Mesmo reconhecida, comunidade quilombola de Lagoa dos Índios sofre com especulação imobiliária e ações contrárias de reintegração de posse
UF: AP
Município Atingido: Macapá (AP)
Outros Municípios: Macapá (AP), Santana (AP)
População: Quilombolas
Atividades Geradoras do Conflito: Agroindústria, Atuação de entidades governamentais, Atuação do Judiciário e/ou do Ministério Público, Especulação imobiliária, Indústria do turismo, Políticas públicas e legislação ambiental
Impactos Socioambientais: Alteração no regime tradicional de uso e ocupação do território, Assoreamento de recurso hídrico, Erosão do solo, Falta / irregularidade na demarcação de território tradicional, Poluição de recurso hídrico, Poluição do solo
Danos à Saúde: Doenças não transmissíveis ou crônicas, Doenças transmissíveis, Falta de atendimento médico, Insegurança alimentar, Piora na qualidade de vida, Violência psicológica
Síntese
Localizada ao longo da rodovia Duque de Caxias, entre Macapá e Santana, a comunidade quilombola de Lagoa dos Índios já foi chamada por muitos nomes durante seus cerca de 200 anos de existência. Contudo, seja a Comunidade de Fortaleza do século XIX ou a Comunidade de Goiabal do século XX, de acordo com os trabalhos de Cecília Bastos, Daguinete Brito (2008) e Danielson Iaparrá (2019), os problemas são basicamente os mesmos: descaso do poder público, omissão, avanço de terceiros sobre seu território, opressão e racismo.
Fundado em 1802 como refúgio para pessoas negras que escapavam da escravidão, o quilombo da Lagoa dos Índios foi construído numa área de ressaca que atualmente está sendo ameaçada pelo avanço da cidade de Macapá. De acordo com Camila Pernambuco Costa (2019), as áreas de ressaca são uma denominação regional para terrenos alagados pela maré e chuvas que atuam com funções de controle do clima local, drenagem das águas pluviais e fluviais, e servem de abrigo para uma rica biodiversidade. A pesquisa de Costa ainda expõe (2019) que as ressacas em Macapá são imprescindíveis para o equilíbrio ambiental e para própria saúde humana, pois servem como corredores naturais de ventilação, amenizando o clima quente da capital.
Em 1962, a DTC emitiu carta de adjudicação em favor dos herdeiros Antonio Guardiano da Silva, José Raimundo da Silva, Auta Maria da Conceição, Raimundo Cândido da Silva e Manoel Joaquim dos Santos, dando direito à posse das terras aos descendentes dos moradores originais do local.
De acordo com estudos como o de Bastos e Brito (2008), baseando-se nos relatos orais dos moradores mais antigos, até meados da década de 1980 a comunidade vivia basicamente da pesca, pecuária, extrativismo e agricultura. A partir dessa década, o crescimento demográfico da cidade de Macapá começou a pressionar os quilombolas, ameaçados pela chegada de novos ocupantes à lagoa. Desde então, sofrem os impactos negativos dessa expansão desordenada rumo às terras do “interior” do município.
Esses novos ocupantes introduziram outras dinâmicas de uso da terra e de apropriação dos recursos naturais. O local, que antes se caracterizava pelo uso coletivo da terra e de apropriação comunitária dos recursos naturais, começou a sofrer um processo de “privatização” com a chegada de novos “proprietários” e o cercamento dessas propriedades, que passaram a limitar o acesso dos quilombolas aos recursos naturais antes comuns da comunidade.
De acordo com dissertação de Iaparrá (2019), instalaram-se nas proximidades do quilombo instituições públicas e privadas como “escolas, penitenciária, postos de combustível, revendedora de veículos, faculdade, conjuntos residenciais de médio e alto padrão, sítios, chácaras, além de atividade da piscicultura”. No entanto, são usufruídas principalmente para fins comerciais de moradores que não se autorreconhecem como quilombolas.
Como resultado, tais empreendimentos contribuíram para as perdas territoriais e para a transformação do modo de vida no quilombo. Não obstante as perdas e transformações, o ambiente natural na Lagoa dos Índios ainda é favorável à atividade da pesca, pequena criação de animais, mas tornou-se inviável a atividade da agricultura em pequena escala devido ao encurtamento dos quintais e o cercamento das áreas comuns.
Se antes as atividades agropecuárias representavam a base da subsistência da comunidade, com a ocupação das terras agriculturáveis e a degradação ambiental decorrente, essas atividades se tornaram cada vez mais raras. Em meio às divergências entre os próprios moradores da comunidade em relação ao autorreconhecimento como uma comunidade quilombola, como mostrou o estudo de Iaparrá (2019), graças ao esforço da Associação das Mulheres Negras da Comunidade da Lagoa dos Índios (AMNCLI), a Fundação Cultural Palmares (FCP) emitiu a Certidão de autodefinição de comunidade quilombola em 19 de agosto de 2005.
