MA – Pequenos agricultores do Maranhão lutam contra monocultura da soja, migração e deterioração ambiental, da saúde e do trabalho

UF: MA

Município Atingido: Tasso Fragoso (MA)

Outros Municípios: Alto Parnaíba (MA), Balsas (MA), Loreto (MA), Tasso Fragoso (MA)

População: Agricultores familiares

Atividades Geradoras do Conflito: Monoculturas

Impactos Socioambientais: Alteração no regime tradicional de uso e ocupação do território, Assoreamento de recurso hídrico, Desmatamento e/ou queimada, Erosão do solo, Poluição de recurso hídrico, Poluição do solo

Danos à Saúde: Doenças não transmissíveis ou crônicas, Piora na qualidade de vida

Síntese

Na região de Vão da Salina, Município de Balsas, 14 famílias de pequenos agricultores estão sendo confinadas pelas grandes fazendas de soja e sofrendo a exposição aos defensivos agrícolas da monocultura.

Segundo denunciam o Fórum Carajás e a Rede de Informação e Ação pelo Direito a se Alimentar (Fian), em 2003, o fazendeiro Jorge Henrique Pes, mais conhecido como Jorge da Serrana, foi acusado de usar um avião para pulverizar as lavouras (1). Os agrotóxicos dissipados por meio tão invasivo atingiram as famílias e os recursos hídricos no entorno da fazenda. Episódios de vômitos, dores de cabeça e irritação nos olhos foram relatados pelos atingidos. Na mesma ocasião, o produtor de soja teria desmatado os declives do perímetro da fazenda, deixando sem cobertura áreas de encosta do planalto do Cerrado maranhense local. O desmate nesta forma ameaça de desmoronamentos e assoreamento os rios próximos

A morte de duas crianças da comunidade de Brejão, em Loreto, ocorreu na semana subseqüente ao da pulverização acima relatada, por provável intoxicação por agrotóxicos (2). A intoxicação por agrotóxicos pode causar lesão hepática e câncer, além de outros problemas de saúde (3).

Em 2003, o Governador do Maranhão e o Ministério Público Estadual, receberam cartas cobrando medidas contra o fazendeiro Jorge Henrique Pes e a indenização das famílias atingidas pelo uso indiscriminado de agrotóxicos.

O ritmo de crescimento da lavoura da soja no sul do Estado é acelerado. Em menos de 20 anos, cresceu de 4 mil para 360 mil hectares. O vertiginoso crescimento foi acompanhado de perversidades no manejo e forma de produção da soja. Em maio de 2008, a Agência Estadual de Defesa Agropecuária (Aged) publicou os resultados da inspeção sanitária vegetal na região de Balsas, abrangendo 14 municípios e uma área de 62 mil quilômetros quadrados, com o cadastramento de 272 fazendas de soja.

Ao manejo inadequado de agrotóxicos e de outras tecnologias empregadas na monocultura da soja soma-se o registro de utilização da força de trabalho em condições análogas à da escravidão. O Grupo Móvel de Fiscalização de Combate ao Trabalho Escravo da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Maranhão (SRTE/MA) resgatou, em fazenda de soja no município de Balsas, em outubro de 2008, nove trabalhadores nessas condições (4).

Contexto Ampliado

A promulgação da Lei de Terras do Estado, pelo então governador José Sarney, em 1969, representou um marco na reorientação econômica do Maranhão. A diretriz era dar aproveitamento ao vasto território de vegetação nativa, favorecendo a ocupação das terras pelos empreendedores do agronegócio vindos de outras regiões do país.

O clima e a topografia favoráveis, associados aos investimentos em infra-estrutura, transformaram rapidamente a paisagem natural em pastagens, campos de soja, de arroz e em minas a céu aberto. A produção de soja no sul do Maranhão beneficia-se do terminal graneleiro da Cargill, em Itaqui (São Luiz), destinado à exportação, e tem a alternativa de abastecer a fábrica da Bunge Alimentos, no sul do Piauí. A malha ferroviária construída para o Grande Projeto Carajás e de outros meios de transportes propiciam o fácil escoamento da produção.

Contudo, a opção de servir o Maranhão à expansão da fronteira agrícola brasileira não ocorreu sem perdas sociais. A massa de pequenos produtores e trabalhadores rurais, descendentes de escravos, índios ou imigrantes da lavoura açucareira nordestina, que se apoiavam na pequena lavra de subsistência, foi gradualmente expulsa de suas terras pela especulação imobiliária e a ação de grileiros. Cooptados como trabalhadores assalariados da empresa latifundiária, muitos viram o emprego no campo reduzido pela mecanização das atividades da monocultura. A migração para as periferias dos centros urbanos foi acentuada, com a favelização e inchaço das cidades, desprovidas de infra-estruturas adequadas. Parcela dos destituídos da condição de sobrevivência no interior do Maranhão foi buscar oportunidades de trabalho nas lavouras de soja do Mato Grosso, nas minas do Pará ou nas plantações de cana-de-açúcar em São Paulo.

O Maranhão ocupa a pior posição no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) no Brasil. O município de Balsas, principal pólo da monocultura da soja, ocupa a 3.060ª colocação, entre os 5.564 municípios brasileiros (5).

