Indígenas lutam por permanência e reconhecimento de santuário e território tradicional
UF: DF
Município Atingido: Brasília (DF)
População: Povos indígenas
Atividades Geradoras do Conflito: Atuação de entidades governamentais, Atuação do Judiciário e/ou do Ministério Público, Especulação imobiliária, Hidrovias, rodovias, ferrovias, complexos/terminais portuários e aeroportos, Implantação de áreas protegidas
Impactos Socioambientais: Alteração no regime tradicional de uso e ocupação do território, Assoreamento de recurso hídrico, Desmatamento e/ou queimada, Falta / irregularidade na autorização ou licenciamento ambiental, Falta / irregularidade na demarcação de território tradicional, Falta de saneamento básico, Incêndios e/ou queimadas, Invasão / dano a área protegida ou unidade de conservação, Precarização/riscos no ambiente de trabalho
Danos à Saúde: Desnutrição, Doenças transmissíveis, Falta de atendimento médico, Insegurança alimentar, Piora na qualidade de vida, Violência – ameaça, Violência – assassinato, Violência – coação física
Síntese
A comunidade indígena Bananal, também conhecida como Santuário dos Pajés, localiza-se na Asa Norte de Brasília (DF), sendo uma área de 50 hectares habitada por diferentes etnias, dentre elas os Fulni-ô Tapuya, Tuxá, Kariri-Xocó, Guajajara e Tupinambá.
De acordo com notícia do Combate Racismo Ambiental (25/07/2012), a ocupação indígena no local iniciou-se em 1957, quando indígenas da etnia Fulni-ô, provenientes de Águas Belas-PE, se deslocaram à Brasília para trabalhar como operários na construção da capital e se refugiaram em meio às matas do Cerrado para se dedicarem ao culto sagrado e a manifestações religiosas ancestrais.
Os Fulni-ô em Águas Belas – PE passaram por intenso processo de desterritorialização, o que também influenciou sua migração para Brasília. Ao longo dos anos, alguns indígenas de outras etnias se fixaram no local.
A partir da década de 1990, o local ocupado pelos indígenas passou a ser palco de um acirrado conflito. De um lado, os indígenas que consideram a área sagrada e solicitaram seu reconhecimento à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai, então Fundação Nacional do Índio); de outro, o Governo do Distrito Federal (GDF), a Companhia de Terras de Brasília (Terracap) e as empreiteiras Emplavi e Brasal, interessados em explorar a área economicamente, com o plano de expansão do Setor Noroeste.
Enquanto os estudos necessários para o reconhecimento da área como terra indígena estavam em andamento, iniciaram-se as movimentações em prol da construção do Setor Noroeste. Em 2007, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e de Recursos Naturais Renováveis (Ibama) emitiu Licença Prévia favorável à Terracap. Em 2009, o Plano Diretor da Cidade (PDOT) de Brasília foi alterado, e a área ocupada pelos indígenas foi entregue ao mercado para ser vendida por meio de leilões públicos, batendo recordes de vendas.
Em 2011, o laudo antropológico foi finalizado. Apesar da posição favorável à ocupação indígena, a Funai contestou o estudo e não considerou a área como terra tradicional indígena. Iniciaram-se as alianças entre indígenas, estudantes e ambientalistas em prol da demarcação da área. Após muita disputa, com três casas indígenas incendiadas e protestos realizados, em 14 de novembro de 2013 a Justiça Federal decidiu a favor da permanência dos indígenas, reconhecendo a área Santuário dos Pajés como terra indígena. O Ministério Público Federal (MPF) acusou a Funai de ter sido negligente.
Ao longo de 2014 e 2019, vários acordos foram realizados entre a empresa pública Terracap, MPF e as comunidades indígenas do Santuário dos Pajés. Entre eles, em 2018, estabeleceu-se uma área de 32 hectares de uso exclusivo e permanente da comunidade indígena da etnia Fulni-ô Tapuya. Quanto às obrigações da Funai, além do registro formal do território, que passaria a ser denominado “Terra Indígena Santuário Sagrado dos Pajés – Pajé Santxiê Tapuya” junto à Secretaria de Patrimônio da União (SPU), cabia o apoio à comunidade no diálogo com os demais órgãos envolvidos para a construção de ações de gestão ambiental e territorial da área.
Em 2019, a Terracap fechou acordo de realocação de indígenas Kariri-Xocó e Tuxá para uma área de 14 hectares, nas imediações do Setor Noroeste. No local, seria construída a Reserva Indígena Kariri-Xocó e Tuxá do Bananal-DF, apesar disso, outros povos não foram contemplados pelo acordo. No termo de compromisso celebrado entre as partes, a área seria doada pela Terracap à União e, posteriormente, administrada pela Funai.
Como se pode notar, a presença multiétnica indígena é uma característica importante deste território. No entanto, os acordos estabelecidos com as comunidades do Santuário dos Pajés não significam, necessariamente, que o conflito seja mediado para garantir os direitos indígenas de todas as etnias presentes. As medidas acordadas privilegiaram reivindicações de alguns povos, enquanto outros ficaram desassistidos, o que levou a divergências entre indígenas do Santuário dos Pajés.
O que se percebe é que o conflito pelo território envolve, de um lado, uma disputa entre os próprios indígenas e, de outro, entre eles e os agentes públicos e privados que avançam com projetos imobiliários no Distrito Federal.
Contexto Ampliado
A comunidade indígena Bananal, também conhecida como Santuário dos Pajés, localiza-se na Asa Norte de Brasília, numa área de 50 hectares habitada por diferentes etnias, dentre elas os Fulni-ô Tapuya, Tuxá, Kariri Xocó, Guajajara e Tupinambá. O território tradicional situa-se próximo ao córrego Bananal, ao Parque Ecológico Burle Marx e ao Parque Nacional de Brasília, na área de expansão urbana onde o Governo do Distrito Federal (GDF) tem interesse em construir o bairro mais caro da cidade, o Setor Noroeste.
De acordo com Crevels (2014, p. 68), o local do Setor Noroeste fica no bairro previsto como o mais caro de Brasília, e dos mais caros do Brasil. Segundo Penhavel (2013), o preço médio do m² do Setor Noroeste, entre 2010 e 2013, era o terceiro maior do país, R$ 10.581, atrás apenas do Leblon, no Rio de Janeiro, e da Vila Nova Conceição, em São Paulo.
De acordo com notícia do Combate Racismo Ambiental (25/07/2012), a ocupação indígena no local começou em 1957, quando indígenas da etnia Fulni-ô, provenientes de Águas Belas-PE, se deslocaram à Brasília para trabalhar como operários na construção da capital e se refugiaram em meio às matas do cerrado para se dedicarem ao culto sagrado e a manifestações religiosas ancestrais.
Os Fulni-ô em Águas Belas – PE passaram por intenso processo de desterritorialização, o que também influenciou sua migração para Brasília. A antropóloga Thais Brayner (2013) esclareceu que, inicialmente, os indígenas usavam o Santuário dos Pajés para realizar cerimônias, mas, posteriormente, passaram a se fixar no local.
O Instituto Socioambiental (s/d) informa que os Fulni-ô sofreram um processo histórico de arrendamento de suas terras em Pernambuco, e muitos se dispersaram por conta desses conflitos fundiários. A descrição do site Povos indígenas no Brasil revela que, a partir de 1929, os Fulni-ô começaram a arrendar suas terras aos habitantes não indígenas do município de Águas Belas. Muitos deles cultivavam essas terras de maneira irregular, e começaram a pagar uma quota anual aos indígenas donos dos lotes, mediante contrato firmado no posto do Serviço de Proteção aos Índios (SPI). O site revela mais detalhes:
“Em 1982, os registros do Posto indicavam que, dos 427 lotes em que está dividida a Terra Indígena, 275 tinham arrendatários que em sua maioria eram pessoas com poucos recursos econômicos. Outra modalidade de arrendamento é aquela a que chamam de ‘chão de casa’. Devido à peculiar situação da cidade de Águas Belas, a partir da década de 1950, a solução encontrada pelas famílias brancas sem casa foi a construção de moradas dentro da Terra Indígena. Para que um branco possa construir uma casa nesta situação, é necessário que conte com a permissão do respectivo dono e do chefe do Posto. Em 1980, o total de casas era de 485, e estavam situadas em 11 lotes. Um relatório de 1986 menciona 800 casas nesta situação” (Povos Indígenas no Brasil 1985-1986; Cedi, 1986).
Detalhes do conflito envolvendo os Fulni-ô de Águas Belas – PE está disponível neste Mapa de Conflitos: https://shre.ink/UjtC.
O caso dos indígenas da etnia Fulni-ô de Águas Belas, que ocuparam a área do Santuário dos Pajés, é mais um exemplo de conflito por território. De acordo com Frederico Flávio Magalhães (2009), os primeiros indígenas dessa etnia que se fixaram na área foram: Antônio Inácio Severo, José Ribeiro, José Carlos Veríssimo e Eloi Lúcio.
Segundo o mesmo pesquisador, Antônio Inácio Severo se tornou conhecido entre trabalhadores da Vila Planalto como “Índio Juscelino”. Entre os indígenas, ele era tratado como cacique Zumba, e exercia o papel de liderança espiritual do território Santuário dos Pajés. A partir da década de 1960, chegaram outros indígenas Fulni-ô, como Maria Veríssimo Machado, acompanhada de duas filhas e dois netos.
Em 1969, chegaram mais dois filhos de Maria Machado; Santxiê Tapuia e Towê Fulni-ô, que chegou acompanhado de esposa e filhos. Ainda segundo os estudos de Magalhães, na década de 1970, os parentes Fulni-ô de Maria Veríssimo continuaram a chegar, como os dois sobrinhos, Mauro Veríssimo e Pedro Ribeiro. Com o tempo, os casamentos, o nascimento de filhos e netos, bem como a morte de líderes espirituais, fortaleceram ainda mais a relação com o território.