Em 2017, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e o Instituto de Meio Ambiente e Ordenamento Territorial do Amapá (Imap) apresentaram o documento “Plano de Trabalho – Regularização de Território Quilombola”, abordando a situação dos processos no Incra e um cronograma de implementação das atividades. Porém, não dispunham de profissionais habilitados para as atividades e o convênio com o Imap foi eivado de fragilidades, segundo o MPF, exigindo a intervenção do órgão para superar as lacunas identificadas. Em 2019, o Incra iniciou novo estudo, interrompido devido à pandemia de covid-19, como divulgou reportagem de Rudja Santos para o Amazônia Real (2023).
O passo conclusivo do processo, a titulação em si, esbarra até hoje (2024) na falta de estrutura do órgão agrário federal, agravando o avanço da especulação imobiliária e permitindo ações de reintegração de posse contra a comunidade.
Contexto Ampliado
Segundo estudos realizados por Cecília Maria Chaves Brito Bastos, Daguinete Maria Chaves Brito (2008), Daniel Iaparrá (2019) e outros, Lagoa dos Índios é uma comunidade tradicional de raízes quilombolas instalada há mais de 200 anos no que é hoje a periferia do município de Macapá. A formação do território tradicional se confunde com a própria construção histórica do Amapá. A comunidade vive na porção oeste do município de Macapá, onde as práticas costumeiras, as relações de compadrio, a atividade agrícola e a relação com a natureza eram mais profundas em tempos anteriores, como descreveu Iaparrá (2019).
No século XVIII o local estava fora dos limites da então vila cidade de Macapá e era considerado de difícil acesso, constituindo-se como ideal para aqueles que resistiram ao trabalho escravo. Além da dificuldade de acesso, os muitos igarapés, regatos e áreas de ressaca propiciavam proteção contra as investidas de feitores ou outros agressores.
De acordo com Kerley Silva (2012), não se pode afirmar uma data exata por falta de fontes escritas, mas provavelmente Lagoa dos Índios foi ocupada pela população negra a partir do fim do projeto colonial português, na segunda metade do século XVIII.
Nas lembranças dos moradores de Lagoa dos Índios, de acordo com Bastos e Brito (2008) e Danielson Iaparrá, Roni Lomba e Edimar Alves (2017) o aquilombamento foi “uma alternativa para os grupos negros conduzirem sua permanência naquele local, e sobretudo, para eles um lugar de estágio do conhecimento da floresta”. Isto permitiu a formação de um grupo moderadamente afastado e relativamente protegido da cobiça portuguesa no período colonial. Na mesma região, conforme os relatos, havia habitantes indígenas que conviveram com os primeiros quilombolas.
Esse lugar, segundo a moradora dona Madalena, em entrevista para Danielson Iaparrá, Roni Lomba e Edimar Alves (2017), representou o meio de obtenção de fartura para os membros do grupo. A fartura relembrada por dona Madalena era a base da autossuficiência e da reprodução de vida no quilombo.
“Antigamente tinha muito tatú aqui, tinha até viado, tinha capivara, paca, um bucado de caça, mais hoje em dia é difícil vê uma cútia, a gente vai nesse mato caçar [e] num pega nada mano, a cidade cresceu tem uma vila pra ali, outra pra lá, aí, os bichos foram embora tudinho. Antigamente a gente ia lanternar no igarapé e matava de oito, nove jacaré, hoje num tem nada [a entrevista foi concedida em 2014]”.
A casa de farinha também era referência de produção alimentar e cultural do quilombo.
De acordo com Edmilson das Merces Batista (2022) sobre as políticas territoriais e a questão fundiária no estado, em 1943, o Amapá, até então parte do atual estado do Pará, foi desmembrado e transformado em território federal, situação que ampliou a influência do governo central. As ações relativas à regularização fundiária também passaram para o domínio da União, sob administração da Divisão de Terras e Colonização (DTC), a qual concentrou sua atuação na expedição de licenças de ocupação para posseiros. Segundo Goria Maria Bastos e Cecília Britto (2013), em Lagoa dos Índios, em 1962, a DTC emitiu carta de adjudicação em favor dos herdeiros Antonio Guardiano da Silva, José Raimundo da Silva, Auta Maria da Conceição, Raimundo Cândido da Silva e Manoel Joaquim dos Santos, dando direito à posse das terras aos descendentes dos moradores originais do local.
Macapá, como muitas cidades brasileiras, sofre com o processo de crescimento desordenado desde meados da década de 1970, quando ocorreu a abertura da Rodovia Duque de Caxias (atual Rodovia Duca Serra), estrada que liga a capital ao município de Santana. O crescimento se intensificou no fim da década de 1980 com momentos de mudança no cenário político nacional, e o Amapá deixou de ser território federal e transformou-se em estado.
De local isolado e de difícil acesso, a área da Lagoa dos Índios passou a ser ponto prioritário da expansão da cidade, resultando na urbanização e na apropriação das terras tradicionais dos quilombolas por terceiros. Embora tais processos tenham propiciado o acesso de seus antigos moradores a serviços públicos e instalações urbanas, ainda que precários, eles também limitaram o acesso dos quilombolas a recursos naturais antes disponíveis, o que inflige à comunidade as consequências indesejadas desse modelo de desenvolvimento.