O duplo movimento resultante da concentração fundiária -negação ao trabalhador dos meios de subsistência, seguido da expulsão/migração em busca de emprego – transformou o Maranhão no maior fornecedor de mão-de-obra em condições similares à do trabalho escravo para outros entes da federação, principalmente Pará e Mato Grosso. Não obstante o fornecimento de trabalhadores recrutados em outros estados para trabalhos em condições aviltantes, essa forma de exploração do trabalho ocorre também em escala considerável no Maranhão. Há vários relatos de trabalhadores da lavoura da soja (bem como dos carvoeiros do cerrado e da floresta), instalados em alojamentos precários, dividindo espaço com ferramentas, agrotóxicos etc. Segundo levantamento da Comissão Pastoral da Terra (CPT), somente em 2007, foram libertados 378 trabalhadores reduzidos à condição de escravos no Maranhão, 13 deles, crianças (6).

Os custos sociais e ambientais do agronegócio extrapolam as fronteiras do Maranhão. Estados como o Piauí, Tocantins, Maranhão, Goiás e Bahia vivem a mesma realidade. Os impactos e mecanismos sociais e econômicos da produção da Soja foram tema central de seminário organizado pelo Instituto Centro Vida (ICV) e o Centro de Apoio Sócio-Ambiental (Casa), em julho/2008, em Brasília. Acredita-se que cerca de 70% da população sertaneja maranhense tenha, no mesmo período, deixado o campo para viver nas cidades ou em outros estados. A escassez de áreas para as populações tradicionais e pequenos produtores é, de outra maneira, apontada como importante causa do aumento dos conflitos de terras no Maranhão. A CPT identificou, no ano de 2007, 5.818 disputas, em 76 municípios (7). Em 2004, o Seminário Bioma Cerrado denunciou o avanço da monocultura da soja, e propôs uma mobilização nacional em defesa da vida e dos povos do Cerrado.

No Maranhão, as distorções do modelo desenvolvimentista adotado estão sendo combatidas com a mobilização da sociedade civil e de alguns setores do Estado em prol de políticas públicas que passam pela desconcentração e regularização fundiária. No Plano para a Erradicação do Trabalho Escravo, do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), há previsão de medidas para o acesso do trabalhador ao campo, por meio de reforma agrária e da regularização fundiária (8). A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 438/2001, caso aprovada, significará um meio importante para combater o emprego do trabalho escravo. A PEC prevê o confisco de terras nas quais forem encontrados trabalhadores tratados em condições análogas à do regime da escravidão.

Última atualização em: 04 de outubro de 2009

Fontes

(1) GTA. Maranhão protesta contra a soja. Disponível em http://www.gta.org.br/noticias_exibir.php?cod_cel=92&regional=1. Último acesso em 16/12/2008.

(2) Maranhão – as vísceras do sertão. 08/12/2008. O Furo. Disponível em http://rogerioalmeidafuro.blogspot.com/. Último acesso em 16/12/2008.

(3) Secretaria de Saúde mapeia trabalhadores expostos a agrotóxicos. Disponível em http://www.meionorte.com/noticias,Secretaria-de-Saude-mapeia-trabalhadores-expostos-a-agrotoxicos-,9144.html. Último acesso em 16/12/2008.

(4) Aged apresenta resultados da Fiscalização Vegetal durante 8ª Agrobalsas Disponível em http://www.ma.gov.br/2008/5/30/Pagina5535.htm. Último acesso em 12/12/2008.

(5) PNUD Brasil. Índice de Desenvolvimento Humano – Municipal, 1991 e 2000. Disponível em http://www.pnud.org.br/atlas/tabelas/index.php. Último acesso em 16/12/2008.

(6) Trabalho escravo. Ano 2007. Comissão Pastoral da Terra. Disponível em http://www.cptnac.com.br/pub/publicacoes/5cc663bf57482f90ee14843325ce36e4.pdf

(7) Comissão Pastoral da Terra .Tabelas do Conflitos no Campo Brasil 2007. Disponível em http://www.cptnac.com.br/pub/publicacoes/e865bc50bbe20f320c53ac 3a5e25ecab.pdf. Último acesso em 16/12/2008.

(8) Fórum Carajás. Migração e trabalho escravo no Maranhão. Disponível em http://www.forumcarajas.org.br/. Último acesso em 16/12/2008.

Avanço da agricultura no cerrado. 05/03/2007. Disponível em http://www.riosvivos.org.br/canal.php?canal=19&mat_id=10308. Último acesso em 16/12/2008.

LEMOS , José de Jesus Sousa. O cultivo da soja no sul do Maranhão: implicações ambientais, sociais e econômicas. Disponível em http://www.funaguas.org.br/trabalhos/t1.htm. Último acesso em 12/12/2008.

http://www.agrisustentavel.com/doc/balsas.htm. Último acesso em 12/12/2008.

SAKAMOTO, Leonardo. 04/09/2008. Agência de Notícias Repórter Brasil. Disponível em http://www.reporterbrasil.com.br/exibe.php?id=1412&name=Os-entraves-políticos-no-combate-ao-trabalho-escravo. Último acesso em 12/12/2008.

A soja no Brasil Central – Expansão agrícola no Cerrado brasileiro. 06/12/2001. Disponível em http://www.riosvivos.org.br/canal.php?canal=50&mat_id=124. Último acesso em 12/12/2008.

STUDTE, Martin. A Expansão da Fronteira Agrícola e a Agricultura Familiar no Cerrado Maranhense. 2008. Fórum Carajás. Disponível em http://www.forumcarajas.org.br/download/pesquisa_cerrado_final_total.pdf. Último acesso em 16/12/2008.

Ficha 8 ? Chapadinha + Barreirinhas, Buriti, São Bernardo, Santa Quitéria, Brejo, Urbano Santos e Anapurus – Baixo Parnaíba do Maranhão: cadeia Minero-Siderúrgica, Monoculturas e a Alternativa Agro-Extrativista para as Populações Tradicionais

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