SP – Ocupação popular resiste contra prefeitura de Osasco e empresário

UF: SP

Município Atingido: Osasco (SP)

Outros Municípios: Osasco (SP)

População: Moradores em periferias, ocupações e favelas

Atividades Geradoras do Conflito: Políticas públicas e legislação ambiental

Danos à Saúde: Piora na qualidade de vida, Violência – ameaça

Síntese

As ocupações coletivas de terra em Osasco vêm acontecendo desde a década de 1970 e ganharam força a partir de meados da década de 1980. Terceira de uma série de ocupações realizadas por um grupo de famílias apoiado pelo Movimento Luta Popular, a ocupação Esperança foi realizada na madrugada do dia 24 para o dia 25 de agosto de 2013.

O proprietário, em nome da empresa KJ Kady Jacqueline Ltda, entrou com ação na Justiça, apesar da área não estar sendo usada há anos. Os ocupantes se defenderam afirmando que “A função social da terra é uma lei, que a especulação imobiliária impede que seja cumprida”. E a juíza responsável pelo caso pediu a realização de uma audiência entre as partes a ser realizada em 18 de setembro.

No dia 31 de agosto, foi realizado um ato público em solidariedade à Ocupação Esperança, com o objetivo de dar visibilidade à ocupação e aproximar militantes e organizações da luta.

No início de setembro, as 100 famílias já tinham aumentado para mais de 1000, e os moradores da Ocupação organizaram uma marcha até a sede da prefeitura, onde exigiram uma resposta com relação à garantia de moradia digna às pessoas que não podem pagar aluguel.

Em 10 de setembro, cerca de 800 pessoas ocuparam a Câmara Municipal de Osasco e pediram para que fosse votada uma moção de apoio ao problema da moradia no município. A votação foi unânime, e todos os parlamentares presentes aprovaram a moção – entregue à prefeitura – solicitando o cadastramento de todos aqueles que estivessem vivendo na área.

Dois dias depois, na noite do dia 12 de setembro, por volta de 19h30, depois de uma assembleia geral, os moradores se deram conta de um incêndio numa área acima da ocupação, onde há uma mata. Conseguiram controlá-lo com o auxílio de cobertores e da pouca água de que dispõem. Segundo eles, era possível sentir o cheiro e a textura do óleo diesel nas árvores, o que comprovava a intencionalidade em iniciar o incêndio.

Na audiência no Fórum de Osasco, em 18 de setembro, com a presença de integrantes do movimento Luta Popular, do proprietário do terreno e do Ministério Público, foi concedida a suspensão do processo por 30 dias. Caso não haja dentro deste prazo proposta de solução que contemple o interesse do proprietário, este poderá reingressar com seu pedido de reintegração de posse, que será, mais uma vez, apreciado.

Contexto Ampliado

Tamo ligeiro. Nossos movimentos parceiros ombro a ombro. A esperança que dá nome à nossa comunidade, esperança de moradia digna em um mundo que nos trata como coisas e o dinheiro como vida. Viva a luta dos de baixo! (Blog Bola e Arte).

As ocupações coletivas de terra em Osasco vêm acontecendo desde a década de 1970 e ganharam força em meados da década de 1980. O Movimento Esta Terra é Nossa, por exemplo, nasceu em 1986 e teve sua origem ligada à favela do Braço Morto, localizada às margens do rio Tietê. As sucessivas enchentes que acometiam a comunidade fizeram com que os moradores passassem a se reunir para discutir seus problemas de moradia e qualidade de vida e começassem a cadastrar famílias para uma ocupação a ser realizada. Construiu-se um barracão na favela para receber estes cadastramentos e fazer reuniões. Sob este barracão, mais de duas mil famílias se juntaram.