Conforme relataram os quilombolas para trabalho de Bastos (2006), a implantação da Colônia Penal Agropecuária e Industrial do Amapá (Cpaia) em 1984, a instalação de uma fábrica de beneficiamento de goiaba e de um supermercado (Casa das Carnes) foram outros empreendimentos na década de 1980 que impactaram o modo de vida da comunidade, que desde então se viu ameaçada pela falta de segurança, fuga de presos e pela violência dos agentes penitenciários e policiais.
Por tudo isso, a população quilombola da Lagoa dos Índios vive num misto de terror e insegurança, alijada de seus direitos e de seu território e sem encontrar na ação do Estado o respaldo necessário para a garantia de sua segurança alimentar, saúde ambiental e direitos territoriais.
Esse paulatino processo de escasseamento das fontes de sustento e proteção da comunidade também foi provocando, ao longo da segunda metade do século XX, a fragilização das relações de vizinhança na Lagoa dos Índios, devido ao estabelecimento e à imposição da lógica da expansão urbana sem que houvesse quaisquer medidas para mitigação dos impactos sobre as famílias que ali viviam. Nesse período, o Amapá passou por profundas transformações territoriais, e novas tecnologias modificaram as relações de sociabilidade entre as pessoas não apenas em Lagoa dos Índios, mas nos territórios tradicionais do Amapá. De acordo com Iaparrá et al. (2017), o núcleo urbano, que estava concentrado no centro de Macapá, a partir da década de 1990 foi expandido em outras direções: novos bairros foram surgindo, expropriações e apropriações do espaço em benefício do modo de vida urbano foram se consolidando.
Dessa forma, o modo de vida majoritário dos moradores da Lagoa está hoje baseado na relação direta com a cidade, pois seus membros se dirigem até ao centro de Macapá em busca de trabalho. Segundo Iaparrá, Lomba e Alves (2017):
“Autônomos, ganham a vida em trabalhos temporários na construção civil (pedreiro, carpinteiro, servente), são vigilantes, empregadas domésticas, auxiliar de serviços gerais e até servidores públicos. O modo de vida na Lagoa tem se alterado de forma significativa nas últimas décadas, o sistema de valores ligados ao uso comunal da terra, valores materiais e imateriais por muito tempo utilizado por esse grupo tradicional estão em metamorfose.”
No entanto, isso não significa que a comunidade se resignou frente às pressões pelo apagamento das relações sociais e políticas tradicionais. A principal estratégia adotada pela comunidade para se preservar social e culturalmente dos novos moradores que migraram mais recentemente para a região é a luta pela titulação de suas terras, o que poderia garantir uma área mínima para o desenvolvimento de suas atividades e impedir que o avanço da urbanização desestruture irremediavelmente seu modo de vida ancestral. Nessa estratégia, a pressão da comunidade se concentra prioritariamente sobre os órgãos públicos encarregados da titulação e da regularização fundiária de terras quilombolas, ou seja, a Fundação Cultural Palmares (FCP) e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
Assim, a territorialidade de Lagoa dos índios, enquanto quilombo reconhecido pelo Estado brasileiro, passou por profundos processos de ressignificação e fortalecimento, especialmente no início dos anos 2000, quando passaram a se organizar em torno da Associação de Mulheres Negras da Comunidade da Lagoa dos Índios (AMNCLI). A coesão política da associação foi estratégica para que, no ano de 2001, a Fundação Cultural Palmares (FCP) iniciasse o processo de reconhecimento da área como Remanescente de Quilombo, de acordo com o artigo 68 das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal de 1988.
Posteriormente, em 2004, a ressaca foi tombada como patrimônio pelo estado do Amapá, pela Lei nº 0455/1999, posteriormente revogada e substituída pela lei estadual 0835/2004 (Lei das Ressacas). Porém, de acordo com Cecília Bastos (2019), esses instrumentos normativos foram construídos de maneira desvinculada da presença quilombola, dissociando o patrimônio ambiental do cultural e da identidade territorial tradicional.
Essa situação e toda a complexidade ocorrida em Lagoa dos Índios emergia em um cenário político marcado por avanços na consolidação de direitos constitucionais para os quilombolas. Em 2003, o Decreto nº 4.887, de 20 de novembro, “regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos de que trata o artigo 68 do ato das disposições constitucionais transitórias”. No artigo 2º: “Consideram-se remanescentes das comunidades dos quilombos os grupos étnico-raciais, segundo critérios de autoatribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida”.
No entanto, em Lagoa dos Índios, isso não evitou a mercantilização das terras para grupos privados que se posicionaram contrariamente à intenção da comunidade original em ter reconhecida aquela região como território quilombola pelo Estado brasileiro, dado que a titulação definitiva e coletiva das terras impediria sua apropriação em massa. Pesquisa realizada por Iaparrá, Lomba e Barros (2017) mostrou a multiplicação, na entrada do ramal do Goiabal, estrada de acesso ao quilombo, de um grande número de placas publicitárias vendendo lotes em condomínios residenciais fechados na região, além de faixas elaboradas pelos próprios moradores, donos de pequenas extensões de terra no quilombo e que têm a intenção de vendê-los. Um exemplo pode ser visto na imagem a seguir:
Ainda assim, a luta coletiva pela titulação das terras era caminho sem volta. Em junho de 2005, os quilombolas manifestaram-se publicamente em Macapá pela agilização do processo de autorreconhecimento da comunidade. Como resultado das lutas sociais, o Certificado de Reconhecimento da Comunidade Quilombola da Lagoa dos Índios foi emitido em 21 de julho de 2005, com apoio da Secretaria Extraordinária de Políticas para os Afrodescendentes do Amapá (Seafro/AP), relembra Bastos (2018).
