Espaço de produção agroecológica e resistência, o acampamento Ana Primavesi aguarda assentamento definitivo enquanto enfrenta a grilagem e os desafios no acesso à água e a alimentos
UF: DF
Município Atingido: Brasília (DF)
População: Agricultores familiares, Trabalhadores rurais sem terra
Atividades Geradoras do Conflito: Agroindústria, Agrotóxicos, Atuação de entidades governamentais, Especulação imobiliária
Impactos Socioambientais: Alteração no regime tradicional de uso e ocupação do território, Contaminação ou intoxicação por substâncias nocivas, Desmatamento e/ou queimada, Incêndios e/ou queimadas, Poluição do solo
Danos à Saúde: Doenças mentais ou sofrimento psíquico, Piora na qualidade de vida, Violência – ameaça, Violência – coação física, Violência psicológica
Síntese
O Acampamento Ana Primavesi, localizado em Brazlândia, região administrativa do Distrito Federal (DF), leva o nome da engenheira agrônoma pioneira da agroecologia no Brasil, e surgiu em 2020, quando cerca de 250 famílias ocuparam uma área da Secretaria do Patrimônio da União (SPU), na Fazenda Sálvia, entre Planaltina/DF e Sobradinho/DF. A ocupação buscava garantir moradia e produção de alimentos, mas enfrentou dificuldades de acesso à água e processo de reintegração de posse em favor da SPU.
Em abril de 2022, durante a Jornada Nacional de Luta pela Terra, cerca de 300 famílias ocuparam uma nova área, no Núcleo Rural do Rio Preto, administrada pela Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap). A escolha se deu pela concentração de contratos irregulares e vencidos em terras públicas, muitas vezes arrendadas ilegalmente a terceiros.
O objetivo era denunciar a grilagem e pressionar o governo para destinar as áreas ao Programa de Assentamento de Trabalhadores Rurais do Distrito Federal (Prat-DF), instituído por meio da Lei Distrital nº 1.572, com objetivo de propiciar acesso à terra, entre outras coisas, ao trabalhador rural.
A ação gerou forte reação de fazendeiros e grileiros, que bloquearam acessos e impediram a chegada de água e alimentos. Houve episódios de violência, como ataques com rojões e incêndios contra as famílias sem-terra, enquanto a Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) foi acusada de não intervir.
Apesar de decisão judicial do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF), assinada pelo juiz Carlos Frederico Maroja de Medeiros, reconhecer a ilegalidade da posse privada, outra ordem, do mesmo órgão, assinada pelo desembargador Alfreu Machado, determinou o despejo das famílias em favor do grileiro Silvio Robaert. Após o despejo, as famílias retornaram provisoriamente à área da SPU, em condições precárias, sem acesso adequado a água e serviços básicos.
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) denunciou a conivência do Estado com interesses privados e reafirmou a luta pela destinação de terras públicas para a reforma agrária, destacando que a região é marcada pela especulação imobiliária e pelo avanço do agronegócio.
Em agosto de 2023, cerca de 200 famílias ocuparam uma nova área de 75 hectares em Brazlândia, pertencente à antiga Fundação Assistencial dos Servidores do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Fassincra), e sob gestão do Incra. Desde então, mediante a acordos e aguardando assentamento definitivo, o Acampamento Ana Primavesi vem se consolidando como espaço de produção agroecológica e resistência, com mutirões, formações e parcerias com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e a Teia dos Povos do Cerrado.
Contexto Ampliado
No dia 3 de outubro celebra-se o Dia Nacional da Agroecologia no Brasil. Essa data foi escolhida por ser o aniversário de Ana Primavesi, engenheira agrônoma austríaca radicada no Brasil e reconhecida como uma das pioneiras da agroecologia no País. Ao longo de quase um século de vida, dedicou-se ao estudo do manejo ecológico do solo, defendendo sua compreensão como um sistema vivo e essencial para a agricultura sustentável (Alcântara, 2021).
Em um ambiente majoritariamente masculino, destacou-se como referência científica e prática na valorização da agricultura familiar camponesa e na crítica à monocultura e ao agronegócio. Sua trajetória e atuação junto a comunidades rurais e assentamentos a tornaram um símbolo para movimentos sociais do campo, sendo homenageada em diferentes iniciativas (Alcântara, 2021). Exemplo disso é o Acampamento Ana Primavesi, localizado em Brazlândia/DF, que leva seu nome como forma de reconhecer sua contribuição à agroecologia.
