RS – Ocupação Baronesa do Gravataí, em Porto Alegre, luta por seu direito à moradia, garantido pela Constituição

UF: RS

Município Atingido: Porto Alegre (RS)

População: Comunidades urbanas, Moradores em periferias, ocupações e favelas

Atividades Geradoras do Conflito: Atuação de entidades governamentais, Especulação imobiliária

Impactos Socioambientais: Falta de saneamento básico, Favelização

Danos à Saúde: Piora na qualidade de vida

Síntese

No cenário habitacional nacional e nas lutas por moradia digna no País, as situações de conflito envolvendo o direito à moradia são frequentes. Aqui damos destaque à Ocupação Baronesa, no município de Porto Alegre, Rio Grande do Sul.

A ocupação Baronesa do Gravataí se situa entre a esquina da rua homônima e a esquina da rua 17 de Junho, no bairro da Cidade Baixa. Trata-se de uma ocupação que se originou em 28 de março de 2019, composta por dez famílias, formadas por 20 adultos e 13 crianças. Essas famílias se organizaram porque foram despejadas de onde moravam ou estavam em situações em que precisaram escolher entre pagar o aluguel ou prover-se de algumas necessidades básicas, como a alimentação. Assim, passaram a ocupar um antigo casarão que estava abandonado há 10 anos, acumulando lixo e entulho.

A construção pertence à Prefeitura Municipal de Porto Alegre e foi cedida para a Brigada Militar do Rio Grande do Sul (BMRS). Porém, o prédio pegou fogo em março de 2019 e, na sequência, foi ocupado pelas famílias que se organizaram para a ocupação.

 

Contexto Ampliado

A Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (DUDH/ONU) traz, desde 1948, a moradia digna como um direito fundamental para a constituição de uma sociedade justa, livre e igualitária. No Brasil, desde o ano 2000, a moradia tornou-se um direito social inscrito na Constituição Federal de 1988, a partir do advento da Emenda Constitucional nº 26/00, em seu artigo 6º. Entretanto, como os outros direitos assegurados na carta magna, como saúde, educação, segurança, alimentação, previdência e outros, a moradia continua a ser negligenciada pelos governos e a ser um privilégio de uma parcela da população com melhores condições financeiras, capaz, portanto, de acessar diretamente (ou através de financiamentos bancários) o mercado imobiliário.

Segundo a legislação brasileira, ter onde morar é um direito garantido, sendo a propriedade da terra e dos imóveis relativa, pois condicionada ao cumprimento de sua função social. Após a Constituição de 1988, foram aprovadas diversas leis para fomentar a habitação como um direito no País, conforme apontado pelo Instituto Humanitas Unisinos.

Ermínia Maricato, arquiteta e urbanista, professora aposentada da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU/USP), em entrevista concedida à Revista on-line do Instituto Humanitas Unisinos, defende que o direito à moradia é absoluto na Constituição, ao passo que o direito à propriedade não é. Para ela, este deve ser condicionado ao exercício de sua função social. Conforme a arquiteta, no Brasil temos um dos arcabouços legais mais avançados no mundo, se considerarmos a questão urbana.

Ela exemplifica uma série de leis que, a partir da Constituição, pautaram a moradia digna, dentre elas: o Estatuto das Cidades (lei nº 10.257/2001), a Lei do Fundo Nacional de Habitação do Interesse Social (lei nº 11.124/2005), e a Lei de Consórcios Públicos (lei 11.107/2005), que ela avalia como importante para o enfrentamento de problemas intermunicipais e que, por sua vez, também serve para questões ambientais em torno das situações de habitação, bem como a Lei Federal do Saneamento de 2007 (lei nº 11.445/2005).

Ela apresenta também a Lei da Mobilidade Urbana (lei nº 12.587/2012), a de Lei dos Resíduos Sólidos (lei nº 12.305/2010) e o Estatuto da Metrópole (lei nº13.089/2015) como arcabouços que se afinam para a constituição de um contexto de política habitacional para todos. Outra Lei de significativa importância é a de Assistência Técnica em Habitação de Interesse Social (ATHIS) (lei nº 11.888/2008).