A primeira ocupação realizada foi a do Jardim Piratininga (Rodrigues, 1988). A pesquisadora Arlete Moyses Rodrigues (1988) realizou um estudo em que aborda a história do Movimento Terra Nossa e transcreve trechos de entrevistas que, mesmo anônimos – a autora não cita os nomes dos entrevistados -, permite ter acesso à percepção daqueles que construíram de fato a história da luta por moradia em Osasco:

Se escrevia o nome de cada um no caderno e aí se viu que o caderno não dava, então começaram as fichas. Foi um susto ver quanta gente vinha se inscrever. Foram mais de 3000 fichas, era tanta gente que tinha que fazer duas reuniões, uma com a favela e outra com os aluguéis.

Segue o depoimento de um morador: Eu passava do meu serviço e via escrito lá: A Terra é Nossa. Aí, eu entrei um dia, interessado, porque eu também pagava aluguel, hoje não pago mais… Aí cheguei lá, falaram que era para deixar os documentos, dar o nome e tal… Continuei indo nas reuniões. Depois entrei na comissão. Eu conheci o movimento através de um conhecido meu de serviço, que me deu o endereço de onde era a próxima reunião que ia ter… A gente tinha medo de ser descoberto. Eu já conhecia o movimento. Aí, um dia, eu vi a placa e pensei: Nossa Senhora, essa terra é nossa, vou chegar nela! Cheguei em casa e disse: eu tenho certeza que esta terra vai também me pertencer. Fui lá e fiquei sabendo que a pessoa para participar dessa terra tem que participar de todas as reuniões e não pode faltar nenhuma, tem que estar em todas elas.

A ocupação coletiva de terras promove a constituição de novos sujeitos políticos que se unem na luta para garantir um direito previsto por lei. São notáveis as estratégias de comunicação e formação de redes, já tradicionais. Um grupo, após ocupar uma terra, passa a ter o apoio de um novo grupo. Segundo Rodrigues (1988), as experiências são transmitidas através de relatos orais dentro do próprio acampamento, prática que atualmente é expandida com a gravação de vídeos assistidos por centenas de pessoas através da internet.

A comunicação e a constituição de um discurso que molda novas ações e o surgimento de atores políticos cada vez mais jovens não se desenvolvem apenas no cenário público, através da grande mídia, tendo órgãos públicos como interlocutores. A pesquisadora Maria da Glória Marcondes Gohn (1991) afirmou que a experiência gera, para os movimentos populares, um método de trabalho. A união de pessoas carentes de equipamentos e serviços dá força a suas ações. Assim, unem-se experiências semelhantes de vida cotidiana a partir do conhecimento de resultados obtidos por outros grupos, a partir da absorção da experiência alheia.

É importante lembrar que a moradia é um direito humano assegurado internacionalmente desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. No Brasil, o acirramento das lutas e o desenvolvimento dos movimentos populares contribuíram para que, no caput do artigo 6º da Constituição Federal de 1988, a moradia fosse incluída dentre outros direitos sociais. Além disso, no artigo 182, a Constituição de 1988 determina que a Política de Desenvolvimento Urbano, tendo o Plano Diretor como seu principal instrumento, passe a ser executada pelo poder público municipal, com o objetivo de garantir o cumprimento da função social da propriedade urbana e o bem-estar dos habitantes das cidades.

Neste artigo, fica facultado ao poder público municipal exigir do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado que promova seu adequado aproveitamento, tendo inclusive o poder de desapropriação (Constituição Federal de 1988). A lei 10.257 de 2001, também chamada de Estatuto das Cidades, regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal de 1988 e garante o direito a cidades sustentáveis, à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, infraestrutura urbana, transporte, trabalho, lazer, para as presentes e futuras gerações; gestão democrática por meio da participação popular e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade. No entanto, as conquistas legais não representaram uma mudança substancial na realidade urbana brasileira, notadamente marcada pela segregação socioespacial e pelas desigualdades metropolitanas e regionais (Ferreira, 2012).

Além disso, as leis federais n° 11.124/2005 e 11.888/2008 tratam, respectivamente, do Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social (SNHIS), criando o Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (FNHIS) e asseguram às famílias de baixa renda assistência técnica pública e gratuita para o projeto e a construção de habitação de interesse social.

