AM – Comunidade quilombola do Tambor aguarda titulação para ficar livre das imposições e da discriminação por funcionários do Ibama

UF: AM

Município Atingido: Novo Airão (AM)

Outros Municípios: Novo Airão (AM)

População: Quilombolas

Atividades Geradoras do Conflito: Implantação de áreas protegidas

Impactos Socioambientais: Alteração no regime tradicional de uso e ocupação do território, Falta / irregularidade na demarcação de território tradicional

Danos à Saúde: Falta de atendimento médico, Piora na qualidade de vida, Violência – ameaça, Violência – coação física

Síntese

Descendentes de escravos fugitivos do Estado do Sergipe, os cerca de 300 quilombolas das comunidades do Tambor, do município de Novo Airão, região metropolitana de Manaus, vivem na região desde o início do século XX, plantando banana, mandioca e vivendo da caça, pesca e do extrativismo do cipó e da copaíba.

Contudo, desde a criação do Parque Nacional do Jaú em 24 de setembro de 1980 (unidade de Conservação com cerca de 2 milhões e 300 mil hectares entre os municípios de Barcelos e Novo Airão), essas comunidades se viram impedidas de realizar a exploração de seus recursos naturais de modo tradicional. Proibidos de caçar, pescar e vender os produtos da floresta, os quilombolas foram impelidos a se mudar para a periferia do município. Há denúncias de que, durante a criação do parque, e em nome da preservação ambiental, o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF) teria expulsado algumas famílias sem qualquer tipo de indenização, e que estas ainda hoje sofreriam com preconceitos e vários tipos de ameaças e restrições impostas pelos funcionários do parque.

Segundo o Relatório de Identificação e Demarcação (RTID) elaborado pelo Incra, a comunidade de Tambor reivindica uma área de pelo menos 700 mil hectares, correspondente a cerca de 30% da área do parque. Por conta disso, desde a publicação do relatório o caso está em discussão na Câmara de Conciliação da Advocacia Geral da União (AGU), pois o ICMBio contesta a legitimidade do pleito das famílias quilombolas.

Contexto Ampliado

A comunidade quilombola do Tambor, no município de Novo Airão, norte do Amazonas, segundo relatos de seus moradores, está presente na região desde 1907, quando os primeiros ex-escravos, saídos de Sergipe, se instalaram no rio Paunini, que passou a ser conhecido como Rio dos Pretos, posteriormente formando a Comunidade do Tambor.

De acordo com Seu Jacinto (vice-presidente da Associação dos Remanescentes de Quilombo da Comunidade do Tambor): “Antigamente eles passavam lá, esse aqui é o Rio dos Negros. Bem, isso aí estava desclassificando a raça negra, hoje em dia não, hoje em dia está classificando a raça negra. Somos negros mesmo, tenho orgulho de ser negro, e sou negro. Pode me chamar de negro, sou negro mesmo, o rio Paunini é um igarapé grande, só entra de rabeta e canoa; lá onde nós trabalhávamos, esse tempo todo, lá nós tínhamos o nosso sítio, tudo lá nesse rio”.

Emannuel Farias Júnior (2010) afirma que o deslocamento dos ex-escravos para a Amazônia foi uma consequência da dupla despossessão provocada pela assinatura da lei áurea e a lei de terras de 1850. Ao mesmo tempo em que os escravos foram libertos, eles não receberam qualquer tipo de apoio ou compensação que pudessem auxiliá-los a se restabelecer, e a lei de terras previa a compra como uma das formas principais de aquisição. Dessa forma, sem outras alternativas, muitas famílias recém-libertas foram ocupar terras devolutas no norte do Brasil, incentivadas principalmente pelos diversos ciclos extrativistas na região, especialmente o da borracha. Segundo Farias Júnior: A maior parte das famílias é descendente de dois casais: Sr. José Maria (sobrinho do Sr. Jacyntho Almeida) e Dona Otilia, e Sr. Isídio Caetano e Dona Severina. Assim mostraram os ensaios genealógicos realizados com as famílias dos pretos residentes no rio Jaú, e também com aquelas que foram deslocadas compulsoriamente do Jaú, após a criação do Parque Nacional do Jaú, em 1980.

Os quilombolas dessa comunidade viviam da agricultura de subsistência, especialmente da plantação de mandioca e banana e do extrativismo de borracha, balata, coquerana, peles, castanha e da copaíba, mas a exploração tradicional do território começou a sofrer restrições com a criação do Parque.