Além da ineficiência e omissão estatal, os moradores da comunidade de Lagoa dos Índios enfrentavam o desafio de conseguir manter sua cultura e organização social específica em uma área crescentemente tomada e assediada por novos moradores, os quais passaram a cercar áreas antes comuns e a impedir o acesso dos quilombolas a elas. Banhistas e outros frequentadores da lagoa, considerada área de lazer da cidade, desrespeitavam a população local e não demonstravam preocupação com a preservação do meio ambiente da Lagoa dos Índios.
Segundo reportagem da Amazônia Real (2023), a ex-superintendente do Incra (2003 a 2006) Cristina Almeida estava à frente da autarquia quando o processo em Lagoa dos Índios começou. Ela falou dos entraves burocráticos que obstam processos de titulação quilombola e frustram iniciativas mais céleres: “Lembro de ir até casas na comunidade e junto a equipe técnica notificar moradores não quilombolas e anunciar que a partir daquele momento nada mais poderia ser construído”.
Outra iniciativa nesse sentido ocorreu em 2008, quando o Conselho das Comunidades Afrodescendentes do Amapá (Ccada), com apoio do deputado estadual Camilo Capiberibe (Partido Socialista Brasileiro – PSB), organizou uma audiência pública para debater o problema da regularização das terras quilombolas no estado. Nessa audiência, ficou clara a falta de estrutura do Incra para cumprir suas obrigações e a inexistência de qualquer política governamental federal para suprir essas necessidades naquele momento.
As ações dos governos locais também se caracterizavam pela sazonalidade e pela intermitência. Em agosto de 2008, o governo do estado do Amapá divulgou na internet a reinauguração do Centro Comunitário de Lagoa dos Índios, uma obra importante que buscava concretizar benefícios para a comunidade. Porém, o mesmo governo não conseguiu normalizar a condição de funcionamento do atendimento à saúde do bairro [Goiabal], o mesmo acontecendo com as políticas públicas de saneamento básico ou educacionais, que não atendem às especificidades da comunidade nem oferecem qualidade à educação básica ofertada.
Já a prefeitura e a câmara municipal de Macapá não reconhecem a existência da comunidade, e, portanto, não promovem políticas específicas ou de regulação urbana para conter o crescimento desordenado na região, que impacta negativamente os ecossistemas e os direitos sociais e territoriais dos quilombolas.
Em setembro de 2008, o Projeto Quintais Produtivos da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) foi iniciado em Lagoa dos Índios. Lidando com “sistemas de manejo tradicionais que se apresentam como sustentáveis ao longo dos anos”, o projeto buscava intensificar a pequena produção familiar, o que permitiria aos quilombolas economizarem nos gastos com alimentação, reduzir sua insegurança alimentar, e até mesmo produzir excedentes comercializáveis.
Outro fator relevante foi a publicação da Instrução Normativa 57, do Incra, de 20 de outubro de 2009, orientando as comunidades interessadas a encaminharem à Superintendência Regional do seu estado uma solicitação de abertura de procedimento administrativo, apresentando a Certidão de Registro no Cadastro Geral de Remanescentes de Comunidades de Quilombos, emitida pela Fundação Cultural Palmares (FCP).
No processo de reconhecimento, demarcação e titulação, a primeira parte dos trabalhos do Incra consiste na elaboração de um estudo da área, destinado à confecção do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (Rtid) das terras a serem tituladas. Uma segunda etapa é a de recepção, análise e julgamento de eventuais manifestações de órgãos e entidades públicas, ou as contestações de terceiros interessados. Se aprovado em definitivo esse relatório, o Instituto publica uma portaria de reconhecimento que declara os limites do território quilombola.
A fase seguinte do processo administrativo corresponde à regularização fundiária, com desintrusão de ocupantes não quilombolas mediante desapropriação e/ou pagamento de indenização, seguida pela demarcação do território. O processo culmina com a concessão do título de propriedade à comunidade, que é coletivo, pró-indiviso e em nome da associação da comunidade da área, registrado no cartório de imóveis, sem qualquer ônus financeiro para a comunidade beneficiada.
Para melhor entender a situação instaurada no cenário nacional em relação à questão quilombola, abrangendo as demais populações tradicionais, de acordo com Bruno Rodrigues (2022), entre 2003 e 2016, durante a gestão do Partido dos Trabalhadores (PT), a questão quilombola recebeu um tratamento expansivo. A administração pública foi mobilizada para a concretização do direito quilombola, principalmente no que concerne a previsão orçamentária para a realização dos procedimentos de titulação junto ao Incra.