De acordo com a antropóloga, ainda na década de 1970, famílias Tuxá, da Bahia, também estabeleceram moradia permanente no Santuário. Nesse período, mudaram-se para o local os indígenas Tuxá: Maria Conceição e seus filhos (Nelsinho Cavalcante, Edilene Conceição Cavalcante e Ednalva da Conceição Cavalcante).
Em 1986, chegaram as primeiras famílias Kariri-Xocó ao Santuário dos Pajés. A ocupação dos Kariri-Xocó começou quando a indígena Ivanice Tononé se deslocou de Alagoas em busca de tratamento médico e foi acolhida temporariamente pelo pajé Fulni-ô, Santixê. Ivanice permaneceu no local e, em seguida, convidou alguns parentes para morarem com ela, juntamente com alguns indígenas da etnia Tuxá.
Segundo Thais Brayner (2013), a aliança entre os Kariri-Xocó e Fulni-ô são conhecidas no Nordeste, em especial em relação às alianças matrimoniais e ao ritual Ouricuri praticado por ambas as etnias. Nesse caso, as alianças entre Kariri-Xocó e Fulni-ô tiveram continuidade em Brasília.
A liderança indígena Santixê informou ao pesquisador Frederico Magalhães que, em 1986, o indígena Pedro Tapuia foi esfaqueado por quatro estranhos dentro do território indígena quando tentou impedir a derrubada de árvores do cerrado para fabricação de carvão. Entre os anos de 1995 e 1996, o pajé Santixê deu entrada no processo junto à Funai (Processo Funai/BSB/1607/96) para formalizar o pedido de regularização do território da Comunidade Indígena do Bananal.
De acordo com Magalhães (2009), a Funai determinou o levantamento antropológico em 1996. Os estudos foram realizados pelo antropólogo Ivson José Ferreira e finalizados em 15 de maio de 1996. Nessa mesma data, a Companhia Territorial de Brasília (Terracap) recebeu o Ofício 336/DAF/06 para tomar conhecimento do referido processo de regularização do território indígena.
O pesquisador Frederico Magalhães destacou que a agência imobiliária continuava a tratar a comunidade indígena como invasora de terras públicas. Na Terracap, esse processo foi transformado no de Nº 111.000.628/1997, mas jamais foi devolvido à Funai, apesar da solicitação do órgão indigenista federal.
Ainda segundo o pesquisador Frederico Magalhães, os indígenas não tiveram voz nas decisões de urbanistas e do governo distrital sobre a área ocupada por eles antes mesmo da inauguração de Brasília, datada de 21 de abril de 1960. O pesquisador citou diversos momentos em que os indígenas foram negligenciados pelos poderes públicos, tal como a ação empreendida pela Terracap em 1998, quando ela elabora, por meio da empresa Tecnologia e Consultoria Brasileira S/A (contratada pela Terracap), o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatório de Impacto Ambiental (Rima) para validar seus planos de ocupação urbana do Setor Noroeste.
Outro exemplo citado foi o Plano de Ocupação da área da Expansão Noroeste realizado pela antiga Secretaria de Estado de Desenvolvimento Urbano e Habitação do Distrito Federal (Seduh/DF), no ano 2000.
Cabe ressaltar que, conforme a Resolução n° 1, de 23 de janeiro de 1986, do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), o EIA-Rima é uma das etapas obrigatórias do processo de licenciamento ambiental, e cabe ao órgão ambiental competente (estadual ou Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais – Ibama) aprovar e licenciar atividades modificadoras do meio ambiente.
Além disso, cabe ao Ibama a responsabilidade de liberar a licença ambiental de qualquer projeto que esteja em área de ocupação indígena, necessitando também recorrer ao parecer da Funai sobre o caso.
No caso do licenciamento ambiental do Setor Noroeste, num primeiro momento o Ibama foi responsável pela emissão das licenças ambientais; posteriormente (conforme detalhado em trecho a seguir), o Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Distrito Federal – Brasília Ambiental (Ibram) assume essa competência no processo do licenciamento.
Ainda segundo Magalhães (2009:30-31), no ano de 2003, o Centro Integrado de Operações, Segurança Pública e Defesa Social do DF (Ciospds) solicitou à Funai a definição e a demarcação da área para garantir a proteção dos indígenas do Bananal (Relatório CIOSP 008/2002-NPO de 15.10.2002, encaminhado por meio do Ofício Nº1654/15.10.2002/GEPLA/CIOSPDS).
Em resposta, a Diretoria de Assuntos Fundiários (DAF) da Funai solicitou a realização de estudos e levantamentos da situação fundiária da área ocupada pelos indígenas, realizado pela antropóloga Stella Ribeiro da Matta Machado, conforme Instrução Executiva Nº 09/DAF de 27/01/2003. O Relatório do Levantamento Prévio entregue pela antropóloga, em 18 de junho de 2003, reforçou a necessidade de adoção de providências para a regularização fundiária do território da Comunidade Indígena Bananal.
Ainda no ano de 2003, a 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, responsável por Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais, encaminhou à Funai uma Nota Técnica (185-P/2003) recomendando a realização de procedimentos administrativos para identificação da área da comunidade como terra tradicionalmente ocupada, de acordo com os termos do Artigo 231 da Constituição Federal de 1988.
Em 2004, a empresa TC/BR Tecnologia e Consultoria Brasileira S/A apresentou o EIA/Rima do Setor Noroeste. Contudo, segundo Magalhães (2009), os estudos sobre a presença indígena no Setor Noroeste não foram realizados de forma adequada, pois não consideraram a abordagem determinada na Constituição Federal e a legislação indigenista brasileira. Após os estudos, a empresa TC/BR indicou que a Funai removesse os indígenas da área, e os órgãos ambientais acataram a decisão.
No ano de 2006, em meio ao conflito entre indígenas e agentes favoráveis ao projeto do Setor Noroeste, foi criado o “Movimento Santuário Não se Move!”. Trata-se de um coletivo formado por estudantes, professores, profissionais de diversas áreas de atuação e outros membros da sociedade civil, criado para reivindicar a permanência da comunidade indígena e a delimitação do território Santuário dos Pajés.
Na visão de Miranda (2014, p. 14), o movimento constrói sua própria identidade, estabelecendo, na prática cotidiana, uma rede associativa de dimensão intercultural e plurivocal que utiliza a profusão de novas tecnologias de comunicação, em especial a internet, para ampliar seu espaço de atuação e, por conseguinte, somar aliados, sejam eles sujeitos coletivos ou individuais.
Em 26 de maio de 2007, Magalhães relatou que o Ibama emitiu Licença Prévia (LP nº20/2006) em favor da Terracap. Entretanto, a viabilização da implantação do parcelamento da área estava condicionada à resolução da questão indígena no processo de licenciamento.
A pesquisa de Christian Ferreira Crevels (2014), do Departamento de Antropologia da Universidade de Brasília (UnB), explicita um aspecto importante desse caso. Apesar do autor não revelar o período de tempo específico no qual o fato ocorreu, o processo do licenciamento ambiental é alterado significativamente, conforme identificado em seu relato:
“No caso do Santuário, a Terracap ingressou no Ibama com pedido de Licença Prévia sem apontar a condição de ocupação indígena no local, apesar de ser claro que a conhecia, o que permitiu que a competência fosse, equivocadamente, declinada para o Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Distrito Federal – Brasília Ambiental (Ibram), e que fosse afastada a participação da Funai. Não obstante a ocupação indígena estar citada na licença ambiental, sua natureza é previamente deslegitimada pela Funai, que atesta que não entende a área como sendo de uma ocupação tradicional, mesmo com os estudos antropológicos realizados no local de Stella Machado, Rodrigo Nacif, Marcos Paulo Schettino e Andréia Magalhães afirmarem o contrário. A responsabilidade pela licença de instalação recai então sobre o órgão estadual, no caso, o Ibram, que libera ambas as licenças ambientais e de instalação para a construção do Noroeste mesmo ciente da presença indígena no local. O Ibram assume erroneamente, pois, havendo componente indígena, a competência para o Licenciamento Ambiental recai à entidade federal com mediação da Funai” (Crevels, 2014, p. 69).
Em sua monografia, Crevels revela detalhes sobre esse conflito. A pesquisa intitulada “A semente pesada nas terras da discórdia: O Santuário dos Pajés e o signo imóvel” está disponível aqui: https://shre.ink/U2hS
No dia 15 de fevereiro de 2008, o então assessor da Subsecretaria de Planejamento Urbano da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Urbano e Habitação, Vicente Correia Lima Neto, encaminhou à Procuradoria-Geral do Distrito Federal – Procuradoria do Meio Ambiente, Patrimônio Urbanístico e Imobiliário alguns dados que confirmavam a versão dos indígenas sobre a história de ocupação do Santuário dos Pajés.
No documento, destacou-se que: “Para fins de comprovação da ocupação, foram levantadas imagens do Plano Piloto de Brasília nos anos de 1965, 1975, 1982, 1986 e 1991. Em 1965, o núcleo não pode ser observado. No entanto, as demais imagens apresentam uma ocupação, que, no decorrer dos anos, permaneceu quase que estática em termos de expansão”.
Por último, o assessor encaminhou cópia desse documento para a Terracap por considerá-la parte interessada na implementação do projeto do Setor de Habitações Coletivas Noroeste.
Em 2009, o Plano Diretor de Ordenamento Territorial (Pdot) do Distrito Federal foi alterado e a área ocupada pelos indígenas deixou de ser considerada Área de Relevante Interesse Ecológico (Arie), sendo liberada ao mercado para ser vendida por meio de leilões públicos.