O Acampamento Ana Primavesi organizou-se em 2020, inicialmente na região da Fazenda Sálvia, localizada entre Planaltina/DF e Sobradinho/DF, em área pública da Secretaria do Patrimônio da União (SPU) (MST, 2022). Sem condição de prosseguir na área devido à dificuldade de acesso à água na região e à reintegração de posse em favor da SPU, as cerca de 250 famílias que ali viviam organizaram uma nova ocupação no final de abril de 2022.
Junto ao Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadores Rurais Sem Teto (MST), durante a Jornada de Luta pela Terra, em Defesa da Reforma Agrária Popular de abril de 2022, que tinha como lema “Por Terra, Teto e Pão”, realizaram uma ocupação no Núcleo Rural do Rio Preto, em Planaltina/DF, em terras públicas administradas pela Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap) (MST, 2022).
Essa região foi escolhida devido à expansão do agronegócio, que impõe monoculturas de milho e soja em detrimento da abundância de água e biodiversidade do Cerrado. Segundo a Direção Estadual do MST do Distrito Federal e Entorno (MST/ DF):
“Nós ocupamos ali porque essa região tem mais de 1.300 contratos de uso de terras públicas da Terracap, que é a agência de terras do DF, dados concretos mostram que a maior parte deles são contratos ilegais, vencidos! Não há vistoria, há muito arrendamento e sublocação das terras pelos cessionários originais para terceiros, o que configura grilagem, e a terra segue sem cumprir sua função social, ambiental e produtiva. Os cessionários estão vivendo de renda de terras que são públicas, do ‘rentismo’, como a gente chama.” (MST, 2022)
A ocupação durou sete dias e tinha como objetivo que a Terracap e o governo do Distrito Federal (GDF) identificassem áreas em situação similar e realizassem uma revisão dos contratos de concessão das terras na área, para que as terras que não estivessem legalmente ocupadas fossem colocadas à disposição do Programa de Assentamento de Trabalhadores Rurais do Distrito Federal (Prat/DF). Portanto, a ocupação buscava denunciar a especulação imobiliária por parte de grileiros e retomar a criação de novos assentamentos (MST, 2022).
Na madrugada de 30 de abril de 2022, cerca de 300 famílias do MST/DF ocuparam a área pública em questão, vinculada à Terracap (Quintino, 2022). No entanto, logo em seguida, fazendeiros e grileiros da região bloquearam a via que dá acesso ao local, impedindo a chegada de água e alimentos para as famílias do MST. Ao longo do dia 1º de maio de 2022, o acesso de insumos para os sem-terra e a via continuavam interditados.
Em 2 de maio de 2022, houve uma reunião do MST/DF com a Casa Civil do Distrito Federal, a Defensoria Pública da União (DPU) e a Secretaria da Agricultura do Distrito Federal (Seagri/DF), além de parlamentares e representantes da Terracap. As principais pautas da reunião foram o desbloqueio da via que dava acesso à ocupação e a permanência das famílias no local (Quintino, 2022).
Na ocasião, foi acordado que a Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) deveria desobstruir o acesso para que os alimentos chegassem à ocupação, mas o acordo não foi cumprido (Vilela, 2022a). Em nota, após a reunião, o MST/DF denunciou o governo e a PMDF por cooperarem com o interesse dos grileiros no território (Vilela, 2022a).
Na manhã de 3 de maio de 2022, um ato na Ocupação Ana Primavesi contou com dezenas de pessoas ligadas a movimentos populares e organizações da sociedade civil, além da deputada federal Érica Kokay (PT/DF, 2010-2026). Procurando mediar a situação, a deputada, após conversar com os grileiros e fazendeiros que bloqueavam o acesso, afirmou que:
“A ideia é que a Terracap, que é a verdadeira dona dessas terras, que são públicas, disponibilize uma outra área para que as famílias sem-terra possam ficar acampadas de forma temporária, até ter o seu assentamento definitivo por meio de um programa de reforma agrária.” (Vilela, 2022a)
Na parte da tarde, houve uma reunião na Secretaria de Agricultura do Distrito Federal (Seagri/DF). A reunião contou com a participação da DPU e da Defensoria Pública do Distrito Federal (DPDF); dos mandatos da deputada distrital Arlete Sampaio (PT/DF, 2019-2023), representada por Gabriel Magno (PT/DF, 2023-2027) e da deputada federal Érica Kokay (PT/DF, 2010-2026); de representantes do MST/DF; de produtores rurais; e de representantes da Terracap e da Secretaria de Estado de Relações Institucionais e Sociais do Distrito Federal (Serins/DF). Na mesa de negociação, Gabriel Magno solicitou a garantia de entrega de água e alimentos para as famílias que estavam na ocupação (Brasil de Fato, 2022).