Entretanto, conforme a professora aponta, mesmo com uma avaliação internacional positiva da legislação brasileira em torno da questão da moradia, ela de fato tem sido insuficiente e ineficaz no Brasil. Segundo Maricato, o planejamento urbano e a questão fundiária, na maioria das cidades, permanecem absolutamente aquém do que é previsto e necessário para promover espaços urbanos mais justos, saudáveis e ambientalmente sustentáveis. Ela afirma que essa situação se originou devido à formação escravista e oligárquica do País, o que reproduz as desigualdades sociais no espaço urbano, fazendo com que toda essa legislação se aplique apenas a uma parte da cidade, a que é visível, integrada e planejada, ou seja, àquela que serve aos interesses das elites políticas e econômicas.

O Observatório da Realidade e das Políticas Públicas do Vale do Rio dos Sinos da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (ObservaSinos/Unisinos) destaca ainda que, graças aos movimentos sociais de luta pela moradia e da luta social de algumas organizações não governamentais, o País ainda é signatário do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da Organização das Nações Unidas (ratificado pelo Decreto Legislativo nº 226, de 12 de dezembro de 1991, e pelo Decreto Presidencial nº 591, de 06 de julho de 1992), que reconhece o direito de todos a um adequado nível de vida para si e sua família, incluindo alimentação, vestuário, trabalho e moradia.

Além disso, o Brasil também segue as diretrizes do Conselho de Direitos Humanos da ONU, particularmente a Resolução nº 2004/2841, que determina que a prática de despejos forçados deve ser combatida, sendo caracterizada pela Resolução como “uma grave violação aos padrões internacionais de direitos humanos, afetando diretamente o direito à moradia”.

Apesar da existência de inúmeros documentos referentes à moradia digna que devem orientar quaisquer políticas habitacionais no País, cabe destacar que, apesar disso, o Brasil permanece com um grande déficit habitacional. Este é referenciado pela ObservaSinos, a partir da definição da Fundação João Pinheiro (FJP), como a soma de quatro componentes: domicílios precários, coabitação familiar, ônus excessivo com aluguel urbano e adensamento excessivo de domicílios alugados.

Conforme discute o ObservaSinos, os domicílios precários incluem no seu cálculo dois subcomponentes, “os domicílios rústicos e os improvisados. Os domicílios rústicos são aqueles sem paredes de alvenaria ou madeira aparelhada. As condições de insalubridade desse tipo de domicílio podem trazer desconforto e risco de contaminação de doenças. Já os domicílios improvisados referem-se aos locais e imóveis sem fins residenciais e lugares que servem como moradia alternativa, o que indica a carência de novas unidades domiciliares”.

A coabitação familiar também é composta por outros dois subcomponentes, “os cômodos e as famílias secundárias. Os cômodos são domicílios particulares compostos por um ou mais aposentos localizados em casa, cortiço e outros locais. Já o segundo subcomponente da coabitação familiar diz respeito às famílias secundárias que dividem a moradia com uma família principal e desejam constituir um novo domicílio”.

O ônus excessivo refere-se ao número de famílias com renda de até três salários mínimos que moram em casa ou apartamento e que destinam 30% ou mais da sua renda para aluguel urbano. O quarto e último componente do déficit habitacional urbano, o adensamento excessivo com aluguel, corresponde aos domicílios alugados com um número médio superior a três moradores por dormitório.

Os dados apresentados pelo ObservaSinos mostram que o Brasil, em 2015, possuía 6.355.743 moradias em condições precárias. Este déficit habitacional aumentou 17% em três anos. Em termos absolutos, isto significa que, entre 2012 e 2015, o hiato de habitação no País aumentou em 925.181 moradias.

Conforme explica o Observatório, é importante destacar que, ao longo dos anos analisados, a causa de ônus excessivo com aluguel foi se tornando gradativamente a maior entre as quatro causas elencadas. Em 2015, 50% do déficit habitacional no País era devido ao aluguel; seguido da coabitação familiar, com 30%; habitação precária, com 15%; e adensamento excessivo, com 5%.

No Rio Grande do Sul foi registrado um déficit de 239.458 moradias em 2015. Este déficit habitacional é 25% maior do que aquele registrado em 2012 (191.189 moradias). O ônus excessivo com aluguel, apesar de ser a maior causa do déficit habitacional em 2015 em terras gaúchas, apresentou maior crescimento a partir de 2013, quando superou a coabitação familiar. A habitação precária e o adensamento excessivo ficaram em terceiro e quarto lugar, respectivamente.

Já a Região Metropolitana de Porto Alegre (RMPA) registrou, em 2015, um déficit de 96.614 moradias, sendo 98% na zona urbana. Esse número é 25% maior que aquele registrado em 2012. Sendo assim, para o Observatório, pode-se concluir que houve um aumento no déficit de 19.236 moradias em apenas três anos.