A primazia das famílias originais sobre a região permaneceu incontestada durante boa parte do século XX. Segundo Farias Júnior (2010): As relações, envolvendo a exploração econômica do mencionado rio, passavam diretamente pelas famílias referidas ao Sr. José Maria e ao Sr. Isídio. Sem as suas autorizações não entrava nem a firma Bezerra e nem os regatões (4) e patrões (5) que se estabeleceram no rio Jaú após a desagregação da empresa extrativista. Com o fim do empreendimento extrativista, as famílias que ocupavam o rio dos Pretos passaram elas próprias a agir como regatões. Para Farias Júnior: Os símbolos da sua autonomia produtiva consistiam nas atividades agrícolas e extrativistas, desenvolvidas com a força de trabalho familiar e também na livre comercialização dos produtos à revelia da firma Bezerra.

Inicialmente administrado pelo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF), posteriormente pelo Instituto Nacional de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), e atualmente pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o parque possui uma área de 2.377.889 hectares, está situado entre os municípios de Barcelos e Novo Airão e tem por objetivo a preservação de ecossistemas naturais. Contudo, a criação do parque se baseou numa visão de meio ambiente restritiva que não levou em consideração as necessidades e as relações tradicionais das comunidades que já viviam na área onde a unidade de conservação foi implantada.

Geógrafo e defensor de estratégias de conciliação dos direitos comunitários e a preservação ambiental das áreas protegidas, Carlos Durigan (2014) afirma que tal processo desconsiderava completamente a população existente no futuro Parque. Estudioso desse processo, ele descreve como as unidades de conservação eram estabelecidas na década de 1980:

Estes foram anos difíceis, em plena ditadura militar, o Brasil ainda engatinhando na agenda conservacionista e ainda carente em referências sólidas para embasar processos como este. Criar uma Unidade de Conservação era basicamente definir um polígono sobre uma área de interesse e decretá-lo como área especialmente protegida. E, em se havendo moradores dentro dos limites de uma Unidade de Conservação, estes deveriam ser indenizados e assim deixar a área.

Desta forma, este processo inicial não buscou consolidar um conhecimento mais profundo da área a ser transformada em um Parque Nacional, não considerou nenhuma possibilidade de incluir seus moradores neste processo, assim como desconsiderou a alta complexidade das relações existentes entre os grupos sociais e de sua história.

Tal fato contribuiu para a desestruturação econômica e social da comunidade quilombola do Tambor, pois ao mesmo tempo em que algumas famílias foram expulsas da área do parque sem qualquer tipo de indenização, sendo obrigadas a se mudarem para a periferia de Novo Airão, as que permaneceram se viram impedidas a continuar explorando a área do mesmo modo que faziam há mais de 100 anos.

Segundo o levantamento realizado pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Novo Airão, permanecem na comunidade do Tambor, cerca de 300 pessoas, que hoje veem seu acesso a medicamentos e mantimentos dificultado, pela proibição da entrada dos regatões (negociantes itinerantes) no rio Paunini, desta forma sendo obrigados a buscar tais necessidades na sede do município. A caça e a pesca também foram proibidas aos quilombolas, o que dificultou ainda mais seu acesso às fontes de proteína animal. Além disso, o Ibama veta o acesso da comunidade a telefone público e a projetos como o “Luz para todos”, proibindo também que os quilombolas possam reformar suas casas de moradia e as casas de farinha, prejudicando a produção deste alimento.

Ao realizar trabalho de campo na UC, Eliana Creado e colaboradores relatam que, apesar de reconhecer a existência de algumas comunidades classificadas como tradicionais na unidade de conservação, os conservacionistas possuíam uma relação distinta de acordo com as atividades econômicas e as formas de subsistência predominantes. Enquanto a coleta de cipós e a agricultura de pequena escala eram vistas como atividades sustentáveis, a caça, a pesca comercial ou ornamental eram malvistas e reprimidas.

Relatam também a repercussão negativa da demanda das famílias quilombolas entre outras famílias da UC, uma organização não-governamental atuante na área e no próprio Ibama:

Quanto aos rebatimentos iniciais da identificação junto ao IBAMA e à FVA [Fundação Vitória Amazônica], eles foram negativos. Em relação à FVA, um dos indivíduos do MPF, comentou o temor inicial do diretor-executivo da ONG do processo fragmentar politicamente os moradores remanescentes da área central do parque. O próprio diretor relatou preocupar-se com o fato dos indivíduos potencialmente beneficiados serem justamente os com melhores condições socioeconômicas, em função dos dois regatões pertencerem às duas famílias.

