Ribeirinhos e comunidades de fundos e fechos de pasto de Correntina lutam pelo direito à água e contra o avanço do agronegócio sobre o Cerrado

UF: BA

Município Atingido: Correntina (BA)

Outros Municípios: Cocos (BA), Jaborandi (BA), Santa Maria da Vitória (BA), Urandi (BA)

População: Agricultores familiares, Comunidades de Fecho e Fundo de Pasto, Comunidades urbanas, Geraizeiros, Posseiros, Ribeirinhos

Atividades Geradoras do Conflito: Agroindústria, Agrotóxicos, Atuação de entidades governamentais, Atuação do Judiciário e/ou do Ministério Público, Monoculturas, Pecuária, Políticas públicas e legislação ambiental

Impactos Socioambientais: Alteração no ciclo reprodutivo da fauna, Alteração no regime tradicional de uso e ocupação do território, Assoreamento de recurso hídrico, Contaminação ou intoxicação por substâncias nocivas, Desertificação, Desmatamento e/ou queimada, Erosão do solo, Falta / irregularidade na autorização ou licenciamento ambiental, Falta / irregularidade na demarcação de território tradicional, Poluição de recurso hídrico, Poluição do solo

Danos à Saúde: Contaminação por agrotóxico, Desnutrição, Doenças não transmissíveis ou crônicas, Insegurança alimentar, Piora na qualidade de vida, Violência – ameaça, Violência – coação física, Violência – lesão corporal, Violência psicológica

Síntese

A captação intensiva de água voltada para abastecer as empresas do agronegócio atinge diversas populações, especialmente ribeirinhos e comunidades de Fundos e Fechos de Pasto do município de Correntina, na região oeste da Bahia. Essa região é conhecida pelo nome de “Além São Francisco”, ou “Berço das Águas”, e está situada no bioma do Cerrado, de acordo com o Instituto Chico Mendes de Conservação e Biodiversidade (ICMBio).

A partir da década de 1970, empresas da agroindústria se instalaram na região, incentivadas pelo Estado a modernizar o campo e produzir para exportação. Contudo, estas empresas também desencadearam diversos conflitos ao tentar expulsar comunidades que viviam e produziam ali há séculos.

Projetos financiados pelo Estado e pelo capital internacional, como o Programa de Cooperação Nipo-Brasileira para o Desenvolvimento dos Cerrados (Prodecer) e o Matopiba – acrônimo que denomina a região que se estende por territórios de quatro estados do Brasil, formado com as primeiras sílabas de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia – foram grandes responsáveis pela expansão da fronteira agrícola na região.

Empresas foram autorizadas pelo Governo do Estado da Bahia a instalar piscinões, por meio de perfurações de grandes poços, e contribuíram para diminuir o volume de águas dos rios que abastecem a bacia do Rio Corrente. Como denomina o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), trata-se de um processo de “grilagem das águas”.

Vale salientar que no oeste da Bahia habitam comunidades tradicionais como as chamadas fundo e fecho de pasto e geraizeros. Desde a promulgação da Constituição de 1988 até 2023, de acordo com a Associação dos Advogados/as de Trabalhadores/as Rurais (AATR), de aproximadamente 1.500 comunidades de fundo e fecho de pasto que existem no estado, apenas 130 tiveram seus títulos de terra emitidos pela Secretaria de Promoção e Igualdade Racial do Estado da Bahia (Sepromi/BA), enquanto 192 estavam em processo de certificação.

Valdivino Rodrigues, integrante da Articulação Estadual de Fundo e Fecho de Pasto da Bahia (ASS), defende que a ausência de regularização fundiária tem agravado os conflitos fundiários e socioambientais, especialmente no oeste, intensificando a violência devido à disputa por territórios, avanço da grilagem, grandes empreendimentos, agronegócio, mineração e projetos de energia (Brasil de Fato, 2023).

Consequentemente, as opressões e a alteração no modo de vida dos ribeirinhos, provocadas pelas constantes secas, foram tão rigorosas que, após diversas tentativas de pressionar o Estado a considerar as demandas das populações afetadas, os moradores do município de Correntina realizaram protestos e manifestações nas terras do Grupo Igarashi, acusado de contribuir para secar o rio Arrojado por meio da retirada de grandes volumes de água, visando a construção de piscinões.

Por isso, a população local luta de forma exemplar, e a resistência do povo de Correntina tornou-se um paradigma na luta pela água no Brasil, chegando a envolver mais de 1/3 dos quase 35 mil habitantes do município em manifestações populares. Para enfrentar o avanço do agronegócio sobre o Cerrado, as populações têm se organizado de diversas formas, como por meio de associações de fundo e fecho de pasto e de coletivos de povos geraizeiros.

Organizações como a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e a AATR têm apoiado a luta das comunidades por meio da amplificação de suas denúncias e ao apontar o Estado baiano e brasileiro como incentivadores e promotores de um modelo de desenvolvimento excludente, na medida em que concedem outorgas hídricas e licenças ambientais para projetos hídricos do agronegócio.

A urgência se dá devido ao secamento das principais fontes de água na região. Um mapeamento realizado entre 2023 e 2024 em parceria com a CPT, organizações comunitárias e pesquisadores da Universidade Federal Fluminense (UFF) e do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Baiano (IF-Baiano/Campus Valença) revelou que, nas sub-bacias hidrográficas dos rios Carinhanha e Corrente, já existem 3.050 corpos d’águas secos, incluindo córregos, riachos, nascentes e cabeceiras de rios (CPT, 2024).

 

Contexto Ampliado

No Brasil, grandes projetos de irrigação do campo que beneficiam a expansão do agronegócio têm levado à expropriação das terras indígenas, quilombolas, ribeirinhas e camponesas. No caso da região oeste da Bahia, este processo é estimulado pelo Estado brasileiro desde a ditadura militar, com o Programa de Cooperação Nipo-Brasileira para o Desenvolvimento do Cerrado (Prodecer), concebido entre os dois países  (Brasil e Japão) a partir de 1974, para o desenvolvimento do setor agrícola.

Também ficou conhecido como Projeto Cerrado ou Jica (Japan Internacional Cooperation Agency), segundo análise de Paulo Brandão (2010), Vera Lúcia Salazar Pessôa e Maria Erlan Inocêncio (2014), entre outros. O objetivo do projeto era impor uma agricultura “moderna” no interior do País com o uso intensivo de máquinas, insumos e tecnologias avançadas para estimular o avanço do capitalismo no campo (agrotóxicos, fertilizantes, transgênicos etc.).

De acordo com Pessôa e Inocêncio (2014), o Prodecer efetivamente começou a ser implementado em 1980 e evoluiu em três fases distintas. Começando em Minas Gerais (Prodecer I), o projeto foi expandido em 1987 para incorporar áreas de Bahia, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul (Prodecer II). A partir de 1995, foi expandido para Maranhão e Tocantins (Prodecer III).

No entanto, o Programa beneficiou apenas 717 produtores, que adquiriram um total de 345 mil hectares de terra em sete estados. Por conseguinte, ao priorizar predominantemente produtores de grande escala em vastas extensões de terras do Cerrado, o Prodecer aprofundou o histórico processo de concentração de terras no campo brasileiro.

Naquela época, os objetivos desenvolvimentistas eram baseados em “desbravar” o interior do País, como se este fosse um espaço vazio de gentes, culturas e produção agrícola. Desconsiderava-se, portanto, que os povos nativos e tradicionais, especialmente da Região Oeste da Bahia, detêm um amplo e profundo conhecimento dos ciclos biogeológicos daqueles espaços.

De acordo com Clóvis Caribé, em entrevista para a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV), em 2017, o desbravamento ocorreu sem consulta das populações locais, como se nada nem ninguém, a não ser a terra (vista como um espaço a ser explorado tecnologicamente), estivesse por lá:

“O Estado considerava esses espaços ‘vazios’ e fez a transferência de produtores do sul do Brasil para lá, regularizou as terras e repassou para as cooperativas. O Estado fundou um esquema de cooperação técnica e pesquisa e, não à toa, o Prodecer financiou a criação da Embrapa [Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária]”.

Consequentemente, segundo Eldo Barreto, da Associação Comunitária dos Pequenos Criadores do Fecho de Pasto de Clemente, localizada em Correntina (BA), a partir da década de 1970, intensificou-se o avanço da grilagem de terras na região:

“Grilagem dos gerais, das terras soltas, de uso comum, de posse das famílias camponesas. É neste momento que os criadores, camponeses, se organizam entre si e resolvem delimitar suas áreas de forma a dar visibilidade à posse, aproveitando os riachos, córregos, rios e morros, completando o fechamento com a cerca de arame farpado, formando assim os vários Fechos de Pasto de uso coletivo”.

Segundo o Relatório “Comunidades de Fechos de Pasto” (2017), os “Fechos de Pasto” da região do Vale do rio Arrojado são grandes extensões de terra de uso comum por famílias e comunidades camponesas, localizadas nos “Gerais”. São também resultado das lutas e resistências dos camponeses contra os grileiros e a burguesia agrária:

“Os ‘Fechos de pasto’ são uma condição necessária para garantir o cerrado em pé, preservado, e evitar o empobrecimento massivo dos camponeses da região, uma vez que a economia de maior relevância é a criação de gado, o que sem o acesso às áreas coletivas a atividade estaria inviabilizada”.

Para estas comunidades e demais moradores destas regiões, outro projeto que os impacta sobremaneira é o Matopiba, também chamado de Mapitoba. O termo é uma combinação das iniciais dos estados do Maranhão, Piauí, Tocantins e Bahia. Trata-se de uma grande região do cerrado, de 73 milhões de hectares, onde se concentra pesquisa e exploração pelo capital estrangeiro direcionado ao agronegócio.

Em 2013, a Embrapa começou a trabalhar formalmente na delimitação deste espaço, consagrando-o como uma região estratégica política e economicamente para o País, devido às pressões dos integrantes da bancada ruralista no Congresso Nacional. Em 06 de maio de 2015, por meio do Decreto Presidencial n° 8447, foi criado o Plano de Desenvolvimento Agropecuário (PDA) do Matopiba. No entanto, por ocasião do processo de impedimento que causou o afastamento de Dilma Rousseff (PT) da Presidência da República em 2016, o projeto não avançou no governo de Michel Temer (MDB), que alegou falta de recursos.

Durante o governo de Jair Bolsonaro (PL) – entre 2019 e 2022 –, as relações com os setores do agronegócio contribuíram para o avanço sobre a fronteira do Matopiba, na medida em que o governo fragilizou a estrutura institucional de órgãos de fiscalização e permitiu um aumento significativo nas taxas de desmatamento. Particularmente no Cerrado, 73% do desmatamento concentrou-se no Matopiba – segundo apontou o Relatório Anual de Desmatamento (RAD), lançado em julho de 2022 pelo projeto MapBiomas (Silva, 2022).

Já em novembro de 2023, conforme publicado pelo site da Presidência da República (2023), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2023-2026) editou o Decreto nº 11.767, instituindo um comitê gestor responsável por elaborar o Plano de Desenvolvimento Agropecuário e Agroindustrial do Matopiba. A iniciativa tinha como foco promover e coordenar políticas públicas voltadas ao desenvolvimento econômico, ambiental e social da região.

No entanto, mesmo sem o financiamento pelo Estado, no município de Correntina e outros delimitados dentro do Matopiba, a grande fronteira agroindustrial continua a avançar a partir da atração de capital nacional e estrangeiro. De acordo com a pesquisadora Daniela Egger, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em entrevista para Maíra Mathias (2017): “O capital internacional selecionou o Matopiba primeiro, depois o Estado brasileiro reconheceu. Na época do Prodecer foi o contrário: o Estado desenhou a estratégia e depois o empresariado chegou”.

