AM – Medidas para a sobrevida da quase extinta Etnia Juma

UF: AM

Município Atingido: Canutama (AM)

Outros Municípios: Canutama (AM)

População: Povos indígenas

Atividades Geradoras do Conflito: Atuação de entidades governamentais

Impactos Socioambientais: Alteração no regime tradicional de uso e ocupação do território

Danos à Saúde: Piora na qualidade de vida

Síntese

Com cerca de 10.000 habitantes, e localizado na bacia do rio Purus (região Sul Amazonense), o município de Canutama é o tradicional lar dos índios da etnia Juma. Os Juma pertencem a um conjunto de povos falantes da família lingüística Tupi-Guarani denominado Kagwahiva. No século XVIII, é provável que os Juma somassem de 12 a 15 mil índios. Após sucessivos massacres e a expansão das frentes extrativistas, os Juma se viram reduzidos a poucas dezenas na década de 1960. Em 1998, quando foram transferidos ilegalmente pela Administração Regional de Porto Velho para a Casa do Índio da capital rondoniense, restavam apenas cinco indivíduos: um pai com suas três filhas e uma neta. Hoje, são 16 indivíduos, incluindo pessoas da etnia Uru-Eu-Wau-Wau que casaram com as mulheres Juma. Apesar de terem logrado a demarcação de uma área de cerca de 38.0000 hectares no município, próximo á cidade de Lábrea, até hoje os Juma não foram retransferidos para seu território. Motivo pelo qual, em setembro de 2008, o Ministério Público Federal (MPF) entrou com uma ação civil pública contra a Fundação Nacional do Índio (Funai) exigindo a reintegração dos Juma a seu território tradicional.

Contexto Ampliado

Os Juma de Canutama são ainda hoje considerados como uma etnia em vias de extinção. Tradicionais habitantes da bacia do rio Purus, entre os atuais municípios de Lábrea e Canutama, os Juma contam hoje com apenas 16 indivíduos. Em 1998, eram apenas cinco um ancião, suas três filhas e uma neta e devido à impossibilidade de casamentos internos, eram considerados um povo extinto. Hoje já contam com 16 indivíduos, incluindo homens da etnia Uru-Eu-Wau-Wau que casaram com as mulheres Juma, e seus filhos, e uma área de 38.351 hectares no município de Canutama, homologada pelo governo federal em abril de 2004, que forma a T.I. Juma.


Este é apenas o último de uma história marcada por violência e massacres. Segundo dados do Instituto Socioambiental (ISA), os Juma formavam uma grande população no século XVII, com cerca de 12.000 a 15.000 índios. Após séculos de expansão da frente extrativista sobre a região, eles estavam reduzidos a algumas poucas dezenas em 1960. Desses, apenas cinco indivíduos chegaram ao ano de 1998. Eles recebiam a assistência esporádica da FUNAI, através da Administração Regional de Rio Branco, que possui um posto indígena em Lábrea, e da Frente de Contato Rio Purus, ligada ao Departamento de Índios Isolados da entidade.


Em 1998, a FUNAI começou a negociar a contratação de um antropólogo para propor uma solução alternativa ao povo, pensando em casamentos com indivíduos de organização social semelhante, uma vez que já não havia mais possibilidades matrimoniais internas. Ao mesmo tempo, e à revelia dos representantes da FUNAI tanto de Lábrea quanto de Brasília, a Administração Regional de Porto Velho retirou os Juma de sua terra, transferindo-os para a Casa do Índio, sob alegação de que lá seriam melhor tratados em razão do estado de saúde dos idosos e de uma índia grávida. Foram posteriormente encaminhados para a aldeia do Alto Jamary, na TI Uru-eu-wau-wau. Desse período surgiu o casamento de três caçadores Uru-eu-wau-wau com as mulheres Juma. Eles e seus filhos formam a atual população Juma.


Apesar da pouco convencional solução da FUNAI para a sobrevida da etnia, a ação de sua Administração Regional de removê-los para áreas fora de seu território tradicional é vista como ilegal e ilegítima pelos próprios índios, que, com o auxílio de entidades do movimento indígena, como a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), e da igreja católica, como o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), conseguiram o apoio do Ministério Público Federal (MPF) para pleitearem sua volta à Terra Indígena (TI) Juma.


Segundo o MPF, a FUNAI vem adiando o retorno dos Juma à Canutama desde novembro de 1998, quando o Departamento de Assistência (DAS), o Departamento de Índios Isolados (DII) e a Administração Executiva Regional de Porto Velho (AERPVH) celebraram um acordo para viabilizar esse retorno.


