SC – Serra da Abelha: importante área de transição de Mata Atlântica para Florestas de Araucárias é defendida pela sociedade civil e por técnicos do ICMBio, mas continua sendo alvo da atividade de madeireiros, sob o olhar passivo das autoridades governamentais

UF: SC

Município Atingido: Santa Terezinha (SC)

Outros Municípios: Santa Terezinha (SC)

População: Agricultores familiares

Atividades Geradoras do Conflito: Atuação de entidades governamentais, Madeireiras

Impactos Socioambientais: Desmatamento e/ou queimada, Invasão / dano a área protegida ou unidade de conservação

Danos à Saúde: Piora na qualidade de vida

Síntese

Localizada entre os municípios de Santa Terezinha e Vitor Meireles, oeste catarinense, a Área de Relevante Interesse Ecológico (Arie) da Serra da Abelha tem se constituído, desde 1996, como alvo da ação de grileiros e madeireiros que extraem ilegalmente madeiras consideradas nobres da área.

Criada por decreto do presidente Fernando Henrique Cardoso, em março de 1996, a Arie Serra da Abelha possui cerca de 4.600 hectares que mantem preservado um importante trecho de transição entre a Mata Atlântica e as florestas de araucárias do sul do Estado. Existe no local grande concentração de araucárias, com uma vegetação de sub-bosque muito bem conservada, com muitas árvores de grande importância ambiental, e de alto valor comercial, como cedros, canelas e perobas.

Desde 1999, a Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida (Apremavi) e ongs associadas à Rede da Mata Atlântica (RMA) vêm denunciando tentativas de loteamento e exploração ilegal de madeira por grupos ligados a madeireiras ? especialmente a partir do imóvel conhecido como fazenda Parolim.

Em 2005, o Ministério Público Federal (MPF) entrou com uma ação civil pública contra o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e a União Federal, por omissão na fiscalização da área e por tentativas de regularização de assentamentos na região, que ameaçariam a preservação do local ? destacadamente a mata de araucárias no município de Santa Terezinha, associada à Área de Relevante Interesse Ecológico (Arie) da Serra da Abelha. No final daquele ano foi firmado um acordo entre o MPF e as entidades rés para a elaboração de estudos a fim de viabilizar a preservação do local.

Em meados de 2006, técnicos do Ibama apresentaram uma proposta de recategorização da Arie como Refúgio de Vida Silvestre do Rio da Prata, ampliando-a para cerca de 19.000 hectares. As conclusões destes estudos, porém, nunca foram colocadas em prática e a fiscalização da área atual permanece deficitária.

Segundo recentes denúncias da Apremavi, diariamente caminhões são vistos transportando madeira extraída ilegalmente e o desmatamento já formou imensas clareiras na área. Através de campanhas e relatórios a entidade tem mobilizado a comunidade a fim de pressionar o governo federal a agir de modo a coibir a prática. Até o momento não se verificou nenhum resultado prático.

A controvérsia em torno da preservação da Serra da Abelha é intensificada pelo fato de cerca de 60% da área atual da ARIE e parte significativa das terras propostas para a criação do futuro Refúgio de Vida Silvestre do Rio da Prata, constarem desde 2003 como partes do território a ser demarcado como Terra Indígena Ibirama-La Klano. Essa sobreposição coloca o futuro da Arie Serra da Abelha, bem como do Refúgio da Vida Silvestre do Rio do Prata e da TI Ibirama-La Klano, em situação jurídica indefinida, de certa forma justificando a inércia governamental e favorecendo a ação dos madereiros que se aproveitam do impasse.

Contexto Ampliado

A Área de Relevante Interesse Ecológico (Arie) da Serra da Abelha se caracteriza pela transição da mata atlântica do litoral para a mata atlântica serrana também conhecida de floresta de pinheiros ou Floresta de Araucárias. A Arie ainda apresenta uma significativa área de Floresta com Araucárias que apresenta uma estrutura fitossociológica bem conservada, onde se destacam as copas dos pinheiros. Estima-se que existam na área mais de 8.000 araucárias . No Sub-bosque podem ser encontrados várias espécies de canela, o cedro e o xaxim-bugio ou samambaiaçú-imperial.

A região na qual a Arie está inserida é hoje palco de diversos conflitos fundiários envolvendo pequenos proprietários, fazendeiros, trabalhadores sem terra e povos indígenas. A controvérsia em torno da demarcação da Terra Indígena Ibirama – La Klano torna a definição de limites na região um assunto extremamente delicado e tem servido como pretexto para a inércia das entidades estatais responsáveis pela fiscalização da área.

