MT – Consciência do Povo Enawenê Nawê não se dobra às tentativas de negociar a descaracterização de seu habitat e modo de vida tradicional

UF: MT

Município Atingido: Sapezal (MT)

Outros Municípios: Campos de Júlio (MT), Comodoro (MT), Juína (MT), Sapezal (MT)

População: Povos indígenas

Atividades Geradoras do Conflito: Atuação de entidades governamentais, Barragens e hidrelétricas, Madeireiras, Monoculturas

Impactos Socioambientais: Alteração no regime tradicional de uso e ocupação do território, Desmatamento e/ou queimada, Falta / irregularidade na autorização ou licenciamento ambiental, Poluição de recurso hídrico

Danos à Saúde: Doenças transmissíveis, Insegurança alimentar, Piora na qualidade de vida

Síntese

Com uma população de pouco mais de 300 indivíduos, os índios Enawenê Nawê do Mato Grosso são hoje uma população ameaçada pela proposta de construção de uma série de empreendimentos hidrelétricos ao longo do rio Juruena. Alimentando-se basicamente de peixes e com uma forte ligação cultural e mítica com o rio, esses índios têm lutado para evitar que os represamentos das águas do Juruena inviabilizem a continuidade de sua reprodução física e social.

O Consórcio Juruena é hoje o responsável para construção e operação de oito pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) a serem construídas ao longo do rio. Cada unidade possui potencial para gerar pouco mais de 30 MW e gerará pequenos reservatórios de pouco mais de 3km². Dispensadas da apresentação de estudos de impacto ambiental (EIA) por uma lei estadual, este consórcio de empresas é apenas o pioneiro de um processo que pode vir a resultar na construção de até 53 empreendimentos desse tipo na bacia.

Os índios Enawenê Nawê alegam que esse uso exagerado dos recursos hídricos irá provocar doenças e fome em seu povo e que deve ser sustado o quanto antes. O Ministério Público Federal (MPF) tem acompanhado o caso e apoiado os índios na luta contra a destruição do meio ambiente da região em nome de um suposto desenvolvimento baseado na agroindústria e no uso intensivo de energia, água e terras.

Protestos, ocupações, violência, agressões e ações judiciais marcam este processo, criando um clima extremamente tenso na região, em relação à qual a posição do Estado tem oscilado entre a total omissão por parte de algumas instituições ao apoio aberto aos empreendedores.

Os Enawenê Nawê são a última etnia a resistir à construção das usinas na localidade. Todas as demais etnias potencialmente atingidas pelos empreendimentos já fecharam acordo com o consórcio.

Contexto Ampliado

Os Enawenê Nawê falam uma língua da família Aruák, vivem em uma única grande aldeia próxima ao rio Iquê, afluente do Juruena, no noroeste do Mato Grosso e ocupam uma terra de 742.088 hectares, que corresponde a uma parte do seu território tradicional. No passado, guerrearam com os Rikbátsa, Cinta Larga e Nambiquara. Embora seus vizinhos mais próximos na atualidade sejam os Mynky, os Nambiquara do Campo e os Rikbátsa, povos que falam línguas distintas entre si, a língua dos Enawenê Nawê é parecida com a língua falada pelos Pareci.

O primeiro contato oficial dos Enawenê Nawê com os brancos foi em 1974, com os jesuítas Vicente Cañas e Tomáz de Aquino Lisboa. Nessa época, a Missão Anchieta estava revendo sua forma tradicional de atrair e civilizar populações indígenas pela educação. A aproximação com os Enawenê Nawê foi lenta e guiada por uma nova filosofia, que buscava mantê-los isolados da sociedade nacional e concentrar as atividades na convivência, com mínima interferência, no atendimento à saúde e na proteção do território. Em 1987, o missionário Vicente Cañas foi assassinado a mando de fazendeiros e grileiros da região interessados nas terras dos Enawenê Nawê.