A antropóloga Thais Brayner (2013) esclareceu que os conflitos entre empreiteiras e indígenas se agravaram a partir de então, pois o Governo do Distrito Federal (GDF) lançou o bairro Noroeste e a Terracap bateu recordes de vendas. Segundo a antropóloga, a empresa Emplavi comprou lotes da Terracap inseridos na área em 29 de janeiro de 2009. A pesquisadora destacou que tanto a Terracap quanto o GDF ignoraram a presença dos indígenas e o processo de reivindicação pelo território.
O pesquisador Frederico Magalhães divulgou que, no dia 16 de março de 2009, a Procuradoria da República no Distrito Federal (MPF/DF) encaminhou algumas recomendações à Superintendente Regional do Ibama no DF e ao Presidente da Funai.
Ao Ibama, a Procuradoria orientou que a área técnica responsável pelo licenciamento do Setor Habitacional Noroeste avaliasse as alterações necessárias ao projeto para que o modo de ocupação da comunidade indígena fosse preservado, até que houvesse uma decisão administrativa definitiva da Funai sobre a demarcação da área como Terra Indígena (TI). À Funai, determinou que fosse constituído o Grupo Técnico de Identificação e Delimitação do território da Comunidade Indígena do Bananal até a elaboração de relatório conclusivo.
De acordo com Thais Brayner (2013), no ano de 2009, o juiz federal Hamilton de Sá Dantas também determinou à Funai a criação de Grupo de Trabalho para identificar e delimitar o território indígena. Segundo a mesma autora, essa medida era uma condicionante da Licença Prévia concedida pelo Ibram.
Em 30 de março de 2009, ocorreu mais um incêndio no Santuário dos Pajés. Dessa vez, o alvo foi a casa de Towê, irmão da liderança indígena Santxiê. Segundo Magalhães (2009), os moradores e apoiadores desconfiaram que o incêndio fosse criminoso, com objetivo de amedrontar os indígenas e pressionar sua saída do local.
Em outubro de 2009, a empreiteira Brasal também comprou área no Setor Noroeste, por meio de licitação promovida pela Terracap, e obteve alvará para a construção (Portal Terra, 14/10/2011).
De acordo com Luana Luizy, em matéria republicada no blog Combate Racismo Ambiental (22/05/2012), em setembro de 2009 a Operação Caixa de Pandora da Polícia Federal (PF) revelou que parlamentares receberam propina para aprovar o Plano Diretor de Ordenamento Territorial (Pdot), o qual viabilizou o início da construção do empreendimento imobiliário Setor Habitacional Noroeste na área da comunidade indígena do Santuário dos Pajés.
Thais Brayner (2013) informou que, entre 2010 e 2011, a Funai autorizou a diligência técnica para o estudo do caso do Santuário dos Pajés por meio das portarias-Funai nº73, de 26/01/2010 e Funai-DPDS nº8, de 11/06/2011.
Em meio ao contexto apresentado, indígenas Guajajara, vindos do Maranhão, chegam à Brasília em 2010 para protestar contra o Decreto n.º 7.056, de 2009, ato que extinguiu diversas unidades administrativas da Funai no Brasil. De acordo com Rafael Daguerre e Ricardo Pitta, no site Outras Palavras (15/06/2023), a decisão dos Guajajara – que formariam a Aldeia Teko-Haw no Santuário dos Pajés – de se fixarem em Brasília se deveu à visão de suas lideranças de que seria estratégico para a causa indígena a ocupação permanente dos centros de poder econômico e político do país. A liderança Deusdete Guajajara fala sobre a chegada das famílias Guajajara no vídeo divulgado pela Mídia 1508, disponível aqui: https://bit.ly/43i0vJs
Em setembro de 2011, o laudo antropológico realizado pelo professor Jorge Eremites de Oliveira, da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), foi entregue aos servidores da Funai em Brasília, para os antropólogos do MPF e para as lideranças da comunidade indígena do Santuário dos Pajés. Nele, Oliveira concluiu que a ocupação indígena era tradicional e sugeriu que a Funai constituísse o Grupo Técnico (GT), sob coordenação de um antropólogo, para proceder aos estudos necessários à identificação, delimitação e demarcação da terra indígena no local. De acordo com Crevels (2014, p. 25), o antropólogo Oliveira coordenou uma investigação de campo para fornecer o laudo, segundo pedido da própria Funai.
No dia 13 de outubro de 2011, a Associação Brasileira de Antropologia (ABA) entregou nota complementar com medições da terra indígena à Presidência da Funai, MPF e lideranças do Santuário dos Pajés. A ABA alertou para a urgência da identificação, delimitação, demarcação e proteção do Santuário dos Pajés, reforçando que o laudo coordenado por Jorge Eremites de Oliveira atestava de maneira clara, objetiva e consistente que se tratava de terra tradicionalmente ocupada por comunidade indígena.
No dia seguinte, 14 de outubro de 2011, o Portal Terra republicou notícia da Agência Brasil ressaltando que, apesar do laudo antropológico favorável à comunidade Santuário dos Pajés, a Funai não considerava a área como Terra Indígena. Além disso, a Funai não providenciou a criação do Grupo de Trabalho; ao contrário, ela contestou o laudo, segundo declarou à Agência Brasil o seu funcionário Mário Moura:
“O laudo apresentado pelo antropólogo Jorge Eremites não se sustenta, e a maioria das pessoas que vivem no local, ainda que há muito tempo, sequer são lideranças indígenas. Se fosse terra particular, eles teriam direito a usucapião, mas como é terra pública, isso não é aplicável”.
Em entrevista para Thaís Brayner, Jorge Eremites de Oliveira expõe sua opinião sobre a recusa da Funai ao laudo que coordenou:
“Neste caso, em particular, tenho dito que a Funai apenas usou o laudo como um subterfúgio para protelar o que antropólogas da antiga CGID [Coordenação Geral de Identificação e Delimitação da Funai] me disseram pessoalmente, durante uma reunião na sede da agência indigenista oficial: que o Santuário dos Pajés não era terra indígena, tampouco poderia ser para que não abrisse um precedente jurídico para outros tantos casos semelhantes existentes no país” (BRAYNDER apud CREVELS, 2014, p. 94).
Ainda segundo a reportagem do Portal Terra (2011), houve protestos por parte de estudantes, indígenas e ambientalistas contrários à construção de imóveis no Santuário dos Pajés. O portal veiculou algumas denúncias dos manifestantes que sofreram agressões de seguranças. O estudante Augusto Dauster, de 23 anos, declarou:
“Viemos aqui tentar parar as máquinas que avançaram além da área permitida e invadiram as terras que são dos índios. Enquanto estávamos acorrentando uma das máquinas, apareceu outra. Ao tentarmos pará-la, o sujeito tentou nos acertar com a pá da escavadeira. Em seguida, vieram quatro seguranças para me imobilizar e tomar minha câmera”.
De acordo com o site Passa Palavra (15/10/2011), a empresa Emplavi contratou como advogado o ex-presidente da Terracap, Antônio Gomes. Na ocasião do protesto citado, em outubro de 2011, a empresa invadiu a área sub judice (expressão latina que significa “em julgamento”) e iniciou a construção irregular de um prédio. As mobilizações no Santuário dos Pajés se acirraram, como pode ser visto no vídeo “Abaixo as Cercas! Santuário Não se Move!”, disponível aqui: https://bit.ly/3DaI3ru
A ação foi acompanhada por seis viaturas da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) e 31 policiais. A PMDF alegou que o caso, por envolver indígenas, era de responsabilidade da PF e, por isso, estaria no local apenas para garantir a segurança de todos.
O procurador-geral da Funai da época, Antônio Salmeirão, também foi ao local buscar uma negociação entre as partes. Ao final, alcançou-se o acordo pela paralisação das obras enquanto a solução não fosse encontrada. A empresa pronunciou-se afirmando que não avançaria nas obras, mas prosseguiria com a limpeza do terreno.
A repercussão desse conflito, por outro lado, gerou mobilização do Centro de Mídia Independente (CMI), que produziu um longa-metragem dirigido por José Furtado chamado “Sagrada terra especulada – A luta contra o Setor Noroeste”. A produção cinematográfica esteve no 44º Festival de Cinema de Brasília em 2011, e ganhou o Troféu Câmara Legislativa.
Em 2012, para o Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, o CMI produziu curta-metragem revelando detalhes do conflito no Santuário dos Pajés: “Ditadura da especulação”. Também dirigido por José Furtado, em parceria com o Coletivo Muruá, ganhou o prêmio do júri popular como melhor curta-metragem no festival (Brayner, 2013, p. 95). Os documentários estão acessíveis aqui: “Sagrada terra especulada – A luta contra o Setor Noroeste”: https://bit.ly/3roPqco; “Ditadura da especulação”: https://bit.ly/3XSdnov.
De acordo com Thais Brayner (2013), em 2011 os Tuxá e Kariri-Xocó fecharam acordo com a Terracap, que se comprometeu a doar 12 hectares na Área de Relevante Interesse Ecológico (Arie) Cruls (nomeada no Zoneamento Ambiental em homenagem ao geodesista belga Luís Cruls, responsável pelo mapeamento do Planalto Central onde seria construída Brasília), situada a 200 metros da área ocupada pelos indígenas, ignorando assim o aspecto sagrado e religioso. A antropóloga afirmou que, no ano de 2012, esses indígenas que aceitaram o acordo continuavam na área do Santuário dos Pajés.
Além disso, a pesquisadora destacou que, naquele ano, as empreiteiras, mesmo quando eram impedidas de construir, continuavam a avançar em direção à terra indígena que ainda estava sob estudo. Segundo a antropóloga, o caso de Santuário dos Pajés seria complexo por envolver diferentes grupos indígenas na área.