As populações também denunciam a falta de participação neste processo, e os projetos agrícolas avançam como fato consumado nas regiões reconhecidas como parte do Matopiba:

“Às vezes a gente acorda com dois, quatro tratores dentro das áreas de gerais, que chamamos de ‘fechos’. E temos que entrar na frente, fazer o necessário para impedir a derrubada do cerrado. Com o Matopiba aumentou a ação de pistoleiros que entram nas comunidades para amedrontar e expulsar as famílias. A grilagem aumentou, a violência no campo aumentou, a tranquilidade das comunidades se perdeu”, declarou Eldo Barreto em entrevista para Maíra Mathias, da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV, 2017).

Em novembro de 2015 foi elaborada uma “Carta Aberta à sociedade brasileira, à Presidência da República e ao Congresso Nacional sobre a destruição do cerrado pelo Matopiba”, durante o Primeiro Encontro Regional dos Povos e Comunidades do Cerrado, realizado em Araguaína (TO) entre 23 e 25 de novembro. A carta foi resultado de debates e reflexões sobre o projeto e suas consequências para os povos do Cerrado. As populações presentes no encontro denunciaram que o Matopiba desencadearia os seguintes impactos e desafios:

“- Irá beneficiar apenas as grandes empresas nacionais e multinacionais, os latifundiários do agronegócio, visando somente o seu crescimento econômico; – Trará mais impactos negativos ao meio ambiente e às populações tradicionais do entorno, com destruição das matas e solos pelo uso intensivo de tratores e correntões e pelo abusivo uso de agrotóxicos com pulverização aérea intensiva; – Aumentará apenas o poder econômico do agronegócio e o político dos atuais parlamentares comprometidos com o mesmo; – Fortalecerá uma estratégia política e pessoal da senadora, ex-presidente da CNA [Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil] e (…) [ex] ministra da Agricultura e Pecuária – Katia Abreu, através da busca de maiores investimentos de recursos do governo federal, via Matopiba, para o estado do Tocantins, visando a viabilização de seu projeto político eleitoral”.

Em 07 de novembro de 2015, pressionados pelas constantes secas ocorridas na região do Vale do São Francisco, a população de Correntina fez uma manifestação pela preservação dos rios e mananciais do município e do aquífero Urucuia. Os principais alvos desta manifestação foram as empresas Mizote e Sublime Douto Têxtil Ltda (Sudotex).

Nesta manifestação, de acordo com o jornal Expresso, foi publicado o “Decreto do Povo Correntino”, um manifesto (sem valor legal) que emula a forma dos decretos do poder Executivo para pressioná-lo. Foi enviado ao governo do estado da Bahia e governo federal, conforme citamos abaixo:

“Decreto do Povo Correntino: O povo Correntino, no uso dos direitos garantidos na Constituição da República Federativa do Brasil, em especial o parágrafo único do seu art. 1º, e, CONSIDERANDO que as ações antrópicas têm influenciado em muito para o processo de aquecimento global, dentre os quais se destacam os desmatamentos; CONSIDERANDO que o Cerrado é o sistema biogeográfico mais antigo da América do Sul e que se encontra em seu clímax evolutivo; CONSIDERANDO a magnitude dos mega empreendimentos que ora estão chegando para os municípios do Oeste Baiano, em especial Correntina, notadamente: Mizote; Desvio do Rio Guará; Sudotex; Agro Brasil (holandeses) e Universo Verde (chineses); CONSIDERANDO que a vazão dos rios do Oeste, em especial o Rio das Éguas, caiu drasticamente nos últimos anos, sem perspectivas de retorno às vazões anteriores; CONSIDERANDO os modelos de irrigação adotados nos gerais, especialmente o pivô central, que são capazes de gastos intrigantes; CONSIDERANDO que no Oeste chegam 120 grandes carretas de veneno mensalmente para ser derramadas em nossos rios; CONSIDERANDO que as gerações de agora e do porvir têm direito a um ambiente saudável e equilibrado; CONSIDERANDO que o meio ambiente é direito difuso, podendo qualquer pessoa lutar por ele; DECRETA: Art. 1º – Fica decretada a suspensão imediata de todas as autorizações de supressão vegetal e outorgas d’água para o mega empreendimento Sudotex, e todos os demais de mesma proporção do município de Correntina; Art. 2º – Fica decretada a criação do Parque Nacional Velha da Galinha para a proteção do município de Correntina e bacia do Rio Corrente; Art. 3º – Fica decretado o fim da permuta de reserva legal obrigatória e esta será fixada dentro do perímetro de cada propriedade/fazenda em Correntina e Bacia do Rio Corrente; Art. 4º – Ficam terminantemente proibidas a mutreta, a pistolagem, a grilagem de terras públicas e a invenção de falsas escrituras; Art. 5º – Fica decretada a imediata instauração de Ação Discriminatória Administrativa Rural em todo o município de Correntina e na Bacia do Rio Corrente; Art. 6º – Fica decretada a imediata suspensão de todas as outorgas e licenças concedidas por quaisquer órgãos do Município, do Estado e da União aos mega projetos: Sudotex (no Rio das Éguas), Desvio do Rio Guará; Desvio do Rio Arrojado (Agro Brasil – holandeses); empreendimento Barra Velha/Mizote; e Universo Verde (chineses); Art. 7º – Fica decretado o fim da exportação de commodities (água doce sob a forma de grãos); Art. 8º – Fica decretada a moratória geral e irrestrita para o Cerrado da Bacia do rio Corrente e Oeste Baiano; Art. 9º – Fica decretada a criação do Fórum Permanente de Meio Ambiente, onde o povo Correntino tomará em suas mãos o seu destino, especialmente no que tange as questões de política ambiental, social, econômica e cultural; Art. 10 – Este decreto entra em vigor nesta data e será reeditado por quantas gerações assim o quiserem, garantindo a vida da atual e das futuras gerações.”

Sobre a empresa Sudotex, citada na carta, esta localiza-se no município de Urandi (BA), onde mantém uma unidade de produção de fios, malhas e roupas de algodão. Conforme publicado no Diário Oficial do Município de Correntina, a Prefeitura Municipal já havia concedido Licença Ambiental Municipal de Operação, válida até 30 de outubro de 2016, a Antônio Oliveira de Souza, proprietário da Sudotex.

De acordo com depoimento do deputado estadual Vitor Bonfim (PV), durante audiência na 115ª Sessão Ordinária da Assembleia Legislativa do Estado da Bahia (Aleba), em 17 de novembro de 2015, a empresa gerava mais de 600 empregos em Urandi (BA) e tinha a promessa de gerar mais 50 com a nova instalação em Correntina.

Bonfim ainda acrescentou que ela iniciou os trabalhos por meio do Sr. Antônio de Oliveira, seu proprietário, no ano de 1993, como algodoeira. Mais tarde, o Sr. Antônio resolveu investir ainda mais no estado da Bahia e se dirigiu para a região oeste, especificamente no município de Correntina, onde adquiriu uma propriedade de 13 mil hectares para plantar algodão e fornecer a matéria-prima para a sua fiação.

Para garantir o funcionamento, a empresa requisitou ao estado da Bahia, por meio da Secretaria do Meio Ambiente (Sema-BA), permissão para abrir 17 poços de alta vazão (piscinões) que captariam água do aquífero Urucuia, o que foi concedido em maio de 2016. A Associação Ambientalista Corrente Verde, de Santa Maria da Vitória (BA), entrou, no mesmo ano, com uma ação civil pública (ACP) pedindo a suspensão da captação de água pela Sudotex.

De acordo com o documento sobre o andamento do Processo n. 0000619-43.2016.805.0069 – ACP emitida em 13 de julho de 2016 pelo Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJBA) -, a juíza Marlise de Alvarenga deferiu Tutela de Urgência para suspender os efeitos da Portaria nº 11.797/2016, do Instituto Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema) – autarquia da Sema-BA, estabelecendo que o órgão deveria abster-se de emitir novas autorizações de outorga das águas subterrâneas ou superficiais na Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco para as Fazendas Sudotex. Acrescentou ainda:

“Oficie-se conforme requerido no item ‘2’ do parecer ministerial para que a CDA/INCRA [Coordenação de Desenvolvimento Agrário do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária] informasse sobre a origem das terras concernentes ao empreendimento Fazenda Sudotex, haja vista graves alegações de grilagem da citada área, bem como a argumentação de que as mesmas consistem em terras devolutas.”

Dentre as comunidades mais afetadas e acuadas pela diminuição dos lençóis freáticos no Cerrado, situam-se as comunidades tradicionais de fundo e de fechos de pasto. Elas estão presentes em diversas formas de resistência ao avanço do agro e hidronegócio, ao Matopiba, além de signatárias de diversas cartas (como o supracitado “Decreto do Povo Correntino”) e manifestos em prol da preservação das águas do Cerrado e contra a violência agrária na região.

Ademais, também estão registradas neste Mapa de Conflitos em resistência às atividades produtivas na Bahia, como construção de barragens e grandes projetos de irrigação. É o caso por exemplo de comunidades prejudicadas por políticas de recursos hídricos em Ponto Novo (BA); de comunidades próximas ao Rio Verde e São Francisco, vítimas de grilagem de terras e de assoreamento dos rios em Xique-Xique (BA); de comunidades rurais de Sento Sé (BA) afetadas pela Tombador Iron Mineração, bem como outros casos que podem ser pesquisados no Mapa.

De acordo com a Cartilha “Comunidades Tradicionais de Fecho de Pasto e seu modo próprio de convivência com o cerrado”, em Correntina, as áreas preservadas são justamente as pertencentes a estas comunidades, sendo a água um fator primordial para seu desenvolvimento, com influência na agricultura, no lazer e um forte elemento de inspiração artística, espiritual e cultural.

A Associação dos Pequenos Criadores do Fecho de Pasto de Clemente (ACCFC) assim se posiciona na referida publicação: “As comunidades de Fechos de Pastos foram privilegiadas na questão da localização dos territórios, pois são comunidades que estão próximas a cursos de água; e com isso também lhes dão o dever de serem guardiãs e defensoras desse recurso”.

Temerosos quanto ao avanço da grilagem nos últimos anos na região e críticos à política estadual que emite decretos que ferem o reconhecimento identitário e a permanência em suas terras, em agosto de 2016, as comunidades tradicionais de fecho de pasto realizaram um encontro em Correntina. Ao final do evento, fizeram publicar uma carta pública em que encaminhavam exigências ao Estado conforme citamos abaixo:

“Nós das Comunidades Tradicionais de Fecho de Pasto da Região de Correntina, reunidas na cidade de Correntina-BA, durante os dias 26 e 27 de agosto de 2016, com intuito de reafirmamos nossa identidade, saberes e fazeres tradicionais dos povos dos Cerrados, discutimos e analisamos o contexto atual e as dificuldades que ameaçam a permanência em nossos territórios”.

Denunciando o cenário de invisibilidade, exigiram do Estado e órgãos competentes:

“- Realização imediata de ações discriminatórias para fins de demarcação e regularização das Áreas/territórios coletivos dos Fundos e Fechos de Pasto; – Correção da lei [estadual n.] 12.910/2013-BA, com a extinção do prazo para autorreconhecimento como comunidade tradicional de Fundo e Fecho de Pasto; – Subsídios à produção, beneficiamento e comercialização de frutos e ervas do Cerrado; – Condições, através de fomento, para preservação das nascentes de forma a conciliar com a utilização tradicional do território”.

