SC – Imbituba segue sofrendo com degradação ambiental

UF: SC

Município Atingido: Imbituba (SC)

Outros Municípios: Imbituba (SC)

População: Moradores de aterros e/ou terrenos contaminados, Moradores de bairros atingidos por acidentes ambientais, Operários

Atividades Geradoras do Conflito: Atuação de entidades governamentais, Barragens e hidrelétricas, Hidrovias, rodovias, ferrovias, complexos/terminais portuários e aeroportos, Indústria química e petroquímica, Mineração, garimpo e siderurgia, Petróleo e gás – refino, Petróleo e gás – transporte, Políticas públicas e legislação ambiental, Termoelétricas

Impactos Socioambientais: Alteração no regime tradicional de uso e ocupação do território, Poluição atmosférica, Poluição de recurso hídrico, Poluição do solo

Danos à Saúde: Doenças não transmissíveis ou crônicas, Piora na qualidade de vida

Síntese

Os impactos socioambientais negativos gerados pelo setor carbonífero ao sul de Santa Catarina, ao longo do século passado, são amplamente conhecidos. Por toda a região, diversos municípios foram atingidos pelas atividades desse setor, desde os trabalhadores nas minas aos operários nas usinas de beneficiamento; dos empregados das usinas termoelétricas aos moradores do entorno das plantas.

Em Imbituba, a degradação ambiental foi gerada indiretamente através da instalação da Indústria Carboquímica Catarinense (ICC), criada para aproveitar os rejeitos piritosos da mineração do carvão mineral. Outrora um resíduo derivado da baixa qualidade do minério, a pirita tornou-se a base da produção de compostos para a indústria de fertilizantes. Entre 1979 e 1992, a ICC produziu ácido sulfúrico e ácido fosfórico a partir de rochas fosfóricas vindas de outras partes do país e do exterior, além de produzir pirita oriunda de Capivari de Baixo/SC.

Na década de 1990, com o advento da consolidação da redemocratização política – e de uma política econômica neoliberal que previa a redução do papel do Estado como catalisador da economia e a privatização ou fechamento de diversas empresas públicas -, a ICC encerrou suas atividades, deixando para trás pilhas de resíduos altamente poluentes, além de uma paisagem de ?terreno lunar? em Criciúma e Forquilhinha. Se, por um lado, a decadência econômica da ICC trouxe miséria e empobrecimento para muitas famílias, seu legado impede que alternativas avancem, já que atinge diretamente atividades agrícolas, a pesca e o turismo.

Após décadas de inércia, o MPF/SC e o poder público municipal tem agido para que a ICC – e a sua atual controladora e poluidora solidária, a Gaspetro – seja responsabilizada pela poluição e obrigada a promover medidas de recuperação ambiental. Em Imbituba, a prefeitura do município ensaia a realização de estudos para determinar a real extensão dos impactos socioambientais e de potenciais agravos à saúde da população.

Contexto Ampliado

Segundo Alcides Goulart e Fábio Moraes, desde meados da década de 1930 havia um persistente debate no meio carbonífero catarinense a respeito da possibilidade de aproveitamento da pirita gerada no processo de exploração do carvão mineral. Uma das características do carvão catarinense é sua alta concentração de enxofre, o que gera grande poluição ambiental em todas as suas fases, da mineração à queima. Inicialmente, esse subproduto não era aproveitado, provocando grandes impactos ambientais e obrigando o país a se tornar importador de enxofre à medida que modernizava seu parque industrial e investia em pesticidas, fertilizantes e outros insumos da agricultura baseada na chamada “revolução verde”.

Entre 1934 e 1965, diversos estudos foram realizados a fim de viabilizar o aproveitamento do material piritoso presente no carvão catarinense, a fim de criarem-se as condições para uma produção nacional de enxofre e seus derivados para fins agroindustriais. Em 1953, o Plano Nacional do Carvão já previa a construção de uma usina para produção de enxofre em Santa Catarina. Mais de duas décadas se passariam antes que tal projeto começasse a se concretizar. Em 1962, é criada a Siderúrgica de Santa Catarina S.A (SIDESC), empresa estatal que se tornaria a Indústria Carboquímica Catarinense (ICC), em 1969.

