que o Governo do Estado visualizasse “apenas” um reservatório de água a ser apropriada, os Anacé ressaltavam a importância do Lagamar para preservação histórica de seu povo. Emocionado, Paulo França destaca:

“O significado da espiritualidade do Lagamar tem muito a ver com a guerra que os Anacé travaram contra os holandeses. Vieram desde o Piauí, Teresina e desceram até a Lagoa do Banana e depois para o Cauípe onde se deram as mortes. Então o Rio ficou vermelho de sangue porque eles mataram os Anacés, alguns conseguiram sobreviver e tiveram que se esconder. Então aquele rio ficou marcado com sangue, é um local sagrado” (entrevista concedida no dia 02 de dezembro de 2018 no Ceará).

Vista do Lagamar do Cauípe em dezembro de 2018. Crédito da fotografia: Kelly Santos (pesquisadora do Mapa de Conflitos Envolvendo Injustiça Ambiental e Saúde no Brasil)

 

Canos instalados pelo Governo do Estado para retirada das águas do Lagamar, dezembro de 2018. Crédito da fotografia: Kelly Santos (pesquisadora do Mapa de Conflitos Envolvendo Injustiça Ambiental e Saúde no Brasil)

 

Em fevereiro de 2017 houve mais uma audiência pública para tratar da extração das águas do Lagamar do Cauípe, mas sem resultados efetivos em termos de negociações sobre a interrupção das obras. Nos meses de março e abril de 2017 foram realizadas ocupações na sede da Funai no Ceará e no Rio Grande do Norte. As ocupações foram em protesto ao Decreto 9.010/2017, assinado pelo, à época ministro da Justiça, Osmar Serraglio, conhecido pela atuação contrária aos direitos dos povos indígenas brasileiros e um dos articuladores da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215/2000.

De acordo com matéria divulgada pelo Conselho Indigenista Missionário no dia 05 de abril, coordenações técnicas locais foram fechadas, servidores foram exonerados e as estruturas remanescentes do órgão foram ocupadas a partir de nomeações políticas.

Uma das pastas foi assumida por Tanúsia Maria Vieira depois da pressão política feita pelo deputado federal Aníbal Gomes do, à época, Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB. De acordo com as lideranças indígenas, ela é casada com um conhecido opositor à demarcação da TI Tapeba.

Em agosto de 2017, aproximadamente 50 famílias Anacé ocuparam imóvel localizado na comunidade conhecida como Buritizinho, em Caucaia. Segundo reportagem divulgada no site da Defensoria Pública da União:

“A área em questão, de aproximadamente seis hectares, está inserida no território em que o Grupo de Trabalho da Funai que realiza estudos antropológicos, etnohistóricos, ambientais e cartográficos [propõe] identificar e demarcar como território tradicionalmente ocupado por indígenas. Apesar de o processo demarcatório ter começado há quase oito anos, ainda não existe uma definição que garanta segurança jurídica à população indígena”.

A imobiliária Centro de Negócios Imobiliários – CNI, empresa que se afirma proprietária do imóvel ocupado pelas famílias Anacé entrou, no mês de agosto, com Ação na justiça estadual contra os indígenas. A 3ª Vara da Comarca de Caucaia aceitou o pedido de liminar e determinou reintegração de posse do imóvel, que foi executada em operação ocorrida no dia 19 de janeiro de 2018. Contudo, em seguida a Defensoria Pública da União (DPU) e a Procuradoria Federal da Funai enviaram petição à Justiça Federal solicitando reconsideração da decisão da justiça estadual. De acordo com a DPU e a Funai, a posse deveria ser garantida ao povo Anacé, sendo o pedido de reintegração de posse inapropriado.

Para além do pedido de reconsideração, a DPU no Ceará – através da defensora pública federal Lídia Nóbrega, juntamente com o Ministério Público Federal, o Escritório de Direitos Humanos e a Assessoria Jurídica Popular Frei Tito de Alencar e a Procuradoria Federal da Funai – acompanhou inspeção judicial à terra indígena Anacé, realizada no dia 26 de fevereiro de 2018, a fim de colher mais informações sobre o episódio de reintegração de 19 de janeiro.