A cartilha “Comunidades Tradicionais de Fecho de Pasto e seu modo próprio de convivência com o cerrado” (já citada anteriormente) também aponta críticas na lei estadual 12.910/2013, que trata da regularização fundiária dos territórios das Comunidades e Povos Tradicionais de Remanescentes de Quilombos, Fundos e Fechos de Pastos. Em seu artigo 2º, autoriza a concessão de direito real de uso das terras públicas, rurais e devolutas de domínio do estado, tradicionalmente ocupadas de forma coletiva pelas comunidades de Fundos e Fechos de Pastos, com o objetivo de garantir a reprodução física, social e cultural sua e de sua família, conforme critérios de autodefinição.

Esclarece a publicação que a correção desta lei objetivava eliminar a exigência de que as populações de Fundos e Fechos de Pasto teriam até a data de 31 de dezembro de 2018 para protocolarem os pedidos de certificação de reconhecimento. Após a regularização fundiária, os ocupantes receberiam Contratos de Concessão de Direito Real de Uso (CCDRU) por período de 90 anos, podendo ser prorrogados por iguais e sucessivos períodos:

“O movimento organizado, a Articulação Estadual das Comunidades de Fundos e Fechos de Pastos da Bahia [ASS], não está de acordo com o estabelecimento deste prazo, pois é um obstáculo para as comunidades. Muitas estão isoladas e não participam de espaços de organização para que possam ter acesso às informações, ainda que o próprio Estado, em convênio celebrado com a Central das Associações Agrosilvopastoril de Fundos e Fechos de Pastos, tenha financiado um projeto da Articulação Estadual das Comunidades de Fundos e Fechos de Pastos, para uma busca ativa de tais comunidades. Mas, devido ao grande número de comunidades espalhadas por um território muito grande, corre-se o risco de que não sejam atingidas todas as comunidades existentes até o prazo determinado por lei. Impedindo assim que muitas comunidades tenham seus direitos reconhecidos como comunidades e povos tradicionais”.

Os integrantes das comunidades de fundo e fecho de pasto, portanto, desaprovaram este dispositivo da lei que condicionava as comunidades que não passaram por processos de reconhecimento à perda das terras em hipótese de não conseguirem protocolar até o fim do prazo. Assim, nesse encontro, a conclusão foi a de que esses períodos eram curtos para se fazer o autorreconhecimento de todas as comunidades de Fundos de Pasto existentes no estado da Bahia. Segundo a cartilha afirma, a lei “não respeita a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho-OIT, que garante aos povos e comunidades tradicionais se auto identifiquem, independentemente do tempo”.

As dificuldades atravessadas por estas comunidades em relação à escassez de recursos hídricos foram pontuadas em reunião na Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) do Senado Federal, em 08 de novembro de 2016, pelo professor de língua portuguesa Iremar Barbosa de Araújo. O professor mostrou as principais facetas de construção da política voltada ao agronegócio naquela região, conforme publicado no Portal Lapa Oeste (2017):

“Uma das questões que existem nesse território tradicional imenso é que as comunidades tradicionais não foram reconhecidas como tais. Fecho de Pasto, por exemplo, do grande Oeste da Bahia, não tem nenhuma visibilidade a nível Brasil […] O estudo recente da ANA [Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico] provou que o Oeste da Bahia é quem sustenta o São Francisco com 80% das águas. Acredito que nas outras regiões também tenha sido assim, mas o agronegócio se fez com 4 grandes questões básicas. Em cima de terras públicas, exclusivamente, são terras roubadas, em cima de água pública, rios que eles represam e depois de 10 anos vem pedir autorização; tecnologias públicas: o agronegócio se faz com dinheiro público. A maior dívida interna do Brasil é oriunda do agronegócio, especialmente com o aparelho estatal muito forte. Órgãos como secretarias, institutos estaduais, no caso da Bahia, o Inema adotou medidas totalmente liberalizantes onde as licenças são autodeclaradas, auto declarativas. Aquilo não existe! As polícias, as milícias que cercam essa região (…) nesse território quem tiver mais bala leva; o judiciário dá liminares (…). Isto vai redundar em fortes conflitos agrários. Especialmente conflitos por água. Sobradinho bateu antes de ontem [06/11/16] 7% da capacidade. O Rio São Francisco seria o responsável hoje por 90% da água do nordeste brasileiro, depois praticamente 70% da energia da região. Quem contribui com 80% destas águas é o Oeste da Bahia. Como é que a gente ‘lasca’ o agronegócio que elimina os rios do oeste da Bahia e compacta o solo daquela região, (…) aquela área é uma região estratégica. Finalmente dizer que o Mapitoba (a gente não chama de Matopiba, não…) é uma coisa imoral. Porque não se discutiu com ninguém que estava lá, porque não se fez estudos apropriados para aquela região, porque se fez invasão de plantas e animais. Só o estado da Bahia recebe 127 carretas de veneno por mês e tudo isso o pessoal tá comendo lá (…). Mas eu queria colocar uma questão central: com essa onda de tecnologia que tá ocorrendo lá, está se desenvolvendo uma tecnologia à base de piscinões no oeste da Bahia. Um piscinão em Correntina tem capacidade para 200 milhões de litros de água e tem uma propriedade que tem 10 piscinões abertos, e o Tribunal de Justiça autorizou o funcionamento (…). Uma pessoa só por dia tem mais água que todo o nordeste brasileiro, que é alimentado pelas chamadas cisternas, captação de águas pluviais. É indecente o que está acontecendo no nordeste da Bahia. Eu queria propor assim, que talvez seria possível que as associações, o Ministério Público – MP, essa comissão do Senado, o povo que está aqui, suas representações… para que a gente pudesse unificar as nossas ações. Não dá para atacar dessa forma. E pedir à companheirada a resistência, não tem outro jeito. Ou o povo resiste ou vai ser enxotado para debaixo da ponte”.

Essa fala expõe muito dos questionamentos dos moradores de Correntina e dos movimentos sociais que atuam na região – Coletivo dos Fundos e Fechos de Pasto do Oeste da Bahia; Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Município de Correntina (Sindtec); Escola Família Agrícola (EFA) Padre André etc. – às ações do Inema. Segundo carta divulgada em 30 de novembro de 2016 pelas entidades mencionadas, o Governo do Estado da Bahia também foi alvo de críticas em função do decreto nº 16.963/2016, que estabelece o “Licenciamento Especial” por cadastro. Com essa lei, a regularização ambiental exime produtores de análise ambiental e de instrumentos de participação social nas licenças ambientais concedidas aos produtores rurais, o que tende a agravar os conflitos nestas regiões.

O Inema desconsiderava também a deliberação do Comitê de Bacia do Rio Corrente de nº 01/2015, que determinava ao órgão abster-se de autorizar novas Outorgas de Direitos de Uso dos Recursos Hídricos da Região de Planejamento e Gestão das Águas (RPGA) da Bacia do rio Corrente. Conforme consta em documento desse Comitê: “excetuando-se as Outorgas do Direito de Uso de Recursos Hídricos para Abastecimento Humano, dessedentação animal e Agricultura Familiar”.

O Ministério Público Federal (MPF) entrou com uma ação de inconstitucionalidade contra a lei nº 16.963/2016 da Bahia e o processo tramitou no Supremo Tribunal Federal (STF). O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, propôs em setembro de 2017 a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5783, que foi sorteada para a relatoria da ministra do STF Rosa Weber.

Diante do descompasso da atuação das diversas instâncias do sistema estadual de gestão ambiental, somado aos impactos negativos da escassez de água sobre a população, conforme denunciaram diversos movimentos sociais ao longo dos anos, em 02 de novembro de 2017, moradores da cidade de Correntina realizaram novas manifestações nos domínios das fazendas Curitiba e Rio Claro, da empresa Lavoura e Pecuária Igarashi Ltda.

A empresa prejudicou ampla parcela da população com a diminuição do volume do rio Arrojado ao captar suas águas para uso na irrigação. Na manifestação, os moradores destruíram maquinários e equipamentos, como o pivô de captação (Bonfim, 2019). De acordo com depoimento de um dos moradores (não identificado) de Correntina divulgado no noticiário Lapa Oeste (2017):

“Infelizmente tem que ser assim. Os agricultores estão acabando com nossos rios. Parabéns à população que está lutando pelo seu rio. Infelizmente aqui no nosso Oeste tem muitos agricultores que só pensam no seu bolso, destroem nossas nascentes desenfreadamente e ainda contam com os órgãos de regulação tais como Inema, cheios de funcionários corruptos que através de propinas liberam outorgas irregulares. Por isso vemos a situação do nosso rio grande secando”.

Logo em seguida à manifestação, a mídia regional, com base em informações divulgadas por fazendeiros, comunicou que o protesto foi incentivado pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST). Entretanto, nota divulgada pela direção estadual do Movimento na Bahia em 06 de novembro de 2017 nega a informação:

“O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) denuncia publicamente a má apuração dos fatos ocorrida por diversos veículos de comunicação a respeito da ocupação e manifestação de comunidades agrícolas nas fazendas Igarashi e Curitiba, nesta última quinta-feira (2), no distrito de Rosário, em Correntina, oeste do estado. Várias manchetes apontam o MST como participante da ação, porém, enquanto organização popular, não há envolvimento nessa mobilização. Mesmo assim, reiteramos que apoiamos as ações de denúncia ao agronegócio, principalmente quando existe um processo de privatização de recursos naturais e investimentos antipopulares, que, neste caso, afeta diretamente as comunidades camponesas localizadas nas proximidades das fazendas. Segundo relatos, o projeto de irrigação da Igarashi e Curitiba estão secando os rios Carinhanha, Corrente e Grande, além de provocar queda de energia na região. Essa situação não é diferente de diversas outras localidades no estado que sofrem com as ações de empresas nos territórios, que para garantir uma maior margem de lucro não levam em consideração o impacto que tais iniciativas possuem ao meio ambiente e nas populações. Paralelo a isso, não podemos esquecer que tais projetos cumprem o papel de esvaziar o campo, ao expulsar as comunidades de seu território a partir do processo de monopolização dos recursos hídricos. Isso se apresenta muito forte nas regiões do semiárido baiano, onde todas águas dos afluentes são moedas de troca compactuada com o Estado.”

Também em 06 de novembro de 2017, a Secretaria de Segurança Pública do Estado da Bahia (SSP/BA) realizou uma reunião para discutir como as investigações sobre as manifestações seriam conduzidas. Conforme palavras do secretário de Segurança Pública, Maurício Teles Barbosa, elas foram classificadas como “ato criminoso”. A reunião teve a presença de setores agrários influentes da Bahia, tais como a Associação dos Produtores de Café da Bahia (Assocafé), Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (Aiba), Sindicato dos Produtores Rurais de Barreiras (SPRB) e Sindicato dos Produtores Rurais de Luís Eduardo Magalhães (SPRLEM).

Em noticiário do portal G1 (2017), Maurício Teles Barbosa destacou na ocasião:

“O trabalho da polícia vai ser reforçado com equipes de inteligência daqui de Salvador para que a gente consiga trazer à tona todos os motivos e a participação das pessoas nesse fato. Porque a mobilização de 500 a 600 pessoas demanda uma logística de mobilização e esse é um dos pontos que vamos atacar. Não estamos discutindo quais são as intenções, se são justas ou não, mas os efeitos do que foi praticado, e isso será tratado e investigado como um fato criminoso”.

Em 07 de novembro de 2017, movimentos sociais, entidades estudantis e pastorais publicaram nota em solidariedade à manifestação de Correntina, denunciando a crise hídrica. Intitulada “Cansado do descaso das autoridades, o povo de Correntina reage em defesa das águas”, foi assinada pelos seguintes apoiadores: CPT/BA; Associação de Advogados/as de Trabalhadores/as Rurais da Bahia (AATR-BA); Grupo de Pesquisa GeograFAR, da Universidade Federal da Bahia (UFBA); Articulação Estadual dos Fundos e Fechos de Pasto da Bahia, Fundação de Desenvolvimento Integrado do São Francisco (Fundifran); Licenciatura em Educação do Campo – Ciências Agrárias, da Universidade Federal do Recôncavo Baiano (UFRB); Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST); Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA); Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB); Movimento Estadual dos Acampados, Assentados e Quilombolas da Bahia (Ceta); Pastoral da Juventude do Meio Popular (PJMP); Pastoral do Meio Ambiente (PMA – Diocese de Bom Jesus da Lapa); Programa de Pós-Graduação em Educação do Campo/UFRB, Mestrado Profissional em Educação do Campo/UFRB.