Como resultado das negociações, os fazendeiros e grileiros permitiram a entrada de água e leite para as crianças, mas seguiram vetando a passagem de gêneros alimentícios (Vermelho, 2022). No entanto, no início da noite, os responsáveis pelo bloqueio das vias atearam fogo nas redondezas e ameaçaram as famílias sem terra. Em nota, o MST/DF afirmou que a PMDF não atuou para reprimir a ação dos fazendeiros (Brasil de Fato, 2022).
Em 4 de maio de 2022, a Justiça do Distrito Federal negou a reintegração de posse solicitada por Silvio Robaert, fazendeiro que cultivava milho e soja no local, junto ao seu filho, logo após a ocupação no dia 30 de abril de 2022 (G1, 2022). Na decisão, assinada pelo juiz Carlos Frederico Maroja de Medeiros, da Vara de Meio Ambiente, Desenvolvimento Urbano e Fundiário do Distrito Federal, consta que não houve comprovação de legalidade na posse por parte dos fazendeiros (Vilela, 2022b). Segundo o juiz:
“A parte autora afirma que ‘a situação da ocupação do imóvel junto aos órgãos público (Terracap, Seagri/DF) é absolutamente legal’, afirmação que se choca com a constatação da existência de procedimento de regularização fundiária. Ora, não se ‘regulariza’ o que é absolutamente legal – a necessidade de regularização denota, a rigor, situação de ilegalidade, que é exatamente o que deve ser regularizado.” (Vilela, 2022b)
Segundo a Terracap, o imóvel em questão está localizado em gleba que é objeto de requerimento de regularização fundiária. O requerente original faleceu em 2015, sendo que, em 2012, o Certificado de Legítimo Ocupante (CLO) havia sido emitido em seu benefício. Seus herdeiros seguiram com o interesse na regularização da área e a arrendaram para o atual ocupante, Silvio Robaert (Vilela, 2022c).
No entanto, o contrato entre o falecido arrendatário e a Terracap proíbe arrendamento, cessão, empréstimo, sublocação ou transferência de todo o imóvel ou parte dele. Sendo assim, a ocupação atual foi considerada nula pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDF) (Vilela, 2022c).
Na decisão que nega a reintegração de posse, o juiz Carlos Frederico Maroja de Medeiros afirma:
“Portanto, a cessão de direitos outorgada pelos sucessores do arrendatário afigura-se nula de pleno direito, posto que violadora da expressa disposição aposta no contrato administrativo, o que impede a consideração da continuidade da posse, posto que fundadas em causas distintas. Assim, a ocupação do imóvel público pelos autores é praticamente tão recente quanto o ato de esbulho afirmado na demanda.” (Vilela, 2022c)
Em sua defesa, Silvio Robaert afirmou em entrevista concedida ao portal G1 que a terra fora adquirida recentemente para que o filho pudesse morar e trabalhar, e garantiu existir um contrato de arrendamento com a Terracap. Por isso, reclamava da insegurança jurídica em relação às áreas rurais em Brasília (G1, 2022). Segundo vídeo publicado em rede social:
“A gente tinha produção de soja, temos o milho na safrinha. Estávamos em recuperação dos tanques de peixe e começando a reforma da casa sede, tanto que hoje estamos dormindo no chão, fora, perto da casa do funcionário, pra termos um abrigo em função dessa invasão. É frustrante, humilhante demais.” (G1, 2022)
Ao longo do dia 4, as ameaças e os ataques às famílias sem-terra continuaram, e uma mulher apresentou quadro de hipertensão (Ferreira, 2022). A direção do MST/DF criticou a omissão dos órgãos competentes, afirmando que, “mesmo com o MST buscando uma negociação junto ao governo para resolver a questão, os fazendeiros seguem com os ataques” (Vermelho, 2022).
Em 5 de maio de 2022, o TJDF concedeu liminar, em ação movida por Silvio Robaert, determinando que os fazendeiros e grileiros desbloqueassem a via que dá acesso à ocupação Ana Primavesi (Vilela, 2022c). O juiz Carlos Frederico Majora de Medeiros afirmou que nenhum particular tem direito de bloquear as vias de circulação, limitando o direito de ir e vir.