Além disso, integrantes da FVA e do IBAMA-Manaus associavam os dois regatões da comunidade Tambor com o comércio ilegal de recursos da fauna. Assim, o benefício do status quilombola gerou incômodo junto ao IBAMA e à FVA, demonstrando a existência de uma normatividade atribuída à noção de populações tradicionais, em uma lógica segundo a qual algumas práticas seriam mais aceitas e mais discutidas do que outras, com diferentes graus de clandestinidade atribuídos aos usuários dos recursos naturais e dos espaços do PARNA-Jaú. Com o reconhecimento, as atividades dos contemplados, quando voltadas à subsistência ou ao consumo interno, não se sujeitariam mais à autorização do poder público e à legislação ambiental.

Segundo Emmanuel Faria Júnior (2011), as poucas atividades produtivas consideradas lícitas pelos órgãos ambintais seriam insuficientes para garantir a subsistência das famílias: Apesar dessa relativa flexibilização dos gestores, o fato é que, desde a implantação do parque, as famílias têm sido obrigadas a sobreviver em condições mínimas, ou seja, com roças diminutas, com a redução das atividades extrativistas, com a proibição de melhorias nas casas em que vivem e nas casas de farinha e com o impedimento de implantação de postos de saúde, telefones públicos e outras infraestruturas públicas.

As primeiras mobilizações das famílias do rio dos Pretos para reivindicar o reconhecimento de suas terras como território quilombola se deram em 2003.

Durante 26 anos, a situação de penúria e dificuldades dos quilombolas de Novo Airão permaneceu inalterada. Todavia, em junho de 2006, com o apoio da Fundação Osvaldo Cruz (Fiocruz) e do Ministério Público Federal (MPF), que elaboraram um relatório de identificação, os quilombolas, organizados em torno da Associação de Moradores Remanescentes de Quilombos da Comunidade do Tambor, conseguiram o reconhecimento público de sua identidade quilombola pela Fundação Cultural Palmares (FCP).

O reconhecimento oficial de sua condição de quilombolas foi um passo importante na luta pela reconstituição do território tradicional e pela indenização das famílias expulsas pelo IBDF, na década de 1980. Porém, este reconhecimento também deu origem a episódios de discriminação e repressão sofrida pelas famílias quilombolas, por parte de funcionários ligados ao Ibama, desta forma não representando ainda a solução do problema.

No dia 20 de setembro de 2007, a Associação de Moradores Remanescentes de Quilombos da Comunidade do Tambor, em parceria com União de Negros e Negras pela Igualdade (Unegro), deu início à “Campanha Estadual Titulação & Indenização Já”, pela demarcação das terras do Quilombo do Tambor e pela indenização das famílias quilombolas expulsas anteriormente. O primeiro evento da campanha foi um ato público no município de Novo Airão, onde lançaram sua pauta de reivindicações.

Em resposta, o Ibama afirmou não reconhecer a existência de quilombolas no Parque, na medida em que não teria recebido qualquer comunicação sobre a existência dos mesmos por parte do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Como alternativa ao atendimento das demandas da comunidade, propôs a respectiva transferência para a Reserva Extrativista do Unini, criada em 2004 no município de Barcelos.

Em dezembro de 2007 foi finalizado o Relatório Técnico de Identificação e Demarcação do Território (RTID) da comunidade quilombola por técnicos do Incra. O processo tramita atualmente em uma câmara de conciliação instalada pela Advocacia-Geral da União (AGU).

Além da perseguição e cercamento das “terras tradicionalmente ocupadas” pelos quilombolas da Comunidade do Tambor, o Ibama estaria prejudicando famílias quilombolas que hoje vivem na cidade de Novo Airão. Segundo denúncia dos quilombolas, em 22 de janeiro de 2008, familiares de Dona Joelina foram vítimas do crime de racismo por parte da guarda fluvial proveniente de Manaus, acompanhada por funcionários do Ibama. Segundo Dona Joelina, em entrevista ao pesquisador do Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia (PNCSA), Emmanuel de Almeida Farias Júnior, seus parentes teriam sido ofendidos com expressões racistas como “pretos fedorentos”, “o piche desses pretos vai contaminar a viatura” e que os classificava como os “pretos do Jaú, que não tinham parada certa”. A pedido da família, Emmanuel Farias Jr. ajuizou junto ao Ministério Público Federal no Amazonas (MPF/AM) uma denúncia de crime de racismo contra o Ibama e a Polícia Militar do Amazonas (da qual faz parte a guarda fluvial). Após a denúncia, a família de Dona Joelina foi chamada ao Ibama e multada no valor de R$ 1.000,00, por estar portando arma de fogo dentro da antiga Estação Ecológica de Anavilhana, a multa foi assinada pela gestora da unidade de conservação (UC).