Esta carta oferece informação adicional sobre o contexto de expropriação praticado pela fazenda Igarashi e o licenciamento ambiental:

“O Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos – Inema concedeu à Fazenda Igarashi, por meio da Portaria nº 9.159, de 27 de janeiro de 2015, o direito de retirar do Rio Arrojado uma vazão de 182.203 m³/dia, durante 14 horas/dia, para a irrigação de 2.539,21 ha. Este volume de água retirada equivale a mais de 106 milhões de litros diários, suficientes para abastecer por dia mais de 6,6 mil cisternas domésticas de 16.000 litros na região do Semiárido. Agrava-se a situação ao se considerar a crise hídrica do Rio São Francisco, quando neste momento a barragem de Sobradinho, considerada o ‘coração artificial’ do Rio, encontra-se com o volume útil de 2,84 %. A água consumida pela população de Correntina, aproximadamente 3 milhões de litros por dia, equivale a apenas 2,8% da vazão retirada pela referida fazenda do Rio Arrojado”.

Tem-se assim uma dimensão das perdas vivenciadas pela população de Correntina. Acrescenta a nota:

“Alegar que as áreas irrigadas no Oeste da Bahia representam apenas 8% da região, ou seja, 160 mil hectares num universo de 2,2 milhões de hectares, não minimiza seus impactos. Megaempreendimentos e suas obras de infraestrutura em plena construção com vistas à expansão das áreas irrigadas determinam uma rota de cada vez maior devastação. Alguns exemplos: Fazenda Santa Colomba, em Côcos; Fazendas Dileta, Celeiro e Piratini, em Jaborandi; Fazendas Sudotex, Santa Maria e Igarashi, em Correntina. Algumas destas fazendas estão construindo centenas de quilômetros de canais, dezenas de reservatórios (piscinões), perfuração de centenas de poços tubulares e instalação de centenas de pivôs. Quanta água está sendo comprometida com tudo isto? Se a irrigação não fosse uma tendência regional, como explicar tantos investimentos neste modelo de agricultura? Comitês e Planos de Bacia e outras medidas no campo institucional, antes promovem esta rota insana, do que preservam os bens comuns da vida, hoje e de amanhã”.

Em relação à cobertura da mídia tradicional e seu papel na disseminação de fake news antes da realização do segundo ato, encontra-se matéria do ex-deputado federal Xico Graziano (então no PSDB) em desaprovação ao ato na página do Poder 360. Em 08 de novembro de 2017, ele apontou que o movimento e seus participantes (“ou bandidos agrários”, como ele os classificava no intuito de deslegitimá-los face à opinião pública) promovem verdadeiro “terrorismo no campo”:

“Os bandidos agrários atacaram novamente, com grande agressividade. Destruíram agora uma fazenda localizada em Correntina (BA). A polícia militar, como sempre, fechou os olhos, compactuando com o crime. Verdadeiro terrorismo no campo. Era dia de Finados. Enquanto as pessoas de bem reverenciavam seus mortos, as do mal, carregadas de ódio, destruíam uma incrível infraestrutura produtiva destinada à produção de alimentos. Sim, produtiva. Sim, alimentos. Se você é daqueles ingênuos que ainda acredita na importância do movimento dos ‘sem-terra’ para combater os ociosos latifúndios, esqueça seu idealismo. É triste, mas é a realidade. Há muito tempo o MST (Movimento Sem Terra), benchmarking nessa matéria, liberou geral na invasão de propriedades agrícolas. Antes, nos anos 1990, convenceram a opinião pública de que, em suas estripulias, ‘ocupavam’ terras improdutivas, vazias, portanto, empurrando-as para o processo da reforma agrária. Eram, assim, justiceiros. Sua ação, embora violenta, fazia a carruagem andar. Passou-se uma década. Com o avanço das desapropriações efetuadas pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), e quanto mais se afirmava a modernização capitalista no campo, o MST, ombreado pela Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), mudou a tática. Passaram a atacar e a depredar fazendas mesmo que produtivas, argumentando que estas, ao produzirem soja ou eucalipto, por exemplo, não serviam ao povo.”

No contexto da manifestação popular de Correntina, a reforma agrária não foi a questão principal, mas sim a apropriação hídrica por uma empresa em detrimento de uma população inteira; ainda assim, as lutas locais, como estas, estão próximas de movimentos sociais como o MST porque fazem críticas à privatização dos recursos naturais. Em razão do MST ter uma visibilidade maior, atacada pelos donos do agro e hidronegócio, a manifestação despertou forte componente de disseminação do preconceito histórico contra este movimento social. O texto de Graziano, portanto, colocou em descrédito a legitimidade do ato realizado pelos moradores de Correntina, com argumentos típicos de sua criminalização.

Em 09 de novembro de 2017, a página SOS Urucuia, da rede social Facebook, repassou convocação para uma segunda manifestação, também denunciando a condução violenta das investigações, e a tentativa de criminalização dos movimentos sociais do campo:

“POVO DE CORRENTINA E REGIÃO, estamos sendo tratados como TERRORISTAS pelo GOVERNADOR E DEPUTADOS aos quais confiamos os nossos votos. PRECISAMOS IR PARA AS RUAS, às milhares de pessoas, união nessa hora. O AGRO NÃO É POP, o AGRO É DESTRUIÇÃO. Salve os NOSSOS RIOS! VENHAM PARA AS RUAS, GOVERNO NÃO PODE OPRIMIR O POVO. SE CHEGOU A ISSO, FOI POR DESCASO. Vista-se de preto, façam seus cartazes de repúdio a estes Deputados e ao Governador. A FORÇA DO POVO SEMPRE VENCERÁ. O dia foi mudado para o SÁBADO, DIA 11, às 07:00 h, em frente ao museu. Vista-se de preto e venham para as ruas”.

Consequentemente, em 11 de novembro de 2017 participaram 12 mil pessoas de uma população total de 33 mil de Correntina, ou cerca de 1/3 da população do município, segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT). De acordo com o bispo dom João Cardoso, da Diocese de Bom Jesus da Lapa, presente na manifestação: “Pequenos ou grandes agricultores não vão ganhar nada com a morte dos rios, é a fonte que nos alimenta. Temos que discutir crescimento com sustentabilidade e responsabilidade ambiental. Nós somos os cuidadores da irmã Terra”.

Segundo moradora não identificada de Correntina, também presente no ato, conforme notícia da CPT (2017): “De dez anos para cá, o rio está ficando cada ano mais seco, porque a seca está longa. Mas aí vem essas empresas querendo ser mais do que Deus, se apoderando das cabeceiras lá de cima, atingindo os lençóis freáticos. Nós não vamos deixar o rio morrer, porque água é vida, é pureza”.

A partir deste ato, e ao desconsiderar os principais motivos que levaram as pessoas às manifestações (distribuição desigual dos recursos hídricos sofrida pelas comunidades do oeste da Bahia devido à degradação dos rios e nascentes), a mídia e as polícias civil e militar agiram no sentido de desqualificá-las e criminalizá-las. No percurso das investigações, os direitos das pessoas que participaram das manifestações foram violados, com denúncias de abusos de poder, coação e ameaças aos parentes dos manifestantes, denúncias estas que foram veiculadas por meio de manifestações públicas, abaixo-assinados, reuniões e ofícios.

Em 13 de novembro de 2017, o Governo do Estado da Bahia emitiu nota de esclarecimento confirmando que a Igarashi estaria dentro da lei quanto à questão do sistema de irrigação. O advogado do Grupo Igarashi, Marco Aurélio Naste, em entrevista ao Notícias Agrícolas (2017), acrescentou:

“A empresa não chega a utilizar nem metade da outorga a que tem direito, outorga esta que, quando concedida pelo Inema a qualquer empresa no estado da Bahia, é feita sempre com base no cálculo de vazão de referência, e em um percentual máximo de 20%. (…) Não ocupamos a totalidade da outorga, e em nenhum momento o rio baixou com o funcionamento da captação, e é evidente que trabalhamos com o sistema de irrigação junto com o regime de chuvas da região”.

Em 22 de novembro de 2017, o Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) publicou uma carta sobre o cenário pós-manifestações em Correntina, em especial sobre a condução das investigações, classificada como “arbitrária e violenta”. De acordo com o CBDDH, o governo estadual enviou ao município uma “Força Tarefa” composta exclusivamente por policiais civis e militares (Brasil de Fato, 2018).

A carta, baseando-se em relatos dos moradores, denuncia que a investigação, conduzida pela Polícia Civil do estado da Bahia (PCBA), estava sendo levada adiante de forma “surpreendentemente célere”, conforme qualifica o comitê. Além disso, as pessoas foram convocadas por três delegados responsáveis pelo processo de investigação.

Sobre o inquérito, foram chamados “homens, mulheres, idosos, em sua maioria moradores das comunidades ribeirinhas, foram inquiridas na delegacia local, que funciona em ritmo nunca antes registrado na história de Correntina”.

Continua a carta (Brasil de Fato, 2018):

“Em paralelo, temos informações de que ocorrem, de forma ostensiva e sem autorização judicial, buscas pelas comunidades, com a participação ativa da Polícia Militar, na tentativa de obter informações das pessoas em suas residências e locais de trabalho, sem sequer uma intimação formal. Já aqueles que eventualmente receberam intimação são chamados para prestar informações poucas horas após o recebimento da notificação, o que impossibilita o acompanhamento do ato por um/a defensor/a. Houve ainda situação em que um adolescente de 17 anos foi constrangido e ameaçado a assinar uma intimação dirigida a um parente. Neste contexto, um clima de medo e apreensão predomina nas comunidades locais e muitos que estão sendo procurados para depor temem, com razão, por sua vida e integridade física. Há relatos de que durante as oitivas na delegacia, os delegados gritam, socam a mesa e ameaçam prender quem se recusa a falar os nomes que eles desejam ouvir, demonstrando assim o clima de intimidação e arbitrariedade na investigação em curso. Na manifestação em defesa das águas, realizada no dia 11 de novembro, que reuniu mais de 10 mil pessoas na cidade, havia um pelotão com 100 policiais militares, incluindo tropa de choque e uso de helicóptero. A manifestação se deu de forma pacífica, mas desde então há informações de que escolas municipais de alguns povoados oficiaram à Secretaria Municipal de Educação, ao Conselho Municipal da Criança e do Adolescente e ao Ministério Público que as crianças estão sofrendo fortes danos psicológicos em razão da atuação truculenta da Polícia Militar e Civil. Foi denunciado que o helicóptero da Polícia Militar estava realizando sobrevoos rasantes em diversas comunidades, em algumas delas impedindo a continuidade de aulas, além de interrogatórios ilegais e ameaças feitas diretamente às crianças, professores/as e demais servidores/as. Outra suspeita é a de que servidores públicos atuantes nas investigações possuem envolvimento com fazendeiros do agronegócio da região. Além do mais, segundo relatos, há fortes indícios – e testemunhas – de que prepostos e veículos da Associação de Produtores de Algodão da Bahia (ABAPA), entidade vinculada ao agronegócio, estão participando do processo das investigações, fato, aliás, sugerido e alardeado pelas próprias manifestações públicas destas entidades. Reina, neste instante, um verdadeiro estado de exceção em Correntina, no qual as liberdades e garantias coletivas e individuais estão suspensas sob pretexto de identificar e prender as supostas lideranças das manifestações, que aparentemente já foram escolhidas como responsáveis pelas autoridades policiais. Entretanto, até agora todos os indícios e depoimentos apontam que a manifestação popular foi resultado do sentimento de reiterado abandono pelo estado, da consciência da ilegalidade e ilegitimidade de um agronegócio destruidor e corrupto, e, mais que tudo, a revolta dos ribeirinhos com a morte anunciada e iminente de seus rios, patrimônio de valor inestimável para toda humanidade”.