Com as obras de extração das águas do Lagamar do Cauípe adiantadas, no dia 25 de outubro moradores bloquearam a Estrada da Pedra, que dá acesso ao Lagamar, a fim de impedir a continuidade da colocação dos canos. Outro protesto aconteceu no dia 27 de outubro, também com bloqueio das vias. Outra audiência pública foi realizada no final de novembro, também sem resolução.

No que diz respeito à retirada das águas do Lagamar, no final de 2017 iniciou-se uma jornada jurídica a fim de barrar as obras. No dia 06 de dezembro, representantes das comunidades deram entrada na ACP solicitando a suspenção imediata dos atos administrativos que autorizaram a retirada das águas com a instalação de 42 poços nas dunas situadas entre o Cumbuco e o Pecém e do Lagamar, bem como interrupção imediata das obras e das atividades em curso no território. No dia 13 de dezembro de 2017, a juíza Maria Valdileny Sombra Franklin, da 1ª Vara Cível da Comarca de Caucaia, acatou o pedido feito na ACP e determinou a suspensão das obras.

Na mesma linha, no dia 18 de dezembro de 2017, o juiz César de Barros Lima, da Vara Única da Comarca de São Gonçalo do Amarante, concedeu liminar suspendendo as obras para retirada das águas do Lagamar até que o procedimento de licenciamento ambiental fosse regularizado. A liminar veio atender ACP movida pelo Ministério Público Estadual do Ceará contra o Governo do Estado do Ceará, a COGERH e a Semace.

Entretanto, no dia 12 de janeiro de 2018, em decisão monocrática, o desembargador Francisco Gladyson Pontes, presidente do Tribunal de Justiça do Ceará, derrubou liminar da juíza Maria Valdileny Sombra Franklin, da 1ª Vara Cível de Caucaia, alegando que, diante do impedimento de continuidade das obras, o Estado do Ceará perderia anualmente R$ 94 milhões de arrecadação, resultando no comprometimento dos recursos financeiros do Estado.

No dia 06 de fevereiro de 2018 houve a inauguração da chamada “Taba do Anacés”. De acordo com Paulo França:

“Taba do Anacés foi um nome utilizado como referência a São Gonçalo porque uma parte da refinaria ficará em Caucaia e a outra parte em São Gonçalo. Taba dos Anacé é o contrário de Anacetaba, que é o antigo nome de São Gonçalo” (entrevista concedida em 02 de dezembro de 2018, no Ceará).

A inauguração foi realizada pelo Governo de Camilo Santana, do Partido dos Trabalhadores, com 543 hectares e 163 residências, uma escola e um posto de saúde.

Paula França é um dos críticos do projeto Taba dos Anacés por acreditar que o foco da discussão ficou comprometido:

“A questão da água, da poluição e da demarcação tem ligações. Foi uma ilusão eles tirarem parte do povo Anacé e jogarem naquela taba para ocultar um pouco, porque (para eles) ‘índio’ só existe naquela taba e que todo território que começa em Caucaia e vai até Paracuru não é mais Anacé. A gente não tem dimensão porque é muito grande. Só a área que está em demarcação desde 2010 começa ali no Garrote e vai até o Cauípe, ela é muito grande. Fora isso, a gente ainda fica imaginando toda área que foi tomada pelo próprio CIPP, que era nossa também. Fora os empreendimentos imobiliários. Nossa luta é essa, continua com a nossa causa” (entrevista concedida no dia 02 de dezembro de 2018, no Ceará).

Em março de 2018, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região – TRF-5 voltou a interromper o andamento das obras de aproveitamento do Sistema Hídrico do Cauípe. De acordo com o desembargador federal Rubens de Mendonça Canuto Neto, a extração do aquífero Dunas/Cumbuco e o aproveitamento de água do Lagamar do Cauípe representam ameaça à segurança hídrica das 27 comunidades locais afetadas, dentre as quais os povos Tapeba e Anacé. No dia 17 de julho de 2018, o MPF, através do Ofício nº 5273/2018/GABPR3/NCR assinado pela procuradora Nilce Cunha Rodrigues, solicitou informações e esclarecimentos por parte do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis – Ibama sobre o processo de licenciamento ambiental para extração de água no município de São Gonçalo do Amarante, localidade de Parada, Siupé e Taíba.