O ônus excessivo com aluguel é a maior causa do déficit na RMPA, representando 50%; seguido da coabitação familiar, com 31%; habitação precária, com 16%; e, por último, o adensamento excessivo, com 3,14%.

De acordo com estudos como esses, pode-se perceber que o País continua a carecer de políticas públicas sérias e perenes, capazes de oferecer soluções ao problema estrutural do déficit habitacional, o que faz com que grandes contingentes da população ocupem de forma precária e informal as franjas e periferias das grandes cidades. Alguns casos já foram descritos neste Mapa, relatando como ocupações se formam e posteriormente são ameaçadas pelo poder público e pela especulação imobiliária.

Em São Paulo, a Ocupação Vila Nova Palestina luta por moradia digna e direitos constitucionais, e, na Paraíba, mais de duzentas famílias da Ocupação Tijolinho Vermelho lutam por moradia. É possível encontrar exemplos também em Minas Gerais, onde mais de mil famílias da Ocupação Dandara lutam para garantir seu direito fundamental à moradia em articulação com a produção de alimentos, e, no Rio de Janeiro, moradores da Vila União de Curicica lutam contra remoções e por indenizações justas no contexto dos megaeventos.

Conforme o Fórum de Gestão do Planejamento da Região 1 do Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano Ambiental de Porto Alegre (CMDUA/PMPA), a Prefeitura possui cerca de 30 imóveis desocupados apenas na região central da capital, sem qualquer uso administrativo ou planos de destinação para o cumprimento do Art. 5°, inciso XXIII da Constituição Federal de 1988, em que a propriedade passou a ser um munus, ou seja, vinculada a um direito-dever, através do desempenho da Função Social da Propriedade. O Fórum destaca ainda a contradição que existe entre o número de edifícios públicos ociosos e a ineficácia do Município em implantar políticas públicas habitacionais. Em vez de cumprir seus deveres, o Estado continua a manter imóveis vazios e abandonados em áreas de grande valor de uso e de troca.

É nesse cenário que surge a ocupação Baronesa do Gravataí. Conforme o jornal Repórter Popular de maio de 2019, ela se localiza entre a esquina da rua Baronesa de Gravataí e a esquina da rua 17 de Junho, no bairro da Cidade Baixa, em Porto Alegre. Trata-se de uma ocupação que se originou em 28 de março de 2019, e atualmente é composta por dez famílias, formadas por 20 adultos e 13 crianças. Essas famílias se organizaram porque foram despejadas de onde moravam ou estavam em situações em que precisaram escolher entre pagar aluguel ou comer. Assim, elas passaram a ocupar um antigo casarão que estava abandonado há cerca de 10 anos, segundo o jornal, acumulando lixo e entulho. De acordo com notícia do jornal on-line da Rádio Guaíba, a construção pertence à Prefeitura Municipal de Porto Alegre e foi cedida à Brigada Militar do Rio Grande do Sul (BMRS). Porém, o prédio pegou fogo em março deste ano e, na sequência, foi ocupado pelas famílias.

Na tarde do dia 25 de março, um incêndio atingiu o imóvel, inutilizando o telhado e o segundo andar do prédio, que é dividido em seis sobrados na parte da frente e mais outras três casas nos fundos. Logo após o ocorrido, os integrantes da ocupação rumaram para o imóvel, formaram um mutirão e iniciaram a limpeza, conforme relatado ao portal Sul 21 por Roger Henrique de Oliveira de Souza, um dos primeiros a chegar no imóvel.

O conflito dos ocupantes com a Prefeitura Municipal de Porto Alegre se iniciou no dia 7 de maio de 2019, quando o fornecimento de água foi suspenso pelo Departamento Municipal de Água e Esgoto (DMAE). Conforme noticiado em site da Câmara Municipal de Porto Alegre, Alice Martins, uma das ocupantes, afirmou que, neste dia, foram “surpreendidos pela presença de um homem se dizendo procurador do município e que chamou representantes do DMAE, da FASC (Fundação de Assistência Social e Cidadania) e do Conselho Tutelar”. Ela ressaltou desconhecer o nome do procurador e que, a partir disso, começaram os conflitos entre os ocupantes e o Município.

