GO – Populações tradicionais e bóias-frias sofrem com trabalho degradante nas monoculturas de cana

UF: GO

Município Atingido: Turvelândia (GO)

Outros Municípios: Jataí (GO), Maurilândia (GO), Porteirão (GO), Rio Verde (GO), Santa Helena de Goiás (GO), Turvelândia (GO)

População: Agricultores familiares, Migrantes, Povos indígenas, Ribeirinhos, Trabalhadores rurais assalariados

Atividades Geradoras do Conflito: Agroindústria, Agrotóxicos

Impactos Socioambientais: Alteração no regime tradicional de uso e ocupação do território, Assoreamento de recurso hídrico, Desmatamento e/ou queimada, Erosão do solo, Invasão / dano a área protegida ou unidade de conservação, Poluição atmosférica, Poluição de recurso hídrico, Poluição do solo

Danos à Saúde: Acidentes, Doenças não transmissíveis ou crônicas, Doenças respiratórias, Doenças transmissíveis, Falta de atendimento médico, Insegurança alimentar, Piora na qualidade de vida

Síntese

A produção sucro-alcooleira causa danos à saúde em diversos momentos de sua cadeia, mas é no momento da colheita que a população os sente na pele de forma mais intensa. A queima da cana para viabilizar o corte manual da cana-de-açúcar gera poluição atmosférica e surtos de doenças e crises respiratórias em toda a população, atingida pelas nuvens de fumaça que se espalham desde os canaviais até os centros urbanos mais próximos.

O próprio trabalho de corte da cana- representa em si um gravíssimo dano a saúde do trabalhador e de suas famílias. Considerado um trabalho degradante, cuja remuneração é calculada na produção individual de cada cortador, as situações de segurança e sanitárias dos trabalhadores na maioria das vezes não são garantidas, e suas possibilidades de reclamar os direitos é reduzida, diante de ameaças de desconto de salário ou mesmo dispensa do trabalho naquela safra.

Conseqüentemente, os trabalhadores contratados para o corte da cana cumprem jornadas extenuantes de aproximadamente dez horas de trabalho, levando a problemas musculares e de postura, além de acidentes de trabalho com os instrumentos de corte (facão e foice) e muitas vezes a estafa e fadiga generalizadas, que já levaram à morte cortadores em algumas regiões do país e em Goiás também. Cabe ressaltar ainda que o uso intensivo de agrotóxicos no momento do plantio e crescimento da monocultura tem ocasionado a contaminação não apenas do solo, mas da água, sendo a causa direta de inúmeras doenças respiratórias e dermatológicas. Há indícios levantados por servidores da área de saúde do município de Maurilândia, de que os agrotóxicos teriam aumentado os casos de câncer de pulmão, intestino e fígado.

Contexto Ampliado

Desde o começo dos anos 2000 verifica-se a expansão desordenada e intensiva de empreendimentos agroindustriais voltadas para a produção em larga escala de cana-de-açúcar e seus derivados, especialmente o etanol. Junto com a ?o crescimento do setor?, como se referem os empresários e usineiros no Sudoeste goiano, inúmeros problemas sociais e ambientais vêm sendo relatados pela população e por outros grupos da sociedade civil organizada, em função dos descumprimentos legais que imperam na implantação e funcionamento das monoculturas e usinas.

Conforme denuncia o Ministério Público Federal (GO), com base em audiências públicas e em outras reclamações oriundas dos grupos atingidos pelos empreendimentos agroindustriais, os principais problemas decorrentes desta expansão desenfreada são: ?avanço dos canaviais sobre áreas de mata nativa do Cerrado, loteamentos irregulares, bloqueio de calçadas, reservas legais, comércio de produtos falsificados e pirateados, poluição sonora, entre outros?.

Outros setores da sociedade, também apontam para o problema da falta de infra-estrutura dos municípios, basicamente rurais, tanto para acomodação como para atendimento da população migrante em período de colheita da safra. Serviços de saúde locais não comportam a alta da demanda de médicos, leitos e remédios, tanto para problemas dos trabalhadores do corte da cana como para a população, que sofre com a poluição atmosférica decorrente da queima da mesma.

O contingente de mão-de-obra no período da colheita sobrecarrega ainda os serviços públicos de Maurilândia e, segundo dados da imprensa e autoridades locais, incrementa a prostituição e a gravidez precoce. As populações rurais e urbanas desta região são atingidas pela perversidade do processo de chegada e implantação das usinas, da sua mão-de-obra migrante, com o inchaço temporário, mas impactante, das cidades, a disseminação de doenças contagiosas e sexualmente transmissíveis, a desestruturação familiar, o consumo de drogas, e o crescimento da violência.

Assim, população local dos municípios localizados no Vale do Rio Verdevem sofrendo os contraditórios processos desencadeados pela expansão e intensificação da chamada bioenergia, apesar de ela se apresentar hoje na sociedade mundial como alternativa ?sustentável? de produção de combustíveis, em detrimento dos combustíveis fósseis, como o petróleo.