Em março de 1999, a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) representaram à Procuradoria da República no Amazonas (PR/AM) denunciando a transferência, considerada por eles como ilegal, dos índios Juma, efetuada por agentes da Funai.


Por esse motivo, em abril de 2008, o MPF/AM recomendou que a Funai elaborasse projeto detalhado de todas as ações a serem implementadas para o retorno dos índios às suas terras, seus custos e cronograma, no prazo máximo de 20 dias, a contar do recebimento da recomendação, bem como procedesse, no prazo máximo de 90 dias, ao retorno dos mesmos à suas terras, dando assim cumprimento às disposições da Constituição Federal, preservando os vínculos familiares dos indígenas, observando a vontade deles e garantindo-lhes condições de ocupar e permanecer na terra indígena Juma.


O não cumprimento dessa recomendação levou a entidade a ajuizar, em setembro de 2008 e por meio do procurador da República, Rodrigo da Costa Lines, uma ação civil pública contra a Funai exigindo o imediato retorno dos indígenas da etnia Juma às suas terras tradicionalmente ocupadas. Além disso, o pedido incluiu danos morais coletivos em consequência dos prejuízos causados aos índios da etnia Juma pela transferência compulsória realizada ilegalmente pela FUNAI.


A juíza da 3ª Vara Federal, Maria Lúcia Gomes de Souza, determinou a intimação da União para manifestação sobre os pedidos de antecipação de tutela, antes de decidir acerca dos pedidos veiculados pelo MPF. Contudo, até hoje, o caso aguarda julgamento e permanece indefinido.


Ao final d e 2008, o judiciário determinou o retorno dos Juma à TI.


O primeiro deslocamento dos índios juma para a terra ocupada tradicionalmente aconteceu em 2009, 11 anos após a transferência para a terra dos uru-eu-wau-wau. Em entrevista ao portal Amazônia Real, o indigenista Leonardo Cruz conta que acompanhou a viagem das famílias de Mborehá, Mandei e o pai delas, Aruká, além de funcionários da Funai ao local: Ficamos por lá 20 dias num acampamento, disse.


Em 2010, conforme o indigenista, o grupo voltou à terra Juma para fazer uma maloca na aldeia, retornando 22 dias depois.


Travassos afirmou à reportagem do Amazônia Real que, em 2011, seus funcionários acompanharam os jumas em uma viagem de dez dias à reserva. Eles ficaram debaixo de lonas, pois na época ainda não havia estrutura de aldeia, contou.


Em 2012, segundo o coordenador, foram realizadas várias incursões ao território juma. Eles permaneceram 170 dias no local, independente da presença de funcionários da FUNAI. Na aldeia juma do rio Açuã foi construída uma cozinha.


Enquanto aguardavam a concretização do retorno definitivo ao seu território tradicional, uma nova esperança do ponto de vista etnológico reacendeu para os Juma. Em dezembro de 2011, a expedição da Frente de Proteção Etnoambiental do Madeira (FPEA Madeira) da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) confirmou ter encontrado vestígios de índios isolados em uma área da Terra Indígena Katauixi/Jacareúba, localizada entre os municípios de Lábrea e Canutama, cerca de 30 quilômetros do canteiro de obras da UHEs Santo Antônio e Jirau.


Em entrevista à repórter Elaíze Farias do jornal A Crítica, o coordenador da FPEA Madeira, Rogério Vargas Motta, confirmou que, aproximadamente em outubro de 2012, eles foram contatados pelos índios isolados durante expedição realizada com o auxílio dos índios Apurinã. Segundo Motta, os indícios apontam para a possibilidade de que este grupo de índios pertença ao mesmo da etnia juma.


Motta reiterou que era preciso elaborar um Plano de Trabalho mais duradouro junto à área dos índios isolados para evitar impactos sociais provocados pelas duas hidrelétricas e pelo avanço de invasão nas áreas sobrepostas – o local fica no entorno do Parque Nacional Mapinguari e Terra Indígena Caititu.


Em agosto de 2013, 15 anos após sua retirada forçada, os Juma finalmente retornaram a seu território tradicional no rio Purus. Essa nova tentativa de retorno, a quinta, encontrou melhores condições de habitação e maior possibilidade de sucesso. Porém, as dificuldades de adaptação dos guerreiros Uru-eu-wau-wau – que, devido ao retorno das suas respectivas esposas à terra de seus antepassados, foram forçados a abandonar suas próprias famílias e seu lar ancestral, sendo, dessa vez, eles os exilados em terras alheias -, ainda são considerados obstáculos ao retorno definitivo dos Juma a seu território.