Em resposta à solicitação, no dia 28 de junho de 2018, o Ibama embargou as obras de perfuração dos poços para retirada das águas do Lagamar. De um lado o conflito foi judicializado e as disputas passaram a tramitar dentro das instâncias do Judiciário; do outro, as comunidades continuaram se organizando e, nos meses de junho e julho de 2018, novos protestos foram realizados, inclusive com instalação de dois acampamentos (em Parada e Coqueiro), impedindo a continuidade das obras de instalação dos canos no Lagamar. De acordo com Paulo França, o acampamento do Coqueiro permaneceu durante dois meses realizando atividades locais de resistência, mas foi desmontado após alguns episódios de repressão e violência da Polícia Militar do Estado do Ceará.

As obras seguem paradas, mas ainda não há segurança de que serão interrompidas outra vez. O território dos Anacé, por outro lado, ainda não recebeu a titulação por parte da Funai. Como destaca Paulo França:

“Os nossos desafios agora são o quê? Continuar lutando pela nossa água, continuar lutando pela nossa cultura, principalmente pela cultura Anacé, pela demarcação. A demarcação vem desde 2010 e está parada lá em Brasília. A gente não quer que ela fique parada, a gente quer continuar lutando dizendo que nós somos Anacés e que nós estamos presentes naquele lugar”.

Em novembro de 2018 a Funai constituiu um novo GT para realizar estudos antropológicos, cartográficos e ambientais complementares sobre o povo Anacé. O anúncio foi feito através da portaria nº 1.353 de 16 de outubro de 2018 e divulgado no Diário Oficial no mês de dezembro. De acordo com a portaria, compunha o GT: Carlos Kleber Saraiva de Sousa – Antropólogo Coordenador, professor da Universidade Federal do Ceará; Antônio Jeovah de Andrade Meireles – Geógrafo, professor da Universidade Federal do Ceará; e Oduvaldo Girão Mota Júnior – Operador de Computador, servidor, lotado na Coordenação Regional Nordeste II.

Atualizada em: 01/06/2019.

Cronologia

Séc. XVII e XVIII – Relatos históricos dão conta da presença de populações indígenas Anacé.

1694 – Fernão Carrilho, administrador colonial, sitia parte dos Anacé a oito léguas ao norte da Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção.

1863 – Relatório Provincial declara extinção de povos indígenas.

1995 – Levantamento para implementação do Complexo Industrial e Portuário de Pecém – CIPP.

06 de março de 1996 – Decreto Estadual nº 24.032/1996 declara de utilidade pública as terras localizadas nos municípios de Caucaia e São Gonçalo do Amarante para fins de desapropriação.

29 de maio de 1996 – Início das obras do CIPP.

05 de junho de 1998 – Criada a Área de Proteção Ambiental – APA do Lagamar do Cauípe, através do Decreto Estadual nº 24.957/1998.

Novembro de 2001 – Início das operações do CIPP.

Março de 2002 – Governos Federal e Estadual inauguram oficialmente o CIPP.

Setembro de 2003 – Povo Anacé reivindica seu território tradicional junto à Fundação Nacional do Índio – Funai e ao Ministério Público Federal – MPF.

Maio de 2007 – Povo Anacé participa, com apoio de outras etnias no Ceará, de ocupação da sede da Funai em Fortaleza para exigir a demarcação de seu território tradicional.

Setembro de 2007 – Realizada a 2ª Assembleia do Povo Anacé.

Dezembro de 2007 – Povo Anacé participa do 2º Encontro dos Povos Indígenas do Ceará.

Abril de 2008 – Defensoria Pública da Comarca de São Gonçalo do Amarante move Ação Civil Pública contra impactos negativos da instalação de usinas termoelétricas no CIPP.

Agosto de 2008 – MPF encaminha recomendação à Funai para que proceda a demarcação da TI Anacé.

Novembro de 2008 – MPF encaminha recomendação ao Governo do Estado do Ceará para que suspenda desapropriações incidentes sobre as terras Anacé.

Fevereiro de 2009 – Povo Anacé realiza protesto contra as desapropriações.