Em 1998 a etnia teve suas terras oficialmente homologadas. Desde 2002, porém, os cerca de 300 índios da etnia estão ameaçados por projetos de pequenas centrais hidrelétricas ao longo do rio Juruena, a maior parte delas, iniciativas para autogeração de energia elétrica por grupos agroindustriais do Estado. Entre esses grupos está o Grupo Amaggi, representado pela Maggi Energia e ligado ao ex-governador Blairo Maggi, principal produtor de soja do Mato Grosso.

Inicialmente a Maggi Energia seria responsável pela instalação de nove PCHs ao longo do rio Juruena. Essas pequenas centrais hidrelétricas estariam a serviço das empresas do Grupo Amaggi e serviriam para baixar custos de produção e aumentar a competitividade das empresas do grupo. Entretanto, desde 2005, as licenças inicialmente concedidas à Maggi Energia foram transferidas ao Consórcio Juruena, formado pelas empresas Juruena Participações e Linear Incorporações. Oito desses empreendimentos receberam da Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema) as licenças prévias e de instalação ainda naquele ano.

Segundo dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), já teria sido autorizada a exploração de 12 empreendimentos hidrelétricos num trecho de pouco mais 130 quilômetros do rio Juruena, com aproximadamente 10 km entre cada PCH. Segundo notícia veiculada pelo ISA, cinco projetos foram licenciados em 2007 e, na sequência, foram licenciadas mais três das 11 obras planejadas. Ainda em 2007 as obras de cinco empreendimentos foram iniciadas mesmo sem haver qualquer consulta aos cinco povos indígenas impactados (Parecis, Nambikwara, Menkü, Rikbátsa e Enawenê Nawê), como determina a Constituição Federal.

Juntos, os empreendimentos possuem potencial para gerar mais de 300 MW, e contam com financiamento de mais de R$ 360 milhões do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Apesar do baixo impacto individual de cada empreendimento isolado (cada PCH gera um reservatório de pouco mais de 3 km³) os impactos acumulados do complexo poderão trazer danos irreversíveis à bacia do rio Juruena, do qual os índios Enawenê Nawê dependem quase que exclusivamente para sua alimentação (os peixes são a base da dieta alimentar da etnia).

Por esse motivo, em 2006, o MPF instaurou procedimento administrativo para verificar as circunstâncias do licenciamento ambiental do Complexo Juruena. Segundo a legislação ambiental do Estado do Mato Grosso, somente empreendimentos com potencial superior a 30MW necessitam apresentar estudos de impacto ambiental para obter o licenciamento necessário à sua instalação e operação. Essa flexibilidade na legislação estadual permitiu que tais empreendimentos obtivessem sucessivamente licenças prévias (LP) e de instalação (LI) sem sequer realizarem estudos que analisem os respectivos impactos sobre o meio ambiente e as populações que vivem ao longo do rio e que dele dependem para sobreviver. Além disso, não há informações sobre seus impactos cumulativos.

Em 2007, mesmo sem o EIA-RIMA, a Superintendência de Infraestrutura, Indústria, Mineração, Serviços e Resíduos Sólidos renovou as LIs de oito dos empreendimentos hidrelétricos. Assim como ocorreu quando da concessão das primeiras LPs e LIs, a Sema renovou as licenças ambientais sem que a área técnica da Funai se manifestasse sobre o componente antropológico dos estudos complementares elaborados para identificar, prevenir e mitigar os impactos resultantes da construção das obras do Complexo do Juruena sobre os grupos indígenas.

Visando resguardar os direitos constitucionais dos povos indígenas da região, em especial dos Enawenê Nawê – etnia mais ameaçada pelos projetos -, o MPF entrou naquele ano com duas ações civis públicas (ACPs) junto ao Tribunal Regional Federal, pedindo a suspensão das obras já autorizadas. Em abril de 2008, obteve liminar favorável, que seria cassada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) dois meses depois.

Paralelamente, os índios Enawenê Nawê iniciavam ações para pressionar o governo estadual a rescindir as licenças ambientais já concedidas e abster-se de conceder novas licenças até que estudos mais abrangentes fossem realizados sobre os impactos cumulativos dos projetos previstos para a bacia. A primeira dessas ações se deu em dezembro de 2007, quando os índios ocuparam o canteiro de obras da PCH Telegráfica, em Sapezal.