Tal procurador, conforme denunciou reportagem no jornal porto-alegrense Sul 21, ainda teria ameaçado retirar as crianças da guarda dos pais se as famílias permanecessem na ocupação. E, conforme relato de Roger Oliveira, o referido procurador ainda teria afirmado que eles não poderiam “estar em um prédio localizado em um ponto nobre da cidade, que vale um monte de milhões”. Para Alice Martins, a tentativa de retirar as famílias se tratava de uma questão de discriminação, e afirmou ainda que, pelo fato das famílias se negarem a sair, foram cortadas a água e a energia elétrica do imóvel. Desde então, eles passaram a receber doações de água da vizinhança. A Procuradoria Geral do Município afirmou que está apurando os fatos sobre a atuação do referido procurador.

Alice Martins destacou em reunião na Câmara Municipal de Porto Alegre que as famílias têm o apoio dos moradores do bairro, ressaltando que, quando chegaram lá, o imóvel estava em ruínas, e que após a ocupação ficou organizado e habitável. Ela informou também que chamaram um arquiteto para atestar as condições do prédio, que obteve laudo positivo, descartando situações de risco na moradia.

Conforme noticiado no Sul 21, em 10 de maio de 2019, a Procuradoria Geral do Município ajuizou uma ação de reintegração de posse do imóvel em questão. Os possíveis riscos provocados pelo incêndio foram os argumentos da PGM para mover a ação. De acordo com a Procuradoria: o “juízo já se manifestou sobre o processo em decisão liminar, determinando que o imóvel seja desocupado em virtude dos riscos que apresenta”.

Conforme informações do site da Câmara Municipal de Porto Alegre, a sua Comissão de Urbanização, Transporte e Habitação (CUTHAB) esteve reunida no dia 21 de maio de 2019 para tratar da ocupação Baronesa do Gravataí. Com a presença de representantes da ocupação e membros da comissão, eles debateram o posicionamento de órgãos da prefeitura diante da ocupação. Na ocasião, houve posicionamentos de ambas as partes reforçando o direito das famílias ocupantes.

Em relação à ordem de despejo, Cristiane Catarina, chefe da Procuradoria de Patrimônio e Domínio Público do Município, afirmou existir um laudo da prefeitura atestando risco de habitação no local. Já Isabel Wexel, defensora pública do Estado do Rio Grande do Sul (DPE/RS), alertou para o fato de que a ocupação só possuía até então 40 dias, o que, segundo ela, tornaria difícil a manutenção das famílias no local. Entretanto garantiu que a DPE/RS tentaria suspender os efeitos da decisão judicial de reintegração de posse, por meio de agravo de instrumento. Wexel também destacou o direito que todos têm à moradia.

Quanto ao corte de fornecimento de água, Cesar Gabim, do DMAE, comunicou que recebeu a denúncia da ligação clandestina e determinou que ela fosse desligada, alegando que não podia ser conivente com irregularidades. A representante do Conselho Tutelar de Porto Alegre, Gilsele Aberbuj, destacou que esteve no local e não constatou irregularidades. Segundo ela, as crianças da ocupação estavam bem assistidas, matriculadas em escolas e visitando o posto de saúde regularmente, não havendo assim situações de descuido ou negligência. Foi nesta reunião que a representante Alice Martins defendeu a ocupação.

No final do encontro, o vice-presidente da CUTHAB, vereador Roberto Robaina (do Partido Socialismo e Liberdade – PSOL), anunciou a decisão da Comissão: enviariam uma carta ao prefeito Nelson Marchezan Júnior (do Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB) pedindo que revisse a decisão de despejar as famílias e mantivesse o fornecimento de água no local até uma solução viável para as famílias. O presidente da Comissão, vereador Dr. Golulart (do Partido Trabalhista Brasileiro – PTB), também ficou encarregado de falar com o prefeito. Também estiveram na reunião o vereador Paulinho Motorista (do Partido Socialista Brasileiro – PSB) e a vereadora Karen Santos (PSOL).

O Fórum de Gestão do Planejamento da Região 1 do Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano Ambiental de Porto Alegre (CMDUA), representado pelo seu Conselheiro, Felisberto Seabra Luisi, no dia 06 de junho de 2019, publicou um manifesto de repúdio à reintegração de posse demandada pelo Município. Neste manifesto, destaca seu posicionamento contrário à reintegração nos moldes em que estava sendo proposta, denunciando ausência de uma alternativa viável às famílias ali presentes.

Mesmo após pedido de revisão da ordem de despejo da CUTHAB, de uma solução viável para as famílias e todas as manifestações em defesa da ocupação, no dia 07 de junho de 2019 foi realizada a reintegração de posse do casarão a pedido da Prefeitura Municipal de Porto Alegre.