Entrevistado por Kátia Brasil, do Amazônia Real, o sertanista Sydney Possuelo, 73, ex-presidente da Funai e coordenador do Departamento de Índios Isolados em 1993, afirmou que foi contrário à retirada dos juma da terra tradicional, mesmo a etnia estando desassistida e abandonada pela própria fundação e missionários. Essa história serve para dizer o seguinte: não se tira índio da terra tradicional dele. Tudo que se faz nesse sentido dá errado. Hoje a etnia sofre com o drama do retorno e da adaptação dos maridos das juma, disse Possuelo. Nós mesmos, que somos civilizados, quando vamos para outro país temos saudade da nossa erra. Imagina aqueles que só têm como afinidade a mata, o ambiente em que nasceu!, concluiu.


Por outro lado, segundo relatório de Ivã Bocchini, coordenador regional da FUNAI de Humaitá (AM), Aruká Juma (que tem aproximadamente 75 anos de idade e é o último descendente masculino do grupo original dos Juma) vivia desgostoso e sofrendo por estar distante de sua terra. A vontade pelo retorno era grande. Hoje o velho Aruká está animado e voltou à ativa. É visto o dia todo trabalhando, confeccionando flechas, colhendo frutos. Já sorri mais e interage bem com a família, que cresce, afirmou Bocchini.


De acordo com Brasil: Com relação à educação e saúde, a fundação afirma que iniciou acordo com as prefeituras de Canutama e Humaitá, ambas no Amazonas, para envio de equipes de enfermeiros e contratação de um professor e construção de uma escola.


Cronologia:


Século XVII: Primeiros contatos entre brancos e os Juma. Estima-se que havia entre 10 e 15 mil indivíduos na época.


1960: Frentes de colonização massacram povo Juma, apenas algumas centenas sobrevivem.


1998: Etnia Juma é considera etnologicamente extinta. Sobreviventes são transferidos para a aldeia do Alto Jamary, na TI Uru-eu-wau-wau. Mulheres Juma se casam com três caçadores Uru-eu-wau-wau.


Novembro de 1998: FUNAI estabelece internamente acordo para volta dos Juma à Canutama.


Março de 1999: Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) representam à Procuradoria da República no Amazonas (PR/AM) denunciando a transferência ilegal dos índios Juma, efetuada por agentes da FUNAI.


Abril de 2004: FUNAI demarca TI Juma.


Abril de 2008: Após quase uma década de adiamentos, MPF recomenda à FUNAI que elabore projeto detalhado de todas as ações a serem implementadas para o retorno dos índios Juma às suas terras tradicionais. Um prazo de 90 dias é estabelecido.


Setembro de 2008: MPF ajuiza ação civil pública contra a FUNAI exigindo o imediato retorno dos indígenas da etnia Juma às suas terras.


Fins de 2008: Judiciário determina retorno dos Juma às suas terras tradicionais.


2009: 1ª tentativa de retorno dos Juma à TI. Permanência dura 20 dias.


2010: 2ª tentativa de retorno dos Juma à TI. Permanência dura 22 dias e uma maloca é construída no local.


2011: 3ª tentativa de retorno dos Juma à TI. Ficam por apenas 10 dias.


2012: 4ª tentativa de retorno dos Juma à TI. Ficam por 170 dias e constroem uma cozinha na aldeia.


2013: 5ª tentativa de retorno dos Juma à TI. FUNAI instala um gerador e uma bomba dágua no local. Grupo permanece maior parte do ano na TI Juma, visitando os Uru-eu-wau-wau por apenas dois meses. FUNAI inicia negociações com prefeituras da região para construção de uma escola e envio de equipes de saúde ao local.

Última atualização em: 09. jul. 2014.

Fontes

BRASIL, Kátia. Adaptação é obstáculo no retorno dos Juma ao Purus (AM). Amazônia Real, 20 out. 2013. Disponível em: http://goo.gl/iS3cbU. Acesso em: 08 jul. 2014.


INSTITUTO SOCIOAMBIENTAL. Juma. Disponível em: http://goo.gl/9An2oP. Acesso em: 28 nov. 2008.


______. TI Juma – Caracterização. Disponível em: http://goo.gl/1YMm7g. Acesso em: 28 nov. 2008.


MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. MPF/AM propõe ação contra FUNAI em favor da etnia Juma. Disponível em: http://goo.gl/UfBgX7. Acesso em: 28 nov. 2008.


______. Ação quer o imediato retorno dos indígenas a suas terras tradicionalmente ocupadas. 25 set. 2008. Disponível em: http://goo.gl/xVAQEj. Acesso em: 08 jul. 2014.


O GLOBO. Índios Juma tentam voltar para seu território. Disponível em: http://goo.gl/EnGPns. Acesso em: 28 nov. 2008.

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