Ao final da carta, recomendam:

Como organizações de defesa dos direitos humanos e dos povos e comunidades do campo e da cidade, reunidas no Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos, exigimos que: Sejam imediatamente apuradas as denúncias de arbítrios, ilegalidades e violência do aparato repressor do estado, devendo haver firme determinação do Poder Executivo e do Ministério Público neste propósito; Que as investigações sejam conduzidas por servidores sobre os quais não pairem nenhuma suspeita de envolvimento com o agronegócio; Que as apurações se deem dentro da legalidade e com respeito aos direitos, garantias e liberdades individuais, assim como da ampla defesa e da garantia de orientação profissional; Que a manifestação popular em defesa das águas pelo povo de Correntina seja tratada no espaço e âmbito adequado, em que suas reivindicações e propostas sejam ouvidas e consideradas, repudiando a criminalização de toda uma população, lideranças sociais, organizações e movimentos que lhes prestam apoio em sua justa luta por um ambiente saudável para viver.”

De acordo com Maurizzan Cruz (2017), em 22 de novembro de 2017 ocorreu uma reunião que tratou da elaboração do plano de ação para desenvolvimento de projetos nas áreas que integram a Região de Correntina. O então governador da Bahia, Ruy Costa (PT), apresentou portaria do Inema (disponível no Diário Oficial do Estado-DOE/BA no dia 22 de novembro) para que as empresas do agronegócio instalassem um sistema de medição da vazão consumida (hidrômetro) em todos os pontos de captação da Bacia do Rio Arrojado. As empresas foram requisitadas a manter seus dados à disposição do Inema e apresentar ao órgão o relatório de instalação no prazo de 60 dias.

Em 30 de novembro de 2017, segundo publicado na Terra de Direitos (2017), o Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) partiu para uma missão de averiguação da situação da população ribeirinha e de defensoras e defensores de direitos humanos no município. A Comitiva foi integrada por membros do Ministério Público Federal (MPF), como a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) do MPF; pelo Fórum por Direitos e Contra a Violência no Campo; Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH); Conselho Indigenista Missionário (Cimi); Comissão Pastoral da Terra (CPT); Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA); Via Campesina; Terra de Direitos (TDD); Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST); Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq); Comissão de Justiça e Paz (CJP); Movimento de Apoio ao Trabalhador Rural de Brasília (MATR); Associação de Advogados/as de Trabalhadores/as Rurais (AATR/Bahia) e Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDH).

Como atividade complementar à atuação do Comitê, no dia seguinte, 1º de dezembro de 2017, ocorreu uma audiência pública proposta pelo Ministério Público do estado da Bahia (MPBA) com mais de 5 mil presentes – segundo matéria de Rafael Tatemoto (2017) para o Brasil de Fato. Os participantes debateram a redução da vazão dos rios da bacia hidrográfica do rio Corrente, a criminalização dos manifestantes e o aparato desproporcional e incomum de efetivo policial nas investigações.

Na audiência, a responsável pela convocação, Luciana Khoury, da área ambiental da PFDC/MPF, defendeu modificações na regulamentação da captação de recursos hídricos:

Nossa crise hídrica é provocada pela falta de chuva, mas não só por ela. Ela também ocorre por conta de atividades produtivas que não levam em conta os limites do ecossistema, que não são regulamentadas e fiscalizadas. Há problemas institucionais de gestão: nós não temos Plano de Bacia, então, não há limite”.

Uma das falas mais pungentes foi da militante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Andréia Neiva:

“Esse conflito é histórico. Tem mais de 40 anos. Sou ribeirinha e, no ano em que nasci, um trabalhador rural foi morto, em 1983. Estão saqueando nossas águas, estão roubando. Pode até ser legal, mas não é legítimo. Nós tivemos várias tentativas de diálogo. Nada foi encaminhado. Chega um momento em que é preciso um ato de rebeldia para ser ouvido. Quando o pai e a mãe não vê, a criança chora. Cadê o governo do estado aqui para ouvir o povo? Se for tratar a gente como bandido, prepara a cadeia, porque vai prender todo o Oeste”.

O trabalhador ao qual se referia Andréia é José Pereira de Souza, conhecido por Zeca de Rosa, que tinha entrado em conflito com um fazendeiro por causa de uma área que a população chama de Aguado, onde se tinha acesso à água “tanto pra consumo próprio, quanto pros animais”, acrescenta a militante. Também segundo ela, em entrevista à EPSJV, foi realizada a leitura do documento oficial do estudo do Sistema Autônomo de Abastecimento de Água e Esgoto (SAAE) da cidade sobre o rio Arrojado e o rio Correntina, comprovando que o alto índice de alumínio na água a tornava imprópria para consumo humano (Tatemoto, 2017).

Sobre a quantidade incomum de contingente policial após a manifestação, as autoridades policiais presentes na audiência afirmaram ter ocorrido uma “denúncia anônima” de que a delegacia da cidade seria invadida. Ainda assim, de acordo com a reportagem, estes representantes se comprometeram a investigar as denúncias de abuso de poder que a população local havia feito (Tatemoto, 2017).

Em 05 de dezembro de 2017, ocorreu o lançamento e a organização do Comitê Oeste da Bahia para o Fórum Alternativo Mundial da Água (Fama) – conforme publicado pelo MAB. De acordo com os proponentes, a criação dos Comitês em todo o Brasil e a realização do Fórum programado para 2018 ocorrem em contraponto ao encontro promovido pelas grandes empresas do hidronegócio, o Fórum Mundial da Água (FMA). Compõem o FMA multinacionais com o objetivo de controlar e privatizar os recursos hídricos.

“A partir do Fama, temos a oportunidade de manter o debate do uso da água aceso, com atividades de agitação e diálogo com a sociedade”, sugere Andréia Neiva, do MAB. Outros objetivos do Comitê eram: combate ao uso indiscriminado de agrotóxicos, à privatização do serviço de saneamento e promoção da produção agroecológica.

Em 18 de dezembro de 2017, aconteceu o Seminário Nacional “A Água na Perspectiva do Bem Viver”, realizado pelo Fórum Nacional de Mudanças Climáticas e Justiça Social (FMCJS), e pelo Movimento Educação de Base (MEB), em Brasília/DF, com o lema “Em Defesa da Vida”. Ao final do seminário, foi elaborada “Moção de apoio à população de Correntina/BA, diante do conflito hídrico pela água no Cerrado Oeste da Bahia”.

Segundo a moção, publicada no blog Combate Racismo Ambiental (2017):

“Nós, participantes do Seminário Nacional ‘A Água na Perspectiva do Bem Viver’, do Fórum de Mudanças Climáticas e Justiça Social 2017 e Movimento de Educação de Base – MEB, realizado na cidade de Brasília/DF entre 16 e 18 de novembro de 2017, nos solidarizamos e manifestamos apoio à população de Correntina/BA. Considerando suas lutas de resistência: – O evento ocorrido no último dia 02 de novembro de 2017, nas fazendas Igarashi e Curitiba do município de Correntina Bahia – Brasil; – A manifestação popular em defesa da Bacia do Rio Correntes, em função do modelo de produção que tem colocado em risco os recursos hídricos e a população; – A criação do Fórum Permanente de Defesa do Meio Ambiente do povo de Correntina; – Decreto do povo Correntino: O poder popular em ação para proteger a humanidade e a natureza. Reafirmamos a necessidade de chamar a atenção da sociedade civil e autoridades públicas para as contradições do atual modelo de desenvolvimento em curso, que de fato tem sido razão dos conflitos na região e que uma leitura meramente criminal desses conflitos não contribui para superar a grave crise hidro-social que a região vive, sofrida, sobretudo, por suas populações camponesas, ribeirinhas, indígenas e quilombolas e pobres urbanos.”

Em 23 de fevereiro de 2018, a empresa Igarashi anunciou a retomada das atividades na fazenda de Correntina. A declaração, dirigida ao então governador da Bahia, Rui Costa (PT), a secretários de Estado e ao delegado de Correntina Marcelo Ribeiro dos Reis Calçado classificava os manifestantes como “vândalos”, e afirmava esperar a punição dos culpados, “incluindo os efetivos planejadores e financiadores da invasão”. No final, o texto solicitava “imediata e ostensiva segurança” para a “garantia da paz”, segundo publicado pelo portal Metrópoles (2018).

O caso foi destaque no lançamento do relatório “Conflitos no Campo no Brasil 2017”, realizado pela CPT, em abril de 2018. Adalgisa Maria de Jesus, a dona Nena, participou dos atos em Correntina:

“Água é a vida de cada um e cada uma de nós. Correntina ficou conhecida depois daquele 2 de novembro de 2017, pouca gente conhecia. O povo de Correntina está perdendo esse bem precioso que é a água. As comunidades por conta da falta da água começaram a não conseguir mais fazer o engenho funcionar. Começou a ter apagão e a faltar energia também. E perceberam que era quando a fazenda Igarashi funcionava a pleno vapor, que a cidade ficava desabastecida. Isso não está certo. Além disso, ela tinha um piscinão que, se enchesse, não correria mais água dentro do rio. O povo não aguentou e foi lá e quebrou os diques que estavam secando o rio. Ninguém vai morrer de sede nas margens do rio Arrojado e ninguém vai morrer parado, sem lutar!”

Outro exemplo de conflito sobre os povos de fundo e fecho de pasto em Correntina ocorreu em abril de 2018. De acordo com denúncia da CPT Centro Oeste da Bahia e da AATR, grileiros se apresentaram como pretensos proprietários dos territórios ocupados pelos trabalhadores rurais. Para justificar o domínio sobre estes territórios, utilizaram a Compensação de Reservas Legais (CRL). A CRL foi instituída pelo Novo Código Florestal, Lei 12.651/2012, que autoriza compensar Reservas Legais no mesmo bioma e na mesma bacia hidrográfica onde se encontra a propriedade produtiva.

De acordo com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), a CRL é um dispositivo, previsto no inciso III e parágrafos 5° a 7° do art. 66 do Código Florestal (Lei Federal n° 12.651/2012), por meio do qual as Unidades de Conservação (UC) de domínio público, com pendência de regularização fundiária, podem receber, em doação, imóveis privados localizados em seu interior para fins de Compensação de Reserva Legal de imóveis fora da UC, desde que localizados no mesmo bioma. Nesse intuito, o ICMBio, após análise técnica, emite certidão de habilitação do imóvel para esse fim, assegurando aos interessados a legitimidade da transação.

Para as comunidades de fundo e fecho de pasto do Oeste da Bahia, como apontam as duas entidades, esta lei incrementa a desigualdade no meio rural, pois acentua a busca desenfreada por áreas com indícios de devolutividade [sem destinação pelo poder público], e, portanto: “em sua maioria, sem a devida Regularização Fundiária e o respaldo legal, ao que alguns estudiosos da região têm chamado de ‘grilagem verde’” (CPT, 2018).

O acirramento destes conflitos em 2018 se deu por conta da ação número 8000574-63.2017.8.05.0069, que tinha como objetivo a Reintegração e Manutenção de posse dos pretensos proprietários da área onde se situa o Fundo de Pasto Capão Modesto. Esta ação foi distribuída em 23 de novembro de 2017, e em 05 de abril de 2018 a juíza Marlise Freire Alvarenga, em audiência de justificação prévia, deferiu o pedido de liminar de Manutenção de Posse em favor dos fazendeiros.