Informado pelo portal GauchaZH, do grupo RBS Participações S/A, as famílias foram retiradas pela prefeitura, que propôs sua instalação em um albergue na capital. Entretanto, não houve acordo, e algumas famílias terminaram ficando na rua no dia do ocorrido. O impasse ocorreu, principalmente, porque os familiares não queriam se separar. A prefeitura ofereceu levar mulheres e crianças para um local, e os homens para outro. Eles poderiam ficar nos albergues entre as 19h e 7h.

Fábio Polycarpo não queria deixar os filhos sozinhos e, por trabalhar como vigilante durante a noite, não teria condições de entrar no abrigo após o turno de trabalho. Ou seja, a proposta da Prefeitura sequer considerava as condições de vida e trabalho daquelas famílias. Entre os adultos da ocupação estava uma mulher grávida de sete meses, que destacou que não queria ficar distante do marido. A conselheira tutelar Lúcia Sant’Anna afirma que pediu à Justiça a prorrogação de mais 30 dias do prazo para remoção das famílias, o que foi negado. Consultada no âmbito do processo, a prefeitura alegou novamente que a desocupação do prédio era urgente e necessária por causa do risco de desabamento do edifício devido ao incêndio ocorrido. Para evitar o retorno das famílias, as entradas do prédio foram lacradas.

Ainda conforme o GauchaZH, a procuradora-chefe de Patrimônio e Domínio Público da Capital, Cristiane Catarina, defendeu as ações do poder municipal alegando que abrigos foram oferecidos a todas as famílias, mas algumas se recusaram a ir para os locais. Sobre a situação de Polycarpo, ela garantiu que fora oferecido um local para ele permanecer com os filhos, o que teria sido rejeitado. Assim como outras três famílias, ele se cadastrou para receber o auxílio-moradia da prefeitura. Em 30 dias, eles teriam uma resposta se receberiam recursos financeiros para poder pagar o aluguel de uma residência.

De acordo com o decreto municipal nº 19.885 de 2017, o valor do benefício é de R$ 500,00 (quinhentos reais) por beneficiário, pelo período de seis meses, possibilitada uma prorrogação por igual período, mediante justificativa fundamentada.

Conforme divulgado no blog Combate Racismo Ambiental, o Fórum Justiça (FJ) no Rio Grande do Sul, a partir dos fatos ocorridos com a Ocupação Baronesa, expediu ofícios no dia 26 de junho à Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJRS), ao Procurador Geral de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (MPRS), ao Prefeito de Porto Alegre e ao Diretor do Departamento Municipal de Habitação (DEMHAB). Os documentos apontam denúncias de inobservância do “Protocolo Interinstitucional para cumprimento dos mandados de reintegração de posse em Conflitos Urbanos Coletivos”, bem como do direito social à moradia (artigo 6º da CF88) e da mediação para se tentar solucionar o conflito. É destacado também que, se as famílias tivessem realmente que sair do imóvel (até o momento, sem nenhuma destinação), deveria ser cumprido o disposto na Lei Orgânica do Município, que estabelece a responsabilidade do Poder Executivo em realocá-las em área próxima (artigo 208, I).

Segundo publicação do G1, alguns integrantes da ocupação Baronesa voltaram a morar no imóvel após a reintegração de posse, mas, no dia 10 de julho, passaram por outra ação de despejo pelo poder público municipal. Desde então, algumas famílias se abrigaram em barracas na calçada em frente ao prédio. Entretanto, a Prefeitura de Porto Alegre iniciou, no dia 18 de julho, a demolição do prédio.

Para justificar o ato, a prefeitura alegou mais uma vez que o imóvel estava sendo demolido porque apresentava risco de desabamento e que o problema fora apontado após uma vistoria realizada por técnicos da Secretaria da Infraestrutura e Mobilidade Urbana do município e pela Defesa Civil, no dia 1º de julho. Conforme a administração municipal, havia riscos para os pedestres, e parte dos telhados já havia caído sobre a calçada. Os técnicos recomendaram, então, a demolição do imóvel, bem como cercamento do terreno e indicação para permuta da área.

Entretanto, o Sindicato dos Arquitetos no Estado do RS (SAERGS) criticou a ação da prefeitura e ressaltou que, apesar de não ser inventariado como patrimônio histórico, o prédio tinha valor arquitetônico por ser um projeto de 1926. A entidade também repudiou a retirada das famílias da calçada e a desocupação do imóvel.