É nesse contexto de consolidação das lutas por direito à moradia que, em 23 de abril de 2009, o então prefeito de Osasco, Emídio de Souza, filiado ao Partido dos Trabalhadores (PT), assinou o termo de adesão ao Programa do Governo Federal Minha Casa, Minha Vida, que prevê subsídios e financiamentos para a construção de um milhão de moradias para famílias com renda de zero a 10 salários mínimos.

Na cerimônia de adesão, o prefeito explicou que a prefeitura faria uma parceria com as construtoras que aderissem ao programa para reduzir o déficit habitacional registrado entre a população desta faixa salarial na região: Os envolvidos vão ajudar a curar uma chaga social, profetizou o ex-prefeito na ocasião. No entanto, as moradias efetivamente entregues pelo programa em Osasco desde então não tiveram impacto significativo sobre a diminuição do referido déficit habitacional, provocando inclusive a revolta das famílias que se inscreveram no programa e mesmo assim continuam sem acesso à moradia (Camargo, 2009).

O programa, que tem como base estudos realizados pela Secretaria Nacional de Habitação (SNH), de acordo com a pesquisadora da USP, Ermínia Maricato (2009), ao incluir uma fatia da classe media (que recebe de 7 a 10 salários por mês), ouviu especialmente os empresários do ramo imobiliário. Além disso, o programa não prevê a urbanização das áreas em que serão construídas as unidades habitacionais: Cada moradia urbana exige um pedaço de terra para a sua existência. E não se trata de terra nua. Trata-se de terra urbanizada, ligada às redes de água, esgoto, transporte coletivo, além de equipamentos de educação e saúde (Maricato, 2009).

Por isso, à luta pela moradia segue-se a luta pelo acesso a serviços e equipamentos públicos urbanos, à organização comunitária e à mobilidade, condições para a integração socioespacial e democratização da cidade.

Em Osasco, por exemplo, há dificuldades em se conseguir terrenos para a construção dessas moradias, pois o programa não inclui uma ação de desapropriação de terras que não estejam cumprindo sua função social. A prefeitura delega o poder de escolha do terreno em que são construídas as unidades residenciais às construtoras, que tomam como principal critério o aspecto econômico, impossibilitando qualquer redistribuição de terra urbana que não esteja sendo utilizada adequadamente. Outro problema que tange esta parceria entre prefeitura e construtoras para a implementação do Programa é que, sem condições de atingir as metas impostas pelo govrno, as empresas construtoras terceirizam seus serviços, precarizando as relações de trabalho com os operários da construção civil para aumentarem a produtividade reduzindo os custos.

O terreno situado na estrada Portugal, no bairro Santa Fé, próximo à rodovia Anhanguera, em Osasco, é um exemplo das consequências das inconsistências da atual política de moradia popular. Ele foi ocupado por cerca de 100 famílias em 24 de agosto de 2013 com o apoio do Movimento Luta Popular, que compõe a Central Sindical e Popular de São Paulo. A ocupação batizada de Esperança tinha como objetivo pressionar a prefeitura de Osasco para a desapropriação da área e a construção de moradias populares no local.

A orientação das autoridades locais foi para que os ocupantes esperassem por uma casa através do Programa Minha Casa, Minha Vida, numa fila junto a outras 43 mil pessoas cadastradas no município. No entanto, o programa entregou apenas 420 moradias em quatro anos de acordo. A maior parte dos moradores possui renda fixa, paga aluguel e poderia assumir o financiamento de uma casa no Programa. Porém, as exigências da Caixa Econômica, como renda mínima de 1500 reais e ocupação profissional registrada em carteira de trabalho, além da morosidade na entrega dos imóveis, constituem obstáculos que impedem o acesso à moradia.

Terceira de uma série de ocupações realizadas por um grupo de famílias apoiado pelo Movimento Luta Popular, a ocupação Esperança foi realizada na madrugada do dia 24 para o dia 25 de agosto de 2013. Às 8 horas da manhã, a Polícia Militar apareceu pedindo para que os moradores se retirassem. No entanto, segundo os próprios policiais afirmaram, uma vez que a ocupação já estava consumada, eles só poderiam intervir após decisão na Justiça, de posse de um mandato. Foi feito o boletim de ocorrência e o dono acionou a Justiça, em nome da empresa KJ Kady Jacqueline Ltda.