Em julho de 2008, uma reunião promovida pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), do Ministério de Minas e Energia, e a Funai com representantes das etnias Rikbátsa, Cinta-Larga, Arara, Apiaká, Kayabi, Munduruku e Enawenê Nawê deixou claro que as preocupações das comunidades estavam apenas no início e que o conflito poderia ser intensificado. Na pauta da reunião, o pedido de que fosse autorizada a realização de novos levantamentos técnicos da EPE nas terras indígenas, para o inventário das bacias dos rios Juruena e Aripuanã. Este inventário subsidiaria a realização de estudos de viabilidade econômica de novos empreendimentos hidrelétricos nas duas bacias, o que significaria impactos ainda maiores para as comunidades e a possibilidade do governo federal continuar incentivando estes empreendimentos na região. Na reunião foi apresentado um mapa produzido pela EPE que identificou 22 novos aproveitamentos hidrelétricos com viabilidade econômica no entorno da Terra Indígena (TI) dos Enawenê Nawê, num trecho de cerca de 150 km de rio, logo acima da TI. No total, o mapa levanta 53 locais para construção de futuras centrais hidrelétricas nas bacias dos rios Aripuanã e Juruena – informou o site do Instituto Socioambiental.

Em 6 de agosto de 2008, o Ministro Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu os efeitos da liminar que impedia a continuidade das obras das oito usinas já licenciadas. Com isso, os empreendedores reiniciaram negociações sobre as compensações para as etnias atingidas. Em 07 de outubro de 2008, as etnias Rikbaktza, Paresí, Nambiquara e Mynky fecharam um acordo de seis milhões com o consórcio. Os Enawenê Nawê se recusaram a fechar qualquer acordo e ficaram politicamente isolados na região.

De acordo com uma carta enviada à ONU, os Enawenê Nawê assim protestaram: Não queremos as barragens sujando nossa água, matando nossos peixes, invadindo nossas terras.

O site 24 horas news lembra que o povo não come carne vermelha e depende quase exclusivamente do peixe. Sua vida espiritual gira em torno de rituais de pesca que têm lugar ao longo do ano. O ritual Iyaõkwa, praticado pelo povo Enawenê Nawê, é de tamanha importância para a diversidade cultural do Brasil que está em processo o seu tombamento como Patrimônio Imaterial Brasileiro, realizado pelo Iphan.

Todos esses fatores levaram os índios a realizar protestos violentos contra o acordo fechado pelas demais etnias. Além disso, o consumo de peixes contaminados por resíduos das obras da PCH Telegráfica estaria provocando diarreia em diversos membros da etnia.

Na manhã do dia 11 de outubro, cerca de 120 índios ocuparam o canteiro das obras da PCH Telegráfica, retiraram os funcionários do local e atearam fogo em máquinas, equipamentos, alojamentos e no escritório do Consórcio Juruena. Além dos prédios, pelo menos 12 caminhões foram destruídos. Ninguém ficou ferido. O protesto externou a insatisfação dos índios diante do poder público e da omissão deste em relação aos possíveis danos que poderiam sofrer. Segundo Daliaywacê Enawenê Nawê, liderança da etnia, a FUNAI deveria estar nos protegendo e está apenas atendendo aos empreendedores, negociando dinheiro. (…) Nós queremos é que façam todas as compensações para que nada mude no rio.

A exceção fica por conta da atuação do MPF, que desde 2005 tem acompanhado o caso e apoiado a etnia. Em 23 de outubro de 2008, o procurador da República em Mato Grosso, Mário Lúcio Avelar, se reuniu com um grupo de lideranças do povo Enawenê Nawê para discutir a proposta de uma moratória para impedir o licenciamento de novos projetos de aproveitamento hidrelétrico. Os índios exigem a realização prévia de uma avaliação dos impactos que o conjunto de barragens pode causar em cada uma das bacias do Estado de Mato Grosso. Para que isso ocorresse, porém, seria necessária que se assinasse um acordo entre Ministério Público, Fundação Nacional do Índio (FUNAI), índios e Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema).