Thais Brayner relatou que os Kariri-Xocó, liderados por Ivanice Tononé, inicialmente mantinham a postura de não sair do local, mas depois houve uma cisão entre eles (quando antes havia aliança entre as famílias) e mudaram de posição. Essa situação abalou as relações dos Kariri-Xocó com os Fulni-ô.
Brayer ressalta que a relação com os demais moradores Tuxá e Kariri-Xocó (em que existia, como descrito anteriormente, relações de parentesco entre eles) foi abalada, bem como a cooperação que existia (2013, p. 77). Segundo o pajé Fulni-ô Santxiê, receber dinheiro pela terra seria inadmissível, pois se negociaria algo que não tem preço; no caso, a sacralidade da terra.
A pesquisadora afirmou que esses indígenas que aceitaram o acordo da empreiteira deixaram-se convencer pelos advogados que os representavam, os quais reforçaram a possibilidade de ganhar dinheiro e terra. Thais Brayner destacou que a mídia (Correio Braziliense, Jornal da Comunidade etc.) divulgou o acordo aceito pelos Kariri-Xocó para deslegitimar a demanda dos indígenas e fez uma larga campanha para ridicularizar a presença indígena em Brasília, apresentando-os como oportunistas que buscavam dinheiro.
Além disso, a pesquisadora destacou que o grupo Fulni-ô liderado por Santxiê não teve relações sistemáticas e duradouras com os Guajajara que vieram a ocupar uma parcela da terra. Isso representou um ponto de tensão entre os indígenas. Por isso, em 2012, os moradores da comunidade Fulni-ô Tapuya denunciaram os Guajajara por crime ambiental.
Em resposta, a antropóloga Elaine Teixeira Amorim, da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do MPF, realizou o Laudo Pericial Antropológico para estabelecer as diferenças de usos, sentidos e ocupação do território pelos indígenas dos três grupos principais: Guajajara, Kariri- Xocó e Tuxá e Tapuya Fulni-ô.
De acordo com o laudo citado anteriormente, “a presença dos Tuxá é antiga e consolidada por meio de alianças políticas e matrimônios. Os Tuxá acabaram trazendo os Kariri-Xocó, também construindo alianças e matrimônios”. É possível considerar que esses fatores levaram Amorim a considerar os Kariri- Xocó e Tuxá como um dos três grupos principais.
O geógrafo Pedro Thomé Quintão Queiroz (2021, p. 30), pesquisador da Universidade de Brasília (UnB), analisou esses conflitos entre as comunidades indígenas do Santuário e concluiu: “Os conflitos na área se processam em duas vertentes, mas sob um mesmo denominador, o território; envolve, de um lado, uma disputa entre os próprios indígenas e, de outro, entre estes e o bairro Noroeste”.
De acordo com Luana Luizy, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi, 25/07/2012), aproveitando a visita no Brasil para criação da filial no Rio de Janeiro, a Anistia Internacional esteve presente no Santuário dos Pajés, no dia 24 de julho de 2012. Indígenas pediram divulgação da luta e denunciaram as medidas de negligência da Funai.
Em agosto de 2012, a casa de Olavo Wapixana e Aldenora foi incendiada. Apesar de não ter sido comprovado, os indígenas não descartaram as suspeitas de o incêndio ter sido criminoso. Segundo esclarecimento de Crevels (2014), algumas etnias do Santuário do Pajé podem ser entendidas como “agregados aos grupos principais”, tal como o exemplo do caso de Olavo Wapixana. Nas palavras do pesquisador:
“O Santuário dos Pajés, como área indígena urbana, também abriga aqueles índios que vêm à Brasília por um ou outro motivo. Na área já residiram, por algum tempo ou por longa duração, estudantes indígenas da UnB, como é o caso de Olavo Wapixana e sua família; como também várias lideranças indígenas que vêm à capital manifestar por algum motivo, ou resolver problemas administrativos junto à Funai” (CREVELS, 2014, p. 61).
Em 14 de novembro de 2013, a Justiça Federal decidiu a favor da permanência dos indígenas e reconheceu a área Santuário dos Pajés como terra indígena. De acordo com o juiz federal Paulo Ricardo Souza Cruz, ao contrário do que os pareceres da Funai indicavam, os documentos reunidos nos autos comprovavam a tradicionalidade da terra, implicando a necessidade de se reconhecer o direito dos indígenas se manterem no local. A nota de Felipe Lázaro e Johana Noblat publicada no blog Combate Racismo Ambiental (12/01/2014) diz que a decisão constrangeu a Funai, acusada pelo MPF de negligência.
A decisão do juiz Paulo Ricardo de Souza Santos, da 2ª Vara da Seção Judiciária do DF, reconhecia como terra indígena uma área de 4,1 hectares no bairro, e garantiu a pelo menos 40 indígenas da etnia Fulni-ô Tapuya a posse permanente dos lotes, determinando ainda que a Funai delimitasse o espaço ocupado pelos Fulni-ô Tapuya.
Segundo nota de Helena Mader, os integrantes da etnia Fulni-ô Tapuya ocupavam local equivalente à área das quadras comerciais CRNW 508, CRNW 708 e EQNW 708/709 do Setor Noroeste. No entanto, de acordo com a mesma reportagem do Correio Braziliense (15/01/2014), em janeiro de 2014 a Terracap apresentou embargos de declaração contra a decisão do judiciário.
Segundo notícia veiculada por Ivan Richard, da Empresa Brasileira de Comunicação (EBC, 17/10/2014), a partir de um acordo (Termo de Compromisso) entre indígenas Kariri-Xocó, Funai e Terracap, a empresa se comprometeu com a construção de 16 unidades habitacionais em outra área de Brasília, visando transferir os indígenas para essa região. A nota ressalta que o acordo foi assinado apenas por membros da etnia Kariri-Xocó, enquanto os Fulni-ô Tapuya, Tuxá e Tupinambá não assinaram e reforçaram a permanência no território.
Em nota, a Terracap informou que o local para onde seriam levados os indígenas Kariri-Xocó seria denominada de Reserva Indígena Kariri-Xocó do Bananal. O local, uma área de 22,08 hectares, está situado entre o viveiro de mudas da Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap) e o Parque Nacional de Brasília. De acordo com outra notícia veiculada pelo G1 (16/10/2014), o termo foi publicado no Diário Oficial do DF, e as unidades estavam previstas para serem entregues em 2016. O acordo também previa a construção de um centro de convivência e casas para as famílias.
Em 2014, o pajé Santxiê Tapuya, líder do Santuário dos Pajés, faleceu por problemas cardíacos (TERENA, 2014). De acordo com seu filho, Fêtxawewe Tapuya Guajajara, em entrevista concedida à Cáritas Brasileira (2020), o laudo do Instituto Médico Legal (IML) concluiu que a morte teria sido por infarto.
Em trecho do seu depoimento para Cáritas, o jovem disse: “O laudo diz que ele teve infarto, mas a família acredita que tenha sido outra coisa, ainda mais porque se recusaram a fazer o exame toxicológico. Ele morreu com 58 anos. Foi uma perda muito grande pro Santuário”.
Daiara Tukano, em seu perfil particular na rede social Facebook, trouxe um relato em março de 2015 sobre o Santuário dos Pajés e lamentou o falecimento do líder pajé. Em seu depoimento, Tukano ressaltou a importância das aldeias urbanas como representatividade política fundamental à sobrevivência dos povos indígenas. Em suas palavras:
“A pré-existência da antiga aldeia Fulni-ô em Brasília faz parte da história oculta e silenciada da cidade [Brasília – DF], omitida e oprimida pelo sonho futurista de construir uma capital nova, moderna e promissora, como se o futuro tivesse a todo custo que atropelar o passado. Assim a cidade começou a ser construída na encruzilhada marcada não distante do córrego do bananal, onde a aldeia se encontra até hoje. Muitos teimam em dizer que os ‘índios’ teriam chegado junto com a construção da cidade porque este seria antes um ‘território desabitado’ (o mesmo argumento usado desde a colônia, pois para invadir estas terras sempre houve o pretexto de que aqui não havia ninguém), mas os resistentes indígenas estão aqui para provar o contrário, inclusive existem fotos aéreas de uma aldeia que já foi muito maior. (…) Reunidos com os Fulni-ó Tapuya, os Tuxá, Guajajara, e outros moradores do santuário dos pajés e da cidade, defendemos o Santuário dos Pajés lutando contra o tempo e as irregularidades esdrúxulas do poder político de quem tem dinheiro”.
Daiara Tukano, indígena que tem sua origem no município de São Gabriel da Cachoeira (AM) e estudava na UnB, disse em seu relato que, na época, estavam apoiando a luta pela demarcação da terra indígena Santuário dos Pajés.
No dia 28 de abril de 2016, as políticas públicas de saúde para os indígenas foram um dos pontos destacados no debate promovido pelas Procuradorias da Mulher do Senado e da Câmara, sendo parte do Projeto Pautas Femininas. De acordo com a Agência Senado (28/04/2016), Daiara Tukano defendeu a necessidade de respeito à autonomia dos povos originários e seus conhecimentos nas políticas públicas de saúde.
Na oportunidade, Daiara também denunciou o avanço de áreas urbanas sobre os territórios tradicionais: “Aqui em Brasília mesmo existe uma aldeia Kariri-Xokó, onde tem uma pajé, Cacica Tanoné, que por quase 30 anos cultivou no cerrado toda uma farmácia viva que foi derrubada na construção do Setor Noroeste”.
