PB – Projeto de Carcinicultura compromete meio ambiente e impede passagem de moradores por acesso tradicional
UF: PB
Município Atingido: Santa Rita (PB)
Outros Municípios: Santa Rita (PB)
População: Pescadores artesanais, Povos indígenas
Atividades Geradoras do Conflito: Atividades pesqueiras, aquicultura, carcinicultura e maricultura
Impactos Socioambientais: Invasão / dano a área protegida ou unidade de conservação, Poluição de recurso hídrico, Poluição do solo
Danos à Saúde: Insegurança alimentar, Piora na qualidade de vida
Síntese
Moradores de Forte Velho, comunidade do município de Santa Rita estão sendo atingidos desde 2002 pelos danos da carcinicultura – a criação de camarões em cativeiro. A empresa responsável é a PRJC Camarões Ltda, cujo proprietário é Paulo Roberto Jacques Coutinho. A comunidade de Forte Velho reclama da obstrução de um acesso tradicional a uma das praias mais utilizadas pela população local, da salinização de suas águas pela criação de camarões e por danos ao ecossistema local.
Contexto Ampliado
A comunidade de Forte Velho é uma das mais antigas do Estado da Paraíba. Segundo Rafael, o início da colonização portuguesa do estado se deu justamente pela foz do rio Paraíba, nas proximidades de onde hoje está localizada. Seu nome faz referência a um antigo fortim existente no local, ponto de observação dos colonizadores (1).
A implantação da empresa PRJC, em 2002, ocupou antiga passagem utilizada pelos moradores da rua da Alegria à praia do Rio da Guia, braço de mar integrante da foz do rio Sanhauá. Alegando questões de segurança, o proprietário instalou um portão no local. A esta restrição, moradores da região acrescentam denúncias relacionadas à salinização da água dos poços pelo viveiro e a mortandade de plantas e animais.
A comunidade ficou prejudicada nas atividades tradicionais de pesca e coleta de mariscos. Além disso, foi obstruída a tradicional passagem para o município de Lucena e ao Santuário Nacional da Igreja da Guia.
Em 2005, o Grupo de Trabalho sobre Carcinicultura, da Câmara dos Deputados, realizou um total de 11 vistorias técnicas a empreendimentos de carcinicultura, e nove audiências públicas em comunidades litorâneas atingidas pela atividade de carcinicultura nos Estados do Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Bahia. As visitas foram acompanhadas por técnicos do IBAMA e das secretarias estaduais de meio ambiente, por pesquisadores das Universidades, representantes de Ongs e da sociedade civil. Através deste trabalho, foi possível averiguar a situação dos índios Potiguar, na Paraíba, sendo definidos pontos de discussão e encaminhamentos tais como a necessidade de verificar a situação das populações de Forte Velho e Tambaúzinho, no Município de Santa Rita. (5)
Em 17 de julho de 2007, representantes da Associação Paraibana dos Amigos da Natureza (Apan), da Organização Não-Governamental Amazona, da Comissão de Direitos Humanos da OAB/PB, da Fundação Margarida Maria Alves e da Associação de Moradores de Forte Velho denunciaram que o presidente da associação de Moradores de Forte Velho, no município de Santa Rita (PB), Luiz Carlos de Almeida Gonzaga, estava sofrendo ameaças de morte, após o fechamento do viveiro mantido pela empresa PRJC.
Segundo a denúncia: elementos encapuzados, dirigindo um veículo sem placa de identificação, teriam buscado saber onde mora Luiz Carlos, sendo que o mesmo não foi localizado apenas porque as pessoas interrogadas (pelos encapuzados) disseram não o conhecer. O procurador da República Werton Magalhães Costa solicitou à Polícia Federal e à Polícia Militar que forneçam proteção policial ao presidente da associação.
Em 31 de dezembro de 2007, parte do dique da empresa se rompeu, gerando impactos ambientais negativos no local. Todo o material utilizado na construção foi levado para a área de manguezal, causando assoreamento no ecossistema, morte da vegetação marinha e da fauna (3). Devido ao vão de aproximadamente 16 metros de largura como consequência do arrombamento, a empresa foi autuada e teve as atividades embargadas pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA).
Como consequência do rompimento, a Justiça Federal determinou paralisação total das atividades do viveiro. Porém, moradores da região afirmaram à reportagem do jornal O Norte que, mesmo após determinação judicial, a empresa funcionava normalmente. O procurador regional dos Direitos do Cidadão, Duciran Farena, disse na ocasião que o rompimento do viveiro era uma prova incontestável de que o empreendimento não tinha a mínima condição de funcionamento.
