PA – Trabalhadores rurais Sem Terra lutam pela vida e por regularização fundiária no Acampamento Nova Esperança

UF: PA

Município Atingido: Bom Jesus do Tocantins (PA)

Outros Municípios: Bom Jesus do Tocantins (PA)

População: Trabalhadores rurais sem terra

Atividades Geradoras do Conflito: Atuação do Judiciário e/ou do Ministério Público, Especulação imobiliária, Pecuária

Impactos Socioambientais: Desmatamento e/ou queimada

Danos à Saúde: Piora na qualidade de vida, Violência – ameaça, Violência – assassinato, Violência – coação física, Violência – lesão corporal

Síntese

O acampamento Nova Esperança localiza-se no município de Bom Jesus do Tocantins, no sudeste do Pará. Esta ocupação situa-se dentro da Fazenda Gaúcha, que pertence à Jacundá Agro Pastoril Ltda., cujo presidente é o empresário e pecuarista paulista Lucas Carlos Batistela, conforme informações do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) divulgadas pelo Combate Racismo Ambiental (01/10/2014). A partir de 2005, as lideranças do acampamento, com o apoio da Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Pará (FETAGRI-PA), passaram a reivindicar a desapropriação de seus 17 mil hectares para fins de reforma agrária. A FETAGRI também recorreu à Justiça, e entrou com um processo de desapropriação (Nº 20051001404-2) na Vara Agrária de Marabá. Em 25 de junho de 2007, o proprietário da Jacundá Agro Industrial – Fazenda Gaúcha interpôs um agravo de instrumento com objetivo de contestar a ocupação reivindicada.

Em seguida, a FETAGRI impetrou outro processo de reintegração de posse sobre a Fazenda Gaúcha (Processo 00010587120058140028), arrolado também na Vara Agrária de Marabá. No dia 21 de maio de 2010, a Juíza de Direito Titular da Região Agrária de Marabá, Claudia Regina Moreira Favacho Moura, encaminhou o processo para a Justiça Federal para saber se haveria interesse jurídico do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) sobre o caso. Após a resposta positiva do INCRA, no dia 25 de maio de 2010, o processo de reintegração de posse foi deslocado para o Juízo Federal. Segundo reportagem do Combate Racismo Ambiental (23/09/2014), o fazendeiro tentou despejar as famílias duas vezes, mas a Vara Agrária e o Tribunal entenderam que, de fato, a terra era pública, e as famílias não poderiam ser despejadas. Contudo, o processo permaneceu em andamento na 2ª Vara Federal de Marabá, sem uma decisão final.

O resultado da morosidade do andamento do processo foi o acirramento da violência contra os acampados. Entre outubro de 2013 e setembro de 2014, a FETAGRI registrou 10 ocorrências na Delegacia de Conflitos Agrários (DECA) de Marabá em relação às recorrentes práticas violentas empreendidas pelo gerente da Fazenda Gaúcha, Reginaldo Aparecido Augusto. Segundo o Combate Racismo Ambiental, no dia 22 de setembro de 2014, durante uma tentativa pacífica de negociação para a liberação da estrada em frente à sede da fazenda, os acampados foram recebidos com vários tiros pelos pistoleiros da Fazenda. O líder do Acampamento, Jair Cleber dos Santos, a liderança do STR, Mateus Sousa Oliveira, os acampados Antônio Alves e Daniel, e o tratorista da Prefeitura de Bom Jesus, Aguinaldo Ribeiro Queiróz, foram atingidos. Jair e Aguinaldo não sobreviveram aos ferimentos. Segundo a reportagem, os trabalhadores que permaneceram no local acusaram a polícia de Bom Jesus de ter facilitado a fuga do gerente e de outros pistoleiros, logo após o crime.