Em 15 de abril de 2016, a então presidenta Dilma Rousseff (PT) publicou o Decreto nº 8.713 que “Regulamenta a Lei nº 10.304, de 5 de novembro de 2001, no que se refere à transferência ao domínio do Estado do Amapá de terras pertencentes à União”, e estipulou prazo de 20 meses para que o Incra concluísse os relatórios antropológicos nos processos de regularização fundiária das terras quilombolas de 29 comunidades espalhadas pelo estado. Portanto, de acordo com o MPF, ao fim do prazo dos 20 meses estipulado no decreto, a competência de titulação das terras passaria ao estado do Amapá, por meio do Instituto de Meio Ambiente e Ordenamento Territorial (Imap).
Em 2016, com o golpe de Estado que retirou Dilma Rousseff da Presidência da República, houve um processo de esvaziamento orçamentário e paralisação burocrática do Incra. Esse esvaziamento perdurou, sob o discurso da crise financeira do Estado e indisponibilidade orçamentária, seguido das discussões sobre o teto de gastos.
O teto de gastos públicos foi uma proposta implementada pelo governo interino de Michel Temer em 2016 que estabeleceu um limite de gastos para a União. De acordo com o Politize, trata-se do projeto de emenda à Constituição (PEC 241), depois PEC 55, quando da tramitação no Senado. O governo federal ficou impedido de criar um Orçamento para a União maior do que o ano anterior – corrigindo os valores de acordo com a inflação. Alguns gastos podem crescer mais do que a inflação, desde que ocorram cortes reais em outras áreas. Portanto, as despesas do governo não terão crescimento real por 20 anos a partir de 2017.
Também em 2016 uma das maiores obras rodoviárias já realizadas no Amapá duplicou a rodovia Duca Serra e modificou ainda mais a dinâmica territorial da região. De acordo com reportagem do portal Amazônia Real (2023), a obra integra o plano de crescimento da área com a perspectiva de melhorar o tráfego da zona oeste para o centro da cidade e beneficiar mais de 150 mil moradores da região metropolitana de Macapá, segundo a gestão de José Renan Calheiros Filho (Movimento Democrático Brasileiro -MDB) no governo estadual.
Diante desse cenário e baseado no Decreto nº 8.713/2016, o MPF convocou, em junho de 2017, representantes do governo do estado do Amapá, Imap, Incra, FCP, da Secretaria Extraordinária de Políticas Afrodescendentes (Seafro), da Secretaria Estadual de Cultura (Secult) e da Defensoria Pública do Estado do Amapá (DPAP) para apresentarem soluções conjuntas para regularização das terras quilombolas no estado.
Por conseguinte, em julho de 2017 o Incra e Imap apresentaram o documento “Plano de Trabalho – Regularização de Território Quilombola”, abordando a situação dos processos no Incra e um cronograma de implementação das atividades. Na avaliação do MPF, o relatório apresentou fragilidades por conta de omissões que poderiam comprometer ainda mais o andamento dos processos de titulação, como “a falta de medidas necessárias para solucionar a escassez de recursos humanos e operacionais no Imap, e a não participação da Seafro e da Secult no processo, conforme determina a legislação”. Também concluiu que o Imap não tinha aptidão, naquele momento, para assumir sozinho o processo de regularização fundiária quilombola no estado do Amapá por falta de condições estruturais e de pessoal.
O MPF recomendou o auxílio técnico do Incra e da FCP para celebração de um Termo de Cooperação Técnica entre Incra e Imap e, em caso de descumprimento, a política de regularização fundiária quilombola seria executada integralmente pelos entes públicos federais.
A ação do MPF também pediu a estruturação permanente dos entes públicos estaduais responsáveis pela efetivação da propriedade coletiva quilombola como a realização de concurso público para provimento de vagas para suprir a carência de pessoal especializado (antropólogos, engenheiros agrônomos, agrimensores etc.) e a compra de equipamentos necessários à realização do trabalho.
Em Lagoa dos Índios, o atraso na titulação de suas terras se devia, portanto, à inexistência de antropólogos no quadro de funcionários do Incra/AP e à falta de recursos para a realização de concursos para sua contratação. Isso colocava o órgão na dependência de custosos e burocráticos convênios com pesquisadores ligados às universidades e centros de pesquisa. Por esse motivo, poucas comunidades quilombolas no Amapá conseguiram avançar em seus processos junto ao órgão.
Em 17 de novembro de 2017 o MPF pediu celeridade ao Incra nos processos de regularização e titulação de territórios da comunidade Lagoa do Índios; do Barro Vermelho, no Maranhão; e do Quilombo da Caçandoca, em São Paulo. O procurador regional da República Felício Pontes Jr. destacou a não conclusão dos processos administrativos de titulação de territórios quilombolas junto ao Incra e pediu celeridade no processo. Para ele, houve violação de direitos fundamentais da comunidade quilombola, pois a falta de regularização fundiária impede a aplicação de uma série de políticas públicas, como saúde e educação, condicionadas ao reconhecimento territorial, além de impedir a própria sobrevivência das comunidades.
Ele afirmou: “É fato que a titulação de terras quilombolas no Brasil vem caindo vertiginosamente. São raros os casos nos últimos anos de publicações de RTIDs e de Portarias de Reconhecimento.”