Contrariando seu distanciamento anterior, em novembro de 2008, o presidente da FUNAI, Márcio Meira, e representantes do governo estadual do Mato Grosso, da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) participaram de encontro com lideranças das etnias Enawenê Nawê e Kamaiurá para discutir a realização de audiências públicas com todos os órgãos responsáveis por licenciamentos ambientais para que as reivindicações das comunidades fossem ouvidas. A Empresa de Pesquisas Energéticas (EPE) se comprometeu a realizar novos estudos sobre os impactos do Complexo Hidrelétrico na pesca no rio Juruena. No dia 31, os Enawenê Nawê também se reuniram com o governador Blairo Maggi para tentar resolver o impasse em torno do Complexo Hidrelétrico Juruena. Essas reuniões resultaram apenas na aproximação entre as partes, sem efeitos concretos em relação à suspensão das obras ou ao atendimento das reivindicações indígenas.

Em dezembro de 2008, um episódio veio acirrar ainda mais os ânimos e diminuir as possibilidades de acordo. No dia 14 daquele mês, quatro índios da etnia Enawenê Nawê denunciaram à Polícia Militar caso de agressão e ameaça sofrida no interior da PCH Telegráfica. Segundo o índio Lolauenacua, de 19 anos, ele e mais três índios, dos quais duas crianças, estavam pescando quando foram abordados pelo segurança de uma empresa terceirizada que presta serviços à PCH. O homem os ameaçou e os agrediu. O Delegado José Carlos prometeu apurar os fatos. Não há notícias de qualquer resultado positivo da investigação.

Em fevereiro de 2009, o caso ganhou repercussão internacional, quando a jornalista Christina Lamb, do Sunday Times, publicou um artigo expondo todo a situação na mídia britânica. Na mesma época, o IPHAN iniciou um trabalho de registro do Yaõkwá, no âmbito do projeto Vida nas Aldeias, sendo o ritual inscrito no Livro das Celebrações do Instituto em maio daquele ano. Contudo, o ritual é prejudicado pela ausência de peixes devido a insucessos na piracema.

De acordo com Vicent Carelli, do ISA: Dois meses depois, os índios pressionaram a FUNAI para a compra de peixes de criatório. Em três dias a FUNAI conseguiu dinheiro das construtoras da PCH (Pequena Central Hidrelétrica) Telegráfica para a compra de três mil quilos de peixe tambaqui para darem início ao capítulo mais importante do Yaõkwá.

No mês seguinte, junho de 2010, eles realizaram novos protestos contra as PCHs, dessa vez na cidade de Sapezal. Os índios denunciavam que novamente as águas do rio Juruena estavam barrentas e impróprias para o consumo humano.

As denúncias dos índios foi parte de um relatório divulgado pela ONG Survival International, por ocasião do Dia Internacional dos Povos Indígenas, em agosto de 2010. De acordo com o relatório: Os povos indígenas estão sofrendo de forma desproporcional o impacto negativo das usinas hidrelétricas construídas em suas terras de origem quase sem receber benefícios por isso.

Em novembro de 2010, o ritual do Yaõkwá foi – finalmente – reconhecido oficialmente como patrimônio imaterial brasileiro pelo IPHAN, passando desde então a ser considerado dever da União protegê-lo e preservá-lo. No ano seguinte, ele foi indicado para integrar uma lista de patrimônios culturais imateriais em necessidade urgente de proteção elaborada pela Unesco, sendo reconhecido pelo Comitê Intergovernamental para Salvaguarda do Patrimônio Imaterial reunido em Bali, na Indonésia.

No ano seguinte, os Enawenê Nawê tiveram ainda de enfrentar um grande incêndio, que destruiu pelo menos 15 casas na aldeia. Segundo informações da FUNAI, o incêndio começou quando eles tentavam queimar seu próprio lixo. Pelo menos quatro pessoas ficaram feridas e 300 ficaram desabrigados. Todos os bens que estavam nas malocas queimadas foram perdidos, como redes de dormir, vestimentas tradicionais e roupas que eles usam para ir à cidade. A perda mais significativa, no entanto, segundo Silva Júnior, foram os alimentos que ficam armazenados nas casas, correspondente a pelo menos metade da produção daquele ano. Em resposta, a FUNAI e a Defesa Civil encaminharam alimentos, lonas, e algumas ferramentas básicas para o início da reconstrução da aldeia.