No dia 30 de setembro de 2014, aproximadamente 600 acampados da Fazenda Gaúcha realizaram manifestação na BR 222, no km 72, para denunciar a morosidade na regularização da fazenda e a omissão da polícia. Apesar de toda a mobilização e das provas do crime, no dia 08 de outubro de 2014, o juiz Murilo Lemos Simão revogou a prisão dos dois únicos acusados dos assassinatos e tentativas de homicídio ocorridos na Fazenda Gaúcha.

Contexto Ampliado

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O acampamento Nova Esperança localiza-se no município de Bom Jesus do Tocantins, no sudeste do Pará. Esta ocupação foi iniciada no ano de 2005, por aproximadamente 500 famílias sem terra, que contam com o apoio da Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Pará (FETAGRI-PA). O acampamento situa-se dentro da Fazenda Gaúcha, que pertence à Jacundá Agro Pastoril Ltda., cujo presidente é o empresário e pecuarista paulista Lucas Carlos Batistela, conforme informações do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra MST divulgadas pelo Combate Racismo Ambiental (01/10/2014).

O município de Bom Jesus do Tocantins tem uma área territorial de 2.816,779 km² e uma população de 16.074 habitantes, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE, 2014). Bom Jesus do Tocantins situa-se a 70 quilômetros de Marabá e o principal meio de acesso entre ambas as cidades é a rodovia federal BR-222.

O caso do acampamento Nova Esperança reflete o complexo contexto da questão fundiária do Sudeste do Pará. Segundo o pesquisador William Santos de Assis (2009), os conflitos de terra foram intensificados nos últimos 50 anos, quando a região de Marabá tornou-se o centro político e econômico regional mais importante das regiões sul e sudeste do estado. A região passou a sediar órgãos estatais, tais como o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), a Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM), o Grupo Executivo de Terras do Araguaia Tocantins (GETAT), além do Exército, que combateu militantes políticos na década de 1970. Esta fixação de órgãos da administração federal e as políticas implementadas, tais como os Programas Integrados de Colonização (PICs) e o Projeto Fundiário (PF), estimularam tanto a migração massiva de famílias de agricultores de outras regiões quanto a instalação das grandes empresas agropecuárias e de latifúndios de propriedade individual. William Santos de Assis acrescentou que tais projetos retalharam e distribuíram as terras do sudeste paraense, muitas vezes sem considerar a existência da população local, dos recursos existentes e das implicações ambientais.

A historiadora Osnera Pinto da Silva (2012) também destacou que, durante as décadas de 1970 e 1980, houve uma forte migração no sudeste paraense, tornando-a uma zona de conflito entre três categorias: posseiros, grileiros e fazendeiros. Entretanto, a historiadora observou que nos conflitos pro ela estudados as principais vítimas foram líderes sindicais ou religiosos que apoiavam a luta pela terra. Outra característica apontada foi a impunidade de mandantes e assassinos, que em boa parte dos casos sequer foram indiciados.

Segundo o pesquisador William Santos de Assis, o aumento da violência no campo no sudeste do Pará forçou o surgimento de novas entidades representativas dos trabalhadores rurais. Conforme o pesquisador, nos anos 1990, o MST se consolidou na região, as delegacias sindicais deram lugar às associações e os Sindicatos dos Trabalhadores Rurais (STRs) se articularam numa estrutura regional denominada FETAGRI Regional Sudeste (FRS-PA). Estes mecanismos fortaleceram os agricultores familiares locais e os movimentos sociais passaram a adotar como parte de suas ações coletivas os acampamentos para reivindicar a posse da terra.

Dados da FETAGRI Regional Sudeste revelam a força destas organizações camponesas e seus afiliados no cenário sociopolítico-econômico regional, pois no ano de 2004 havia uma área de 160 mil hectares sob situação de conflito fundiário. Como referido anteriormente, a ocupação da Fazenda Gaúcha ocorreu no ano seguinte, 2005. Nesta ocupação, as 500 famílias sem terra reivindicaram, por intermédio da FETAGRI, a desapropriação dos 17 mil hectares da fazenda para fins de reforma agrária. Ainda no ano de 2005, a FETAGRI passou a reivindicar tais terras por via judicial e o processo de desapropriação (Nº 20051001404-2) passou a tramitar na Vara Agrária de Marabá. Em 25 de junho de 2007, o proprietário da Jacundá Agro Industrial Fazenda Gaúcha interpôs um agravo de instrumento com objetivo de contestar a ocupação reivindicada.