No caso de Lagoa dos Índios, segundo o MPF, a omissão do Incra e da FCP foi clara violação aos princípios da legalidade, da eficiência e da razoável duração do processo (artigos 37, caput, 5º, LXXVIII, da Constituição Federal). De acordo com o procurador, nenhum prazo foi respeitado pelo Incra.
Em 08 de janeiro de 2018, o MPF solicitou à Justiça que determinasse ao Incra e à FCP a conclusão, no prazo máximo de dois anos, de todos os processos de regularização fundiária quilombola pendentes no Amapá. Até esse momento, no Amapá, mais de 20 comunidades esperavam a titulação de suas terras, algumas há mais de 15 anos. A ação decorreu de processo no MPF para acompanhar a transferência de terras públicas federais, pretendidas por comunidade quilombolas, ao Estado do Amapá.
Em 12 de março de 2018, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) decidiu, por unanimidade, dar provimento à ação do MPF determinando que o Incra e a FCP delimitassem e demarcassem a área da Comunidade Quilombola Lagoa dos Índios no prazo de dois anos. A sentença também atendeu ao pedido do MPF para caracterização de dano moral coletivo no caso em razão da mora administrativa para a titulação, determinando indenização de R$ 1 milhão em favor da comunidade quilombola.
Segundo o relator do caso, desembargador Antônio Souza Prudente, a inércia do Incra e da FCP, afrontava o exercício pleno do direito de propriedade de terras tradicionalmente ocupadas: “A orientação já consolidada é no sentido de que se afigura legítima a atuação do Poder Judiciário visando suprimir eventual omissão do poder público, na implementação de políticas públicas, mormente em se tratando do exercício de garantia constitucional, como no caso”.
Em 2019, de acordo com informações de Rudja Santos para o Amazônia Real, o Incra anunciou um estudo fundiário e uma tentativa de dar início à elaboração do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (Rtid).
Para mais informações sobre os procedimentos necessários para a titulação quilombola, o Tribunal de Justiça da Bahia (TJ/BA) divulgou uma cartilha que, de forma resumida, mostra os passos para a Regularização de Territórios Quilombolas e, principalmente, para “pontuar a diferença entre Certificação e Titulação de territórios quilombolas”.
Em 03 de novembro de 2020, ocorreu um apagão em 13 cidades do Amapá, ocasionando sete mortes no total e uma em Lagoa dos Índios. De acordo com o Reporter Brasil, Danielle Silva, manicure, de 23 anos, já estava há cinco dias sem energia elétrica em casa e não conseguia dormir por conta do calor. Ela saiu de moto para passar a noite na casa de um parente que tinha ventiladores em funcionamento, mas foi atingida na estrada de acesso ao bairro Goiabal, pois não havia nenhum tipo de sinalização para o trânsito, já que os semáforos estavam desligados por conta do blecaute.
Reportagem da Amazônia Real também divulgou as consequências da falta de energia no cotidiano dos quilombolas e casos de racismo da Polícia Militar do estado do Amapá (PMAP) ao realizarem uma manifestação pela religação da energia. Juliana Oliveira, autônoma e moradora de Lagoa dos Índios, relembrou dos cinco dias do apagão em que passaram sem energia ou água e afirmou: “A partir do sexto dia que começou a vir umas três horas de tempo de energia, mas ainda está difícil porque de noite é uma quentura absurda, é muito carapanã, a gente fica a noite todinha acordada, e quando chega de dia tem que trabalhar cansado”. Elisabete Pereira, comerciante do quilombo da Lagoa dos Índios, relatou ter perdido toda a comida no freezer, e que, nas idas e vindas da energia elétrica, por conta do rodízio, o aparelho acabou queimando.
Apesar das promessas, o governo federal – durante a gestão de Jair Bolsonaro – se recusou a pagar duas parcelas de auxílios emergenciais (para compensar as perdas geradas pelo isolamento social da pandemia de covid-19) à população do Amapá solicitadas em ação judicial movida pelo partido Rede. Em novembro de 2020, a Advocacia-Geral da União (AGU) entrou com recurso para negar o pedido. Porém, no dia 11 de dezembro, a Justiça Federal determinou prazo de dez dias para que a União e a Caixa Econômica Federal (CEF) efetuassem o pagamento da primeira parcela.
Em 14 de abril de 2021, o Partido Socialismo e Liberdade (Psol) propôs uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 828/DF no contexto da pandemia de covid-19. De acordo com a revista Consultor Jurídico, “pugnou-se, cautelarmente, em síntese, a interrupção dos despejos, desocupações ou remoções forçadas, judiciais ou administrativas, de ocupações objeto de disputa judiciais ou não, medida parcialmente deferida em 3/6/2021, com o propósito de proteção à moradia naquele período”.
Em novembro de 2022, a 4° Vara Cível da Justiça Estadual do Amapá ordenou que cerca de 300 famílias da comunidade quilombola Lagoa dos Índios fossem expulsas de sua comunidade. De acordo com o Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes), o judiciário estadual determinou que as famílias deveriam se retirar até o dia 5 de dezembro. No dia 11 de novembro, as moradoras e os moradores do quilombo fizeram uma manifestação pelo direito de permanecer no território.