No entanto, apesar das perdas materiais, a maior preocupação do grupo na época era com a questão espiritual. Alguns objetos importantes, como as máscaras que usam no ritual para alegrar os espíritos, foram queimados, e eles temiam pela vida do povo. Segundo a crença, quando falta alimento e quando falta o ritual com esses objetos, os espíritos ficam descontentes. Uma nova máscara não pode ser construída nessa época, pois ela tem um momento certo para ser confeccionada.

No ano seguinte, o ritual do Yaõkwá permanecia ameaçado pela escassez de peixes. Em 30 de março de 2012, os Enawenê Nawê protocolaram uma carta junto ao MPF denunciando a redução na disponibilidade de pescado. Em resposta, o MPF expediu ofício ao presidente da FUNAI, Márcio Meira, e ao diretor de Promoção ao Desenvolvimento Sustentável da FUNAI, Aloysio Guapindaia, pedindo providências imediatas para a doação de peixes. O MPF também recorreu à via judicial pedindo que a Justiça Federal determine a imediata doação de peixes aos Enawenê Nawê.

No dia 09 de abril, o juiz federal da 2ª Vara da Justiça Federal em Mato Grosso deferiu o pedido e determinou à intimação da FUNAI e das empresas Campos de Júlio Energia, Parecis Energia, Rondon Energia, Sapezal Energia, Telegráfica Energia para que antecipassem a doação de peixes, a fim de assegurar o ritual sagrado da comunidade indígena.

No ano seguinte, 2013, o MPF continuou a apoiar a luta indígena; dessa vez, no tocante a um antigo pleito dos Enawenê Nawê relacionado à construção de uma estrada ligando à aldeia Halaytawa a rodovia de acesso às cidades vizinhas. Atualmente o único caminho para chegar à área urbana exige pelo menos oito horas de navegação pelo rio Juruena. Desde 2009, a demanda é objeto de inquérito do MPF e, em 2013, finalmente a promotoria conseguiu se reunir com representantes da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), do Departamento Nacional de Infraestrutura (DNIT) e do Governo do Mato Grosso para discutir medidas para solucionar o problema.

Após a reunião ficou acordado que:

1)    &nbs;O Estado do Mato Grosso se comprometeu a apresentar, em 45 dias, estudo com análise do traçado já aberto [cerca de 31 dos 33 quilômetros previstos] e das medidas necessárias para durabilidade do ramal, e indicar os custos da obra. Em seguida, o estudo será encaminhado ao Ministério Público Federal em Mato Grosso, à FUNAI e ao ICMbio. A FUNAI e as lideranças Enawenê Nawê acompanharão a equipe do Governo do Estado do MT na elaboração do estudo.

2)     O Governo do MT apresentará o estudo ao ICMBio para que sejam adotadas as medidas necessárias relacionadas à regularização do ramal já iniciado.

3)     O DNIT e o Governo do MT vão verificar a possibilidade de disponibilizar os recursos financeiros necessários à realização da obra.

Em outubro daquele ano, o MPF novamente moveu uma ação civil pública em prol da etnia. Dessa vez, demandando que a Justiça Federal obrigasse a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) a concluir, em até 30 dias, o relatório para a revisão dos limites da Terra Indígena Enawenê-Nawê, incluindo a região do Rio Preto. Esta área foi excluída de demarcações anteriores, mas é considerada pelos índios como uma área imprescindível à sobrevivência física, cultural e alimentar daquele povo. Sendo a sua inclusão na TI considerada por antropólogos que realizaram estudos para a FUNAI como a única proposta viável para a garantia dos direitos indígenas e das condições necessárias para a sobrevivência da sociedade Enawenê, de acordo com as suas pautas culturais.