Tal decisão sofreu pedido de reconsideração elaborado pelo Ministério Público do Estado da Bahia (MPBA), considerando que alguns aspectos não foram atendidos para que se fundamentasse tal decisão judicial, a exemplo do fato de sequer ter havido uma perícia judicial nas áreas em litígio (CPT; AATR, 2018). Conforme consulta aos autos, tratava-se da disputa entre a Agropecuária Sementes Talismã LTDA e mais seis pessoas físicas contra os moradores da comunidade de Capão do Modesto:

“Narra a petição inicial que os Requeridos estariam turbando a posse das áreas apontadas na inicial de ID nº 9184217, os Requerentes procederam à busca e obtiveram informações de que os mesmos pretendem levar a sua intenção a feito, promovendo então o esbulho. Alegaram que já em várias oportunidades os requeridos destruíram cercas existentes e construíram outras, soltaram gado para pastagem em área de preservação ambiental, destruíram marcos divisórios, derrubaram placas informativas e efetuaram queimadas propositais”.

A carta da AATR e da CPT recomendava (CPT, 2018):

“1) Retirada imediata das empresas de segurança dos Territórios das comunidades de Fundo e Fecho de Pasto de Capão do Modesto e Fecho de Pasto de Porcos, Guará e Pombas; [No caso de Fecho de Pasto de Porcos, Guará e Pombas, trata-se da prisão irregular de morador da comunidade de Garrotes em 15 de abril de 2018. Conforme a carta, o morador estava campeando o gado no referido Fecho de Pasto: “sendo este indivíduo conduzido à Delegacia de Correntina, e posteriormente ao Batalhão da Polícia Militar local. Ato totalmente arbitrário, que contraria inclusive os direitos humanos, visto não terem poder de polícias os seguranças citados”] 2) Reforço policial a fim de garantir a segurança dos moradores das comunidades citadas; 3) Prisão imediata de pistoleiros, jagunços e policiais que estejam envolvidos em ações de pistolagem contra as comunidades e povos tradicionais da região, em especial, os aqui citados; 4) Realização de vistorias nas áreas apresentadas como Reserva Legal das propriedades em litígio, a fim de identificar a dominialidade e a veracidade dos documentos apresentados pelos pretensos proprietários (fazendeiros); 5) Abertura de processo de Ação Discriminatória Administrativa Rural (ADAR), a fim de que se comprovem os indícios de devolutividade das terras em litígio, com posterior Regularização Fundiária dos Territórios tradicionais às comunidades e das posses individuais aos seus ocupantes seculares; 6) Apoio a iniciativas de autogestão territoriais que possam dar continuidade à conservação de áreas estratégicas de Cerrados”.

De acordo com reportagem do Metrópoles (2018), a empresa contestou o histórico de ocupação do Capão do Modesto apresentado pelos posseiros e pela nota pública assinada pela CPT e AATR.

Os produtores rurais reivindicam, com amparo na lei e na Constituição Federal, a manutenção de sua posse legítima, mansa e pacífica sobre área de sua propriedade devidamente registrada nos cartórios competentes e averbada como reserva legal. (…) Esse local é de mata nativa do Cerrado e abrange parte considerada como Área de Preservação Permanente [APP], nos termos da legislação ambiental em vigor, e passou recentemente a ser invadido por pessoas com o intuito de o transformarem em pastagem de seu gado” – acrescentou a empresa Talismã, referindo-se à região onde ocorreu o embate com as comunidades locais (Reserva Legal com 9.400 hectares).

De acordo com o Repórter Brasil (2018), no início de junho de 2018, a desembargadora Telma Laura Silva Brito, do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), deu ganho de causa à comunidade. No mês seguinte, em cobertura do Repórter Brasil, a assessoria da Agropecuária Talismã declarou “desconhecer o ‘conflito fundiário’” e repudiar “com veemência tais acusações infundadas”.

Depoimentos de posseiros à reportagem do Metrópoles (2018) indicam tratar-se de uma briga antiga, do início dos anos 1980, quando um fazendeiro desmatou a cabeceira do riacho para plantar pinheiros, eucaliptos e pés de caju. Pode-se com isto apontar ser um conflito que carrega consigo as consequências da apropriação indevida da água em sua origem, apesar dos desdobramentos indicarem aparentemente uma disputa por terras sem envolvimento de outros recursos.

De acordo com Amanda Alves (2019), nos dias 2 e 3 de março de 2019, um grupo composto por 70 pessoas realizou um encontro para troca de experiências de luta em defesa dos territórios e das águas na região de Correntina. Participaram desse evento comunidades da Bahia e de Minas Gerais, incluindo comunidades tradicionais geraizeiras, quilombolas, pescadores e integrantes de assentamentos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) do Norte de Minas Gerais, bem como comunidades de fundo e fechos de pasto e quilombolas das regiões de Barra Correntina e Irecê, na Bahia.

O objetivo principal do intercâmbio foi unir essas populações, que compartilham histórias de vida e luta semelhantes devido à cultura, convivência e relação com o bioma do Cerrado, e pelo impacto das políticas de “desenvolvimento” e “modernização conservadora” em seus territórios. Durante o intercâmbio, o grupo visitou o território do Brejo Verde, Tarto e Catolés, incluindo quintais produtivos, nascentes e áreas comunais de fundo e fecho de pasto.

Houve também um almoço típico na Comunidade de Fundo e Fecho de Pasto do Tarto, acompanhado de depoimentos e chula, um estilo musical tradicional da região. À noite, foi exibido o curta-metragem “O Levante dos Ribeirinhos” (produzido a partir de reportagem de Eumano Silva e Gilberto Alves, com edição de vídeo e de imagens por Gabriel Pereira e Michael Melo para o site Metrópoles), que relata a revolta de 2017 dos ribeirinhos do vale do rio Arrojado contra fazendas que utilizavam excessivamente a água dos rios e do lençol freático.

Após a exibição, houve uma roda de conversa para troca de experiências. A última etapa do intercâmbio incluiu uma visita ao Museu do Cerrado, em Correntina, para conhecer a formação e evolução do bioma. A experiência de intercâmbio encorajou os povos geraizeiros a continuarem lutando por seus territórios, fortalecendo suas tradições (Alves, 2019).

Em 25 de janeiro de 2021, a CPT-BA divulgou uma nota denunciando mais um ataque de grileiros ao Fecho de Pasto de Vereda da Felicidade, localizado em Correntina. Entre os dias 22 e 24 de janeiro, as comunidades que utilizavam o fecho foram surpreendidas pela derrubada da casa de alvenaria que estavam construindo para abrigo durante o manejo do gado.

No dia 22, os invasores utilizaram uma pá carregadeira para enterrar o material de construção e espalhar a brita, chegando às margens da Vereda da Onça, além de criarem obstáculos na estrada para impedir o acesso das comunidades. No domingo (24 de janeiro), os malfeitores retornaram à área e destruíram um rancho de madeira com mais de 50 anos, utilizado para descanso, e derrubaram mais de 4 km de cerca e currais comunitários dos geraizeiros.

Os crimes foram comunicados à Delegacia de Polícia de Correntina, e a nota da CPT-BA destacou a gravidade da violência, mencionando que, quase simultaneamente, moradores da comunidade de Braço do Roçado, no município de Barra, foram ameaçados por homens armados. A nota não identifica os autores dos ataques.

O Fecho de Pasto de Vereda da Felicidade é utilizado há mais de um século por famílias geraizeiras das comunidades de Mocambo e São Francisco, de Santa Maria da Vitória; Cobra Verde, Jenipapo e Silvânia, de Correntina, de forma comunal. A área de 12.800 ha de cerrados conservados possui cinco veredas perenes e é fundamental para o modo de vida dessas comunidades, que praticam a solta sazonal do gado e o extrativismo.

Em nota, a Associação de Preservação de Meio Ambiente Veredas da Felicidade, a Comissão Pastoral da Terra – Centro Oeste da Bahia, o Núcleo da Diocese de Bom Jesus da Lapa e a Associação dos Advogados de Trabalhadores Rurais da Bahia (AATR) clamaram por Justiça e pela intervenção das autoridades para evitar uma tragédia, pois o território é fonte de sustento dessas comunidades (CPT, 2021).

Segundo Paulo Oliveira e Thomas Bauer (2022), a violência contra as comunidades de fecho de pasto em Correntina recrudesceu após a derrota eleitoral do então presidente Jair Bolsonaro (PL) em 2022. O motivo principal dessa escalada de ameaças de morte, disparos, destruição de infraestrutura e cercas foi a disputa por áreas de vegetação nativa do cerrado e suas veredas, preservadas por essas comunidades tradicionais. Os fecheiros, que criam gado e vivem do extrativismo e agricultura de subsistência, apesar do reconhecimento estadual, enfrentam a falta de providências para proteger seu modo de vida e segurança.

Em 06 de novembro de 2022 ocorreu um atentado contra o sr. João, um idoso então com 81 anos, e o Sr. Pedro, de 79 anos, ambos moradores do Fecho do Capão do Modesto – identificados na notícia apenas com o prenome. Um pistoleiro (não identificado) os ameaçou de morte caso não retirassem seu gado da área, alegando ter vindo de Mato Grosso para resolver a situação.

No dia seguinte, ao tentar registrar a ocorrência em Correntina, sr. João enfrentou a burocracia e morosidade das autoridades. Ele buscou apoio no MPE-BA, sendo atendido pelo promotor Vítor César Meira Matias; ele também foi orientado a procurar o tenente-coronel Luiz Augusto Normanha de Carvalho, da Polícia Militar da Bahia (PMBA). O promotor, ciente da falta de viaturas da PMBA, conseguiu a promessa da Câmara de Vereadores para ceder um veículo (Oliveira; Bauer, 2022).

Além do atentado ao Sr. João e ao Sr. Pedro, houve vários registros de destruição de cercas e abertura de valas para impedir o acesso dos fecheiros e do gado às veredas. Em um ato de intimidação, pistoleiros deixaram uma mensagem ameaçadora em uma vaca. A situação evidencia a vulnerabilidade dos fecheiros diante da ação de pistoleiros e da aparente falta de estrutura e lentidão das autoridades locais para lidar com a violência no campo (Oliveira; Bauer, 2022).

Paulo Oliveira e Thomas Bauer (2023) entrevistaram Nilson José Rodrigues (o “Maguila”), então prefeito de Correntina (BA), eleito pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Ele expressou sua impotência diante dos conflitos agrários na região oeste da Bahia, mencionando as milícias rurais, ameaças e atentados cometidos por pistoleiros contratados por latifundiários para expulsar integrantes de comunidades tradicionais de fundo e fecho de pasto em Correntina e Santa Maria da Vitória.

Maguila lamentou a omissão do então governador Rui Costa (PT) na questão e afirmou que, sem o apoio do chefe do governo estadual, não tinha força para enfrentar o poder do agronegócio. Ele mencionou que, desde setembro de 2022, a violência recrudesceu no município, e cerca de 50 organizações que integram a Campanha Nacional em Defesa do Cerrado alertaram as autoridades estaduais, mas que praticamente não houve providências. A única ação foi o envio de efetivo da Companhia Independente do Cerrado (Cipe/Cerrado) da PMBA, mas nenhum pistoleiro ou contratante foi preso em Correntina, apesar das queixas das associações de fundo de pasto na delegacia local e no MPF.

O então-prefeito Maguila relatou dificuldades em obter apoio do governo estadual, mencionando um pedido de audiência com a então diretora do Inema, Márcia Teles, que não foi atendido em cerca de dois anos. Ele também teve uma reunião com o governador Rui Costa, mas as resoluções não foram claras.