Sobre a destruição da farmácia viva, o jovem Fêtxawewe Tapuya Guajajara trouxe mais detalhes na sua entrevista para Cáritas (2020). Segundo ele, o herbário possuía cerca de 800 espécies de plantas medicinais, além de exemplares de outros biomas brasileiros: “Era um herbário reconhecidíssimo por causa das plantas fitoterápicas do Cerrado. Em um dos ataques que sofremos, ele foi queimado. Sobraram pouquíssimas mudas”.
De acordo com Marília Marques, do portal G1-DF (13/10/2017), o acordo realizado pela Terracap em 2014, que previa conceder uma terra de 22 hectares e a construção de moradias a alguns indígenas, ainda não havia sido cumprido no ano de 2017. Além do não cumprimento, segundo Francisco Guajajara, do Santuário dos Pajés, “muitos indígenas não foram ouvidos no acordo firmado entre a Terracap e a Funai”.
A Terracap justificou em nota que o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) não autorizou as obras. Em resposta, o ICMBio disse que o projeto previa o uso direto de recursos (água) de dentro da unidade de conservação e, por isso, se manifestou contrário à realocação dos indígenas na região próxima ao Parque Nacional de Brasília.
O MPF defendeu o reconhecimento do território indígena e argumentou: “O Santuário dos Pajés, é de fato, terra de ocupação tradicional indígena. […] Logo, a reivindicação apresentada pela comunidade é pertinente do ponto de vista dos direitos dos povos originários no Brasil” – segundo trecho veiculado pelo G1 – DF.
Indígenas do Santuário dos Pajé questionaram, no dia 20 de novembro de 2017, a legalidade de obras de pavimentação da via W9 iniciadas pela Novacap (empresa ligada à Terracap). Segundo reportagem de Letícia Carvalho, no G1 – DF (29/11/2017), funcionários derrubaram parte da vegetação nativa que estaria no perímetro reivindicado como território indígena. A Terracap argumentou que “o serviço estava sendo executado fora da área delimitada pela ação judicial”.
Além da denúncia sobre as obras, os indígenas disseram que os funcionários da Novacap estavam armados e que houve agressões verbais contra alguns membros indígenas. O advogado que representava alguns indígenas do Santuário, Ariel Foina, em nota publicada pelo Brasil de Fato (05/12/2017), destacou que a ação da Novacap era ilegal: “É uma desobediência direta à ordem judicial expressa que proibia exatamente aquilo que foi feito”. De acordo com a nota, o episódio foi investigado pelo MPF.
Cristiane Sampaio, na agência Brasil de Fato (05/12/2017), ressalta algumas estratégias utilizadas para retirar os indígenas do Santuário dos Pajés: “Os especuladores têm feito de tudo: desde prometer bens como carros e imóveis em outras áreas da cidade até promover invasões de fato, com o objetivo de provocar uma migração dos grupos que hoje habitam o terreno”.
Sobre a atuação da Novacap citada anteriormente, Sampaio destaca que, segundo os moradores, funcionários teriam agido com violência e ameaçado indígenas que estavam no local, entre eles, Márcia Guajajara. Os moradores indígenas sustentaram que a área desmatada estava no perímetro objeto de disputa judicial.
No dia 16 de dezembro de 2017, um grupo de voluntários se uniu aos indígenas para promover um replantio da área degradada pela Novacap. O mutirão teve início no dia 15 de dezembro e foram plantadas cerca de 850 mudas, doadas pelo Jardim Botânico de Brasília.
Em 29 de junho de 2018, após anos de disputa no Judiciário, o Santuário dos Pajés, MPF, Terracap, Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Distrito Federal – Brasília Ambiental (Ibram) e a Funai assinaram acordo (Ação Civil Pública 2009.34.00.038240-0) determinando como posse permanente da comunidade indígena uma área de 32,48 hectares.
No referido acordo, o Santuário dos Pajés esteve representado por Marta de Sousa Silva (Marcia Guajajara) e Fetxawewe Tapuya Guajajara Veríssimo, filho de Santxiê Tapuya, e estabeleceu-se seu uso exclusivo pela comunidade indígena, parentes em primeiro grau, cônjuge e descendentes diretos do Pajé Santxie Tapuya (Cláusula Primeira).
O acordo firmado entre os familiares de Santxiê Tapuya , a Terracap e demais órgãos também estabeleceu as seguintes obrigações:
“CLÁUSULA TERCEIRA – A Terracap, num prazo de até 10 (dez) anos, providenciará, após expressa solicitação e indicação do(a) representante da COMUNIDADE INDÍGENA, as seguintes construções, a) um malocão (centro de convivência indígena) b) um ambiente escolar com pelo menos duas salas de aula, com banheiro e uma cozinha (no ambiente escolar) c) 4 (quatro) unidades habitacionais d) implantação do sistema de abastecimento de água e esgotos e) sistema de distribuição de energia”.
Ainda foi acordado que a Terracap providenciaria a colocação de alambrado (cercamento) em volta da área acordada e um posto de vigilância instalado na entrada da área, custeado pela própria empresa. Segundo o documento, essa medida teria a finalidade de controlar a entrada e a permanência de pessoas não autorizadas pelos representantes indígenas.
Determinou-se que a Terracap utilizasse técnicas adequadas de pavimentação e compactação nas obras a serem feitas na proximidade da área indígena, bem como na construção da Via W9, de forma a respeitar o espaço do “Ministério do Índio Espiritual” e da “Casa de Reza”, situados dentro do Santuário dos Pajés.
Quanto às obrigações da Funai, além do registro formal do território, que passaria a ser denominado “Terra Indígena Santuário Sagrado dos Pajés – Pajé Santxiê Tapuya” junto à Secretaria de Patrimônio da União (SPU), cabia o apoio à comunidade no diálogo com os demais órgãos envolvidos para a construção de ações de gestão ambiental e territorial da área.
À comunidade indígena, ficou acordada a permissão para que a Terracap (e empresas contratadas) pudesse implantar as infraestruturas necessárias para a construção da Via W9, permitindo, assim, que se estabelecesse a ligação entre a 1ª e a 2ª etapas do Setor Habitacional Noroeste. Ademais, o acordo previa que a comunidade indígena se comprometesse a requerer a extinção de todas as demandas judiciais ajuizadas em desfavor da Terracap. O acordo encontra-se disponível na íntegra aqui: https://bit.ly/3rePdrS
A demarcação dos 32 hectares do território foi, em parte, um passo na luta dos indígenas do DF; no entanto, o direito de usufruto seria apenas para indígenas da etnia Fulni-ô Tapuya, conforme redigido na Cláusula Primeira do referido acordo. Cabe reforçar que o Santuário dos Pajés também é habitado por outras etnias que não tiveram suas reivindicações contempladas. Os Kariri-Xocó e os Tuxá deverão ser realocados, segundo informações divulgadas na 20ª edição da revista Darcy da Secretaria de Comunicação da Universidade de Brasília (Secom/UnB – 07/02/2023).
Conforme exposto por Queiroz (2021), o requerimento por parte dos indígenas do Santuário dos Pajés era de uma área de aproximadamente 50 hectares, necessária para manutenção de seus modos de vida e de seu patrimônio-territorial. A figura cartográfica abaixo (Figura 01) representa uma aproximação da área de 50 hectares, realizada a partir do georreferenciamento da delimitação presente em Oliveira; Pereira; Barreto (2011) e Queiroz (2021), demonstrando os limites da demarcação reivindicada por indígenas do Santuário dos Pajés.
Na avaliação do advogado representante de uma parte dos indígenas do Santuário dos Pajés, Ariel Foína, o acordo era uma vitória, mas, segundo ele, para chegar ao acerto judicial, seus clientes renunciaram a mais da metade do território pleiteado. “Conseguimos manter a área onde estavam as edificações mais antigas” (Metrópoles, 07/07/2018). Em contrapartida à redução da área do Santuário dos Pajés, a Terracap se comprometeu a suprimir do projeto do bairro Noroeste alguns lotes.
Em outubro de 2019, a Terracap assinou acordo com as comunidades indígenas Kariri-Xocó e Tuxá. Segundo dados divulgados no site da empresa, as 16 famílias seriam realocadas para uma área de 14 hectares, nas imediações do próprio bairro. No local, seria construída a Reserva Indígena Kariri-Xocó e Tuxá do Bananal-DF. De acordo com o termo de compromisso celebrado entre as partes, a área seria doada pela Terracap à União e, posteriormente, administrada pela Funai.
Sobre esse fato, Queiroz (2021, p. 30) destacou que os indígenas que já haviam aceitado a desocupação finalizaram acordo em outubro de 2019 que prometia sua realocação em uma área próxima de onde habitavam, ainda dentro do Setor Noroeste. A remoção desse grupo é um dos fatos que permitiria a construção da via W9, obra que estava paralisada por conta do conflito no Santuário dos Pajés. Cabe ressaltar que a via W9 permitiria o tráfego de veículos entre o Setor de Transporte Norte (STN) e a rodovia DF-040, próximo ao Setor de Recreação Pública Norte (SRPN) (Correio Braziliense, 21/10/2019).
Sobre os impactos dessa via no território indígena, segundo relatos de campo sistematizados na pesquisa de Queiroz (2021, p. 37), a via W9 preocupava a comunidade, pois seus efeitos poderiam incidir sobre edificações no Santuário dos Pajés: a Casa de Rezas e o Ministério do Índio Espiritual, patrimônios que não se limitam à estrutura física, mas têm significados culturais, ancestrais e sagrados.
Conforme destacado por Queiroz (p. 47), a ancestralidade do território do Santuário dos Pajés emerge de relações como essa, de vida-morte, da qual se resguarda a essência pelo patrimônio-territorial da comunidade. Outros patrimônios-territoriais que representam essa relação são os três cemitérios presentes no Santuário dos Pajés; um deles, hoje sobreposto por um edifício construído, enquanto os outros dois estão envolvidos na própria delimitação de 32,5 hectares.