Em fevereiro de 2008, uma vistoria conjunta do IBAMA e do Ministério Público Federal (MPF) na Paraíba foi realizada, constatando-se, além do impedimento do acesso, a ocorrência de diversos vazamentos nos tanques de carcinicultura. Conforme o procurador da República Duciran Van Marsen Farena, a situação merece atenção, considerando-se que já houve o arrombamento de um dos tanques em janeiro, causando sérios danos ambientais (2).
Posteriormente, ainda em fevereiro, o MPF na Paraíba encaminhou à empresa uma recomendação para desobstrução do acesso da comunidade à praia do Rio da Guia. A comunidade de Forte Velho denunciou ainda que vigilantes armados impediam qualquer espécie de trânsito no local.
Como afirmou o procurador Duciran Farena, autor da recomendação, o acesso aos bens de uso comum do povo (como os cursos de água e as praias) deve ser sempre livre e franco em qualquer direção e sentido, não podendo ser a comunidade privada do uso deste bem por imposição do proprietário de terras. Acrescenta ainda que a situação é agravada pelo fato de que ali existia uma servidão de passagem sobre a antiga fazenda, e mesmo após a instalação do viveiro o acesso continuou aberto, sendo recente a instalação do portão.
Ainda na ocasião, a comunidade voltou a denunciar a contaminação de poços provocada pela atividade do viveiro. Diversos poços foram visitados pelo procurador, constatando-se a total imprestabilidade das águas que antes abasteciam a comunidade.
A implantação deste viveiro foi objeto de diversas ações movidas pelo Ministério Público Federal, tais como a Ação Civil Pública nº 2006.82.00.003522-1 e as Ações Penais nº 2007.82.00.002552-9 e nº 2007.82.00.003301-0, pelos crimes de desobediência e poluição, tendo em vista o funcionamento não autorizado do empreendimento de carcinicultura.
Apesar da morosidade característica do judiciário brasileiro, a partir de 2009, algumas dessas ações geraram impactos positivos sobre a comunidade. Em abril daquele ano, o judiciário determinou a retirada do portão que impedia o trânsito da comunidade para a praia do rio Guia. De acordo com reportagem do Jus Brasil: No local, foi colocada placa para informar à comunidade sobre o livre acesso. A decisão da Justiça Federal afirmou ser ilegal a presença de um portão situado no final da Rua da Alegria, em Forte Velho, sem a devida autorização administrativa, por criar um obstáculo à servidão de passagem em favor da comunidade (9).
Em 2010, uma nova ação judicial foi movida contra a PRJC devido à realização de obras no local. No entendimento do MPF, a realização dessas obras, às vésperas do início dos trabalhos periciais determinados pela Justiça na Ação Civil Pública nº 2006.82.00.003522-1, visa alterar o objeto a ser periciado, escondendo as condições sob as quais tem funcionado o criadouro até agora, ou mesmo impedir a rápida conclusão dos trabalhos, já que o viveiro tem autorização para funcionar somente até a conclusão dos trabalhos periciais. A paralisação imediata de qualquer atividade do viveiro, que não esteja relacionada com o fim da obra, também foi solicitada pelo MPF (8).
Os impactos ambientais gerados pelo empreendimento foram agravados em maio de 2011, quando a empresa despejou pelo menos 14 toneladas de camarões considerados doentes nos manguezais próximos a Forte Velho. Segundo reportagem dO Norte, ambientalistas se mostraram preocupados devido à possibilidade de os animais contaminarem a cadeia alimentar da região e, consequentemente, causarem danos ao meio ambiente e à saúde da população.
A presidente da Associação Amigos da Natureza (Apan), Socorro Fernandes, revelou à reportagem que soube do ocorrido após contato com os moradores da região. Segundo ela, os camarões foram jogados no leito do mangue e, em virtude das chuvas, vários deles escoaram para o mar: "O problema maior está nesse escoamento, pois os peixes que os pescadores capturam podem se alimentar do camarão doente, e aí se torna um problema de saúde pública".
O líder comunitário do Forte Velho, Luiz Carlos Almeida, confirmou o fato e disse que acidentes com os camarões de viveiros eram comuns na região. Segundo ele, desde 2002, são registrados despejos de camarões provenientes de viveiros por motivos desconhecidos pela comunidade: "Esse problema é antigo, mas desde 2006 que temos ações na Justiça para que algo seja feito", revela.