Atualização: 24/07/2019

Cronologia

28 de março de 2019 – Famílias ocupam prédio abandonado pela Prefeitura de Porto Alegre e dão origem à “Ocupação Baronesa do Gravataí” no bairro da Cidade Baixa, em Porto Alegre/RS.

7 de maio de 2019 – Início do conflito com a Prefeitura Municipal de Porto Alegre, que, por meio do Departamento Municipal de Água e Esgoto (DMAE), suspende o fornecimento de água do imóvel.

21 de maio de 2019 – Comissão de Urbanização, Transporte e Habitação (CUTHAB) da Câmara Municipal de Porto Alegre realiza reunião para tratar da Ocupação Baronesa do Gravataí.

07 de junho de 2019 – Realização da reintegração de posse do casarão ocupado a pedido da prefeitura municipal de Porto Alegre.

26 de junho de 2019 – Fórum Justiça no Rio Grande do Sul expede ofícios de inobservância à reintegração de posse realizada pela prefeitura à Presidência do Tribunal de Justiça, ao Procurador Geral de Justiça, ao Prefeito de Porto Alegre/RS e ao Diretor do Departamento Municipal de Habitação (DEMHAB).

10 de julho de 2019 – Integrantes da ocupação, que retornaram ao imóvel, passam por uma segunda reintegração de posse pela Prefeitura Municipal de Porto Alegre.

18 de julho de 2019 – Poder público municipal inicia demolição do prédio.

 

Fontes

ABATI, L. Após reintegração de posse, famílias com crianças passarão a noite na rua em Porto Alegre. GauchaZH, Porto Alegre, 07 jun. 2019. Disponível em: http://bit.ly/2xskuZt. Acesso em: 03 jul. 2019.

ANDRADE, R. Ocupação Baronesa do Gravataí foi tema de debate na CUTHAB. Câmara Municipal de Porto Alegre, Porto Alegre, 21 maio 2019. Disponível em: http://bit.ly/326Yp0G. Acesso em: 03 jul. 2019.

APÓS reintegração de posse, Prefeitura de Porto Alegre inicia demolição de imóvel no bairro Menino Deus. G1 RS, Porto Alegre, 18 jul. 2019. Disponível em: https://glo.bo/2YKBS6T. Acesso em: 04 ago. 2019.

CASTRO, A. Divididas entre comer ou pagar o aluguel, famílias ocupam casarão na Cidade Baixa. Sul 21, Porto Alegre, 17 maio 2019. Disponível: http://bit.ly/2Y3o5wM. Acesso em: 16 jul. 2019.

COMO garantir o direito à moradia digna? Região Metropolitana de Porto Alegre – Déficit habitacional chega a 96 mil casas. Revista IHU On-line – Instituto Humanitas Unisinos, Porto Alegre, 6 de fev. 2019. Disponível em: http://bit.ly/2LCxogp. Acesso em: 19 jul. 2019.

FAMÍLIAS correm risco de despejo em Porto Alegre. Repórter Popular, Porto Alegre, 29 maio 2019. Disponível em: http://bit.ly/2Yv37mB. Acesso em: 03 jul. 2019.

FÓRUM RGP1. Em Defesa da Ocupação Baronesa. Sul 21, Porto Alegre, 06 jun. 2019. Disponível em: http://bit.ly/2Zc7wLI. Acesso em: 20 jul. 2019.

MARICATO, E. Direito à moradia é absoluto na Constituição, o à propriedade não. Entrevista concedida à Manuela Azenha. Revista IHU On-line – Instituto Humanitas Unisinos, Porto Alegre, 24 jan. 2017. Disponível em: http://bit.ly/2Grw2RC. Acesso em: 12 jul. 2019.

MORAES, J. Justiça cumpre reintegração de posse em prédio no bairro de Menino de Deus, na Capital. Rádio Guaíba. Porto Alegre, 07 jun. 2019. Disponível em: http://bit.ly/2XlO4dF. Acesso em: 03 jul. 2019.

SILVA, R.M. FJ oficia autoridades sobre a Ocupação Baronesa e práticas referentes às reintegrações de posse e garantia do direito de moradia. Combate Racismo Ambiental, Rio de Janeiro, 26 jun. 2019. Disponível em: http://bit.ly/2JnevKW. Acesso em: 03 jul. 2019.

VIEIRA, F. Preço do aluguel residencial fecha abril com alta de 0,36% em Porto Alegre. Jornal do comércio, Porto Alegre, 16 maio 2019. Disponível em: http://bit.ly/2Kwvqv8. Acesso em: 05 ago. 2019.

 

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