Em seguida, a FETAGRI impetrou outro processo de reintegração de posse sobre a Fazenda Gaúcha (Processo 00010587120058140028), arrolado também na Vara Agrária de Marabá. A ação novamente colocou em questão a legitimidade da posse da Jacundá Agro Industrial Ltda., ante a indicação de práticas de grilagem. No dia 13 de maio de 2010, a Juíza de Direito Titular da Região Agrária de Marabá, Claudia Regina Moreira Favacho Moura, decidiu que a Jacundá Agro Industrial Ltda. deveria prestar melhores esclarecimentos sobre a posse alegada.

O passo seguinte da juíza Claudia Regina Moreira Favacho Moura foi encaminhar o processo para a Justiça Federal no dia 21 de maio de 2010, para saber se haveria interesse jurídico do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) sobre o caso. Após confirmar que os 17 mil hectares da Fazenda eram terras públicas federais, o INCRA manifestou interesse no dia 25 de maio de 2010. A partir disso, a juíza Claudia Regina Moreira Favacho Moura solicitou o deslocamento de competência e encaminhou os autos de reintegração de posse para o Juízo Federal. No dia 28 de maio de 2010, após extrapolar o prazo de recursos por parte da Jacundá Agro Industrial Ltda., o Juiz de Direito de Marabá/PA, Eduardo Antônio Martins Teixeira, determinou o imediato deslocamento do processo (n.º 0001058-71.2005.814.0028) à Justiça Federal.

Segundo reportagem do Combate Racismo Ambiental (23/09/2014), a partir de 2010, com esta Ação tramitando na Justiça Federal de Marabá, o INCRA passou a reivindicar a desapropriação da Fazenda Gaúcha, por ocupar ilegalmente terra pública federal. Desde então, a Vara Agrária de Marabá e o Tribunal de Justiça do Pará negaram por duas vezes o pedido de liminar feito pelo fazendeiro para despejar as famílias. Apesar da Vara Agrária e do Tribunal entenderam que, de fato, a terra era púbica e as famílias não poderiam ser despejadas, o processo permaneceu em andamento na 2ª Vara Federal de Marabá, sem uma decisão final. A reportagem acrescentou que, diante da morosidade da Justiça, a FETAGRI e a Comissão Pastoral da Terra (CPT) solicitaram reunião do Ouvidor Agrário Nacional, Gercino José da Silva Filho, com o juiz federal de Marabá, Carlos Haddad, mas, mesmo assim, o caso continuou em aberto.

Enquanto o processo se alongava na Justiça, a violência se intensificava no Acampamento Nova Esperança. O Combate Racismo Ambiental (23/09/2014) informou que, entre outubro de 2013 e setembro de 2014, a FETAGRI registrou 10 ocorrências na Delegacia de Conflitos Agrários de Marabá em relação às recorrentes práticas violentas empreendidas pelo gerente da Fazenda Gaúcha, Reginaldo Aparecido Augusto, conhecido como Neném, contra os acampados. A Federação informou que o gerente já havia agredido, ameaçado e humilhado trabalhadores que passaram em frente à sede da fazenda, que também era guarnecida por um grupo de jagunços fortemente armados.

O Combate Racismo Ambiental (23/09/2014) divulgou nota da CPT, da FETAGRI e do STTR na qual foi informado que, apesar de todas as dificuldades impostas aos acampados ao longo dos anos da ocupação, as famílias plantaram roças e passaram a produzir grande quantidade de alimentos, que comercializam no município de Bom Jesus. Os acampados também construíram uma escola onde estudam mais de 100 alunos.