A figura abaixo, divulgada por Queiroz (2021), representa a demarcação do território indígena do Santuário dos Pajés, após acordo firmado com a Terracap.
De acordo com sua pesquisa de campo, Queiroz (2021, p. 37) revela que o acordo de 2018 vinha sendo cumprido pela Terracap, e esse processo, nas suas palavras, “é marcado pela violência contra todas as escalas que compreendem o território, modus operandi do Estado-mercado”.
As imagens a seguir registradas pelo autor (Figuras 03, 04) representam alguns pontos abordados no acordo. Para Queiroz, “são demonstrativas da violência que incide sobre o território e o contraste da ação com o discurso ‘ecológico’ e ‘sustentável’ do bairro Noroeste”.
Na visão do geógrafo, a delimitação da área da comunidade indígena Santuário dos Pajés em 32 hectares não significa, no entanto, que sua produção e suas vivências cotidianas se limitem a essa demarcação. Em suas saídas de campo e contatos com os indígenas da comunidade, o pesquisador relata que os indígenas buscam fortalecer relações com apoiadores e na proximidade com a comunidade no geral, entre as quais a escolar e universitária. Nesse contexto, foram realizadas atividades referentes à Semana Santuário dos Pajés, que envolveu atividades com a comunidade entre os dias 24 e 28 de junho de 2019.
Tendo em vista esses novos fatos, o jovem indígena, Fetxawewe Tapuya Guajajara, filho do pajé Santxiê Tapuya (falecido em 2014), concedeu entrevista a Jucelene Rocha, da Cáritas Brasileira, publicada no site da organização em 13 de fevereiro de 2020. Aos 21 anos, o estudante de Ciências Sociais na Universidade de Brasília (UnB), falou sobre o histórico de luta de seu pai, os desafios em assumir uma posição de liderança no território e o processo de demarcação do Santuário dos Pajés:
“Dentro dos hectares do Santuário havia quatro cemitérios, eram mais de 102 hectares. Então era muita terra, hoje em dia a gente conseguiu demarcar 30 hectares e meio. O governo só queria deixar quatro hectares, e aqui dentro somos mais de três povos indígenas, tendo a presença mais fixa dos Fulni-ô, Guajajara e Wapixana. Mas acolhemos, por exemplo, estudantes de outras etnias. Aqui somos basicamente 150 pessoas, mais ou menos, porque as famílias vão pras comunidades e outras voltam. Mas ao todo agora somos em torno de 60 a 68 famílias. Antes dos conflitos da terra, a gente tinha uma estrutura melhor pra receber os estudantes, depois do conflito da terra a gente perdeu muita coisa. Perdeu a oca das mulheres, a oca das crianças”.
Quanto ao falecimento de seu pai, o pajé Santxiê, apesar de divulgado ter sido decorrente de problemas cardíacos, o fato nunca foi investigado. Na visão de Fêtxa Tapuya Guajajara, a morte dele também envolveu questões políticas: “Se ele fosse enterrado aqui seria um peso maior pra causa da demarcação e, por isso, o governo não queria que ele fosse enterrado aqui, a Funai não queria que ele fosse enterrado aqui”. O corpo foi enterrado na aldeia em Águas Belas -PE, local de origem do pajé.
Outras pautas como racismo, violências e preconceitos contra os povos indígenas foram destacadas pelo indígena durante a entrevista. Ele reforçou o engajamento da juventude indígena e, por consequência, a insurgência de outras pautas de reivindicação, como a juventude indígena LGBT (sigla atual LGBTQIA+), gravidez na adolescência, casamento forçado e os feminismos das mulheres indígenas. Ao fim, o jovem disse que, apesar da demarcação do território do Santuário dos Pajés, os indígenas continuavam com receios:
“Apesar de já termos a terra demarcada, a gente ainda tem muito medo. Até porque, atualmente, o presidente do Brasil [ex-presidente Jair Bolsonaro] tem o discurso muito anti-indígena, a gente tem medo de a qualquer momento não termos mais a terra demarcada. Temos ouvido muito falar disso. A Funai hoje em dia é agronegócio, né? É agro. Já tem mais ruralista lá dentro do que indígena mesmo. A gente recorre muito à 6ª Câmara [Câmara temática do Ministério Público Federal que trata de temas específicos das Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais], recorremos também a redes internacionais. Vem gente de todo lugar aqui conhecer e levar um pouco dessa história. Muito do apoio que o Santuário conseguiu foi internacional mesmo”.
Aspectos sobre racismo, violência, preconceito e medos relatados pelo jovem indígena expressam-se também em notícias veiculadas no início de 2020. No dia 18 de fevereiro de 2020, policiais federais cumpriram seis mandados judiciais no Santuário dos Pajés, com base numa operação que investigava uma suposta fraude processual na demarcação do território.
De acordo com notícia veiculada no G1 – DF (18/02/2020), a operação mobilizou 80 agentes da PF e foi autorizada pela 15ª Vara Federal do DF. Ao todo, foram cinco mandados de busca e apreensão no território e um mandado de busca exploratória. Segundo a PF, o objetivo também era investigar uma denúncia de posse ilegal de armas de fogo por moradores indígenas.
Em junho de 2020, a Terracap entregou oito casas provisórias para as famílias Kariri-Xocó e Tuxá do Santuário dos Pajé, na região da Área de Relevante Interesse Ecológico (Arie) Cruls. O cumprimento dessa medida tinha como base o acordo realizado em outubro de 2019.
Segundo Carolina Jardon, da Agência Brasília (08/07/2020), numa área de 14 hectares seria construída a Reserva Indígena Kariri-Xocó e Tuxá do Bananal-DF e a Terracap prometia implementar a infraestrutura da área, que incluiria: sistema de abastecimento de água, esgoto e energia, 16 unidades habitacionais, estrutura de guarita, centro cultural, sete ocas pequenas, um terreiro e uma casa de produção de farinha.
Segundo dados publicados no site da Terracap, a construção da reserva indígena Kariri-Xocó e Tuxá no Setor Noroeste estava sendo executada pela empresa Multi Primi Engenharia Ltda., com previsão de término para março de 2023 e valor estimado de R$ 5.526.317,94.
Os pesquisadores Pedro Thomé Quintão Queiroz, geógrafo e mestre em geografia pela UnB e Beatriz Maia, graduada em medicina pela Universidade Católica de Brasília (UCB), divulgaram, em dezembro de 2020, resultados prévios de uma pesquisa realizada no Santuário dos Pajés. A pesquisa teve por objetivo compreender alterações nas dinâmicas territoriais da comunidade indígena durante o período da pandemia de covid-19.
Em relação ao acesso à informação e comunicação relacionadas à pandemia, segundo foi relatado na entrevista, a principal fonte de informações veio das redes sociais e de grupos de parentes em aplicativos de mensagens, compartilhando notícias, informações e a situação de outras comunidades. Além do mais, foi ressaltada a disponibilidade de informações pelo Ambulatório de Saúde Indígena [ASI] do Hospital Universitário de Brasília (UHB):
“Aqui em Brasília foi muito via apoiadores que mandaram mensagem, o próprio ASI do UHB que entrou em contato […] para ficar em observação com a gente, se tivemos algum contato com a covid ou alguma coisa assim. Tirando isso, a gente também colhe essas informações do site da APIB […], e páginas do Instagram […] relacionadas ao movimento indígena. Acho que a gente não ouve muito jornal, a gente não segue muito jornal em si, […] mas querendo ou não, uma hora ou outra nós ouvimos informações vindo de jornal. Mas no mais veio a partir disso, do WhatsApp, outros familiares mandando informações[…] sobre covid, inclusive até mesmo como se proteger, como higienizar o alimento que compra no supermercado, o uso da máscara, foi muito via WhatsApp” (Entrevista concedida pela liderança indígena FT, em Brasília – DF, em setembro de 2020. QUEIROZ; MAIA, 2021).
Durante a pandemia de covid-19, as dinâmicas de visitas à comunidade do Santuário foram, segundo relatado, uma das principais alterações sentidas. A principal fonte de renda das comunidades era obtida por meio da venda de artesanatos, mas, impossibilitados de receber visitantes devido ao período de isolamento social, houve um comprometimento de arrecadação da comunidade.
Sobre a ocorrência ou não de casos positivos de covid-19 na comunidade indígena, um dos entrevistados relatou:
“Aqui não teve ninguém não, até porque a gente teve o alto cuidado da medicina tradicional: muito chá, muito banho, enfim, muito coisa de raiz assim, raizada, essas coisas. Também para se prevenir […] nós usamos certas raízes, […] certas folhagens e tudo mais, vindas de comunidades externas, por exemplo do Maranhão, Pernambuco e de outras (Entrevista concedida pela liderança indígena FT, em Brasília – DF, em setembro de 2020. QUEIROZ; MAIA, 2021).
Como resultado, a pesquisa de Queiroz e Maia aponta alterações nas dinâmicas ritualísticas e nos encontros cotidianos da comunidade, além de aspectos como a demarcação do território, apropriação das técnicas de informação e comunicação, e acesso aos sistemas de saúde especializados, como favoráveis à contenção dos casos de covid-19 naquele contexto territorial. A pesquisa encontra-se disponível aqui: https://shre.ink/UEaR.
Embora limitados pelo contexto da pandemia, o uso das tecnologias virtuais com fins de resistência ajudou na mobilização de novos apoiadores para as lutas do Santuário dos Pajés. No dia 10 de dezembro de 2020, foi criada a Comissão Especial de Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do DF. De acordo com o site Outras Palavras (15/06/2023), o grupo foi criado como “resposta aos ataques do governo Bolsonaro aos direitos indígenas”.