A seguir, a família de Dona Joelina foi presa na “boca” do Rio Puduari, portanto, fora dos limites da referida UC. Na ocasião, foram extraviados três sacos de farinha de 60 quilos entre outros produtos alimentícios que seriam utilizados durante a extração do cipó feita anualmente pela família no rio Puduari. Além da farinha, foram retidos vários instrumentos de trabalho e motores rabeta que tinham acabado de adquirir junto ao “patrão”, que seria pago com o produto do trabalho de extração de cipó. Segundo os quilombolas, sumiram também com a gasolina que estavam levando para a área de extração. Desde então, segundo a família, os instrumentos de trabalho expropriados não foram devolvidos, razão pela qual membros da família têm passado por grandes dificuldades, inclusive por situação de insegurança alimentar, e acumulam uma enorme dívida com o patrão.

Com o avanço do processo administrativo no Incra, o Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio) contestou as conclusões do relatório e se opôs à demarcação do território. O caso foi parar na Câmara de Conciliação e Arbitragem (CCAF) da Advocacia Geral da União (AGU) em 2008. O objetivo das negociações, segundo representantes do Incra ouvidos pela repórter Afra Balazina, da Folha de São Paulo, era chegar a um acordo que pudesse conciliar os direitos das famílias quilombolas com a preservação ambiental da área.

De acordo com reportagem de Elaíze Farias para o portal Amazônia Real (05/11/2014), o caso permaneceu em discussão na Câmara de Conciliação até março de 2014, quando as partes chegaram a um acordo e um termo de conciliação foi lavrado. Segundo o acordo, a comunidade terá de ser realocada para uma área a ser escolhida em comum acordo entre os comunitários, o Incra e o ICMBio, além de serem indenizadas. Tal acordo vigoraria apenas após a consulta formal à comunidade, conforme previsto na Convenção n°169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Ao solicitar informações a esse respeito a representantes da gestão do Parque, Farias (05/11/2014) recebeu uma nota na qual o ICMBio defendia que, devido ao alto grau de isolamento geográfico da região, torna-se praticamente inviável a implementação das políticas sociais para as famílias quilombolas. Ainda segundo a nota, a remoção e a realocação seriam benéficas para as famílias, pois, segundo o órgão ambiental, haveria um ganho em qualidade de vida.

As famílias quilombolas, no entanto, discordam da posição da gestão do Parque:

Não queremos sair daqui de jeito nenhum e temos vários motivos para ficar. Aqui é tranquilo. Se quisermos comer, vamos pescar. A gente pode ter pouca coisa, mas tem uma mata, um rio e ar puro. Já estamos acostumados com o local, sabemos onde podemos pescar, caçar e fazer nossas roças. Sabemos quando sobe e desce o rio. Muitos já estão velhos. Se saíram daqui, vão para onde?, disse José Alberto do Nascimento, 55, presidente da Associação dos Moradores Remanescentes de Quilombo do Tambor, à agência Amazônia Real.

Vieram aqui e a gente já foi falando que ninguém quer sair. Nos disseram que as famílias ou iriam para Novo Airão ou para a Reserva Extrativista Unini. Unini faz fronteira com o Jaú, mas não tem mais área para receber as famílias. E ainda é uma área de várzea, que alaga, vai tudo para o fundo. Aqui no Tambor é terra firme, as famílias estão acostumadas com esse ambiente. E, se for para a cidade, o que vai acontecer com as famílias? Vão ficar à mercê de outra realidade, sem experiência de viver em cidade. No Tambor, apesar de ser distante, as famílias têm bem-estar, não passam fome, tem comida, tem peixe, tem roça, diz Sebastião Ferreira, uma das principais lideranças do Tambor, segundo Farias.