Março de 2009 – GT de Combate ao Racismo Ambiental divulga, ao final do II Seminário Brasileiro contra o Racismo Ambiental, a Carta de Fortaleza, na qual defende direitos do povo Anacé. Na mesma época, a Rede Brasileira de Justiça Ambiental aprova em Assembleia Nacional carta em repúdio ao financiamento das termelétricas Pecém I e Porto de Itaqui, pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID.

Abril de 2009 – Anacé denunciam ação de funcionários do Instituto de Desenvolvimento Agrário do Ceará – IDACE entre as comunidades indígenas.

Agosto de 2009 – Funai constitui grupo de trabalho para realizar estudos de identificação da TI Anacé.

Outubro de 2009 – BID libera 260 milhões de dólares em recursos para financiamento da UTE I.

Dezembro de 2009: MPF ajuíza ACP em defesa dos Anacé.

2010 – Funai inicia, por meio da Portaria n. 1035, processo de identificação e delimitação do território indígena dos Anacé.

Maio de 2010 – Revista Veja publica reportagem: “A farra da antropologia oportunista” contestando a legitimidade das demandas territoriais dos Anacé e de outras comunidades indígenas e quilombolas brasileiras.

Junho de 2010 – Governo do Estado do Ceará propõe troca de parte do território Anacé por área de igual tamanho dentro do CIPP, a fim de viabilizar a instalação da Refinaria Premium II da Petrobras. Alguns representantes da comunidade se declaram contrários à proposta.

Dezembro de 2010 – MPF, através da 6ª CCR, posiciona-se contrariamente ao acordo proposto pelo governo estadual.

2010 – Criação do Comitê Territorial de Matões.

Janeiro de 2011 – Petrobras entrega Estudo e Relatório de Impacto Ambiental – EIA/RIMA à Semace tendo em vista a concessão de Licença Prévia.

2011 – Estudo de avaliação do potencial hídrico superficial e subterrâneo da região do Cauípe realizado pela Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos – COGERH.

– Lei Estadual nº 14.920/2011 autoriza a COGERH a conceder, às empresas Porto do Pecém Geração de Energia S/A e MPX Pecém II Geração de Energia S/A, 50% de desconto sobre o valor da tarifa de água.

Setembro de 2011 – Presidência da Funai concorda com construção da Refinaria Premium II em área reivindicada pelos Anacé.

14 de maio de 2012 – Assembleia Legislativa do Estado do Ceará realiza audiência pública para discutir Decreto Provincial de 1863 que afirmava a ausência de população indígena.

Setembro de 2012 – Governo do Estado do Ceará e Petrobras firmam acordo para aquisição de terreno para reassentamento dos Anacé.

Março de 2013 – Funai encaminha à Semace termo de anuência em relação ao acordo firmado no ano anterior, anuindo em relação à proposta do órgão ambiental estadual para concessão de Licença de Instalação à Refinaria Premium II.

Abril de 2013 – Governo do Estado do Ceará entrega área de 1.930 hectares à Petrobras.

14 de maio de 2013 – Assinado termo de cessão de terreno aos Anacé em reunião na 6ª Câmara do MPF.

1º de julho de 2013 – Governo do Estado adia assinatura do termo de compromisso com Funai e União relativo à área a ser adquirida para criação da Reserva Taba dos Anacés.

17 de julho de 2013 – Governo do Estado adia novamente assinatura do termo de compromisso com Funai e União.

03 de agosto de 2013 – Governo do Estado do Ceará adia novamente assinatura do termo de compromisso, alegando fazê-lo a pedido da Funai até a resolução de impasse com o Povo Tapeba, também afetado pelo acordo com o Estado.

22 de novembro de 2013 – Termo de compromisso indígena da Refinaria Premium II é assinado.

Janeiro de 2014: Governo do Estado do Ceará define prazo para início das obras da Reserva Taba dos Anacés.

2016 – Governo do Estado do Ceará divulga Plano de Segurança Hídrica da Região Metropolitana de Fortaleza com previsão de realização de agosto de 2016 a março de 2017.

Fevereiro de 2017 – Audiência Pública promovida pelo deputado estadual Renato Roseno na Assembleia Legislativa do Ceará para tratar da extração de água do Lagamar do Cauípe.

Março e abril de 2017 – Povos indígenas realizam ocupações nas sedes da Funai na capital do Ceará e no Rio Grande do Norte. As ocupações são em protesto ao Decreto 9.010/2017 assinado pelo então ministro da Justiça Osmar Serraglio.