A nota esclareceu que, devido às péssimas condições das vias de acesso à escola do Acampamento, as lideranças conseguiram negociar com o prefeito de Bom Jesus, Sidney Moreira de Souza (PT-PA), a liberação de um trator para fazer a recuperação da estrada. No dia 22 de setembro de 2014, quando o trator da prefeitura passou nas proximidades da sede da fazenda, o gerente Reginaldo Aparecido Augusto colocou uma caminhonete no meio da estrada para impedir a passagem. A nota informou que policiais civis e militares de Bom Jesus apareceram no loca, mas nada fizeram para desinterditar a estrada e desarmar o gerente e seu grupo.

Na tentativa de convencer o gerente a liberar a estrada, o trabalhador rural e coordenador da ocupação, Jair Cleber dos Santos, e o sindicalista do STR de Bom Jesus, Mateus Sousa Oliveira, se dirigiram à sede da fazenda. Esta ação foi acompanhada por homens, mulheres e crianças do Acampamento, mas, quando o grupo se aproximou da residência, foi recebido a tiros. O líder do Acampamento, Jair Cleber dos Santos, a liderança do STR, Mateus Sousa Oliveira, os acampados Antônio Alves e Daniel, assim como o tratorista da prefeitura, Aguinaldo Ribeiro Queiróz, foram feridos com vários tiros. Jair Cleber dos Santos não sobreviveu aos ferimentos e os demais foram encaminhados para internação no Hospital de Bom Jesus do Tocantins. Segundo a reportagem, os trabalhadores que permaneceram no local acusaram a polícia de Bom Jesus de ter facilitado a fuga do gerente e de outros pistoleiros, logo após o crime. Ao final da Nota, a FETAGRI, a CPT e o STR de Bom Jesus culparam a morosidade do INCRA, da Justiça Federal e da Delegacia de Conflitos Agrários de Marabá – DECA como causa principal deste conflito.

Segundo a Agência Pará de Notícias (23/09/2014), a Polícia Civil prendeu André Santos de Souza, funcionário da Fazenda Gaúcha, reconhecido por testemunhas como uma das pessoas que atirou contra os trabalhadores rurais.

O Combate Racismo Ambiental divulgou reportagem de Elaíze Farias (26/09/2014) que informou sobre o enterro do corpo de Jair Cleber dos Santos em um cemitério da rodovia que liga Marabá ao município de Itupiranga, também no sudeste do Pará, no dia 24 de setembro de 2014. Naquele mesmo dia, 12 pessoas prestaram depoimento na Delegacia de Conflitos Agrários sobre o caso, sendo oito delas integrantes do acampamento. A reportagem entrevistou o presidente da FETRAGRI, Francisco de Assis Soledade, o qual afirmou que a morte de Jair causou revolta nas famílias sem terra e que muitas pessoas iriam se mobilizar para exigir a prisão do principal suspeito. Segundo ele, a fazenda está 100% ocupada pelas famílias. Das coisas daquele que se diz dono da fazenda há apenas algumas cabeças de gado. É uma ocupação que a gente chama de acampamento. As famílias já produzem muita coisa. Ano passado, produziram 10 mil sacas de farinha, que são comercializadas nas cidades vizinhas. De acordo com a reportagem, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG) também manifestou nota em seu site expressando indignação, revolta, tristeza e pesar por mais um crime envolvendo trabalhadores (as) rurais.