À tarde, a Guarda Metropolitana retornou ao local da ocupação garantindo que o terreno era público e que, por isso, seria sua atribuição impedir a invasão (nas palavras de um deles). A guarda chegou a fechar os acessos à ocupação e adentrá-la com armas de bala de borracha em punho. Os ocupantes exigiram a apresentação de documentos que comprovassem que o terreno era da prefeitura e se recusaram a deixar a área sem a comprovação, pois, segundo levantamento anteriormente feito pelo Movimento Luta Popular, a área seria privada, não cabendo aos órgãos públicos realizar qualquer despejo. No fim da tarde, os policiais se retiraram.

A função social da terra é uma lei, que a especulação imobiliária impede que seja cumprida, denunciam os ocupantes. A juíza responsável pelo caso pediu a realização de uma audiência entre as partes a ser realizada dia 18 de setembro.

Tendo o proprietário acionado a Justiça, o despejo poderia acontecer a qualquer momento; as famílias seguiam dispostas a resistir. A responsabilidade da política habitacional é obrigação dos governos municipal, estadual e federal. Eles não podem fechar os olhos. Caso o proprietário esteja disposto a negociar, a responsabilidade do Estado é ainda maior, afirmou o movimento, em nota pública. Se houver a reintegração, poderá haver um novo Pinheirinho. E queremos saber quem vai se responsabilizar pela tragédia.

No dia 31 de agosto, foi realizado um ato em solidariedade à Ocupação Esperança, atividade com o objetivo de aumentar a visibilidade da ocupação e aproximar militantes e organizações da luta. Estiveram presentes diversos movimentos sociais e entidades, como a Assembleia Nacional dos Estudantes Livres de São Paulo (ANEL), a CSP-Conlutas, o DCE Livre da USP, o Movimento Mulheres em Luta, entre outros. Às 14h, ocorreu uma assembleia para definir os próximos passos da mobilização, contando com o apoio de todas as entidades e movimentos presentes.

No início de setembro, as 100 famílias já tinham aumentado para mais de 1000. Com menos de um mês de existência, a ocupação já possuía cozinha e banheiros coletivos, uma pequena horta e uma composteira. Também foram formadas comissões de limpeza, infraestrutura e abastecimento. Em assembleias diárias, entram em pauta assuntos pertinentes ao coletivo e avisos. Muitas pessoas prestam solidariedade e circulam pela ocupação conhecendo os moradores, levando doações, gravando vídeos e disseminando a notícia do nascimento da Esperança.

No dia 2 de setembro, os moradores da Ocupação organizaram um ato que seguiu até a sede da prefeitura. Do lado de fora do prédio, permaneceram cerca de 600 manifestantes que, batendo panelas e entoando gritos de guerra – como É fácil dizer não quando se tem uma mansão, Osasco quer moradia, não heliporto e Ia ia ia, queremos moradia -, exigiram uma resposta da prefeitura com relação à garantia de moradia digna às pessoas que não podem pagar aluguel.

Por volta das 13h, sete dos manifestantes foram recebidos pelo Secretário de Habitação, Sérgio Gonçalves, pelo chefe de gabinete, Rubens do Nascimento e pelo Secretário de Segurança e Controle Urbano, André Luiz Santiago. Após uma hora de conversa, os representantes da prefeitura garantiram oferecer uma alternativa para o impasse com o proprietário do terreno e para a questão da construção de moradias populares até o dia 10 de setembro. Um dos manifestantes apontou a importância de a prefeitura ter se comprometido com a questão: O terreno pode ser privado, mas o problema da falta de moradia é público, e de absoluta responsabilidade das instâncias de governo (Central Sindical e Popular).