Rodrigues e Ortiz (2006) destacam como recorrências nas grandes regiões por onde tem se expandido os programas de incentivo a produção do etanol as seguintes situações: a pressão sobre pequenas e médias propriedades rurais gerando a concentração fundiária e a diminuição de produtos agrícolas comercializáveis e de consumo local e regional, esgotamento dos recursos hídricos e do solo e degradação de áreas protegidas, desarticulação das culturas e tradições regionais de populações rurais e indígenas, geração de empregos e mercado de trabalho temporários, com base em mão-de-obra migrante (especialmente em época de colheita), ocasionando problemas urbanos como falta de infra-estrutura nos serviços básicos, além do estímulo à prostituição e a conseqüente desagregação familiar, super-exploração dos trabalhadores visando o aumento da produção e comprometendo a saúde dos mesmos, aumento da poluição atmosférica causada pela queima da cana-de-açúcar, dentre outros.

Encaminhamentos.

Além de um quadro normativo com exigências legais voltadas para a regulação das atividades produtivas da agroindústria da cana-de-açúcar e do álcool, como leis municipais e instrumentos de controle sobre os empreendimentos e seus impactos socioambientais, em 2007 alguns municípios de Goiás criaram leis estabelecendo parâmetros de expansão dos canaviais. Após ampla mobilização do Ministério Público Federal e também por parte das populações atingidas pela expansão canavieira, preocupadas com os danos sociais e ambientais existentes e futuros, mudanças no campo legal e nas políticas públicas foram parcialmente implementadas. No município de Rio Verde, o limite máximo permitido de monoculturas de cana-de-açúcar é de 10% da área do município. Outros municípios do sudoeste goiano trabalham com margens mais permissivas, que variam de 15% a 35%.

Outro instrumento de regulamentação e controle social sobre os empreendimentos agroindustriais, o zoneamento econômico ecológico, reuniu os interesses e desejos da sociedade por maior controle social sobre a expansão canavieira, mesmo que de maneira tímida. Entretanto, como apontado por pesquisadores da UFG, o zoneamento seguiu a trilhas das áreas mais férteis e planas, que garantem ao mesmo tempo produtividade do solo e substituição da mão-de-obra pela colheita mecanizada.

A FAEG vem produzindo material impresso e realizando campanhas de conscientização de seus filiados e trabalhadores rurais da região, no sentido de se organizarem coletivamente para enfrentar as dificuldades advindas com os empreendimentos sucroalcooleiros. Ao mesmo tempo em que representam uma fonte de renda temporária, os trabalhadores também já reconhecem esses empregos como penosos, que lhes exige muitas vezes a própria vida.

Última atualização em: 05 de dezembro de 2009

Fontes

Atlas da questão agrária
http://www4.fct.unesp.br/nera/atlas/configuracao.htm

Couto, Gisleide da Silva. Cana-de-açúcar em Goiás: Problema ou potencialidade. In: IX Simpósio Nacional Cerrado. Outubro de 2008, Brasília, DF. Acesso em 20/10/2009: www.cpac.embrapa.br/download/677/t

Fórum de C&T da Associação de Docentes UFG. Os impactos da cana-de-açúcar no território goiano. Matéria on line de 09/10/2007. Acesso em 20/10/2009:
http://www.adufg.org.br/galeriamidia.php?idmateria=1393&idgaleriamidia=1&mostra_ges=S

Ministério Público Federal ? GO. Defesa da Saude é escolhida como meta prioritária do Ministéiro Público. Audiências acontecem com grande participação popular. Jornal MP Goiás. Novembro de 2007. Acesso em 20/10/2009: http://www.mp.go.gov.br/portalweb/hp/1/docs/JornalMP_ed11.pdf

Novaes. José Roberto. Por traz dos Verdes Canaviais (Goiás, 1994). Filme Documentário do Projeto Trabalho e Mudanças Sociais da UFRJ. 2007.

Osava, Mário. Brasil: A cana da amargura Envolverde – IPS.- Matéria publicada em31/08/2007. Acesso em 10/10/2009: http://envolverde.ig.com.br/materia.php?cod=36730&edt

Pires, Lucineide Mendes. Reflexão sobre o impacto causado pela expansão da cana-de-açucar nas áreas de cerrado: um olhar sobre Goiás. In: Revista Mirante. Terceira Edição – Vol. 01 nº02 (2007). Acesso em 20/10/2009: http://www.revistamirante.net/4ed/20508.pdf

Regis, Hebert. Implicações da vocação à cultura. Tribuna do Planalto. Matéria ?Controle sobre a expansão canavieira?, on line de 09/10/2007, extraída do Fórum de C&T da Associação de Docentes UFG. Acesso em 20/10/2009:
http://www.adufg.org.br/noticias.php?idmateria=1394&idlink=1&day=&month=&year

Rodrigues, Délcio e Ortiz, Lúcia. Em direção à sustentabilidade da produção de etanol de cana-de-açúcar no Brasil. Outubro de 2006. Acesso em 20/10/2009: http://www.vitaecivilis.org.br/anexos/Etanol_Sustentabilidade.pdf

Um comentário

  1. Bom dia, senhora, bom dia, senhor,

    Meu nome é Maïder Poissenot, sou estudante de mestrado em Geografia na Universidade de Paris 1 Panthéon-Sorbonne. Venho até você para obter contatos e informações sobre o tema que me interessa para minha tese. Gostaria de trabalhar sobre o impacto da monocultura da cana-de-açúcar no sul de Goiás, nos arredores de Santa Helena de Goiás, e os problemas de saúde pública e ambientais que ela causa.

    Você poderia me dar alguns contatos e informações adicionais?

    Atenciosamente,
    Maïder Poissenot

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