No dia 25 de setembro de 2014, o Correio do Tocantins informou que Agnaldo Ribeiro Queiroz, tratorista da prefeitura, morreu no Hospital Regional do Sudeste do Pará. O Correio do Tocantins foi ao local do crime e entrevistou diversas pessoas. Uma delas foi Marilene Alves dos Santos, de 58 anos, irmã de Jair Cleber, que denunciou as frequentes ameaças sofridas pelos acampados. A esposa de Jair, Zildete Chaves da Silva, de 29 anos, também foi entrevistada e disse que era casada há quatro anos e que teve dois filhos com ele, um de dois anos e outro de quatro meses. Segundo ela, todos tinham medo, pois viam os pistoleiros armados, e Jair já havia sido ameaçado várias vezes. A viúva desabafou: Queremos que haja Justiça e que alguém tome uma providência para que isso não aconteça em outras áreas. Todo mundo sabia que isso ia acontecer, essa tragédia foi anunciada e não queremos que isso aconteça com mais nenhuma família de nenhum acampamento. Ele lutava pelos direitos de todo mundo.

Geuza Morgado, coordenadora da Comissão Pastoral da Terra (CPT), em Marabá, também afirmou ao repórter do Correio do Tocantins que a morte de membros do Acampamento Nova Esperança era questão de tempo. Ela frisou que os trabalhadores rurais estavam revoltados com o descaso. E fez questão de esclarecer: As pessoas dizem que houve conflito, mas não houve. Os trabalhadores não balearam ninguém, não estavam armados e foram recebidos com armas. Jair foi assassinado a mando, com certeza, do proprietário dessa fazenda e com conivência de todos esses poderes. A lei que está para proteger é aquela que desprotege. Há mais de seis anos essa liderança lutava para que se fizesse a reforma agrária naquela área e mesmo assim nem o INCRA e nem a Justiça Federal fizeram o que deveria ser feito. Fizeram pouco caso desses trabalhadores. A versão de Geuza foi confirmada por José da Conceição Silva, um dos coordenadores do acampamento Nova Esperança, que declarou que os acampados sempre estiveram de forma pacífica na área. Ele enfatizou: Nunca agredimos ninguém, eles já nos agrediram, mas sempre os respeitamos. Nunca trocamos forças com eles. Fizemos várias denúncias na DECA sobre o gerente que nos ameaçava e o pessoal da fazenda até já espancou um de nós.

O presidente da FETAGRI no Pará, Francisco de Assis da Costa, também conversou com a Reportagem do Correio do Tocantins: Aqui era comum, quando os sem-terra iriam passar pelas estradas, serem humilhados. O pessoal da fazenda atirava, o gerente perseguia os trabalhadores. Lá na fazenda tinha armas, bombas caseiras, a polícia viu esse arsenal. Há quatro anos o caso está na Justiça Federal sem receber resposta e agora ocorre mais uma ação do latifúndio na região que tem a prática de humilhar, perseguir e matar o trabalhador. Esse gerente representa a prática, existente na região, de assassinatos de trabalhadores. Estamos todos preocupados com essa realidade. Por fim, Francisco informou que a FETAGRI pretendia solicitar uma audiência com o juiz pedindo para acelerar o processo de aquisição da área.

O Combate Racismo Ambiental (30/09/2014) informou que aproximadamente 600 manifestantes, acampados da Fazenda Gaúcha, realizaram uma manifestação na BR 222, no km 72, entre os municípios de Abel Figueiredo e Bom Jesus do Tocantins, para denunciar a morosidade na regularização da fazenda e a omissão da polícia, que ainda não havia efetuado a prisão do assassino suspeito. A manifestação começou às 6h e se encerrou às 21h do mesmo dia. Durante o ato, os trabalhadores apagaram o nome da fazenda na placa localizada na entrada do local e escreveram Projeto de Assentamento Jair Agnaldo, em homenagem às duas vítimas fatais. Enquanto isto, uma comissão formada por dez lideranças participava de reunião com o juiz Heitor Moura Gomes, da 2ª Vara da Justiça Federal de Marabá, para cobrar agilidade sobre o caso.