Segundo a decisão, o grupo teria 72h para que as autoridades policiais realizassem o desbloqueio do acesso. No documento, determinou que:
“Em face do exposto, comino cautelarmente à parte ré a obrigação de abster-se de realizar obstrução de vias ou constrangimentos físicos diretamente às pessoas dos autores, e determino a expedição de ofício, com urgência, ao DF Legal e à Polícia Militar do Distrito Federal, para que efetuem, em até 72h, a desobstrução da via mencionada na demanda.” (Vilela, 2022c)
Ainda no dia 05, em retaliação, fazendeiros e grileiros da região, bem como seus funcionários, realizaram um cerco às famílias sem-terra com caminhonetes e tratores, em uma tentativa de retirar os ocupantes à força. Segundo vídeos divulgados pelo MST/DF, esse grupo ateou fogo na fazenda ocupada e soltou rojões em direção às famílias (Vilela, 2022c). Como consequência, pessoas acampadas foram vítimas de queimaduras e ferimentos devido aos ataques.
Na ocasião, o MST/DF postou vídeos em suas redes sociais do incêndio e de uma mulher desmaiada, afirmando que os “fazendeiros” e seus funcionários atearam fogo próximo ao local como forma de intimidação (G1, 2022). Além disso, uma mulher ficou ferida e outra teve queimaduras no corpo devido aos rojões disparados pelos grileiros e fazendeiros (Ferreira, 2022).
Silvio Robaert registrou ocorrência sobre o incêndio na Polícia Civil (PCDF), afirmando não ser responsável por atear fogo no local e culpabilizando os assentados. A PMDF alegou, por nota, que o fogo teria sido ateado pelos assentados por volta das 13h30 daquele dia (G1, 2022).
Ainda no dia 5 de maio de 2022, o Sindicato dos Professores no Distrito Federal (Sinpro/DF) lançou nota de repúdio contra o bloqueio do acesso à ocupação (Sallorenzo, 2022). Segundo a nota, “o Sindicato dos Professores no Distrito Federal repudia veementemente as atitudes criminosas de fazendeiros que bloqueiam o acesso à ocupação Ana Primavesi, localizada no núcleo rural Rio Preto, em Planaltina” (Sallorenzo, 2022). Além disso, denunciaram os ataques às famílias sem-terra que ocorreram no dia anterior.
No dia 6 de maio de 2022, o desembargador Alfeu Machado, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF), determinou o despejo imediato das famílias acampadas em favor da reintegração de posse de Silvio Robaert (Ferreira, 2022). Segundo Adonilton Rodrigues, da direção estadual do MST, “ao contrário dos fazendeiros, que não cumpriram a ordem judicial de desobstruir a via de acesso à ocupação, sairemos para, inclusive, demonstrar que, de fato, seguimos a lei” (Ferreira, 2022).
Na ocasião, o dirigente também afirmou que o Poder Judiciário e a Polícia Militar estariam se mostrando mais favoráveis a garantir o direito à propriedade privada dos fazendeiros do que garantir o direito à alimentação das famílias (Ferreira, 2022).
Segundo entrevista com a direção do MST/DF, a semana da ocupação “foi uma semana de muita fome, de negação do estado. Ao mesmo tempo, ficou nítido que a polícia, o estado, estavam ao lado deles [dos fazendeiros], então foi muito complicado, muito difícil mesmo. Não tem nada pior do que você, num espaço público, ser negado a receber comida, a poder sair e voltar de um espaço público, né, e tudo isso com a conivência do estado e do governo federal, que mostrou de que lado eles estão, o que é que eles colocam como condução e desenvolvimento da sociedade, algo muito triste, muito problemático.” (MST, 2022)
Ao serem despejados da área ocupada no Núcleo Rural do Rio Preto, as famílias sem-terra tiveram que voltar à área provisória que ocupavam desde 2020, e que pertence a SPU (CPT, 2022). Na ocasião, a direção do MST/DF explicou que os fazendeiros “conseguiram reintegração de posse, mas eles não têm documento da terra – há uma incompatibilidade. Não há como eles comprovarem que são donos dessa terra porque o dono dessa terra é o Estado” (CPT, 2022).