Este conflito se complexifica na medida em que envolve o atendimento de diversos direitos individuais e coletivos cujo atendimento depende da intermediação de um Estado nem sempre aparelhado ou qualificado para atender ou harmonizar os diversos interesses colocados em jogo. Em meio a esse cenário, grupos criminosos se aproveitam para explorar ilegalmente os ricos recursos naturais existentes na floresta de forma predatória e provocando sua destruição.

Um exemplo desse fato ocorreu em 1999. Denúncias da Apremavi e da Rede Mata Atlântica davam conta que pessoas ligadas a madeireiros estavam loteando ilegalmente o imóvel conhecido como Fazenda Parolim. Segundo estas denúncias, lotes de até 25 hectares estavam sendo negociados em troca de parte da produção, o que incluía o desmate de madeiras nobres (a projeção indicava então uma perspectiva de perda de 80% da mata nativa) e parte de uma pequena produção agrícola. Na mesma época, famílias de trabalhadores rurais sem-terra e de ex-funcionários da referida fazenda que se encontravam acampados às margens da estrada que corta a fazenda, vieram a público esclarecer as denúncias e afirmaram não estar ligados a qualquer empresa madeireira e que apenas pretendiam a criação de um assentamento no local.

Não há registros da criação do referido assentamento, mas, quando o MPF propôs a ação civil pública em 2005, incluiu o Incra e alguns posseiros entre os réus. Da ação civil pública nasceu um acordo formalizado em novembro daquele ano, dando origem ao projeto de ampliação da área de preservação, com a possível criação do Refúgio de Vida Silvestre do Rio da Prata pelo Ibama, a qual jamais saiu do papel. No âmbito federal, as unidades de conservação são hoje de responsabilidade do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade ? ICMBio.

Em novembro de 2006, o Ibama realizou audiências públicas nos municípios de Santa Teresinha e Vitor Meireles, nas quais apresentou o projeto de criação do Refúgio de Vida Silvestre do Rio da Prata, e garantiu o apoio da população e autoridades locais. Contudo, desde então, o projeto permanece parado na Casa Civil da Presidência da República, que não sinalizou com qualquer perspectiva de efetivação da Arie em futuro próximo. Enquanto isso não ocorre (ou qualquer outra medida para minimizar o desmatamento ilegal), os bosques da Serra da Abelha e da região permanecem ameaçados de desaparecer.

As denúncias se acumulam, mas há pouca resposta por parte do poder público. Em 24 de abril de 2009, a Apremavi vistoriou a Fazenda Parolim, após receber denúncias de desmatamento da comunidade local. A denúncia foi encaminhada às autoridades federais no início de maio de 2009. Em 29 de maio, a entidade voltou a vistoriar a constatando o agravamento do desmatamento. Em 1º de junho de 2009, a Apremavi reiterou as denúncias às autoridades federais sobre desmatamento dentro da área proposta para a criação do Refúgio de Vida Silvestre do Rio da Prata.
Enquanto o imenso patrimônio natural é dilapidado pela ação gananciosa de poucas pessoas, a maioria da população local se vê ameaçada nos seus direitos constitucionais a um meio ambiente equilibrado e poderá sofrer os sérios impactos decorrentes da destruição do ecossistema e da inadimplência das autoridades ambientais federais e estaduais.

Última atualização em: 15 de dezembro de 2009

Fontes

A NOTÍCIA. Acampados negam interesse por madeira. Disponível em: LINK. Acesso em: 03 set. 2009.

CASANOVA, Leandro da Rosa, PROCHNOW, Miriam e CORREIA, Tatiana Arruda. Relatório de vistoria de campo: vistoria de denúncia de desmatamento na fazenda Parolim e arredores, município de Santa Terezinha (SC). Disponível em: LINK. Acesso em: 03 set. 2009.

INSTITUTO DE MEIO AMBIENTE E RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS (Ibama). Proposta de ampliação e/ou reclassificação da ARIE da Serra da Abelha/ Rio da Prata. Disponível em: LINK. Acesso em: 03 set. 2009.

O BARRIGA VERDE. Nova denúncia de desmatamento é feita pela Apremavi. Disponível em: LINK. Acesso em: 03 set. 2009.

O ECO. Santa Catarina às avessas. Disponível em: LINK. Acesso em: 03 set. 2009.

PEREIRA, Orlando. ONGs querem evitar invasão de mata nativa. A Notícia, Joinville, 27 abr. 1999. Disponível em: LINK. Acesso em: 03 set. 2009.

PROCHNOW, Miriam. Mata Atlântica está sendo devastada em Santa Catarina. Notícias da Apremavi, Ibirama, 08 maio 2009. Disponível em: LINK. Acesso em: 03 set. 2009.

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO (TRF4). Consulta Processual Unificada: AÇÃO CIVIL PÚBLICA Nº 2005.72.13.000073-9 (SC). Disponivel em: LINK. Acesso em: 28 ago. 2009.

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