No dia 10 de setembro, cerca de 800 pessoas ocuparam a Câmara Municipal de Osasco e pediram para que fosse votada uma moção de apoio ao problema da moradia no município. A votação foi unânime, e todos os parlamentares presentes aprovaram a moção que foi entregue à prefeitura. Esta pediu o cadastramento de todos aqueles que estivessem vivendo na área e marcou uma nova reunião com a presença de representantes da Caixa Econômica Federal (Assembleia Nacional dos Estudantes Livres).

Entretanto, na noite do dia 12 de setembro, por volta de 19h30, depois da assembleia geral, os moradores se deram conta de um incêndio numa área acima da ocupação e, com cobertores e a pouca água de que dispunham, conseguiram controlá-lo. Segundo moradores, era possível sentir o cheiro e a textura do óleo diesel nas árvores, o que comprovava, segundo eles, que o incêndio havia sido criminoso. Depois do incidente, eles constituíram uma brigada de incêndio (Centro de Mídia Independente).

A audiência marcada pela juíza responsável aconteceu no Fórum de Osasco, no dia 18 de setembro, e teve a presença de integrantes do Movimento Luta Popular, do proprietário do terreno e do Ministério Público Estadual. Foi concedida pela juíza a suspensão do processo por 30 dias. Caso não haja dentro deste prazo proposta de solução que contemple o interesse do proprietário, este poderá reingressar com seu pedido de reintegração de posse que será mais uma vez apreciado (Central Sindical e Popular).

No dia 20 de setembro, a americana Erica Huggins, do Partido Panteras Negras, visitou a ocupação. Erica afirmou em sua página no Facebook ter ficado muito honrada e inspirada por lideranças tão jovens à frente deste movimento pelos sem terra e sem casa (Facebook Erica Huggins).

O mesmo grupo de pessoas que realizou a ocupação Esperança participou também de outras duas ocupações organizadas pelo Movimento Luta Popular em Osasco no período de dois meses. Uma delas aconteceu no dia 13 de julho, com 300 famílias, num terreno da prefeitura localizado na rua Francisco Morato, no bairro Parque Bandeirantes, abandonado há três décadas. No dia 17 de julho, a Guarda Metropolitana de Osasco, junto a Polícia Militar de São Paulo, tentou realizar um despejo sem decisão judicial e sem mandato de reintegração de posse. Depois de negociações, os ocupantes optaram por sair pacificamente mediante promessa de reunião com a prefeitura, na esperança de vitória em outro terreno (Central Sindical e Popular).

A ocupação posterior foi realizad em uma área que tem sido alvo de uma polêmica na imprensa por conta do projeto de instalação de um heliporto. Nos últimos meses, o STB – Sistema Brasileiro de Televisão – tem realizado diversas matérias jornalísticas contra o heliporto – na zona norte de Osasco, em local bem próximo à sede da TV de Silvio Santos -, que estaria causando distúrbios devido ao barulho das obras. O SBT enfatizava em suas reportagens a irregularidade na documentação da empresa responsável.

Segundo a emissora, a prefeitura concedeu autorização para a construção de um heliporto, ponto de pouso e decolagem particular, sem comercialização ou oferecimento de serviços, mas com 24hs de operação e atendimento de pista constante (Tudo Variado). Os moradores da área também reclamam principalmente por causa do barulho e da falta de segurança. O projeto de construção do heliporto virou uma espécie de símbolo – apropriado pelo grupo que realizou as três ocupações – da luta pela moradia em Osasco, da prioridade às obras que não atendem às demandas da população e contribuem para a especulação imobiliária. No momento, a obra está embargada e as famílias deixaram o terreno.

Gláucia, 23 anos, casada e mãe de dois filhos, participou da ocupação do Parque Bandeirantes e, na ocupação Esperança, conta em vídeo realizado pela Ação Direta de Vídeo Popular que pagava aluguel há três anos, quando seu marido sofreu um acidente e ficou dois meses sem trabalhar. A proprietária do imóvel em que moravam entrou com uma ordem de despejo (Blog do Sakamoto). Assim, Gláucia e a família se uniram a centenas de outras famílias na luta coletiva pela garantia de um direito previsto na Constituição Brasileira de 1988 e no Estatuto das Cidades de 2001: moradia digna para todos.