De acordo com o presidente do órgão, Bruno Antunes Cerqueira, a Comissão se colocou como apoiadora na luta do Santuário dos Pajés. Em suas palavras: “Vamos somar na luta das causas indígenas. Brasília recebe o Acampamento Terra Livre todos os anos e possui indígenas residentes da Comunidade do Santuário dos Pajés”.
O já citado Pedro Thomé Quintão Queiroz, de acordo com documento publicado em maio de 2021 pela Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan), apresentou sua pesquisa de mestrando em Geografia pela UnB, com o título “Patrimônio-territorial indígena na urbanização de Brasília e no Santuário Sagrado dos Pajés : contexto latino-americano”, que teve por objetivo: “Analisar aspectos referentes ao patrimônio-territorial da comunidade Santuário dos Pajés que reafirmem sua permanência e vínculo com o território, na ‘era urbana’ latino-americana”.
O pesquisador busca debater o conceito de “era urbana” analisando processos relacionados ao avanço do mercado imobiliário de Brasília sobre o território indígena e as consequências para a comunidade, decorrentes do modelo de urbanização latino-americana. Em suas palavras:
“O Santuário dos Pajés emerge como um fenômeno que exemplifica com clareza como a urbanização latino-americana, em suas mais diversas facetas, recai sobre grupos que historicamente sofrem com o subjugo e o preconceito, que afetam desde o ser às suas representações territoriais, materiais ou imateriais, passadas ou presentes” (QUEIROZ, 2021, p. 30).
O pesquisador revela:
“Os efeitos do processo de urbanização que se desenvolve sobre o Território indígena Santuários dos Pajés, representado pelo mercado imobiliário de Brasília, ao contrário do que se supunha, não é um entrave para a manutenção e preservação de seu patrimônio-territorial. Estes resistem frente ao avanço da fronteira criada pelos agentes do Estado-mercado que se sobrepõe ao Santuário dos Pajés. A resistência destes patrimônios-territoriais se processa em diversos espectros: tanto em transfigurações estruturais, no que diz respeito a algumas edificações para que se mantenham fisicamente representadas no território; quanto na memória dos indígenas que habitam o Santuário dos Pajés, que resguardam e, assim, preservam esse patrimônio” (QUEIROZ, 2021, p. 53).
De acordo com reportagem de Afonso Ferreira e Walder Galvão, do portal G1-DF, no dia 25 de setembro de 2021, um indígena de 15 anos morreu após ser atingido por um raio na aldeia Teko-Haw, no Santuário dos Pajés. O caso foi investigado pela Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) como “morte por eletroplessão [causada por descarga elétrica]”.
Sobre esse caso, outra reportagem de Rafael Daguerre e Ricardo Pitta, publicada na Mídia 1508 (17/06/2023), conta que Francisco Guajajara, cacique da aldeia Teko-Haw, disse que a falta de assistência básica por parte do governo teve influência no ocorrido, pois as autoridades ignoraram os apelos da aldeia pela instalação de um para-raios (equipamento de segurança necessário por se tratar de uma área de descampado).
Apesar do acordo que reconheceu uma área de 32 hectares para algumas etnias da comunidade do Santuário dos Pajés, preservar as tradições indígenas em meio ao centro urbano continuava sendo um desafio. Na visão de Fetxawewe Tapuya Guajajara, divulgada 20ª edição da Revista Darcy, Secom UnB, e republicada no site da UnB Notícias (07/02/2023), rituais de cura praticados pela comunidade, como a Jurema Sagrada e Ayahuasca (ambos envolvendo a ingestão de bebidas psicoativas à base de raízes e plantas nativas do Nordeste do país e da floresta amazônica, respectivamente), tornaram-se cada vez mais raros, em função da falta de privacidade.
“Temos que fazê-los de madrugada, porque às vezes aparecem drones para nos observar ou alguém coloca uma música bem alta nos prédios. Precisamos muito de um momento com a natureza e com nossa espiritualidade e ancestralidade para cultuar aquilo em que acreditamos” – revelou o indígena.
Entre os dias 10 e 17 de fevereiro de 2023, Rafael Daguerre e Ricardo Pitta, ambos da Mídia 1508, estiveram na aldeia Teko-Haw, localizada no Santuário dos Pajés, para verificar a situação vivida pela comunidade Guajajara. De acordo com Daguerre e Pitta (2023), os indígenas dessa aldeia estão no território desde 2009, quando vieram do Maranhão para protestar contra o desmonte na Funai. Com cerca de 37 famílias, os Guajajara permaneceram em Brasília, no Santuário do Pajé.
Segundo a publicação, a maioria sobrevive apenas da venda de artesanato, e poucos conseguem ter acesso ao Bolsa Família, mesmo se enquadrando nos critérios socioeconômicos definidos no programa. As refeições são feitas com o que eles plantam na terra delimitada pela Terracap. A comunidade relatou violação de direitos como à saúde e educação.
Na mesma reportagem publicada na agência Outras Palavras (15/06/2023) e produzida pela Mídia 1508, Arão da Providência Guajajara denunciou: “O governo não apresentou proposta de atendimento pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai). Também não ofereceu atendimento pelo Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei), sob a alegação de que não há unidade em Brasília. Há também a Casa da Saúde Indígena [Casai], mas não foi oferecido o serviço”.
A Comissão Especial de Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas da OAB do DF esteve na aldeia durante a mesma semana que a reportagem da Mídia 1508. Carla Eugênia Nascimento, presidenta da Comissão, falou do interesse da OAB em avaliar dificuldades e fragilidades dos direitos básicos de assistência à saúde, educação, moradia e infraestrutura da aldeia. Mais detalhes sobre as frentes de atuação da OAB na aldeia Teko-Haw estão disponíveis no vídeo da Mídia 1508 disponível em: https://bit.ly/3rjc9Xc
Ainda com base na reportagem de Daguerre e Pitta, sobre o acordo realizado em 2018 com a Terracap e o Santuário dos Pajés, a visão de representantes da comunidade Guajajara da aldeia Teko-Haw era de que a medida teria sido uma manobra para travar a demarcação da TI, além de confinar os indígenas em um espaço consideravelmente menor do que aquele historicamente reivindicado por eles.
De acordo com Arão Guajajara: “A Funai informou que a terra (indígena) só passará para ela quando for revogada a Lei Distrital que criou a ARIE Cruls. A ARIE Cruls é uma área de proteção ambiental que admite uma pequena presença humana e com o manejo tradicional”. Apesar do posicionamento favorável do judiciário, o processo demarcatório sequer havia sido iniciado, lembrou Arão.
Em abril de 2023, indígenas do povo Guajajara que vivem na aldeia Teko-Haw no Santuário dos Pajés inauguraram uma escola indígena na região. Segundo reportagem de Bruna Yamaguti, do portal G1 – DF (19/04/2023), a escola foi erguida pelos próprios indígenas com uso de técnicas tradicionais da cultura Guajajara, usando barro batido, madeira e bambu.
O cacique da aldeia, Francisco Filho Guajajara, explicou que enviou uma lista com professores indígenas para o governo do Distrito Federal e aguardava autorização da Secretaria de Estado de Educação (SEE-DF) para que a escola fosse oficialmente reconhecida como unidade de ensino.
De acordo com a liderança Guajajara, a expectativa é que mais de 80 crianças sejam contempladas pela escola bilíngue (português e a língua tupi ze’egete). A iniciativa se fez necessária após as crianças passarem anos frequentando escolas não indígenas. A construção da unidade teve apoio de grupos de voluntários, que ajudaram a arrecadar recursos, materiais escolares, livros, cadeiras e mesas.
Na matéria da Mídia 1508, Francisco Guajarara relata: “A gente tem até os documentos pedindo água e luz pra cá na aldeia, mas o governo não quer dar, porque se a Funai não reconhecer a área indígena ninguém vai dar assistência. Na realidade, aqui na aldeia Teko-Haw não tem estrutura nenhuma de governo aqui dentro. Nós estamos sofrendo dentro daqui da capital, estamos sofrendo”.
Até o momento da publicação da reportagem da Mídia 1508 (junho de 2023), outra reivindicação não atendida dos Guajajara era a do reconhecimento oficial da escola indígena construída por eles. A reportagem destacou que já aconteciam atividades na escola comunitária indígena, mas, no entanto, os professores indígenas trabalhavam em condições precárias, sem remuneração, além de não existir garantias de que as aulas oferecidas contariam para efeitos da escolarização formal dos estudantes.
Atualizada em outubro 2023
Cronologia
Fins da década de 1950 – Início da ocupação indígena no Santuário dos Pajés por indígenas da etnia Fulni-ô, provenientes de Águas Belas-PE.
21 de abril de 1960 – Inauguração de Brasília.
Década de 1970 – Famílias Tuxá e Fulni-ô estabelecem moradia permanente no lugar e ali passam a constituir uma comunidade multiétnica.
1986 – Chegam as primeiras famílias Kariri Xocó no Santuário dos Pajés.
1995-1996 – Indígenas abrem processo junto à Funai, sob Nº 1.607/1996, com intenção de pedir reconhecimento da presença deles no local e demarcação da terra. O processo, com importantes documentos para o esclarecimento dos fatos, como procedimentos oficiais para a regularização da área, desaparece do órgão indigenista.
1998 – Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap) elabora o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatório de Impacto Ambiental (Rima), no contexto do Licenciamento Ambiental conduzido pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama), para validarem seus planos de ocupação urbana do Setor Noroeste.
2000 – Secretaria de Estado de Desenvolvimento Urbano e Habitação do Distrito Federal (Seduh/DF) realiza Plano de Ocupação da área da Expansão Noroeste.