A reportagem divulgada pelo Combate Racismo Ambiental (01/10/2014) reproduziu a fala de um agricultor sobre a morte de Jair e de outros trabalhadores rurais da região. Segundo ele, que preferiu não se identificar: Quem aperta o gatilho para matar trabalhador rural no sul e sudeste do Pará é o PT, é o INCRA, é a DECA, é o fazendeiro empresário que grila terras e a Justiça sempre morosa e a favor do latifúndio. Ainda nesta reportagem o presidente da FETAGRI, Francisco de Assis, criticou a demora da prisão do gerente da fazenda e afirmou: Se fosse um trabalhador que tivesse matado o gerente, já tinha dez ou vinte trabalhadores presos. Como foi o gerente que matou dois companheiros nossos, até agora a polícia não achou o gerente para prender.

Apesar de toda mobilização, no dia 08 de outubro de 2014, o juiz Murilo Lemos Simão revogou a prisão dos dois únicos acusados dos assassinatos e tentativas de homicídio ocorridos na Fazenda Gaúcha: Reginaldo Aparecido Augusto e André Santos Souza. Segundo o Combate Racismo Ambiental, o fato gerou ainda mais revolta entre os acampados, a FETAGRI, a CPT e ao STRs de Bom Jesus do Tocantins, que incluíram em suas demandas o pedido de afastamento do magistrado dos processos que apuram assassinatos no campo.

Cronologia

2005: A Federação dos Trabalhadores na Agricultura (FETAGRI) reivindica a área da Fazenda Gaúcha, de 17 mil hectares para assentamento de cerca de 500 pessoas. O processo Nº 20051001404-2 de desapropriação tramita na Vara Agrária de Marabá.

25 de junho d 2007: Agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por Jacundá Agro Industrial Ltda. (Fazenda Gaúcha) contra decisão do MM. Juiz de Direito da Vara Agrária Cível da Comarca de Marabá que em Autos de Reintegração de Posse (Proc. Nº 20051001404-2).

13 de maio de 2010: A Juíza de Direito Titular da Região Agrária de Marabá, Claudia Regina Moreira Favacho Moura, mantém a decisão de melhor esclarecimento acerca da legitimidade da posse alegada pela Jacundá Agro Industrial Ltda., ante a dúvida instalada nos autos de prática de grilagem de terra, segundo a Ação de Reintegração / Manutenção de Posse (Proc: 00010587120058140028).

21 de maio de 2010: A Juíza de Direito Claudia Regina Moreira Favacho Moura encaminha os autos à Justiça Federal (Processo n.º 0001058-71.2005.814.0028), a quem compete definir acerca da existência de interesse jurídico do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA).

25 de maio de 2010: Após a União manifestar interesse no imóvel objeto da contenda, manifestado por intermédio de sua entidade autárquica – INCRA, a Juíza de Direito Claudia Regina Moreira Favacho Moura solicita o deslocamento de competência e encaminha os autos de reintegração de posse (Processo n.º 0001058-71.2005.814.0028) ao Juízo Federal.

28 de maio de 2010: Depois de considerar a desistência da autora Jacunda Agro Industrial Ltda. de qualquer prazo recursal em vigência, o Juiz de Direito de Marabá/PA, Eduardo Antônio Martins Teixeira determina a imediata remessa dos autos (Processo n.º 0001058-71.2005.814.0028) à Justiça Federal.

Outubro de 2013 a setembro de 2014: A FETAGRI registra 10 ocorrências na Delegacia de Conflitos Agrários (DECA) de Marabá em relação às recorrentes práticas violentas empreendidas pelo gerente da Fazenda Gaúcha, Reginaldo Aparecido Augusto, conhecido como Neném, contra os acampados.

22 de setembro de 2014: O coordenador da ocupação da fazenda Gaúcha, Jair Cleber dos Santos, é assassinado pelo gerente da fazenda, Reginaldo Aparecido Augusto, conhecido como Neném. Mateus Sousa Oliveira (Sindicalista do STR de Bom Jesus), Antônio Alves, Daniel e o tratorista da prefeitura, Aguinaldo Ribeiro Queiróz, também são feridos com vários tiros e são internados no Hospital de Bom Jesus do Tocantins.