Entrevistado por Farias, o antropólogo João Siqueira, que estudou a comunidade, também coanudava esta posição. Segundo ele, a retirada das famílias provocaria danos ao modo de vida e defendia que as políticas sociais deveriam ser garantidas independentemente da localização geográfica. A posição da CAF também contrariava a intepretação do MPF quanto ao caso. Desde abril daquele ano, o MP move uma ação civil pública a fim de garantir a titulação e impedir a remoção.

De acordo com nota publicada pelo MP em novembro, quando a CCAF anunciou o fechamento do acordo entre as instituições federais: Uma possível retirada afeta direitos fundamentais da comunidade quilombola. (…) Na ação, o MPF/AM pede que a Justiça determine que o ICMBio e o Incra não promovam a retirada da comunidade quilombola do Parque Nacional do Jaú e que, no prazo de um ano, o Incra conclua o processo administrativo de regularização fundiária da comunidade do Tambor. A ação tramita na 3ª Vara Federal no Amazonas, onde aguarda decisão.

Uma decisão foi tomada em 14 de janeiro de 2015 pelo juiz federal Ricardo Sales, da 3ª Vara da Justiça Federal do Amazonas. Segundo Elaíze Farias, além de negar provimento ao pedido do MPF, o juiz declarou ainda que a ação do MPF não provou que se tratava de comunidade quilombola e determinou a realização de um novo estudo antropológico a partir de profissionais a serem nomeados pelo tribunal.

Entrevistado por Farias, o então procurador do 5º Ofício Cível do MPF/AM, Fernando Merloto Soave, que ficou no lugar de Júlio José Araujo Júnior, autor da ação, disse que a decisão foi omissa, pois ela não aprecia o pedido que consta na ação: O juiz apresenta algo que não é divergência no processo. Não há contestação se os moradores são ou não quilombolas. Ele não se manifesta quanto ao nosso pedido, disse. Para o promotor Júlio José Araujo Júnior, a decisão judicial feria a constituição federal e os tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, pois ambos legitimam o autorreconhecimento como único critério para definição identitária.

Em outubro de 2015, mais de um ano após a decisão da CCAF, a comunidade do Tambor permanecia ameaçada de remoção e ainda não havia sido formalmente consultada sobre o acordo. Naquele mês, foi realizado em Alter do Chão o seminário Terras Quilombolas e Unidades de Conservação, promovido pela Comissão Pró-Índio de São Paulo (CSIP-SP). Ao final do evento, os participantes divulgaram uma carta-pública em que reivindicavam a retomada e a conclusão do processo de titulação de diversas comunidades afetadas por problemas similares aos do Tambor, como as de Alto Trombetas (I e II), Cunani e Santo Antônio do Guaporé.

Cronologia:

1907: Descendentes de ex-escravos sergipanos chegam ao rio Paunini, afluente do rio Jaú.

1980: Governo Federal cria o Parque Nacional do Jaú.

2003: Começam as primeiras mobilizações para reconhecimento das terras do rio dos Pretos como Quilombo do Tambor.

2005: É fundada a Associação dos Moradores Remanescentes de Quilombo da Comunidade do Tambor.

2006: Parceria entre Fiocruz e MPF gera relatório que irá subsidiar demanda quilombola pela regularização fundiária de seu território.

20 de setembro de 2007: Associação de Moradores Remanescentes de Quilombos da Comunidade do Tambor, em parceria com União de Negros e Negras pela Igualdade (Unegro), dá início à “Campanha Estadual Titulação e Indenização Já”.

2007: Ibama afirma desconhecer existência de comunidades quilombolas no Parque e se oferece para transferir as famílias para a Resex do Unini.

Dezembro de 2007: INCRA conclui RTID da comunidade quilombola do Tambor.

22 de janeiro de 2008: Segundo denúncias dos quilombolas, Dona Joelina é vítima de racismo por parte de funcionário do Ibama.

2008: ICMBio contesta conclusões do RTID na Câmara de Conciliação da AGU.

Março de 2014: CCAF propõe acordo para realocação de comunidade quilombola.

Abril de 2014: MPF move ação civil pública para garantir titulação do território da comunidade.

Janeiro de 2015: TRF nega provimento a pedido do MPF e determina realização de novo estudo antropológico para confirmar identidade quilombola.

Outubro de 2015: Diversas comunidades quilombolas da Amazônia, entre elas a do Tambor, divulgam carta-pública reivindicando a titulação de suas terras ao final do seminário Terras Quilombolas e Unidades de Conservação.

Última atualização em: 18 de novembro de 2015.

Fontes

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