A partir de então, a empresa passa a fazer parte da Petrofértil, uma subsidiária da Petrobras voltada para a produção de fertilizantes. Instalada em Imbituba e iniciando sua operação em 1979, a ICC funcionou durante duas décadas, dedicando-se à produção de ácidos sulfúrico e fosfórico.

Gourlarti e Moraes destacam a importância da empresa para a economia regional. Segundo os pesquisadores, “durante o período que esteve em operação, de 1979 a 1992, a ICC, que tinha elevados custos de manutenção, foi deficitária. Expressiva para a economia regional, a estatal se manteve entre os três maiores empregadores do município de Imbituba, atingindo o máximo de 329 trabalhadores (próprios e terceirizados) em 1988, e um importante elo do complexo carbonífero, consumindo, em treze anos, mais de 2,3 milhões de toneladas de pirita. Chegou a 15% da demanda brasileira de ácido fosfórico, em 1985 e 1988. Seu auge pode ser identificado entre os anos de 1982 e 1985, onde os recordes de produção foram várias vezes superados, mas foi em 1988 que a carboquímica chegou ao máximo de sua produção, tanto de ácido sulfúrico como de ácido fosfórico”.

Durante décadas, a geração de empregos serviu de álibi para que os aspectos autoritários de sua instalação, e os riscos ambientais inerentes à sua atividade, fossem ignorados. Criada e instalada em pleno governo militar, a ICC seguiu o roteiro padrão da época colocando os interesses econômicos acima dos direitos sociais e do equilíbrio ambiental. Prevista para ser instalada numa área portuária de 106.000 m², pertencente ao Departamento Nacional de Portos e Vias Navegáveis, ICC exigia áreas para a deposição adequada de seus subprodutos: para tanto, 1400 hectares de terras urbanas e rurais foram desapropriadas. As famílias removidas, sem qualquer chance de resistência ou negociação, foram reinstaladas no recém-criado bairro de Vila Nova Alvorada.

As atividades da ICC consumiam matéria-prima oriunda de Araxá/MG e Catalão/GO – ou do Marrocos (rochas fosfóricas) -, transportadas de trem e navio até Imbituba, além de pirita fornecida pela CSN através do Lavador de Capivari em Capivari de Baixo/SC.

O funcionamento da ICC deu novo impulso à indústria carbonífera catarinense, na medida em que consumia matéria-prima que, de outra forma, seria considerada apenas um rejeito de difícil manejo, impulsionando a indústria de fertilizantes nacional com o barateamento da matéria-prima dessas indústrias.

Além dos óbvios impactos ambientais relacionados à sobrevida dada a um setor altamente poluente como o setor carbonífero, a ICC também gerava sua própria degradação ambiental. O projeto inicial previa que os resíduos gerados pela ICC (óxido de ferro e gesso residual) seriam reaproveitados por plantas de produção de cimentos, tintas e vernizes. Entretanto, como relata Maria Conceição Raimundo, isso não ocorreu: “O óxido de ferro era resfriado em tambor rotativo. A seguir, através de correias transportadoras, ia para uma moega, de onde era retirado por caminhões, transportado e acumulado em depósito próximo das redondezas da fábrica. O gesso passou a ser depositado também nas redondezas, porque não havia de imediato uma alternativa de consumo”.

No início dos anos 1990, a ICC sofreu os impactos de mudanças na política econômica brasileira. As primeiras eleições presidenciais em 25 anos, derivada do processo de reabertura política iniciado na década anterior, elegeram um grupo político que se pretendia renovador em relação ao regime passado, o qual em consonância com o receituário neoliberal em voga nos países desenvolvidos defendia, entre outras medidas, a desestatização – ou privatização – das empresas estatais consideradas antieconômicas. Com dificuldades para equilibrar suas contas desde meados da década de 1980, a ICC foi incluída no Plano Nacional de Desestatização (PND).

O fim dos subsídios e a concorrência de fornecedores internacionais – que conseguiam fornecer a matéria-prima a um custo mais baixo para a indústria nacional de fertilizantes – foram fatais para a ICC, que encerrou sua produção em 1992. Sem interessados na sua compra, a empresa seria liquidada dois anos depois.