Para o MPF/MT, esse tempo de inação da FUNAI diante do pleito dos indígenas, que desde 2000 é arrastado pela administração do órgão, foi extremamente prejudicial à população indígena, acirrando os conflitos agrários na região e a degradação ambiental ao longo dos anos. Demonstra-se evidente que, diante do quase absoluto silêncio administrativo da FUNAI, a via judicial é a única capaz de assegurar as garantias constitucionais estabelecidas aos povos indígenas, afirmam as três procuradores da República, Talita de Oliveira, Ludmila Bortoleto Monteiro e Marcia Brandão Zollinger, que assinam a ação civil pública.

Cronologia:

1974: Primeiro contato oficial entre os Enawenê Nawê e a sociedade nacional através de missionários jesuítas membros da Missão Anchieta.

1987: Missionário Vicente Cañas é assassinado por fazendeiros interessados nas terras indígenas.

1998: Terras Enawenê Nawê são homologadas.

2002: Índios iniciam mobilização contra projetos de pequenas centrais hidrelétricas no rio Juruena.

2005: Maggi Energia transfere direitos de construção de PCHs ao Consórcio Juruena. Sema concede licença prévia a oito das doze PCHs de interesse do consórcio.

2006: MPF instaura inquérito administrativo para investigar licenciamento ambiental das PCHs.

2007: Licenças de instalação de oito empreendimentos são renovadas. MPF move ações civis públicas em defesa dos povos indígenas afetados pelos empreendimentos e exigindo a suspensão das obras.

Dezembro de 2007: Índios Enawenê Nawê ocupam obras da PCH Telegráfica em Sapezal exigindo suspensão de licenças ambientais dos empreendimentos no rio Juruena.

Abril de 2008: MPF obtém liminar e suspende obras de PCHs.

Julho de 2008: EPE, MME e FUNAI realizam negociações com representantes dos índios Rikbátsa, Cinta-Larga, Arara, Apiaká, Kayabi, Munduruku e Enawenê Nawê. EPE solicita autorização para realização de estudos técnicos de viabilidade de novos empreendimentos nos rios Juruena e Aripuanã. É apresentada estimativa de pelo menos 53 novos empreendimentos na bacia de tais rios, sendo 22 só no entorno da TI Enawenê Nawê.

Agosto de 2008: STF suspende liminares, liberando continuidade das obras.

07 de outubro de 2008: Etnias Rikbátsa, Pareci, Nambiquara e Mynky fecham acordo de seis milhões com o consórcio a título de compensação por impactos socioambientais dos empreendimentos. Povo Enawenê Nawê se nega a firmar acordos.

11 de outubro de 2008: Povo Enawenê Nawê ocupa novamente a PCH Telegráfica. Na ocasião, máquinas e equipamentos do consórcio são incendiados.

23 de outubro de 2008: MPF se reúne com os Enawenê Nawê e discute proposta de moratória a novos empreendimentos hidrelétricos no rio Juruena.

Novembro de 2008: Presidente da FUNAI, Márcio Meira, e representantes do governo estadual do Mato Grosso, da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) participam de encontro com lideranças das etnias Enawenê Nawê e Kamaiurá para discutir a realização de audiências públicas com todos os órgãos responsáveis por licenciamentos ambientais para que as reivindicações das comunidades sejam ouvidas.

31 de novembro de 2008: Povo Enawenê Nawê se reúne com o então governador Blairo Maggi.

14 de dezembro de 2008: Índios são agredidos na região da PCH Telegráfica.

Fevereiro de 2009: IPHAN inicia o registro e filmagem do ritual do Yaõkwá.

Maio de 2009: Yaõkwá é registrado como celebração oficial brasileira pelo IPHAN.

Julho de 2009: Pressionada pelos índios Enawenê Nawê, FUNAI compra peixes de cativeiro para continuidade do Yaõkwá, já que, devido a obstáculos à piracema, os peixes não desceram o rio nesse ano.

Junho de 2010: Enawenê Nawê protestam em Sapezal.

Agosto de 2010: Survival Internacional inclui caso dos Enawenê Nawê em relatório a respeito dos impactos das hidrelétricas sobre os povos indígenas do mundo.