Além disso, reafirmou o compromisso da Ocupação Ana Primavesi com a reivindicação do acesso à terra por meio do Programa de Assentamento de Trabalhadores Rurais (Prat/DF) e criticou a grilagem de terras públicas e a especulação imobiliária em curso na região (CPT, 2022).
Em 17 de maio de 2022, a Direção Estadual do MST/DF concedeu entrevista para a Comissão Pastoral da Terra – Goiás (CPT/GO) sobre a situação do Ana Primavesi. Na ocasião, afirmou que:
“Essas famílias foram despejadas e continuam na insalubridade. Elas já estão juntas acampadas desde 2020 e essa área para onde retornaram agora é uma área muito difícil de se viver, não tem água, já houve uma reintegração de posse anterior, e agora elas dependem que a gente possa, enquanto organização, encontrar outra área para onde ir, porque não adianta ficar pulando de um lado para outro sem ter a perspectiva de assentamento ou de seu reconhecimento como famílias acampadas. Elas têm uma identidade de coletivo, de comunidade, e querem encontrar uma área onde elas tenham horizonte, perspectiva de construir algo. A situação ambiental é calamitosa porque são áreas ambientalmente muito boas, porque é uma área de recarga aquífera, de manancial, de reserva ambiental, que são exploradas na lógica que o agronegócio opera, com pulverização aérea de agrotóxicos e utilização de adubação química, monocultivo de produção, sem diversidade. Você pode pesquisar sobre a COARP, Cooperativa dos Produtores do Rio Preto (DF). Eles dizem qual é a linha: não é a de produzir comida para o povo, é a de produzir commodities, com a finalidade de gerar lucro e renda. Então não cumpre sua função social, nem sua função ambiental e nem sua função produtiva para o DF.” (MST, 2022)
As famílias permaneceram nas terras públicas da SPU, às margens de uma rodovia da Fazenda Sálvia, entre Planaltina e Sobradinho, entre o despejo e meados de 2023. Em junho de 2023, em uma reunião do MST/DF com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a SPU, ficou acordada em negociação uma solução temporária para as famílias do acampamento Ana Primavesi.
Em 19 de agosto de 2023, cerca de 200 famílias ocuparam uma área abandonada, de 75 hectares, que pertence à Fundação Assistencial dos Servidores do Incra (Fassincra) em Brazlândia/DF (Campos, 2023). De acordo com o MST, a ideia é que esse acampamento provisório na Fassincra fosse um acampamento popular produtivo, no qual seriam plantados abóbora, arroz, feijão e outros gêneros alimentícios (Dutra, 2023).
Sobre a ocupação, o Incra afirmou que o caso será atribuído ao Programa Nacional de Reforma Agrária. Segundo nota:
“A Fundação Fassincra foi extinta, e com isso, atualmente, as áreas estão sob gestão do Incra. São 75 ha, incluindo a reserva legal. Caso haja destinação das áreas para o Programa Nacional de Reforma Agrária a seleção de famílias será feita na forma da lei. A Superintendência do Incra no Distrito Federal e Entorno já está em contato com os ocupantes na busca de uma solução para a questão.” (Dutra, 2023)
Em dezembro de 2023, sem-terras do Acampamento Ana Primavesi participaram da Formação-Ação de Agentes Populares de Saúde do Campo com ênfase em Agroecologia do Distrito Federal e Entorno, coordenada pelo Programa de Promoção de Saúde, Ambiente e Trabalho (Psat) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Brasília, em parceria com o MST e outros movimentos sociais do Campo, Floresta e das Águas (Fiocruz Brasília, 2023).
Maira Moreira, do Acampamento Ana Primavesi, afirmou que essa iniciativa fortalece o coletivo e que “é preciso cada vez mais ocuparmos esses lugares, para cultivarmos uma vida saudável, esse é um direito nosso” (Fiocruz Brasília, 2023).
Em 12 de janeiro de 2025, em parceria com a Teia dos Povos do Cerrado, o acampamento promoveu o Mutirão de Transição Agroecológica do Acampamento Ana Primavesi. Na ocasião, realizaram plantio de feijão guandu consorciado e de Plantas Alimentícias Não Convencionais (Pancs). Além disso, realizaram uma roda de conversa com o tema “Reforma Agrária no contexto da Bacia do Descoberto” (Baobáxia, 2025).
Atualizada em setembro 2025.
Cronologia
2012 – Emissão do Certificado de Legítimo Ocupante (CLO) em benefício do falecido arrendatário da Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap).