O fim das atividades da ICC, contudo, não pôs fim aos problemas gerados por 20 anos de atividades sem qualquer tipo de controle ambiental. Sua infraestrutura e os resíduos gerados podem ser encontrados até hoje em Imbituba, Criciúma e Forquilhinha (onde funcionava, desde 1982, a unidade de concentração da pirita da empresa). Além disso, com o fim da ICC, seus funcionários foram dispensados, provocando a decadência e o empobrecimento dos trabalhadores que dela dependiam, direta ou indiretamente.

Segundo Raimundo, a publicização dos impactos ambientais da ICC impediu que, num primeiro momento, o turismo, outra atividade importante no município, substituísse a indústria como atividade principal. Isso agravou ainda mais o desemprego e intensificou as tensões sociais.

Desde o fechamento da ICC, o destino do material depositado nos terrenos da empresa ainda é uma grande preocupação para a população do seu entorno. Após o impacto inicial, a economia do município vem se reorganizando em torno do setor turístico, especialmente em torno das vertentes ecológicas e de aventura.

Ondas propícias para a prática de surf e a localização da cidade na rota de migração da baleia-franca (Gênero Eubalaena) atraem centenas de turistas todos os anos. Para uma cidade que se pretende “a capital nacional da baleia-franca”, as montanhas de fosfogesso à beira-mar são uma lembrança incômoda de um passado recente não tão ecologicamente correto.

Entre as propostas para o aproveitamento do material está o seu uso na construção civil. Segundo Ana Cajazeiras e Armando Castilhos Jr, há em Imbituba cerca de três milhões de toneladas de fosfogesso que poderiam “se constituir em matéria-prima de baixo custo”.

Já o Ministério Público Federal, em Santa Catarina, entende que a ICC e a Gaspetro – subsidiária da Petrobras que substituiu a Petrofertil no controle da empresa – são solidárias na responsabilidade sobre os resíduos gerados e ainda estocados em seus terrenos. Em janeiro de 2007, o MPF/SC entrou com uma ação civil pública contra as empresas a fim de buscar judicialmente a recuperação de uma área de 977.932,71 m², localizada nos municípios de Forquilhinha e Criciúma.

Estima-se que os custos para recuperar esses danos seriam da ordem de R$ 20 milhões. Segundo os procuradores, esse recurso deveria ser investido em um Projeto de Recuperação de área Degradada (Prad) a ser apresentado ao IBAMA, a fim de impedir que a degradação verificada no local (onde ainda existem pilhas de resíduos da atividade de concentração de pirita) continue a impactar as atividades agrícolas, pesqueiras e a ameaçar a qualidade de vida e a saúde da população do entorno.

Não há registro de ação semelhante em relação à degradação em Imbituba. Pouco se conhece a respeito da real extensão dos impactos provocados pela ICC naquele município. Para preencher essa lacuna, a Prefeitura Municipal de Imbituba foi autorizada pela Câmara Municipal daquele município, em abril de 2010, a firmar convênio com o Instituto de Pesquisas Ambientais e Desenvolvimento Humano Catarinense (IPADHC), a fim de “elaborar estudo técnico detalhado diagnosticando o impacto ambiental no solo imbitubense ocasionado pela ação da Indústria Carboquímica Catarinense ” ICC no Município e, ainda, estruturar e viabilizar encontro de profissionais especializados no tema, que atuarão na elaboração do estudo técnico científico pretendido pelo Município”.

Como o convênio ainda estar por ser firmado e não há notícias a respeito de sua efetivação ou do andamento dos estudos, não há como descrever seus resultados. Contudo, fica patente o interesse do município em conhecer os impactos gerados pela empresa, o que pode gerar novas ações judiciais no futuro.

Cronologia

1978: Início das operações da ICC. Unidade de produção de ácido sulfúrico entra em operação.

1979: Inicio das operações da unidade de produção de ácido fosfórico da ICC.