De acrdo com o Ministério Público Federal (MPF), o empreendimento PRJC Camarões está embargado pelo IBAMA desde o dia 14 de outubro de 2005. No entanto, o funcionamento parcial da atividade foi autorizado em 22 de outubro de 2007, exclusivamente para fins de produção da prova pericial requerida, a qual deve ser realizada a qualquer momento. Mesmo com o embargo, o proprietário tem explorado a atividade normalmente (6).
Cronologia:
2002: PRJC instala fazendas de camarão em cativeiro em Santa Rita/PB e impede passagem para praia do rio Guia. Moradores protestam e responsabilizam empresa por salinização de poços e mortandade de animais e plantas.
2005: Grupo de Trabalho sobre Carcinicultura, da Câmara dos Deputados, realiza visita a empreendimentos de carcinicultura na Paraíba e sinaliza a necessidade de averiguação da situação em Forte Velho.
14 de outubro de 2005: IBAMA embarga empresa.
17 de julho de 2007: Representantes da Associação Paraibana dos Amigos da Natureza (Apan), da Organização Não-Governamental Amazona, da Comissão de Direitos Humanos da OAB/PB, da Fundação Margarida Maria Alves e da Associação de Moradores de Forte Velho denunciam ameaças sofridas por membros da comunidade ao MPF/PB.
Outubro de 2007: Empresa é autorizada a funcionar parcialmente pela Justiça para fins de produção de provas.
31 de dezembro de 2007: Dique da empresa se rompe gerando impactos ambientais negativos na região. IBAMA autua a empresa e embarga suas atividades.
17 de janeiro de 2008: Justiça Federal determina paralisação total das atividades do viveiro.
Fevereiro de 2008: IBAMA e MPF realizam vistoria conjunta a constatam irregularidades. MPF encaminha recomendação para desobstrução da via à empresa.
Abril de 2009: Judiciário determina a retirada do portão que impede acesso da comunidade à praia do rio Guia.
Dezembro de 2010: MPF requer paralisação de obras da empresa.
Maio de 2011: PRJC despeja 14 toneladas de camarões doentes nas proximidades de Forte Velho.
Última atualização em: 07 de abril de 2013
Fontes
1. RAFAEL, Antonio. Forte Velho. Minube, 23 fev. 2012. Disponível em: http://goo.gl/QohKA. Acesso em: 07 abr. 2013.
2. MPF/PB quer desobstruir acesso impedido por viveiro de camarão. Procuradoria Geral da República. Disponível em: http://goo.gl/WuzPn. Acesso em: 02 ago. 2009.
3. VIVEIRO de Camarão causa dano ambiental em Santa Rita. Procuradoria Geral da República. Disponível em: http://goo.gl/1DtrB. Acesso em: 02 ago. 2009.
4. ESGOTO e criação de camarão destroem manguezais da Paraíba. Ecodebate, 22 abr. 2009. Disponível em: http://goo.gl/IccvU. Acesso em: 02 ago. 2009.
5. TELES, João Alfredo de Melo. Relatório Síntese GT Carcinicultura. Fortaleza: Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias da Câmara dos Deputados, mai. 2005.
6. Forte Velho agoniza: Viveiro despeja 14 toneladas de camarões doentes em área de preservação ambiental. O Norte, 16 mai. 2011. Disponível em: http://goo.gl/N6s4n. Acesso em: 07 abr. 2013.
7. SUSPENSA atividade em viveiros de camarão. O Norte, 19 jan. 2008. Disponível em: http://goo.gl/GvCUa. Acesso em: 07 abr. 2013.
8. MPF/PB quer paralisação imediata de obras da empresa PRJC Camarões, em Santa Rita. JusBrasil, 02 dez. 2010. Disponível em: http://goo.gl/pvo2S. Acesso em: 07 abr. 2013.
9. Ação do MPF/PB assegura acesso de comunidade à praia do Rio da Guia. JusBrasil, 03 abr. 2010. Disponível em: http://goo.gl/fAz8Q. Acesso em: 07 abr. 2013.
10. RODRIGUES, Gislayne. MPF/PB apura ameaças de morte após fechamento de viveiro de camarão. Procuradoria Geral da República, 18 jul. 2007. Disponível em: http://goo.gl/XmN7K. Acesso em: 07 abr. 2013.