Reportagem do Brasil de Fato cita o empresário Satoru Kubota, que tentava provar judicialmente ser o proprietário das terras tradicionalmente ocupadas pelo quilombo, alegando tê-las herdado de seu pai, Chiaki Kubota. O empresário afirmou que a família comprou a área em um leilão federal em 1977 e que, no local, funciona uma granja desde então. “Nós sempre trabalhamos na granja. Não somos marginais e nem bandidos”. Os moradores da comunidade denunciaram que o empresário teria loteado uma parte do terreno cujos compradores seriam pessoas que ocupavam posições de poder localmente, como delegados, policiais e até juízes.
Segundo Edinelson Vidal, liderança quilombola e vice-presidente da Associação Quilombola Lagoa dos Índios Arco da Ressaca, o processo que deixou as moradoras e os moradores em risco já durava dez anos, sendo que todas as determinações judiciais foram anuladas ou suspensas. De acordo com depoimento para o Andes:
“Nós temos documentos de 1918. Aqui faz parte da Lagoa dos Índios. Ao recorrer como quilombolas e a gente ganhou. Duas reintegrações de posse foram suspensas. Nós temos roça, fazemos farinha. Aqui mora na faixa de 300 famílias, tem bastante pessoas que precisam da terra para sobreviver. Vamos procurar justiça. A Justiça federal que deve julgar a causa dos quilombos, e não estadual. Nós vamos vencer, vamos correr atrás”.
Para Lindoval Rosário, advogado dos quilombolas, a Fundação Cultural Palmares (FCP) entrou no processo de ação anulatória e a decisão da Justiça Estadual do Amapá descumpriu critérios sobre despejos e desocupações conforme a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 828. Entre as regras estão o acolhimento e a realocação de famílias em vulnerabilidade para moradias dignas.
A reportagem do portal Brasil de Fato também divulgou a manifestação dos quilombolas e a revolta gerada pela decisão judicial. Segundo o advogado Lindoval Rosário, a Justiça Estadual não ouviu os órgãos federais (Incra, FCP, MPF etc.) nem os moradores durante a audiência de conciliação, e, por determinação do Incra, o empresário com o título da terra devia ser indenizado pela União: “Mas não se retira comunidade quilombola de terra quilombola. É um direito constitucional deles”. O advogado entrou com recurso e a decisão passou para o âmbito do Tribunal de Justiça do Amapá (TJAP).
De acordo a repórter Rudja Santos (Amazônia Real), enquanto estava na comunidade entrevistando moradores às margens da Estrada do Goiabal, foi interrompida por dois homens que se diziam caseiros da propriedade e que, de forma truculenta, perguntaram o que ela estava fazendo, “pedindo” para ela sair do terreno que, segundo eles, seria de propriedade de Satoru Kubota. Um dos homens, que se identificou como Lourival Cardoso Gomes, disse que trabalhava “pro japonês”. Enquanto tentava expulsar os moradores da frente do terreno, ameaçava chamar a polícia dizendo “quilombola é pra lá, não aqui”.
Luiz Carlos da Silva Padilha, 38 anos, afirma que ele e seus ancestrais nasceram e foram criados no quilombo. “A nossa família tem gerações aqui e a gente tem que brigar por uma área que é nossa. O Incra veio e está no laudo as áreas que são por direito nossas”. De acordo com a reportagem, ele explicou, emocionado, que a comunidade se sente insegura porque a qualquer momento um juiz pode dar posse das terras a alguém de fora. “Qualquer um pode vir e entrar numa área que é nossa e se achar no direito de tomar a terra pra ele. Num lugar que é dos nossos filhos, dos nossos netos e bisnetos”.
Além de não poderem ocupar suas próprias terras, os moradores denunciam graves ameaças. Marcos Pereira da Silva lembrou que, quando moradores eram avistados dentro do terreno dos Kubota, eram recebidos com tiros. “Não era em nós, mas era no rumo pra espantar, pra deixar a gente à mercê. A gente vive ameaçado dentro da nossa própria terra. A gente sente medo. A comunidade vive à mercê dos grandes que vêm querer humilhar a gente aqui dentro” disse ele, completando que o avô, Manoel Joaquim dos Santos, foi um dos primeiros moradores da comunidade.
Danielson também afirmou que o judiciário estadual se declarou incompetente para julgar a propriedade da área pretendida por Kubota. A decisão esclareceu que “compete à Justiça Federal decidir sobre a existência de interesse jurídico que justifique a presença, no processo, da União, suas autarquias ou empresas públicas”.
Essa experiência poderá mostrar que o quadro de ações públicas com repercussão social vão da titulação da terra ao fomento de uma tradição agrícola e cultural das comunidades. A titulação, a educação e o respeito e consciência identitária são bases essenciais para que comunidades historicamente oprimidas consigam enfrentar os impactos e as disputas diante de um modelo de desenvolvimento que as tem vulnerabilizado e desrespeitado.
Por tudo isso, é essencial que ocorra uma transformação permanente das ações sociais do Estado brasileiro no local – a começar pela titulação das suas terras, que abre caminho para outras políticas públicas. Sem uma alteração na situação atual, as perspectivas de um futuro digno para essa comunidade são muito reduzidas, e ela continuará a sofrer todos os impactos de um desenvolvimento que, na maioria das vezes, não a contempla, e a pagar com sua saúde e com o futuro de seus membros pela resistência a esses processos.