2015 – Falecimento do arrendatário e gestão da gleba da Terracap por seus herdeiros.
2020 – Formação do Acampamento Ana Primavesi, organizado pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), na região da Fazenda Sálvia, entre Planaltina/DF e Sobradinho/DF, em terras públicas da Secretaria de Patrimônio da União (SPU).
2022 – Reintegração de posse em favor da SPU e despejo dos sem-terra do Ana Primavesi.
30 de abril de 2022 – Ocupação de terras públicas pertencentes à Terracap, no núcleo rural de Rio Preto, em Planaltina/DF, por cerca de 300 famílias sem-terra durante a Jornada de Luta Pela Terra e em Defesa da Reforma Agrária Popular.
– Bloqueio do acesso às terras ocupadas por grileiros e fazendeiros da região, impedindo a entrada de água e alimentos para os sem-terra.
1º de maio de 2022 – Manutenção do bloqueio, impedindo acesso de água e alimentos para as famílias.
02 de maio de 2022 – Reunião do MST/DF com a Casa Civil do DF, a Defensoria Pública da União (DPU) e a Secretaria da Agricultura do Distrito Federal (Seagri/DF), além de parlamentares e representantes da Terracap, solicitando a entrada de água e alimentos e a permanência das famílias no local. O acordo firmado, de que a Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) desobstruísse a área, não é cumprido.
03 de maio de 2022 – Ato no Acampamento Ana Primavesi com a presença de dezenas de pessoas de movimentos populares, organizações da sociedade civil e da deputada federal Érica Kokay (PT/DF).
– Reunião na Secretaria de Agricultura do Distrito Federal (Seagri/DF) com a DPU; a Defensoria Pública do Distrito Federal (DPDF); a direção do MST/DF; a deputada distrital Arlete Sampaio (PT/DF, 2019–2023), representada por Gabriel Magno (PT/DF, 2023 – 2027); a deputada federal Érica Kokay (PT/DF, 2010-2026); representantes de produtores rurais locais; da Secretaria de Estado de Relações Institucionais e Sociais do Distrito Federal (Serins/DF) e da Terracap.
– Fazendeiros e grileiros permitem a entrada de água e leite para as crianças após negociações, mas o acesso a comidas segue bloqueado.
– Fazendeiros, grileiros e seus funcionários ateiam fogo nas redondezas e ameaçam famílias.
04 de maio de 2022 – O juiz Carlos Frederico Maroja de Medeiros, da Vara de Meio Ambiente, Desenvolvimento Urbano e Fundiário do Distrito Federal, nega a reintegração de posse solicitada por Silvio Robaert.
– Fazendeiros, grileiros e seus funcionários seguem ameaçando as famílias sem-terra. Mulher sem-terra apresenta quadro de hipertensão devido aos conflitos.
05 de maio de 2022 – O juiz Carlos Frederico Maroja de Medeiros concede liminar determinando que fazendeiros desbloqueiem a via que dá acesso ao Acampamento Ana Primavesi em até 72h.
– Fazendeiros, grileiros e seus funcionários ateiam fogo na fazenda, fazem um cerco às famílias sem-terra com caminhonetes e tratores, e lançam rojões em direção às famílias. Sem-terras são feridos e queimados devido aos ataques.
– Sindicato dos Professores do Distrito Federal (Sinpro/DF) divulga nota de repúdio contra as atitudes dos fazendeiros ao impedir o acesso à ocupação.
06 de maio de 2022 – O desembargador Alfeu Machado, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDF), determina o despejo das famílias sem-terra em favor da reintegração de posse de Silvio Robaert.
Maio de 2022 – As famílias sem-terra retornam às terras da SPU, às margens de uma rodovia da Fazenda Sálvia.
17 de maio de 2022 – A Direção Estadual do MST concede entrevista à Comissão Pastoral da Terra – Goiás (CPT/GO) sobre a situação do Acampamento Ana Primavesi.
Junho de 2023 – Reunião do MST/DF com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a SPU para acordar uma solução temporária para as famílias do Acampamento Ana Primavesi.
19 de agosto de 2023 – Ocupação de área abandonada pertencente à antiga Fundação Assistencial dos Servidores do Incra (Fassincra), sob gestão do Incra, na região de Brazlândia/DF, por cerca de 200 famílias do Ana Primavesi.