Novembro de 2010: Yaõkwá é reconhecido como patrimônio imaterial brasileiro.

Setembro de 2011: Incêndio destrói casas na aldeia.

23 de novembro de 2011: Yaõkwá passa a integrar a lista de patrimônios culturais imateriais em necessidade urgente de proteção elaborada pela UNESCO.

Março de 2012: Povo Enawenê Nawê encaminha carta ao MPF denunciando ameaças ao Yaõkwá devido a escassez de peixes. MPF demanda providências a FUNAI e move ação judicial para garantir disponibilidade de pescado.

09 de abril de 2012: Juiz federal da 2ª Vara da Justiça Federal em Mato Grosso defere o pedido e determina a intimação da FUNAI e das empresas Campos de Júlio Energia, Parecis Energia, Rondon Energia, Sapezal Energia, Telegráfica Energia para que antecipem a doação de peixes.

Junho de 2013: MPF pressiona autoridades estaduais e federais a se comprometer com construção de estrada para ligar aldeia à rodovia.

Última atualização em: 02 jul. 2014.

Fontes

24 HORAS NEWS. Indígenas ameaçados voltam a expor Mato Grosso no cenário internacional. Disponível em: http://goo.gl/enUMZF. Acesso em: 08 jun. 2009.

______. Governo tenta convencer índios de MT a deixar explorar potencial hídrico. Disponível em: http://goo.gl/IWOhGJ. Acesso em: 08 jun. 2009.

AMAZONIA.ORG. Governo do Mato Grosso e índios Enawenê Nawê tentam diálogo a respeito de hidrelétrica. Disponível em: http://goo.gl/iLmgN2. Acesso em: 08 jun. 2009.

______. Índios reagem à hidrelétrica e ateiam fogo na PCH Telegráfica. Disponível em: http://goo.gl/sEfqOU. Acesso em: 08 jun. 2009.

CARELLI, Vicent. Hidrelétricas ameaçam ritual indígena protegido pelo Iphan. Amazonia.org, 28 maio 2010. Disponível em: <http://goo.gl/gLwkd1>. Acesso em: 01 jul. 2014.

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ÍNDIOS sofrem de forma desproporcional impacto de hidrelétricas. Amazônia.org, 09 ago. 2010. Disponível em: <http://goo.gl/pWRCck>. Acesso em: 01 jul. 2014.

INSTITUTO SOCIOAMBIENTAL. Enawenê Nawê pedem moratória para novos licenciamentos de hidrelétricas em Mato Grosso. Disponível em: http://goo.gl/ovYnkx. Acesso em: 08 jun. 2009.

INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO BRASILEIRO. Seis novos bens entram na lista de Patrimônio Cultural do Brasil. Combate Racismo Ambiental, 06 nov. 2010. Disponível em: <http://goo.gl/IBsx9U>. Acesso em: 01 jul. 2014.

MONTEIRO, Telma. Complexo Hidrelétrico do Juruena ameaça a sobrevivência dos Enawenê-Nawê. Combate Racismo Ambiental (republicando o blog Telma Monteiro), 26 jun. 2010. Disponível em: <http://goo.gl/eTjzcB>. Acesso em: 01 jul. 2014.

MPF/MT pede conclusão do estudo para revisão da Terra Indígena Enawenê-Nawê. MPF, 18 out. 2013. Disponível em: http://goo.gl/OyjtPL. Acesso em: 01 jul. 2014.

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RITUAL de tribo brasileira é indicado a patrimônio da UNESCO. Amazônia.org, 22 nov. 2011. Disponível em: http://goo.gl/ql5pJc. Acesso em: 01 jul. 2014.

RITUAL sagrado e alimentação de indígenas estão sob ameaça por falta de peixe. MPF, 16 abr. 2012. Disponível em: http://goo.gl/LSlNGy. Acesso em: 01 jul. 2014.

SOARES, Adélia. Ritual indígena dos Enawenê Nawê de Mato Grosso foi reconhecido hoje (23) pela UNESCO. Iphan, 23 nov. 2011. Disponível em: http://goo.gl/4LxC1N. Acesso em: 01 jul. 2014.

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