E eles falam: não pode, não pode. Mas se você falar assim: Osasco vai ser sede de uma olimpíada em 2016. Você ia ver neguinho arrumando dinheiro de tudo que era canto. Em 2016 ia ter piscina, quadra, ia ter tudo aqui. Agora, como são 1500 famílias atrás de moradia, eles falam que não tem recurso. Recurso a gente sabe que tem, mas é recurso para coisas de interesse deles. Mas eles não veem que aqui eles também podem ganhar. Porque a gente não vai deixar de pagar os impostos, porque ninguém quer nada de graça. A gente quer ter direito a uma moradia digna – Gláucia, moradora da ocupação Esperança (Blog Sakamoto, vídeo feito pelo autor sobre a ocupação).

No final de 2011, a empresa de Desenvolvimento Rodoviário de São Paulo (DERSA), controlada pelo governo do estado de São Paulo (e proprietária da área) – e cujo objetivo é construir, operar, manter e administrar rodovias e terminais intermodais, algumas delas através de remuneração através de praças de pedágio -, vendeu o terreno (mesmo com as famílias dentro) para uma empresa chamada Vega, que por sua vez entrou com um processo de reintegração de posse. Em audiência de conciliação com o judiciário, a empresa se propôs a indenizar as famílias em 2000 reais, valor considerado irrisório.

Após várias tentativas de diálogo frustradas, as famílias organizadas através do Movimento Popular Terra Livre, em protesto, bloquearam o Rodoanel no dia 14 de setembro de 2013. Somente a partir de então as negociações começaram a avançar. Ocorreu uma reunião com a Secretaria de Habitação do Estado de São Paulo, a DERSA e o movimento Terra Livre junto com a Associação Casa do Povo, em que a Prefeitura e o governo do Estado se comprometeram com a inclusão das famílias nos programas Minha Casa, Minha Vida e Casa Paulista.

A ocupação Esperança, em Osasco, suscita algumas peculiaridades nos padrões de mobilização dos movimentos urbanos populares por moradia. Em primeiro lugar, é notável o rápido aumento no número de famílias acampadas em menos de um mês de ocupação. Observando o caso um pouco mais a fundo, é possível atribuir este aumento ao fato de as famílias já estarem se mobilizando em ocupações anteriores, formando um grupo articulado pronto para realizar novas ocupações e disposto a oferecer suporte e apoio a outras no município, através de atos, manifestações populares e moções, com uma forte consciência do aspecto coletivo do problema da moradia; o que, afinal, caracteriza as ocupações coletivas de terra.

Além disso, a ocupação angariou, com a mesma rapidez, o apoio de organizações nacionais e internacionais, assim como de pessoas que simpatizavam com a causa. Passaram então a transmitir em vídeos e depoimentos a experiência da luta pela moradia, explicitando o que leva famílias despejadas por não poderem pagar aluguel ou impossibilitadas de preencher os requisitos de programas de governo a aderirem ao movimento de mobilização para a ocupação de terras urbanas.

Toda esta movimentação e visibilidade contribuem para o fortalecimento não só do discurso de um movimento popular urbano como do próprio ethos da coletividade, que se expande cada vez mais, agregando a esperança de cidades democráticas, com moradia digna para todos e com participação popular na gestão urbana.

Em 03 de outubro de 2013, os membros da comunidade ocuparam pela segunda vez a Câmara dos Vereadores de Osasco, de onde saíram em manifestação até a Prefeitura da cidade. O ato pressionou o poder local para que este se comprometesse a intermediar uma reunião entre os moradores e a Caixa Econômica Federal (CEF), a fim de que discutisse o destino da ocupação.