Janeiro de 2007: Ministério Público Federal em Santa Catarina (MPF/SC) propõe ação civil pública a fim de obrigar a Petrobrás Gás S/A (Gaspetro) e a ICC a recuperarem área de mais de 970 mil m², contaminada por material piritoso abandonado pelas empresas em Criciúma e Forquilhinha.

Abril de 2010: Câmara Municipal de Imbituba autoriza administração municipal a firmar convênio com o Instituto de Pesquisas Ambientais e Desenvolvimento Humano Catarinense (IPADHC), com o objetivo de elaborar estudo técnico detalhado diagnosticando o impacto ambiental no solo imbitubense ocasionado pela ação da ICC no município.

Cronologia

1978: Início das operações da ICC. Unidade de produção de ácido sulfúrico entra em operação.

1979: Inicio das operações da unidade de produção de ácido fosfórico da ICC.

Janeiro de 2007: Ministério Público Federal em Santa Catarina (MPF/SC) propõe ação civil pública a fim de obrigar a Petrobrás Gás S/A (Gaspetro) e a ICC a recuperarem área de mais de 970 mil m², contaminada por material piritoso abandonado pelas empresas em Criciúma e Forquilhinha.

Abril de 2010: Câmara Municipal de Imbituba autoriza administração municipal a firmar convênio com o Instituto de Pesquisas Ambientais e Desenvolvimento Humano Catarinense (IPADHC), com o objetivo de elaborar estudo técnico detalhado diagnosticando o impacto ambiental no solo imbitubense ocasionado pela ação da ICC no município.

Fontes

CAJAZEIRAS, Ana P e CASTILHOS JUNIOR, Armando B. Reutilização do fosfogesso na construção civil – aspectos ambientais.In: Congreso Interamericano de Inginería Sanitaria y Ambiental, 26, Lima, Peru, 1998. Anais. Lima: AIDIS, 1998. Disponível em: http://www.bvsde.paho.org/bvsaidis/resisoli/peru/brares171.pdf. Acesso em: 27 mai. 2010.

CâMARA MUNICIPAL DE IMBITUBA. AUTóGRAFO Nº 60, 13 DE ABRIL DE 2010. Disponível em: http://www.cmi.sc.gov.br/Arquivos/Projetos/ec67779115d16b171486d782acd593ea.doc. Acesso em: 27 mai. 2010.

GOULARTI Fº, Alcídes e MORAES, Fábio F. de. Formação, expansão e desmonte parcial do complexo carbonífero catarinense. Disponível em: http://www.fee.tche.br/sitefee/download/jornadas/2/e6-01.pdf. Acesso em: 27 mai. 2010.

NUNES, Cléria. Recuperação de área degradada no sul de SC pode chegar a R$ 20 milhões. Notícias do MPF, Brasília, 26 jan. 2007. Disponível em: http://www.fee.tche.br/sitefee/download/jornadas/2/e6-01.pdf. Acesso em: 27 mai. 2010.

RAIMUNDO, Maria Conceição M. B. O Estado na criação: crise e reestruturação do Porto de Imbituba (SC). Disponível em: http://bdtd.ibict.br/. Acesso em: 27 mai. 2010.

2 comentários

    • 2024, #tapior.

      com a especulação imobiliária, fruto do mal planejamento militar, que de deu origem aos herdeiros da ICC, que hoje querem construir edificações de luxo/LIXO em APP – Áreas de Proteção Permanente e APA – Áreas de Preservação Ambiental.

      Ao invéz deles terem a mínima empatia e responsabilidade de lidar com lidar com os impactos na saúde dos imbitubenses e turistas, deixados por seus genitores, querem agora destruir nascentes, restingas e butiazais, com água potável e alimentos deliciosos, para trazer mais pessoas para a região, para suprir e lidar com a FALSA necessidade de ampliação dos resíduos industriais que trafegam pelo porto. Afinal, sabemos que 13% dos agrotóxicos utilizados no Brasil, chegam por essa cidade. E os índices de câncer aumenam em 702 mil novos casos a cada ano… Pessoas vivendo mais… Mais Doentes por Mais Tempo…

      #Queremos
      #ArPuro
      #ÁguaLimpa
      #SEMagrotóxico
      #comidadeVerdade
      #morariaDignia
      #Tods

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