O prefeito observou que a situação piorou com o alto rendimento dos latifúndios, especialmente das plantações de algodão e soja, levando a atentados, ameaças de morte, bloqueios de estradas e destruição de cercas e ranchos pertencentes às comunidades tradicionais. A Campanha Nacional de Defesa do Cerrado criticou a inação das autoridades estaduais diante das ações das milícias rurais, mencionando o histórico do governador com omissões e atos questionáveis (Oliveira; Bauer, 2023).

A intensificação das ações intimidatórias dos latifundiários contra os pequenos produtores seria motivada pela necessidade de preservar 20% do bioma Cerrado para cumprir o Código Florestal, o que lhes permitiria obter empréstimos e comercializar a produção. Como a preservação pode ocorrer em qualquer área do cerrado, os latifundiários buscam expulsar os fecheiros para utilizar suas terras intactas como reserva legal.

O Observatório do Código Florestal (organizado por uma rede de mais de 40 entidades de todo o Brasil ligadas à defesa da vegetação nativa e produção sustentável) confirmou o reduzido controle público sobre as declarações dos produtores e apontou que 42 milhões de hectares dos imóveis se sobrepunham a territórios protegidos, incluindo áreas de comunidades tradicionais. Roberta Del Giudice, secretária-executiva do observatório, explicou que isso permite que produtores acessem créditos mesmo em locais proibidos, e que muitos casos envolvem grilagem.

Maguila descreveu as dificuldades da prefeitura em fiscalizar e multar infratores, especialmente quando possuíam licenças estaduais do Inema. Ele citou o caso da empresa Agro Tati (antiga Papaiz) que, mesmo notificada e multada pelo município, poderia continuar as atividades com uma licença estadual. Maguila expressou sua frustração e impotência diante da situação, apesar de tentar ajudar as comunidades dentro do que ele considerava “limitações” do poder local (Oliveira; Bauer, 2023).

Em 21 de fevereiro de 2022, o juiz Matheus Agenor Alves dos Santos, do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJBA), concedeu tutela antecipada para reintegrar e manter a posse dos posseiros tradicionais na área, determinando que os empresários do agronegócio desocupassem a reserva e se abstivessem de atos de vigilância ou intimidação. Insatisfeitos com essa decisão, os fazendeiros recorreram.

Em 17 de março de 2022, a desembargadora Telma Laura Silva Brito, do TJ-BA, suspendeu a decisão de primeira instância de forma provisória. A Abapa, por meio de uma assessoria, informou que o processo judicial tratava de um pedido de manutenção de posse de área de reserva legal e negou qualquer envolvimento em ameaças ou atos de violência contra as comunidades, bem como o uso de segurança armada na região (Oliveira; Bauer, 2022).

A área em disputa é utilizada há cerca de 200 anos pela comunidade de Capão do Modesto, e nela cerca de 80 famílias praticam a criação de gado e o extrativismo. Essa comunidade tradicional recebeu certificação do governo estadual e, em 2015, reconhecimento como povo tradicional pela Secretaria de Promoção da Igualdade Racial do estado da Bahia (Sepromi/BA). A então Coordenação de Desenvolvimento Agrário do estado da Bahia (CDA/BA) se comprometeu a iniciar o processo de regularização fundiária, o que, até 2022, segundo a notificação, não havia ocorrido (Oliveira; Bauer, 2022).

Notícia publicada no site da CPT (dezembro de 2022) relata que pistoleiros contratados por latifundiários continuaram a aterrorizar e tentar expulsar as comunidades tradicionais de fecho de pasto em Correntina, mesmo com as operações da CIPE-Cerrado. Nenhum responsável tinha sido preso até aquele momento, e os criminosos voltaram a destruir cercas e cavar trincheiras para impedir que o gado dos fecheiros acessasse as áreas nativas do cerrado, principalmente nos fechos do Cupim e da Vereda da Felicidade.

Em novembro de 2022, sete produtores, entre eles a Agropecuária Sementes Talismã, Luiz Carlos Bergamaschi (presidente da Abapa) e Dino Rômulo Faccioni (fazendeiro e advogado), moveram uma ação (Processo 8000574-63.2017.8.05.0069, em trâmite na 1ª Vara dos Feitos Relativos às Relações de Consumo, Cíveis e Comerciais de Correntina) contra oito integrantes da Associação Comunitária de Preservação Ambiental dos Pequenos Criadores de Fecho de Capão do Modesto, buscando a reintegração e manutenção de posse da área em litígio.

Os autores da ação alegaram que a comunidade impedia o livre exercício da posse da área de reserva legal. Em contrapartida, os pequenos criadores registraram queixas de ameaças de morte e destruição de benfeitorias (Oliveira; Bauer, 2022).

Em 26 de novembro de 2022, os proprietários da Fazenda Santa Tereza III, Alexandre Yamaguti, Eliton Gavazzoni e Jarbas Guimarães Júnior, fizeram um requerimento de outorga do Inema indicando interesse em usar água e intervir em corpo hídrico (Oliveira; Bauer, 2022). Em dezembro de 2022, o fecheiro João utilizou as redes sociais para denunciar o desmatamento da Cabeceira da Onça e da Cabeceira de Morrinhos, áreas cruciais para o abastecimento de água, alertando para o desaparecimento dessas nascentes devido a um licenciamento de 226,9 hectares liberado pelo governo estadual.

João também informou que os pistoleiros permaneciam armados, impedindo o acesso dos moradores aos fechos, e que máquinas continuavam destruindo a vegetação. Outro integrante das associações de fecho de pasto, Pedro, divulgou vídeos mostrando a destruição de cercas e mata-burros (estrutura geralmente utilizada em propriedades rurais para impedir a passagem de animais, especialmente gado, em áreas onde há necessidade de controlar o trânsito deles) (Oliveira; Bauer, 2022).

Outra matéria de Oliveira e Bauer (2023) apontou que, em 13 de abril de 2023, pistoleiros abriram fogo contra um grupo de fecheiros que realizavam um mutirão no Fecho de Pasto do Cupim em Correntina (BA), ferindo três pessoas: Gelson Neves (atingido na barriga e em estado grave), Alecsandro de Jesus Matos (ferido no braço e na costela) e Vivaldo José dos Santos (baleado na clavícula). O atentado ocorreu por volta das 15h30, quando o grupo retornava para casa após reconstruir a ponte de acesso e o rancho do fundo de pasto do Cupim, que haviam sido destruídos por capangas em janeiro de 2023.

Anteriormente ao mutirão, o vereador Ebraim Silva Moreira (PSD) havia solicitado proteção policial para os pequenos criadores e lavradores, mas o pedido foi ignorado. O caso foi registrado na delegacia local como seis tentativas de homicídio qualificado.

A Associação Comunitária de Preservação dos Pequenos Criadores do Fecho de Pasto de Cupim, Sumidor e Cabresto relatou ter localizado motocicletas escondidas antes do ataque. No local da emboscada, foram encontradas cápsulas de projéteis de carabina e de pistola .380. Os agricultores e pequenos criadores de gado afirmaram que o fecho de pasto faz divisa com as fazendas Santa Tereza e Bandeirantes, e que os proprietários dessas terras tinham interesse na área da associação (Oliveira; Bauer, 2023).

Antes do ataque em abril de 2023, uma sequência de crimes em setembro de 2022 levou a Campanha Nacional em Defesa do Cerrado – que na época reunia 56 movimentos, organizações e redes sociais – a encaminhar um requerimento pedindo providências urgentes ao então-governador Rui Costa (PT-BA) e a outras oito autoridades. A campanha buscava impedir uma tragédia na região, mas, segundo a notícia, nem Rui Costa nem o atual governador Jerônimo Rodrigues (PT) tomaram providências efetivas para prender os pistoleiros e mandantes e/ou reduzir os crimes na região. No boletim de ocorrência, o delegado Marcelo Ribeiro dos Reis Calçado registrou que não foi informado sobre quem eram os mandantes do crime, nem se os funcionários das fazendas andavam armados (Oliveira; Bauer, 2023).

Em 06 de setembro de 2023, conforme o site oficial do Supremo Tribunal Federal (STF), o tribunal declarou inconstitucional a lei do estado da Bahia que estabelecia um prazo final para que comunidades tradicionais de fundo e fecho de pasto protocolassem requerimentos de regularização fundiária de seus territórios. Essa decisão ocorreu no âmbito da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5783, na qual a Procuradoria-Geral da República (PGR) argumentou que o prazo limite de 31 de dezembro de 2018, previsto na Lei estadual 12.910/2013, violava o direito à identificação e à proteção dessas comunidades, que possuem uma relação ancestral com as terras que ocupam.

A ministra Rosa Weber, relatora da ação no STF, considerou que a norma estadual era incompatível com a proteção territorial devida às comunidades tradicionais. Segundo sua avaliação, as terras coletivas são parte fundamental da existência dessas comunidades, essenciais para sua reprodução física e cultural, e negar essa garantia seria negar a própria identidade desses grupos.

A ministra também afirmou que a restrição imposta pela lei era inadequada, desnecessária e desproporcional, pois não contribuía para a resolução de conflitos fundiários e a estabilização social, podendo, inclusive, agravar a situação e favorecer a grilagem e a especulação imobiliária. Acompanharam o entendimento da relatora os ministros Cármen Lúcia, Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Luiz Fux (STF, 2023).

Nos dias 16 e 17 de setembro de 2024, segundo publicado no site oficial do MPF (2024), o órgão realizou uma visita à cidade de Correntina e arredores com o objetivo principal de conhecer de perto as dificuldades enfrentadas pelas comunidades tradicionais de fundo e fecho de pasto que vivem no oeste da Bahia e para atuar na proteção de suas terras e modo de vida.

Durante esses dias, foram realizadas reuniões e visitas à parte das terras tradicionais pertencentes ao estado da Bahia, que têm sido alvo de grilagem e comercialização para empresas do agronegócio. Nas reuniões, que ocorreram no Centro de Treinamento de Lideranças em Correntina, participaram representantes de 12 comunidades tradicionais do Vale do Rio Corrente e do Vale do Rio Arrojado, além de representantes da AATR e da CPT.

Durante a reunião de 16 de setembro de 2024, foram relatadas pressões intensificadas do agronegócio sobre os territórios tradicionais desde a década de 1970, resultando em desmatamento e grilagem de terras. As lideranças locais apontaram a lentidão do estado da Bahia em resolver questões relacionadas à titularidade das terras, dificultando a concessão de contratos de direito real de uso para as comunidades e favorecendo a ação de grileiros que invadem e registram ilegalmente as terras públicas, transferindo-as posteriormente a empresas do agronegócio. Além das questões fundiárias, a destruição ambiental e a poluição de nascentes foram outras preocupações levantadas, com um apelo ao estado da Bahia pela regularização das terras e implementação de medidas de proteção (MPF, 2024).

Em 17 de setembro de 2024, representantes da AATR, da CPT e do MPF realizaram uma visita às terras tradicionalmente utilizadas pelas comunidades, guiados pelos fecheiros. Durante a visita, foi possível observar o modo de vida local, incluindo os “ranchos” e as fontes de água natural, essenciais para a subsistência das comunidades.

Os líderes comunitários explicaram práticas como o transporte de gado durante as secas e o uso sustentável das terras. O MPF informou que deve continuar monitorando a situação das comunidades e adotando medidas para que os órgãos públicos competentes atendam às demandas levantadas (MPF, 2024).

Conforme matéria no site da CPT-BA de 03 de dezembro de 2024, foi publicado o resultado de um mapeamento realizado ao longo de 2023 e 2024 nas sub-bacias hidrográficas dos rios Corrente e Carinhanha, no oeste da Bahia e extremo norte de Minas Gerais. O trabalho identificou 3.050 trechos de águas já secos, incluindo córregos, riachos, nascentes e cabeceiras de rios, totalizando 7.120 km de extensão de águas mortas.