2003 – Antropóloga da Funai, Stella Ribeiro da Matta Machado, elabora relatório de levantamento prévio (processo nº 1.230/2003) que constata a presença Tuxá e Fulni-ô na área do Santuário dos Pajés.
2003 – Em Nota Técnica (185-P/2003) da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do Ministério Público Federal, o antropólogo Marco Paulo Froes Schetino recomenda a identificação e delimitação da área do Santuário dos Pajés como terra indígena tradicionalmente ocupada.
2003 – Antropóloga da Funai, Andréia Luiza L. B. Magalhães solicita ao órgão em seu parecer (143/CGID/2003) a constituição de Grupo de Trabalho (GT) Identificação e Delimitação para a regularização fundiária do território da Comunidade Indígena Bananal.
2006 – É criado o “Movimento Santuário Não se Move!” para reivindicar a permanência da comunidade indígena e a delimitação do território Santuário dos Pajés.
26 de maio de 2007 – Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e de Recursos Naturais Renováveis (Ibama) emite Licença Prévia (LP nº20/2006) em favor da Terracap como condição para a viabilização da implantação do parcelamento da área, e destaca a resolução da questão indígena no processo de licenciamento. Posteriormente, o Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Distrito Federal – Brasília Ambiental (Ibram) assume o licenciamento ambiental do empreendimento.
2008 – Governo do Distrito Federal (GDF) começa a licitar lotes no setor Noroeste.
27 de novembro de 2008 – Juíza Gildete Silva Balieiro, da Vara de Registros Públicos do Distrito Federal, rejeita as ações de impugnações apresentadas por indígenas.
2009 – Parecer histórico e antropológico sobre a área do Santuário dos Pajés é preparado por Rodrigo Thurler Nacif e, um parecer técnico, por Juliana G. Melo e Leila Burger Sotto-Maior (número 34/CGID/DAF).
16 de março de 2009 – Procuradoria da República no Distrito Federal (MPF/DF) encaminha recomendações sobre o caso à Superintendente Regional do Ibama no DF e ao Presidente da Funai.
2009 – Juiz Hamilton de Sá Dantas determina à Funai que crie um Grupo de Trabalho (GT) para o estudo do caso em questão.
2009 – Plano Diretor de Ordenamento Territorial do Distrito Federal (Pdot) é alterado, área ocupada pelos indígenas deixa de ser considerada Área de Relevante Interesse Ecológico (Arie) e é liberada ao mercado imobiliário para ser vendida por meio de leilões públicos. O GDF lança o bairro Noroeste e bate recordes de vendas.
29 de janeiro de 2009 – Empresa Emplavi compra lotes vendidos pela Terracap. Ambos ignoram a presença dos indígenas e o processo de reivindicação pelo território é iniciado.
30 de março de 2009 – Ocorre um incêndio na casa de Towê, irmão da liderança Santxiê. Os moradores e apoiadores desconfiam da possibilidade de que o incêndio seja criminoso.
26 de janeiro de 2010 – Funai autoriza diligência técnica (portarias-Funai nº 73, de 26/1/2010, e Funai DPDS nº 8, de 11/6/2011) para constituição de Grupo Técnico para estudar o caso do Santuário dos Pajés.
2010 – Famílias Guajajara chegam à Brasília para protestar contra o Decreto n.º 7.056, de 2009, que extinguiu unidades administrativas da Funai no Brasil. Posteriormente, os Guajajara formam a Aldeia Teko-Haw no Santuário dos Pajés.
Setembro de 2011 – Laudo antropológico de parte da área da antiga Fazenda Bananal, também conhecida como Santuário dos Pajés, é entregue pelo professor Jorge Eremites de Oliveira, da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), a servidores da Funai em Brasília, bem como a antropólogos do Ministério Público Federal (MPF) e lideranças do Santuário dos Pajés.
2011 – Atendendo a pedido da Funai, o antropólogo Jorge Eremites conclui o laudo e sugere que a Funai constitua GT para proceder estudos no local. O funcionário Mário Moura da Funai contesta o laudo e não considera a área como terra tradicional indígena.
16 de agosto de 2011 – Indígenas denunciam invasão e destruição de vegetação do território tradicional por parte do GDF e da Terracap.
13 de outubro de 2011 – Associação Brasileira de Antropologia (ABA) entrega nota complementar com medições da terra indígena à Presidência da Funai, MPF e lideranças do Santuário dos Pajés.
14 de outubro de 2011 – Protestos de estudantes, indígenas e ambientalistas contrários à construção de imóveis no Santuário dos Pajés. A ação é acompanhada por seis viaturas da PMDF e 31 policiais.
2011 – Os Tuxá e Kariri-Xocó fecham acordos com a Terracap.
2011/2012 – Centro de Mídia Independente (CMI) produz dois longa-metragens sobre o conflito e ganha prêmios no 44º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro (Festbrasília).
2012 – Moradores da comunidade Tapuya Fulni-ô denunciam os Guajajara por crime ambiental. Antropóloga Elaine Teixeira Amorim realiza Laudo Pericial Antropológico para estabelecer diferenças de usos, sentidos e ocupação da terra pelos indígenas dos três grupos principais, sendo eles: Guajajara, Kariri- Xocó e Tuxá e Tapuya Fulni-ô.
24 de julho de 2012 – Anistia Internacional visita o Santuário dos Pajés.
Agosto de 2012 – Casa de Olavo Wapixana e Aldenora é incendiada. Indígenas suspeitam de incêndio criminoso.
Novembro de 2013 – Justiça decide a favor da permanência dos indígenas e reconhece a área Santuário dos Pajés como território tradicional do povo Fulni-ô Tapuya.
Janeiro de 2014 – Terracap apresenta embargos de declaração contra a decisão do judiciário.
Outubro de 2014 – É realizado acordo entre indígenas Kariri-Xocó, e a Terracap se compromete com a construção de unidades habitacionais. Fulni-ô-Tapuya, Tuxá e Tupinambá não assinam acordo e reforçam a permanência no território no Santuário dos Pajés.
2014 – O pajé Santxiê Tapuya, líder do Santuário dos Pajé, falece por problemas cardíacos. Familiares questionam laudo do Instituto Médico Legal (IML).
Março de 2015 – Daiara Tukano denuncia que a história do Santuário representa a continuidade do choque de culturas e do genocídio do povo indígena.
Abril de 2016 – Debatedores do Projeto Pautas Femininas, das Procuradorias da Mulher do Senado e da Câmara discutem saúde indígena. Daiara Tukano denuncia que a farmácia viva do Santuário dos Pajés foi derrubada na construção do Setor Noroeste.
Outubro de 2017 – Acordo celebrado em 2014 pela Terracap não é cumprido sob justificativa de que o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) não autorizou a construção das unidades habitacionais. Francisco Guajajara, do Santuário dos Pajés, denuncia que não houve diálogo sobre esse acordo e cobra demarcação do território.
Novembro de 2017 – Empresa Novacap realiza obras de pavimentação e causa desmatamento no Santuário do Pajés. Funcionários agem com violência e ameaçam, segundo denúncias dos indígenas.
Dezembro de 2017 – Voluntários e indígenas promovem replantio da área degradada pela Novacap.
Junho de 2018 – Acordo firmado entre o MPF, a Terracap, o Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) e a Funai estabelece área de 32 hectares de uso exclusivo e permanente da comunidade indígena da etnia Fulni-ô Tapuya, do Santuário dos Pajés.
Junho de 2019 –Semana Santuário dos Pajés.
Outubro de 2019 – Terracap faz outro acordo de realocação de indígenas Kariri-Xocó e Tuxá para uma área de 14 hectares, nas imediações do Setor Noroeste.
Fevereiro de 2020 – Fetxawewe Tapuya Guajajara, jovem liderança do Santuário dos Pajés, concede entrevista e fala sobre preconceito, conflitos e o protagonismo das juventudes indígenas.
18 de fevereiro de 2020 – Policiais federais cumprem mandados judiciais no Santuário dos Pajés com base em denúncia de suposta fraude na demarcação do território.
Junho de 2020 – Terracap entrega oito casas provisórias para as famílias Kariri-Xocó e Tuxá do Santuário dos Pajé, na região da Área de Relevante Interesse Ecológico (Arie) Cruls.
2020 – Pesquisadores da Universidade de Brasília (UnB) e Universidade Católica de Brasília (UCB) divulgam pesquisa sobre impactos da covid-19 no Santuário dos Pajés.
Dezembro de 2020 – É criada a Comissão Especial de Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do DF. Presidente Carla Eugênia Nascimento declara apoio ao Santuário dos Pajés.
25 de setembro de 2021- Um indígena de 15 anos morre após ser atingido por um raio na Aldeia Teko-Haw, no Santuário dos Pajés. Francisco Guajajara, liderança indígena Guajajara, denuncia que as autoridades ignoraram apelos da aldeia pela instalação de um para-raios.
Fevereiro de 2023 – Repórteres da Mídia 1508 e membros da Comissão Especial de Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas da OAB de Brasília avaliam condições de precariedade na Aldeia Teko Haw, no Santuário dos Pajés.
Abril de 2023 – Indígenas do povo Guajajara da Aldeia Teko Haw inauguram escola indígena, mas aguardam autorização da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEE-DF) para reconhecimento oficial do estabelecimento e contratação dos professores indígenas, em regime de voluntariado.
Fontes
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O que houve com a tentativa de homicídio com arma de fogo que atingiu o pai de Xua perpetrado por PM?
Como faço pra visitar a terra indígena Santuário dos Pajés? Onde ligo? Como consigo o contato? É com a FUNAI?
Qual é a injustiça? Se o indígena que veio construir Brasília tem direito à posse da terra onde decidiu morar, por que todos os demais candangos não tiveram o mesmo direito? Por que o GDF vive requerendo suas terras dos não-indígenas e tudo bem?
Obrigado