Dezembro de 2023 – Participação de sem-terras do Ana Primavesi na Formação-Ação de agentes populares de Saúde do Campo com ênfase em Agroecologia do Distrito Federal e Entorno, coordenado pelo Programa de Promoção da Saúde, Ambiente e Trabalho (Psat) da Fiocruz Brasília, em parceria com o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) e os movimentos sociais do Campo, Floresta e das Águas.
12 de janeiro de 2025 – Mutirão de Transição Agroecológica no Acampamento Ana Primavesi, com apoio da Teia dos Povos do Cerrado.
Fontes
2º MUTIRÃO da Teia Cerrado – Ana Primavesi – Plantas. Baobáxia, 2025. Disponível em: https://shre.ink/tmQb. Acesso em: 04 set. 2025.
ACAMPAMENTO Ana Primavesi: entrevista traz desafios da região. Página do MST, 17 maio 2022. Disponível em: https://shre.ink/tmQr. Acesso em: 27 ago. 2025.
ALCÂNTARA, Fernanda. Um ano sem Ana Primavesi, pioneira da agroecologia. Página do MST, 05 jan. 2021. Disponível em: https://shre.ink/tmQf. Acesso em: 02 set. 2025.
BRASIL. Ministério da Saúde – MS. Fundação Oswaldo Cruz em Brasília. Fiocruz Brasília forma novos agentes populares de saúde do campo. Fiocruz Brasília, 20 dez. 2023. Disponível em: https://shre.ink/tmQn. Acesso em: 27 ago. 2025.
CAMPOS, Giovanna. MST ocupa terreno abandonado no Distrito Federal. Jornal Opção, Goiânia, 21 ago. 2023. Disponível em: https://shre.ink/tmQW. Acesso em: 27 ago. 2025.
DF: FAZENDEIROS ameaçam famílias sem-terra e ateiam fogo em área próxima à ocupação. Brasil de Fato, Brasília, 4 maio 2022. Disponível em: https://shre.ink/tmQQ. Acesso em: 27 ago. 2025.
DUTRA, Francisco. MST ocupa área de 75 hectares do Incra no DF. Metrópoles, Brasília, 21 ago. 2023. Disponível em: https://shre.ink/tmQa. Acesso em: 27 ago. 2025.
FERREIRA, Janelson. Justiça ordena despejo de famílias em ocupação do MST no DF. Página do MST, 06 maio 2022. Disponível em: https://shre.ink/tmQl. Acesso em: 02 set. 2025.
GOVERNO do Distrito Federal despeja 250 famílias acampadas beneficiando grileiros de terras públicas. CPT, 14 maio 2022. Disponível em: https://shre.ink/tmkY. Acesso em: 02 set. 2025.
GRILEIROS ateiam fogo em acampamento de Sem Terras. Vermelho, 05 maio 2022. Disponível em: https://shre.ink/tmk6. Acesso em: 02 set. 2025.
JUSTIÇA nega reintegração de fazendeiros em terras ocupadas pelo MST. G1 Distrito Federal, 05 maio 2022. Disponível em: https://shre.ink/tmk0. Acesso em: 2 set. 2025.
QUINTINO, Roberta. MST denuncia ataque de grileiros em ocupação na região de Planaltina, no Distrito Federal: a área foi bloqueada impedindo o acesso a alimentos e água. Brasil de Fato, Brasília, 02 maio 2022. Disponível em: https://shre.ink/tmkw. Acesso em: 27 ago. 2025.
SALLORENZO, Letícia. Sinpro repudia ato criminoso de fazendeiros contra MST. Sinpro-DF, Brasília, 05 maio 2022. Disponível em: https://shre.ink/tmkN. Acesso em: 27 ago. 2025.
VILELA, Pedro Rafael. Ato político negocia desbloqueio de acesso em ocupação do MST no Distrito Federal. Brasil de Fato, Brasília, 03 maio 2022. Disponível em: https://shre.ink/tmki. Acesso em: 27 ago. 2025.
VILELA, Pedro Rafael. Justiça nega pedido de reintegração de posse contra famílias do MST no DF. Brasil de Fato, Brasília, 04 maio 2022. Disponível em: https://shre.ink/tmkC. Acesso em: 27 ago. 2025.
VILELA, Pedro Rafael. Justiça determina que fazendeiros desbloqueiem acesso à ocupação do MST no DF. Brasil de Fato, Brasília, 05 maio 2022. Disponível em: https://shre.ink/tmkK. Acesso em: 27 ago. 2025.