A partir de janeiro de 2014, com a proximidade da Copa do Mundo da FIFA, a ser realizada em 12 cidades-sedes no Brasil e que tem promovido importantes impactos sobre as comunidades urbanas do entorno dessas cidades, muitos deles já relatados neste Mapa, a comunidade da Ocupação Esperança promoveu um debate a respeito do tema, intitulado Ocupar e Resistir: Moradia e Copa da FIFA 2014, organizado com o apoio do Comitê Popular da Copa de São Paulo e o movimento Luta Popular. Segundo estimativas do próprio Comitê, em todo o país cerca de 250 mil pessoas estavam sendo removidas em função das obras para a organização da Copa e das Olimpíadas a serem realizadas no Rio de Janeiro em 2016.

Em março de 2014, a juíza Ana Cristina Ribeiro Bonchristiano, da 3ª Vara Cível de Osasco, autorizou a desocupação do local, ficando a cargo da Polícia Militar a organização da operação necessária.

As famílias locais permaneceram mobilizadas, o que garantiu a realização de uma nova rodada de negociações com a Prefeitura de Osasco em reunião de 15 de abril. Enquanto os representantes da comunidade debatiam com o poder local, outros permaneceram em vigília do lado de fora. Estiveram presentes os secretários de Relações Institucionais da Prefeitura de Osasco, Waldyr Ribeiro Filho, e da Habitação, Sérgio Gonçalves. A Prefeitura se comprometeu a entrar em contato com o Ministério das Cidades para viabilizar um projeto habitacional e mediar uma negociação para que o governo do estado garanta bolsa aluguel a todos os moradores da Ocupação. Ficou definido que os moradores apresentariam um cadastro das famílias da Ocupação Esperança, a ser analisado pela Prefeitura. O cadastro foi protocolado nesta quarta-feira, dia 23, dentro do prazo combinado.

Enquanto ainda se desenrolavam as negociações políticas, em 23 de abril de 2014, os advogados que apoiam a comunidade anunciaram que haviam conseguido judicialmente um adiamento por 30 dias dos efeitos da liminar de reintegração de posse concedida no mês anterior.

Cronologia:

1986 – Surge o Movimento Esta Terra é Nossa, em Osasco, a partir da favela Braço Morto.

2001 – Promulgação da Lei nº 10.257, também chamada de Estatuto das Cidades, que regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal de 1988 e garante o direito a cidades sustentáveis, à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, infraestrutura urbana, ao transporte, trabalho e lazer para as presentes e futuras gerações.

2005 – Ocupação Raio de Luz se torna comunidade no bairro Jardim Padroeira II, em Osasco, onde vivem cerca de mil famílias.

Maio de 2009 – Assinatura pelo prefeito de Osasco do termo de adesão o Programa Federal Minha Casa, Minha Vida.

Final de 2011 – A empresa de Desenvolvimento Rodoviário de São Paulo – DERSA (controlada pelo governo do estado de São Paulo e proprietária da área da comunidade Raio de Sol) vende o terreno com as famílias dentro para uma empresa chamada Vega, que por sua vez entra com processo de reintegração de posse. Em reunião de conciliação com o judiciário, a empresa se propôs a indenizar as famílias em dois mil reais.

13 de julho de 2013 – 300 famílias ocupam um terreno da prefeitura localizado na rua Francisco Morato, no bairro Parque Bandeirantes, abandonado há três décadas.

17 de julho de 2013 – A Guarda Metropolitana de Osasco, junto à Polícia Militar de São Paulo, tenta realizar um despejo sem decisão judicial e sem mandato de reintegração de posse. Depois de negociações, os ocupantes optam por sair pacificamente mediante promessa de reunião com a prefeitura, na esperança de vitória em outro terreno.

25 de agosto de 2013 – Realização da Ocupação Esperança, com o apoio do Movimento Luta Popular.

31 de agosto – Realizado ato em solidariedade à Ocupação Esperança, atividade com objetivo de dar visibilidade à ocupação e aproximar militantes e organizações da luta.

02 de setembro de 2013 – Os moradores da Ocupação Esperança organizam ato até a sede da prefeitura de Osasco.

10 de setembro de 2013 – Cerca de 800 pessoas ocupam a Câmara Municipal de Osasco e pedem para que seja votada moção de apoio ao problema da moradia no município.