Última atualização: fevereiro de 2024.
Cronologia
1802 – É fundado o quilombo da Lagoa dos Índios.
1943 – O Amapá, até então parte do estado do Pará, é desmembrado e transformado em território federal.
1962 – A Divisão de Terras e Colonização emite carta de Adjudicação em favor dos herdeiros Antonio Guardiano da Silva, José Raimundo da Silva, Auta Maria da Conceição, Raimundo Cândido da Silva e Manoel Joaquim dos Santos, dando direito à posse das terras aos descendentes dos moradores originais do local.
Década de 1980 – Instalação de uma fábrica de goiaba e do supermercado Casa das Carnes, ambos de propriedade de Odilon Filho, nas proximidades do quilombo.
1984 – Implantação da Colônia Penal Agropecuária e Industrial do Amapá (Cpaia) nas proximidades do quilombo Lagoa dos Índios.
2001 – A Fundação Cultural Palmares (FCP) inicia o processo de reconhecimento da área como remanescente de quilombo.
2004 – Ressaca é tombada como patrimônio pelo estado do Amapá por meio da lei estadual 455/1999, posteriormente revogada e alterada pela lei 835/2004 (Lei das Ressacas).
Junho de 2005 – Os quilombolas manifestam-se publicamente em Macapá pela agilização do processo de autorreconhecimento da comunidade como remanescente de quilombo pela FCP.
21 de julho de 2005 – FCP entrega certidão de autodefinição de comunidade de Lagoa dos Índios como remanescente de quilombo.
2008 – Conselho das Comunidades Afrodescendentes do Amapá (Ccada), com o apoio do deputado estadual Camilo Capiberibe (Partido Socialista Brasileiro- PSB), organiza audiência pública para debater o problema da regularização das terras quilombolas no Amapá.
Agosto de 2008 – O governo do estado do Amapá anuncia reinauguração do Centro Comunitário de Lagoa dos Índios.
20 de outubro de 2009 – A Instrução Normativa 57, do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), estabelece que as comunidades interessadas devem encaminhar à Superintendência Regional do seu estado uma solicitação de abertura de procedimento administrativo, apresentando a Certidão de Registro no Cadastro Geral de Remanescentes de Comunidades de Quilombos, emitida pela FCP.
15 de abril de 2016 – A presidenta Dilma Rousseff publica Decreto nº 8.713 que “Regulamenta a Lei nº 10.304, de 5 de novembro de 2001, no que se refere à transferência ao domínio do Estado do Amapá de terras pertencentes à União”, e estipula prazo de 20 meses para que o Incra conclua os relatórios antropológicos nos processos de regularização fundiária das terras quilombolas de 29 comunidades espalhadas pelo estado do Amapá.
2016 – Uma das maiores obras rodoviárias já realizadas no Amapá duplica a rodovia Duca Serra, impulsionando a urbanização da região do quilombo Lagoa dos Índios.
Junho de 2017 – Baseando-se no Decreto nº 8.713/2016, o MPF convoca representantes dos governos federal e do estado do Amapá para apresentarem soluções conjuntas para regularizarão das terras quilombolas do estado.
Julho de 2017 – O Incra e o Instituto de Meio Ambiente e Ordenamento Territorial do Amapá (Imap) apresentam o documento “Plano de Trabalho – Regularização de Território Quilombola”, abordando a situação dos processos no Incra e um cronograma de implementação das atividades.
17 de novembro de 2017 – MPF requisita maior celeridade ao Incra nos processos de regularização e titulação de territórios da Comunidade Lagoa do Índios; do Barro Vermelho, no Maranhão; e do Quilombo da Caçandoca, em São Paulo.
08 de janeiro de 2018 – MPF solicita à Justiça que determine ao Incra e à FCP a conclusão, no prazo máximo de dois anos, de todos os processos de regularização fundiária quilombola pendentes no Amapá.
12 de março de 2018 – Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) decide, por unanimidade, dar provimento ao recurso do MPF determinando que o Incra e a FCP delimitem e demarquem a área da Comunidade Quilombola Lagoa dos Índios no prazo de dois anos.
03 de novembro de 2020 – Ocorre apagão em 13 cidades do Amapá, ocasionando sete mortes no total, sendo uma em Lagoa dos Índios.
Novembro de 2020 – Advocacia-Geral da União (AGU) entra com recurso para negar o pedido do partido Rede para obrigar o executivo a pagar duas parcelas de auxílios emergenciais à população do Amapá.
11 de dezembro – A Justiça Federal determina que o governo federal e a Caixa Econômica Federal (CEF) têm dez dias para efetuar o pagamento da primeira parcela.
14 de abril de 2021 – Partido Socialismo e Liberdade (PSol) propõe Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 828/DF no contexto da pandemia de covid-19.
Novembro de 2022 – 4ª Vara Cível da Justiça Estadual do Amapá ordena que cerca de 300 famílias da comunidade quilombola Lagoa dos Índios sejam expulsas de sua comunidade.
11 de novembro de 2022 – As moradoras e os moradores do quilombo fazem manifestação pelo direito de permanecer no território.
Fontes
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