Agosto de 2017 – Aproximadamente 50 famílias indígenas Anacé ocupam imóvel na comunidade conhecida como Buritizinho, em Caucaia, identificada como parte do território tradicional daquele povo.

2017 – Empresa Centro de Negócios Imobiliários – CNI move ação, na justiça estadual, contra o povo Anacé que ocupou o imóvel no mês de agosto.

2017 – Juiz da 3ª Vara da Comarca de Caucaia defere pedido liminar determinando reintegração de posse em benefício da CNI.

25 de outubro de 2017 – Moradores do bairro Coqueiro bloqueiam a Estrada da Pedra, acesso ao Lagamar.

27 de outubro de 2017 – Novo protesto é realizado pela população atingida contra obra do Governo do Estado para retirada de água do Lagamar do Cauípe, na área do “Eixão das Águas”, em Caucaia.

24 de novembro de 2017 – Audiência Pública sobre extração de água no Lagamar do Cauípe é promovida pelo deputado estadual Renato Roseno.

06 de dezembro de 2017 – Representantes das comunidades afetadas entram com pedido de suspenção imediata dos atos administrativos que autorizam a retirada das águas com a instalação de 42 poços, bem como interrupção imediata das obras e atividades em curso no território.

07 de dezembro de 2017 – Moradores do Coqueiro voltam a ocupar a Estrada da Pedra em protesto contra as obras do Sistema Hídrico do Cauípe.

13 de dezembro de 2017 – Juíza da 1ª Vara da Comarca de Caucaia, Maria Valdileny Sombra Franklin, acata pedido feito através da ACP movida pelos representantes das comunidades contra o Estado do Ceará. Em caráter liminar, suspende as obras em curso.

18 de dezembro de 2017 – Juiz César de Barros Lima, da Vara Única da Comarca de São Gonçalo do Amarante, concede liminar suspendendo obras para retirada das águas do Lagamar atendendo à solicitação da ACP movida pelo Ministério Público Estadual do Ceará contra o Governo do Estado do Ceará, a COGERH e a Semace.

2018 – Defensoria Pública da União e Procuradoria Federal da Funai enviam petição à Justiça Federal solicitando reconsideração da decisão da justiça estadual. De acordo com a DPU e a Funai, a posse deveria ser garantida ao povo Anacé.

12 de janeiro de 2018 – Em decisão monocrática, o desembargador Francisco Gladyson Pontes, presidente do Tribunal de Justiça do Ceará, suspende liminar emitida pela Juíza Maria Valdileny Sombra Franklin, da 1ª Vara da Comarca de Caucaia.

19 de janeiro de 2018 – Judiciário Estadual realiza operação de reintegração de posse na comunidade Buritizinho. Povo Anacé denuncia operação como violenta.

23 de janeiro de 2018 – Obras de aproveitamento do Sistema Hídrico do Cauípe são retomadas.

26 de fevereiro de 2018 – DPU no Ceará, através da defensora pública federal Lídia Nóbrega, juntamente com o Ministério Público Federal, Escritório de Direitos Humanos e Assessoria Jurídica Popular Frei Tito de Alencar e da Procuradoria Federal da Funai, acompanha inspeção judicial à terra indígena Anacé a fim de colher mais informações sobre o episódio de reintegração violento do dia 19 de janeiro.

23 de março de 2018 – Decisão judicial liminar do Tribunal Regional Federal da 5ª Região – TRF-5, através do desembargador federal Rubens de Mendonça Canuto Neto, volta a interromper o andamento das obras de aproveitamento do Sistema Hídrico do Cauípe.

17 de julho de 2018 – A PR-MPF, através do Ofício nº 5273/2018/GABPR3/NCR assinado pela procuradora Nilce Cunha Rodrigues, solicita informações e esclarecimentos por parte do Ibama sobre o processo de licenciamento ambiental para extração de água no município de São Gonçalo do Amarante.

Junho e julho de 2018 – Moradores das localidades de Taíba e Pecém, em São Gonçalo do Amarante, montam acampamento na comunidade de Parada a fim de barrar as obras de retirada das águas do Lagamar do Cauípe.

 

Fontes

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