12 de setembro de 2013 – Por volta de 19h30, depois da assembleia geral, os moradores da Ocupação Esperança conseguem controlar um incêndio.

20 de setembro de 2013 – A americana Erica Huggins, do Partido Panteras Negras, visita a ocupação.

03 de outubro de 2013: Moradores da Ocupação Esperança ocupam a Câmara dos Vereadores e conseguem promessa de reunião com representantes da Prefeitura e da CEF.

Janeiro de 2014: Ocupação Esperança sedia debates sobre as remoções em função das obras da Copa de 2014.

Março de 2014: Juíza Ana Cristina Ribeiro Bonchristiano, da 3ª Vara Cível de Osasco, concede liminar determinando desocupação do terreno.

15 de abril de 2014: Moradores da Ocupação Esperança se reúnem com Prefeitura.

23 de abril de 2014: Judiciário suspende liminar de desocupação por trinta dias.

Última atualização em: 18 jun. 2014.

Fontes

CAMARGO, Henrique Andrade “Minha Casa, Minha Vida” pode causar mais danos do que benefícios. 2009. Disponível em: http://goo.gl/73RwYM Acessado em 20 de setembro de 2013.

CENTRO ACADÊMICO DE CIÊNCIAS HUMANAS DA UNICAMP. Quando morar é um privilégio, ocupar é um direito! Apoio à ocupação “Nova Esperança” em Osasco/SP! Disponível em: http://goo.gl/M2jOAq Acessado em 20 de setembro de 2013.

CENTRO DE MÍDIA INDEPENDENTE. Ocupação Esperança se fortalece. Disponível em: http://goo.gl/1KvHRV Acessado em 20 de setembro de 2013.

______. Nota atualizada do Luta Popular sobre ocupação Esperança. Disponível em: http://goo.gl/8swqIO Acessado em 20 de setembro de 2013.

CSP – CONLUTAS – Central Sindical e Popular. Incêndio criminoso tentou destruir Ocupação Esperança. Disponível em: http://goo.gl/nyXWSz. Acessado em 22 de setembro de 2013.

______. Ocupação em Osasco cresce e reintegração de posse é ameaça concreta. Disponível em: http://goo.gl/klpSBP. Acessado em 21 de setembro de 2013.

______. Movimento Luta Popular ocupa terreno em Osasco (SP). Disponível em: <http://goo.gl/6w3LvO>. Acessado em 22 de setembro de 2013.

______. Famílias da Ocupação Esperança em Osasco resistem e voltam a protestar nesta terça. Disponível em: http://goo.gl/fqBx33. Acessado em 20 de setembro de 2013.

FAMÍLIAS organizadas pelo movimento Luta Popular ocupam terreno em Osasco. Disponível em: http://goo.gl/mSVwcP. Acessado em 20 de setembro de 2013.

FERNANDES, Cássia do Carmo Pires e SILVEIRA, Suely de Fátima Ramos da. Ações e Contextos da Política Nacional de Habitação: Da Fundação Casa Popular ao Programa Minha Casa, Minha Vida. 2011.

FILHO, Celso e OSAKABE, Marcelo. 700 famílias temem reintegração de posse em Osasco. O Estado de São Paulo, 14 abr. 2014. Disponível em: <http://goo.gl/Pq1TXM>. Acesso em: 16 jun. 2014.

SAKAMOTO, Leonardo. Ocupação reúne 1,5 mil famílias e pede desapropriação de área em Osasco. Disponível em: <http://goo.gl/ll0Ot1>. Acessado em 20 de setembro de 2013.

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OCUPAÇÃO Esperança completa oito meses e conquista prazo contra desocupação. PSTU Vale, 24 abr. 2014. Disponível em: http://goo.gl/kqqpl1. Acesso em: 16 jun. 2014.

OCUPAÇÃO Esperança promove debate sobre Copa do Mundo e moradia. Combate Racismo Ambiental, 31 jan. 2014. Disponível em: <http://goo.gl/0M5fve>. Acesso em: 16 jun. 2014.

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