23 de setembro de 2014: A Polícia Civil prende André Santos de Souza, funcionário da Fazenda Gaúcha, acusado de atirar contra membros do acampamento Nova Esperança. Ele é reconhecido por testemunhas como uma das pessoas que atiraram contra quatro trabalhadores rurais.

25 de setembro de 2014: Morre no Hospital Regional do Sudeste do Pará o camponês Agnaldo Ribeiro Queiroz, baleado por funcionário da fazenda Gaúcha.

30 de setembro de 2014: 600 manifestantes, acampados e acampadas da Fazenda Gaúcha, realizam manifestação na BR 222 km 72, localizada entre os municípios de Abel Figueiredo e Bom Jesus do Tocantins, para denunciar a morosidade na regularização da Fazenda, onde ocorreu o assassinato do trabalhador rural Jair Cleber dos Santos e a omissão da polícia, que ainda não efetuou a prisão do assassino suspeito.

08 de outubro de 2014: Após o juiz Murilo Lemos Simão revogar a prisão preventiva dos dois únicos acusados dos assassinatos e tentativas de homicídio ocorridos no interior da Fazenda Gaúcha, movimentos sociais exigem o afastamento do magistrado dos processos que apuram assassinatos no campo.

Fontes

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AGÊNCIA PARÁ DE NOTÍCIAS. Preso acusado de atirar contra acampados em fazenda no sudeste do Pará. Marabá, 23 set. 2014. Disponível em: http://goo.gl/fxhgw4. Acesso em: 14 out. 2014.

ASSIS, Willian Santos. Mobilização camponesa no sudeste paraense e luta pela reforma agrária. In: FERNANDES, B. M.; MEDEIROS, L. S.; PAULILO, M. I. (Org.). Lutas camponesas contemporâneas: condições, dilemas e conquistas. 1ªed.São Paulo: UNESP, 2009, v. II, p. 113-138.

COMBATE RACISMO AMBIENTAL. NOTA Movimentos pedirão o afastamento do Juiz Murilo Lemos Simão dos processos que apuram assassinatos no campo. Rio de Janeiro, 09 out. 2014. Disponível em: http://goo.gl/ezLRYW. Acesso em: 14 out. 2014.

________________________. Quem aperta o gatilho nos assassinatos de trabalhadores rurais no Pará? Rio de Janeiro, 01 out. 2014. Disponível em: http://goo.gl/xgTvhq. Acesso em: 14 out. 2014.

________________________. Acampados fazem manifestação contra impunidade e reivindicam regularização fundiária no Pará. Rio de Janeiro, 30 set. 2014. Disponível: http://goo.gl/xfGf2q. Acesso em: 14 out. 2014.

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_______________________. Líder de acampamento é assassinado e quatro acampados são feridos, no Pará. Rio de Janeiro, 23 set. 2014. Disponível em: http://goo.gl/QKXKt2. Acesso em: 14 out. 2014.

COMISSÃO PASTORAL DA TERRA NACIONAL (CPT). Líder de acampamento é assassinado e quatro acampados são feridos, no Pará. S/l, 23 set. 2014 apud COMBATE RACISMO AMBIENTAL. Rio de Janeiro, 23 set. 2014. Disponível em: http://goo.gl/QKXKt2. Acesso em: 14 out. 2014.

FARIAS, Elaíze. Suspeito de matar líder de acampamento de sem-terra continua foragido no Pará. Amazônia Real. S/l, 26 set. 2014 apud COMBATE RACISMO AMBIENTAL. Rio de Janeiro, 26 set. 2014. Disponível em: http://goo.gl/USjcn7. Acesso em: 14 out. 2014.

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SILVA, Osnera Pinto da. Caminhando pelos mortos, caminhando pela vida: conflitos, romarias e santidade no Sudeste Paraense (1980-2010). Dissertação (Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Severino Sombra). Universidade Severino Sombra, Vassouras/RJ 2012.

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