Além disso, foram mapeados 580 trechos de águas em estado crítico, correspondendo a 3.837 km². O mapeamento foi uma iniciativa da Pastoral do Meio Ambiente (PMA), da CPT e dos pesquisadores Thiago Damas, da Universidade Federal Fluminense (UFF), e Eduardo Barcelos, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Baiano (IF-Baiano/Valença), com participação de diversas organizações da região e comunidades locais.

A principal causa da morte das águas é atribuída à expansão do agronegócio nas últimas três décadas, com a utilização de métodos de captação de água em larga escala, como piscinões e pivôs centrais, negligenciando a recarga dos aquíferos. Segundo os participantes do mapeamento, o agronegócio é apontado como o maior consumidor de água no País.

Entidades como a Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (Aiba) e a Associação Baiana dos Produtores de Algodão (Abapa) conseguem com facilidade outorgas de água concedidas pelo Inema. Moradores e entidades populares denunciaram a situação, e o mapeamento serviu como instrumento de denúncia e mobilização popular. O resultado do mapeamento pode ser visto aqui.

 

 

 

Atualização: abril 2025

 

Cronologia

1970: Empresas da agroindústria se instalam na região de Correntina, incentivadas pelo Estado a modernizar o campo e produzir para exportação, intensificando a grilagem de terras.

1974: Criação do Programa de Cooperação Nipo-Brasileira para o Desenvolvimento dos Cerrados (Prodecer), conhecido também como Projeto Cerrado ou Japan Internacional Cooperation Agency (JICA).

2013: Início da delimitação da região do Matopiba, região estratégica política e economicamente para o País.

27 de janeiro de 2015: Empresa Igarashi recebe o direito de retirar água do rio Arrojado por parte do Instituto Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema).

06 de maio de 2015: Por meio do Decreto Presidencial n° 8447, é criado o Plano de Desenvolvimento Agropecuário do Matopiba.

Novembro de 2015: Encontro Regional dos Povos e Comunidades do Cerrado, em Araguaína/TO, elabora Carta Aberta contra o projeto Matopiba.

07 de novembro de 2015: Manifestação da população de Correntina pela preservação dos rios e mananciais do município e do aquífero Urucuia com a publicação do “Decreto do Povo Correntino”.

17 de novembro de 2015: Deputado estadual Vitor Bonfim (PV) defende a empresa Sudotex durante audiência na 115ª Sessão Ordinária da Assembleia Legislativa do Estado da Bahia (Aleba).

2016: A Associação Ambientalista Corrente Verde, de Santa Maria da Vitória (BA), entra com uma ação civil pública (ACP) pedindo a suspensão da captação de água pela Sudotex.

13 de julho de 2016: Juíza Marlise de Alvarenga, do Tribunal de Justiça (BA), defere Tutela de Urgência para suspender os efeitos da Portaria nº 11.797/2016 do Instituto de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema).

Agosto de 2016: Campanha Nacional em Defesa do Cerrado é lançada.

26 e 27 de agosto de 2016: Encontro das Comunidades Tradicionais de Fecho de Pasto da Região de Correntina.

Novembro de 2016: Pronunciamento do professor Iremar Araújo em reunião na Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) do Senado Federal.

02 de novembro de 2017: Moradores da cidade de Correntina realizam manifestações nas fazendas Curitiba e Rio Claro, da empresa Igarashi.

06 de novembro de 2017: Secretaria de Segurança Pública do estado da Bahia (SSP/BA) realiza reunião para discutir como conduzir as investigações sobre as manifestações.

07 de novembro de 2017: Movimentos sociais, entidades estudantis e pastorais publicam nota de apoio à manifestação de Correntina intitutlada “Cansado do descaso das autoridades, o povo de Correntina reage em defesa das águas”.

09 de novembro de 2017: Página SOS Rio Urucuia, da rede social Facebook, repassa convocação para uma segunda manifestação da população de Correntina, também denunciando a violência nas investigações.

11 de novembro de 2017: 12 mil pessoas se manifestam nas ruas de Correntina, em apoio aos protestos de 02 de novembro de 2017.

13 de novembro de 2017: Governo do Estado da Bahia emite nota de esclarecimento confirmando legalidade dos usos que a Igarashi faz do rio Arrojado.

22 de novembro de 2017: Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) publica nota sobre o cenário pós-manifestações em Correntina, acusando as polícias civil (PCBA) e militar (PMBA) de conduzir as investigações de forma arbitrária e violenta.

– Realizada reunião convocada pelo então governador Ruy Costa (PT) para elaboração do plano de ação para desenvolvimento de projetos nas áreas que integram a Região de Correntina.

30 de novembro de 2017: CBDDH parte para missão de averiguação da situação da população ribeirinha e de defensoras e defensores de direitos humanos no município de Correntina.

01 de dezembro de 2017: Ministério Público Federal (MPF) realiza audiência pública no ginásio de esportes da cidade com mais de 5 mil pessoas.

05 de dezembro de 2017: Lançamento e organização do Comitê Oeste da Bahia para o Fórum Alternativo Mundial da Água (Fama), realizado em Brasília em 2018.

18 de dezembro de 2017: Acontece o Seminário Nacional “A Água na Perspectiva do Bem Viver”, realizado pelo Fórum Nacional de Mudanças Climáticas e Justiça Social (FMCJS) e pelo Movimento Educação de Base (MEB), em Brasília/DF.

23 de fevereiro de 2018: Empresa Igarashi anuncia retomada das atividades na fazenda de Correntina.

05 de abril de 2018: Juíza Marlise Freire Alvarenga, em audiência de justificação prévia, defere o pedido de liminar de Manutenção de Posse em favor dos fazendeiros no âmbito da ação 8000574-63.2017.8.05.0069.

27 de abril de 2018: Associação dos Advogados/as de Trabalhadores/as Rurais (AATR) e Comissão Pastoral da Terra (CPT) divulgam nota conjunta denunciando as violações constantes contra os direitos das populações de fundo e fecho de pasto em Correntina.

Junho de 2018: Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) dá ganho de causa em favor da comunidade Fundo e Fecho de Pasto Capão Modesto, em Correntina.

02 e 03 de março de 2019: Grupo com 70 pessoas de comunidades tradicionais da Bahia e Minas Gerais realiza encontro para troca de experiências de luta em defesa dos territórios e das águas em Correntina.

25 de janeiro de 2021: A CPT-BA divulga nota denunciando ataque de grileiros ao Fecho de Pasto de Vereda da Felicidade em Correntina.

Novembro de 2022: A violência contra as comunidades de fecho de pasto em Correntina recrudesce devido à disputa por áreas de vegetação nativa preservadas.

06 de novembro de 2022: Pistoleiro ameaça de morte os idosos Sr. João e Sr. Pedro, do Fecho do Capão do Modesto.

07 de novembro de 2022: Sr. João, da comunidade do Fecho do Capão do Modesto, busca apoio no Ministério Público do Estado da Bahia (MPBA).

21 de fevereiro de 2022: O juiz Matheus Agenor Alves dos Santos, do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJ-BA), concede tutela antecipada para reintegrar posseiros tradicionais na área do Capão do Modesto e determina que empresários do agronegócio desocupem a reserva e cessem intimidações.

17 de março de 2023: A desembargadora Telma Laura Silva Brito, do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), suspende provisoriamente a decisão da primeira instância após recurso dos fazendeiros.

26 de novembro de 2023: Alexandre Yamaguti, Eliton Gavazzoni e Jarbas Guimarães Júnior, proprietários da Fazenda Santa Tereza III, requerem outorga hídrica no Inema.

Novembro de 2023: Sete produtores movem ação contra integrantes da Associação Comunitária de Preservação Ambiental dos Pequenos Criadores de Fecho de Capão do Modesto.

Dezembro de 2023: O fecheiro João denuncia desmatamento das Cabeceiras da Onça e de Morrinhos e a presença de pistoleiros na região.

13 de abril de 2023: Pistoleiros abrem fogo contra um grupo de fecheiros em mutirão no Fecho de Pasto do Cupim, em Correntina, ferindo Alecsandro de Jesus Matos, Gelson Neves e Vivaldo José dos Santos.

06 de setembro de 2023: O Superior Tribunal Federal (STF) declara inconstitucional a lei da Bahia que estabelecia prazo final para regularização fundiária de comunidades de fundo e fecho de pasto no âmbito da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5783, movida pelo Ministério Público Federal (MPF)

16 e 17 de setembro de 2024: O MPF realiza visita a Correntina para conhecer as dificuldades das comunidades de fundo e fecho de pasto e atuar na proteção de suas terras e modo de vida.

03 de dezembro de 2024: A CPT-BA publica o resultado do mapeamento realizado com a Pastoral do Meio Ambiente (PMA), a CPT, organizações locais e pesquisadores nas sub-bacias dos rios Corrente e Carinhanha, identificando 3.050 trechos de águas secas e 580 em estado crítico.

 

 

Fontes

 

ALVES, Amanda. Comunidades tradicionais trocam experiências de lutas em defesa dos territórios e das águas em Correntina (BA). Comissão Pastoral da Terra, republicado por Combate Racismo Ambiental, 08 maio 2019. Disponível em: https://shre.ink/Mxxj. Acesso em: 26 mar. 2025.

APÓS protesto com incêndio em fazenda na BA, polícia abre inquérito para apurar invasão. G1, 06 nov. 2017. Disponível em: https://shre.ink/MeAY. Acesso em: 05 abr. 2025.

AS ARROJADAS águas de Correntina. Brasil de Fato, 27 nov. 2017. Disponível em: https://shre.ink/ejrp. Acesso em: 05 abr. 2025.

ASSOCIAÇÃO DOS PEQUENOS CRIADORES DO FECHO DE PASTO DE CLEMENTE (ACCFC). Comunidades Tradicionais de Fechos de Pastos e seu modo próprio de convivência e manejo da sociobiodiversidade do cerrado: história, direitos e desafios. Clemente: Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), 2018. Disponível em: https://shre.ink/MxuP. Acesso em: 26 mar. 2025.

BARBOSA, Altair Sales. Eles não são santos. São os exterminadores do futuro. (O caso do oeste da Bahia). Caminhos do Cerrado, republicado por Combate Racismo Ambiental, 13 nov. 2017. Disponível em: https://shre.ink/MeAe. Acesso em: 05 abr. 2025.

BONFIM, Joice. Apropriação das águas, Matopiba e territorialização do agronegócio no Oeste da Bahia? As águas em fronteira de Correntina. 2019. 213f. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais, Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade) – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). 2019. Disponível em: https://shre.ink/Mxe7. Acesso em: 26 mar. 2025.

BRANDÃO, Paulo Roberto B. A formação territorial do Oeste Baiano: a constituição do “Além São Francisco” (1827-1985). GeoTextos, vol. 6, n. 1, p. 35-50, jul. 2010. Disponível em: https://bit.ly/2LiYu7W. Acesso em: 05 abr. 2025.

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Um comentário

  1. Simplesmente é triste ver uma entidade científica como a Fiocruz ter uma publicação tão enviesada e com inúmeras informações e fatos falsos como esta aqui. Menos de 5% da área agrícola da região é irrigada, as Fazendas Curitiba não pertencem ao grupo Igarashi. É mentira a notícia de que a captação utilizaria toda a água do rio, o volume outorgado e captado não chegaria a 0,01% da vazão nominal do rio. A verdade é que ocorreu uma invasão por pessoas transvertidas de comunidade tradicional, que usam desse subterfugio para grilar e vender terras. Aliás é fato recorrente, eles invadem terras que os mesmos venderam no passado, não criam animais, não produzem 1 hectares de horta ou fruta e são usados por políticos e grileiros.

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